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Comunhão, uma necessidade (J. I. Packer)

O que impede a comunhão? Quatro coisas, pelo menos.

O primeiro obstáculo é a auto-suficiência. Não pode haver comunhão enquanto as pessoas não percebem que dependem umas das outras para receberem ajuda espritual. Uma atitude de auto-suficiência espiritual pode refletir o estado de morte espiritual do não-convertido, para quem todas as coisas espitiuais parecem irreais; ou pode refletir a miopia espiritual de crentes indolentes (cf. Hb 5.12 ss.; Rm 12.1-3) , os quais podem ser até mesmo velhos na fé. Esta atitude também pode ser a racionalização de alguém que, pelo orgulho, pelo senso de culpa ou pela hipocrisia consciente, ou mesmo por todos esses três defeitos, não está disposto a compartilhar suas necessidades espirituais e a pedir a ajuda de outros. Porém, qualquer que seja a causa, a auto-suficiência exclui a comunhão desde o seu início.

O segundo obstáculo é o formalismo. Alguns compreendem que a comunhão cristã se resume em envolver-se na adoração pública com uma postura correta, sobretudo na ocasião da Ceia do Senhor, e evitam qualquer comunhão mais íntima. Essa atitude tem diminuído em nossos dias, especialmente através do informalismo do movimento carismático, embora haja lugares onde ela persiste. Uma vívida adoração litúrgica, certamente é comunhão cristã, mas esta não se limita à adoração litúrgica, e eu espero que isto já esteja claro para meus leitores.

O terceiro obstáculo é a amargura, que se expressa por constantes atitudes de hostilidade. Hebreus 12.15 nos adverte sobre a perturbação que uma raiz de amargura pode causar. A amargura parece derivar-se mais freqüentemente do orgulho ferido e da malícia defensiva, de algum senso de injustiça, de maus tratos ou de traição, ou então da inveja que se ressente em face dos dons, da posição ou do sucesso de outrem. A inveja, em particular, torna-se uma raiz oculta de amargura, expremindo-se em controvérsias, em frieza pessoal, em maledicência (que alguém definiu como a arte de confessar os pecados alheios), em protesto ou em divisionismo. Na comunhão autêntica, cujo alvo é tornar a outra pessoa mais hábil para Deus, há um lugar próprio para crítica construtiva. A crítica pode ser exigida pelo amor, como os pais o sabem, mas ela precisa ser construtiva, e não destrutiva, oferecida com gentileza e restrição, por alguém que esteja consciente de ser ele mesmo um pecador e que reconhece que todos nós aceitamos bem pouco qualquer crítica. Entretanto, quando o motivo por trás da crítica é a amargura, ela acontecerá de modo arrogante e desenfreado, que nega comunhão, ao invés de promovê-la.

O quarto obstáculo é o elitismo, uma atitude de superioridade que produz “panelinhas” alicerçadas sobre o exclusivismo. Trata-se de uma imitação satânica da verdadeira comunhão, da qual nada é excluído, exceto a incredulidade. Quando grupos superentusiasmados se reúnem para formar associações baseadas em pequenas peculiaridades doutrinárias ou na atração magnética de um líder, o orgulho sobressai e a comunhão definha. Essa lista de obstáculos à comunhão poderia ser mais minuciosa, mas sem dúvida não há necessidade disso.

(Extraído do livro Vocábulos de Deus, J. I. Packer, pg. 181, Editora Fiel)

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Os Pecados Não São Todos Iguais

Essa pergunta nos conduz para dentro do que tem sido, para muitos evangélicos, um território inexplorado. Pensamos na conversão como o momento em que a culpa de todos os nossos pecados – do passado, do presente e do futuro, são lavados pelo  sangue remidor de Cristo. Como pecadores justificados pela fé e herdeiros de sua glória prometida, nos regozijamos na salvação e não atinamos mais para as subsistentes deficiências e como Deus pode ainda “pesá-las”.

Se questionados, explicamos nossa posição é a da verdadeira segurança evangélica. Mas o que é isso?

Os puritanos históricos também eram evangélicos, mas divergiam de nós nesse ponto  consideravelmente. Lembravam que Cristo nos havia ensinado a orar diariamente por perdão. Um dos exercícios de disciplina espiritual deles (que ainda não é nosso, geralmente) era o auto-exame toda a noite a fim de discernir quais atos em particular, praticados ou omitidos, pelos quais eram passiveis de pedido de perdão.

