William J. Watterson
I Co 11:20-34 – A Ceia, o único memorial de Cristo instituído para esta dispensação, apresenta duas características aparentemente contraditórias: simplicidade e sublimidade. Vamos examiná-las resumidamente.
A Instituição da Ceia
O Novo Testamento contém quatro relatos da instituição da Ceia: Mateus 26:26-28; Marcos 14:22-24; Lucas 22:19-20; I Coríntios 11:20-34. Apesar do lugar de destaque que a Ceia ocupa nos corações daqueles que amam a Cristo (e com toda razão), é interessante notar que a Palavra de Deus destaca a simplicidade desta celebração. O Novo Testamento fala relativamente pouco acerca duma reunião tão preciosa; não porque a Bíblia desconhece a importância da Ceia, mas para enfatizar que esta reunião só é preciosa devido ao Senhor do qual ela fala.
Afirmamos que a Ceia é uma reunião simples pelos seguintes motivos:
a) Instituída num contexto simples
As quatro narrativas da instituição da Ceia mostram que ela foi instituída de uma forma bem simples, sem qualquer ostentação. O Senhor não preparou um ambiente especial, e nem mesmo preparou, de antemão, seus discípulos, avisando-os de que iria instituir esta reunião. Eles estavam reunidos para outro propósito e não para a instituição da Ceia, mas para a celebração da Páscoa. E no meio daquela festa dos judeus, sem qualquer aviso prévio, o Senhor instituiu a Ceia.
b) Realizada com elementos simples
Ao fazer isto, Ele não utilizou-se de alguma coisa cara e especial, mas de dois elementos simples, que estavam em abundância ali sobre a mesa. Ele tomou, simplesmente, um pão e um cálice. Não eram elementos trazidos especialmente para a ocasião; eram elementos trazidos ali devido à festa da Páscoa, e que Ele aproveitou para instituir a Ceia. Todos os anos, havia pães e cálices sobre a mesa na festa da Páscoa. O Senhor usou aquilo que estava ali à Sua disposição.
c) Realizada de forma simples
Toda a cerimônia é marcada pela simplicidade. “O Senhor Jesus tomou o pão; e, tendo dado graças, o partiu e disse: Tomai, comei: isto é o meu corpo que é partido por vós; fazei isto em memória de mim. Semelhantemente, depois de cear, tomou o cálice, dizendo: Este cálice é o Novo Testamento no meu sangue; fazei isto, todas as vezes que o beberdes, em memória de mim.” Só isto! Eu reconheço, é claro, que este ato aparentemente tão simples é repleto de instrução e solenidade. Mas repare este fato: do ponto de vista da liturgia, do ritual, da forma de celebração, a Ceia não poderia ser mais simples!
Por quê?
Faríamos bem se meditássemos nisto. Por que a instituição da Ceia é caracterizada por tanta simplicidade?
O Senhor poderia ter levado Seus discípulos para algum lugar especialmente preparado, avisando-os de que o propósito de sua reunião seria a instituição de algo muito importante. Poderia ter usado elementos atraentes e caros. Poderia ter estabelecido um ritual requintado e atraente. Mas não o fez.
Na Velha Aliança foi assim. As instruções para a construção do Tabernáculo foram dadas no monte Sinai, no meio de vozes, trovões e relâmpagos. A construção foi feita com materiais caros como ouro, e era de uma beleza impressionante (no seu interior). E não era de qualquer forma que os sacerdotes oficiavam; havia muitos rituais relacionados com a adoração no Tabernáculo.
Mas a instituição da Ceia está em absoluto contraste com todo este ritual do Velho Testamento. No meio da festa da Páscoa, sem qualquer aviso prévio, usando elementos comuns e normais, o Senhor institui uma celebração extremamente simples. Nada de rituais, nada de pompa e glória humana. Apenas uma cerimônia simples.
