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O homem na nova criação
Na primeira criação, o homem tinha a capacidade do pensamento voluntário, o qual o colocava em uma posição de responsabilidade. Ele podia, portanto, obedecer ou desobedecer. Nós sabemos que ele desobedeceu, e a motivação não foi o fruto, mas o “eu”. A queda foi total: o homem desistiu de Deus.
Cristo, o segundo Adão, desistiu de qualquer pensamento de Sua própria vontade – Ele não fez uso de Sua liberdade ou do poder por Sua vontade. Ele veio para obedecer: “Eis aqui venho (no princípio do livro está escrito de Mim), para fazer, ó Deus, a Tua vontade” (Hb 10.7; Sl 40.7,8). Ele renunciou a Si mesmo. No meio da ruína, Ele amarrou o valente; Adão, por sua vez, sucumbiu no lugar de bênção. Cristo suportou o abandono, para o qual o homem correu voluntariamente, para sua eterna ruína.
Na nova criação é diferente: o homem regenerado agora tem o conhecimento do que Deus é, tendo sido criado “em verdadeira justiça e santidade” (Ef 4.24). Nós temos um relacionamento poderoso e íntimo em comunhão com Deus, pelo Espírito Santo. Nós fomos redimidos. Por causa da obra perfeita da graça do Senhor, nós fomos trazidos de volta, restaurados e reconciliados com Deus. Que coisa maravilhosa é a redenção!
O evangelho: o que é?
O evangelho é boas-novas de perdão ao culpado. É incalculável sua abrangência quanto aos diferentes níveis de culpa daqueles a quem ele é dirigido. O evangelho revela um sacrifício suficiente para todos; e a cada pecador da raça humana é ordenado recebê-lo como uma palavra fiel e digna de toda aceitação, a saber: que Cristo Jesus veio ao mundo para salvar até mesmo o pior dos pecadores.
O evangelho não nos ensina como devemos lançar o fundamento; ao contrário, esclarece-nos a respeito do firme fundamento que Deus lançou em Sião sobre o qual todos de igual forma são convidados e ordenados a edificar sua esperança, sem qualquer receio de serem repreendidos pelo gracioso Criador por causa de qualquer conduta do passado. De modo geral o Evangelho é um tanto mal compreendido por aqueles que nele professam crer. Esses o vêem como uma compensação para suas deficiências por meio dos méritos de Cristo, mas esse é outro evangelho. O evangelho de Cristo se destina aos que se acham longe da retidão, aos que são pobres, cegos e nus, os quais não têm dinheiro para comprar a salvação ou qualquer mérito que os recomende ao favor divino. Cristo veio, não para chamar os justos, mas os injustos ao arrependimento. Se não somos pecadores, nada temos a ver com o evangelho. Se somos pecadores, não rejeitamos o conselho de Deus contra nós supondo, em vão, haver em nós qualquer coisa que nos favoreceu diante Dele. Por outro lado, não imaginemos que nossos pecados são tão grandes que não podem ser perdoados. A justiça de Deus é totalmente independente de nossa obediência. O ladrão na cruz foi salvo pela fé em Cristo. Ninguém entrará no céu por qualquer outra maneira.
Tampouco devemos supor que temos ou viremos a ter em nós mesmos algo que nos recomende ao favor de Deus. “Eis agora o tempo sobremodo oportuno, eis agora o dia da salvação” (2Co 6.2). Portanto, cheguemo-nos a Deus com a oração do publicano: “Ó Deus, sê propício a mim, pecador!” (Lc 18.13). Procuremos por essa misericórdia mediante o sacrifício de Cristo.
Apesar das Escrituras serem claras e objetivas quanto a esse assunto, ele serve de pedra de tropeço e de loucura para muitos daqueles que ouviram o evangelho. Ofende-lhes o orgulho serem colocados no mesmo nível dos “párias” da sociedade. Pensam eles que há alguma diferença a ser feita; mas enganam-se, por não conhecerem as Escrituras e por não compreenderem a malignidade do pecado nem a graça de Deus. Enxergam o fato como uma barganha que Deus se propõe a fazer com Suas criaturas: que, sob certas condições, Deus os aceitará. Todavia, o que existe de fato é a mensagem da reconciliação, dirigida a todos os homens, declarando que já foi feita, na cruz, uma expiação completa pelo pecado e convidando cada pecador da raça adâmica a aproximar-se de Deus com urgência e tê-Lo como amigo e Pai, mediante Cristo.
Quando Moisés levantou a serpente no deserto, esse ato serviu como um remédio, igualmente apropriado a todos os que haviam sido picado. Quer a pessoa acabasse de ter sido picada, quer tivesse o veneno já infectado o sangue, ao olhar para a serpente o enfermo era curado. Em referência a essa simbologia, Cristo dirigiu-se a toda a humanidade, sem discriminação e disse: “Olhai para Mim e sede salvos, vós, todos os termos da terra; porque Eu sou Deus, e não há outro… Deus justo e Salvador não há além de Mim” (Is 45.22,21).
Ao anunciar a promulgação do evangelho, o Senhor declarou pelo profeta: “Os olhos altivos dos homens serão abatidos, e a sua altivez será humilhada; só o Senhor será exaltado naquele dia” (Is 2.11).
Ao mesmo tempo em que o evangelho é uma proclamação do perdão enviado os pecadores, sem qualquer exceção, e um convite ilimitado aos culpados para que se refugiem no sangue do sacrifício, é também o poder de Deus para salvação apenas daqueles que crêem. Porém, é inútil falar em ser justificado pela retidão de Cristo, a menos que o coração seja purificado pela fé.
Podemos dizer que cremos em Cristo e sermos ainda escravos do pecado. Podemos enganar a nós mesmos e afirmar que cremos na justiça de Cristo, enquanto continuamos a viver segundo a carnalidade. Mas todo ramo da videira que não der fruto será lançado no fogo. Nós não podemos enganar a Deus; e se, com a Bíblia em mãos, enganamos a nós mesmos, então, somos indesculpáveis.
Se cremos no evangelho de Cristo, ele operará eficazmente em nosso coração (1Ts 2.13) e nos ensinará que, renegando a impiedade e as paixões mundanas, devemos viver sensata, justa e piedosamente no presente século. Se aquilo em que cremos não produz tal efeito, então, não é sobre a verdadeira graça de Deus que estamos firmados. Toda a doutrina cuja crença não produz esse efeito é falsa; e o iludirmos a nós mesmos com nossos próprios enganos é o conforto que obtemos dessa doutrina. “Os que pertencem a Cristo crucificaram a carne, com as suas paixões e concupiscências” (Gl 5.24).