Em primeiro plano em suas mente estava a santidade de Deus, o temor diante de sua ira, e da sua maravilhosa longanimidade em educar e corrigir seus irresponsáveis e recalcitrantes filhos. Nessa realidade se contextualizava a certeza que tinham de que o  sangue precioso de Cristo de fato limpava os arrependidos de todos os pecados. A maioria dos evangélicos posteriores não chega ao pé deles. Estamos quase todos fora do passo marcado por eles.

A Escritura ensina que na avaliação de Deus alguns pecados são piores e implicam em maior culpa do que outros. Alguns pecados nos causam maior dano. Moisés classifica a derrocada do bezerro de ouro como um grande pecado (Ex. 32:30). Ezequiel em sua terrível alegoria disse que depois de que Aolá (Samaria) arruinou-se pela sua infidelidade a Deus, Aolibá (Jerusalém) “tornou-se mais corrupta … e sua luxúria e lascívia eram piores do que as de sua irmã” (Ez 23:11). João distingue pecados que não são dos que são irremediavelmente para a morte (1Jo 5:16). Isso tudo sem contar a advertência de Jesus acerca do pecado imperdoável (Mc 3:28-30).

As perguntas nºs 151 e 152 do Catecismo Maior de Westminster, de produção puritana, trazem clareza à matéria quando analisa os agravantes dos pecados, assim provendo meios de discernir a gravidade e a culpa deles. Sobre um prisma, todos os pecados são iguais por mais triviais que nos pareçam. Eles são dignos da “ira e maldição de Deus, tanto nessa vida como na vindoura e não podem ser expiados senão pelo sangue de Cristo.” Nenhum pecado é pequeno quando é cometido contra o grande e benevolente Deus. Por outro lado, porém, a gravidade de cada transgressão depende uma série de fatores.

Primeiro na medida em que os transgressores são mais conhecidos, aos olhos do público e são considerados dignos de fé pública, “guia para os outros, e que serves de modelo para serem seguidos por outros.” Por exemplo, Salomão em 1 Reis 11:9-10 e o servo negligente em Lucas 12:48-49- pessoas reconhecidamente confiáveis flagradas em pecado; Natã descrevendo o pecado de Davi com Bete-Seba em 2 Samuel 12:7-10; e os judeus apresentados como guias portadores da luz do céu em Romanos 2:17-23.

Segundo, as transgressões são categorizadas em função das pessoas ofendidas, ou seja, numa graduação que vai do Pai, Filho e Espírito Santo para “qualquer dos santos, particularmente o irmão mais fraco”. Por exemplo, ha os que publicamente desonram a Cristo, em Hebreus 10:28-29; e os que levam as pessoas a tropeçarem em Mateus 18:6, Romanos 14:13-15, e 1 Coríntios 8:9-12.

Terceiro, na medida em que se desfia a consciência e a censura impostas pelos outros, os transgressores agem “deliberadamente, intencionalmente, presunçosamente, impudentemente, orgulhosamente, maliciosamente, freqüentemente, obstinadamente, com gáudio, contumácia, ou reincidência após o arrependimento”. Assim temos um desafio cumulativo a Deus em Jeremias 5:8 e Amos 4:8-11; indiferença à consciência e correção em Romanos 1:32 e Mateus 18:15-17; e recaída da graça em 2 Pedro 2:20-22.

Quarto, as “circunstâncias dos tempos e lugares,” fazem o mal ser pior – por exemplo, a junção de pecado com a religiosidade hipócrita em Ezequiel 23:37-39, e envolvimento de outros no pecado de alguém em 1 Samuel 2:22-24.

Finalmente, há o pecado imperdoável, a resistência obstinada à luz do Espírito acerca da divindade e graça de Jesus Cristo, que leva a retirada de qualquer possibilidade de fé e arrependimento, e sua conseqüência letal. Sua natureza está evidente em Mateus 12:31-32 e Marcos 3:28-30.

Precisamos aprender a ver o pecado de forma translúcida, tratar a nós mesmos de forma realista e repudiá-lo e odiá-lo de todo o coração.

J. I. Packer is Board é da Junta de Dirigentes e Professor de Teologia do Regent College e Editor Executivo de Christianity Today.

Tradução de Anamim Lopes Silva

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