A razão é clara. A Ceia não é uma reunião para provocar admiração em ninguém devido à beleza de seus rituais e cerimônias. Não foi instituída para atrair, de qualquer forma, a carne (que sempre gosta da pompa dos rituais tradicionalistas). É, pelo contrário, uma reunião que, quando celebrada em sua simplicidade original, impressiona qualquer pessoa espiritual presente, por trazer à memória a pessoa do Senhor Jesus. Ele é o motivo e a razão de ser desta celebração. Ela impressiona quem já pertence a Cristo e O ama, mas não tem nada para agradar ou atrair o incrédulo. É uma celebração simples, porque a importância está na Pessoa de quem lembramos. O valor não está nos símbolos, mas na Pessoa de quem estes símbolos falam.
Um ritual requintado, uma celebração bela e atraente chamaria toda a atenção para si, desviando nossa atenção do Senhor. A simplicidade da Ceia não ofusca, mas destaca a glória do Senhor.
Por este motivo, devemos zelar pela simplicidade desta reunião. Abandoná-la significa desonrar o Senhor. Não podemos permitir que nada e nem ninguém chame para si a atenção durante a Ceia. Muitas igrejas, bem intencionadas, e querendo mostrar a importância que dão à Ceia, acabam por destruí-la. A beleza dos preparativos, a programação formal (onde alguém é responsável por “presidir” a Ceia, alguém serve os elementos a todos os participantes, etc), e coisas semelhantes apenas servem para agradar aos olhos humanos, e acabam tirando a nossa atenção daquele que é o centro e a razão da Ceia, o nosso amado Senhor Jesus Cristo.
Uma reunião preciosa
Apesar de extremamente simples, a instituição da Ceia nos lembra que é, também, uma reunião das mais preciosas para o cristão. O homem só sabe valorizar o exterior, mas esta reunião, que não tem nada para atrair a carne, nada para impressionar o ser humano, é preciosa para toda aquele que é salvo.
O principal motivo pelo qual celebramos a Ceia é para lembrar do Senhor. Três vezes lemos estas palavras ditas pelo Senhor: “Em memória de Mim”. Pode haver ocupação mais nobre, mais preciosa, para um cristão do que lembrar do seu Senhor?
Lamentavelmente a correria do dia a dia torna-nos tão esquecidos. Durante a semana, lembramos do Senhor muito menos do que deveríamos. Quão precioso, então, que podemos celebrar a Ceia todo domingo. Pelo menos durante aquela hora temos o privilégio de ocuparmo-nos somente com o Senhor. Estamos ali, não para aprender nem ensinar; não para pedir nem agradecer por orações respondidas; não para exortar nem consolar; estamos ali somente para lembrar! Lembrar daquele que representa tudo para nós.
Quanto mais importante uma pessoa, mais importância terá qualquer coisa feita em memória desta pessoa (uma estátua, um memorial, etc). Tratando-se do Senhor Jesus Cristo, aquele que é “mais sublime do que os céus” (Hb. 7:26), percebemos um pouco da importância de celebrar a Ceia, pois ela é em memória dEle.
Outra indicação da importância da Ceia está no juízo solene pronunciado sobre aqueles que participarem indignamente (I Co 11:27-34). Aos olhos de Deus, participar indignamente torna alguém “culpado do corpo e do sangue do Senhor”. Quem participa indignamente “come e bebe para sua própria condenação”. A Ceia é preciosa aos olhos de Deus, e Ele não permite que alguém participe indignamente sem sofrer as conseqüências. Não é um acontecimento qualquer, onde qualquer um pode chegar de qualquer forma. É algo precioso para Deus, pois fala da morte do Seu Filho Unigênito, e deveria ser precioso para nós também.
Ainda há, porém, pessoas que desprezam este memorial. Ainda há cristãos que proclamam seu amor por Cristo com todo o ânimo quando podem falar ou cantar, mas ausentam-se da Ceia. Irmão, se você diz que ama ao Senhor, mas não tem interesse em lembrar dEle da forma como Ele pediu, alguma coisa está muito errada.
Que cada leitor já salvo pondere estas coisas. Estamos dando a devida importância à Ceia do Senhor, sem afastarmo-nos da simplicidade que caracterizou sua instituição? Deus permita que sim.