“Para conhecê-Lo…” (Fp 3.10).
“Estou há tanto tempo convosco, e não Me tendes conhecido, Filipe?” (Jo 14.9).
Leia também Fp 1.10; Hb 8.11; 1Jo 2.20,27.
É da maior importância para os filhos de Deus reconhecerem plenamente que, acima de todas as coisas, o objetivo de Deus é que eles O conheçam. Esse é o objetivo que governa todos os Seus tratos conosco. Essa é a maior de todas as nossas necessidades.
Isso é o segredo da força, da perseverança e do serviço. Isso determina a medida de nossa utilidade para Ele. Essa era a única paixão da vida do apóstolo Paulo. Essa era a causa de seu incessante trabalho a favor dos santos. Isso é o coração e o ponto central da Epístola aos Hebreus. Esse era o segredo da vida, do serviço, da persistência, da confiança do Senhor Jesus como Filho do homem.
Todos esses fatos precisam ser examinados mais de perto. Começamos sempre com o Senhor Jesus como o representante de Deus, o Homem de acordo com a mente divina. Em Sua vida na terra, não houve parte ou aspecto que não tivesse a força e a habilidade enraizadas em, e derivada de, Seu conhecimento interior de Seu Pai, Deus. Nunca podemos esquecer que Sua vida era de absoluta dependência de Deus, voluntariamente aceita. Ele atribuía tudo ao Pai: palavra, sabedoria e obras. Os milagres foram possíveis por meio de Seus apóstolos como por meio Dele mesmo. Isso não coloca os apóstolos no mesmo nível pessoal que Ele. Sua deidade permanece. Ele é Deus manifestado na carne, mas Ele aceitou, do ponto de vista humano e em relação ao homem, as limitações e a dependência do homem para que Deus pudesse ser Deus manifestado. Há uma sujeição aqui segundo a qual, de Si mesmo, Ele não é capaz de fazer coisa alguma (Jo 5.19). O princípio de toda a Sua vida, em cada fase e detalhe, era Seu conhecimento de Deus. Ele conhecia o Pai no que diz respeito às palavras que falava, as obras que fazia, aos homens e mulheres com quem tratava; com respeito ao momento de falar, agir, ir, permanecer, render-se, recusar, silenciar; com respeito aos motivos, pretensões, declarações, inquisições, sugestões dos homens e de Satanás. Ele sabia quando podia e quando não podia entregar Sua vida. Sim, tudo aqui é governado por aquele conhecimento interior de Deus. Há numerosas evidências em Atos como a prática, e nas Epístolas como a doutrinária, revelação da mente de Deus, de que Deus definiu que esse princípio deve ser mantido como a lei básica da vida de Seu povo ao longo do tempo. Esse conhecimento, no caso do Senhor Jesus, era o segredo de Sua completa supremacia e de Sua absoluta autoridade.
Mestres em Israel o procuraram, e a questão que apressou a busca deles foi o conhecimento. “Tu és mestre de Israel, e não sabes isto?” (3.10). Nicodemos tinha ido ao único que sabe, cuja autoridade é superior à dos escribas, não somente em nível, mas em espécie.
Até o fim do Evangelho de João, o qual especialmente traz uma percepção sobre esse assunto, “conhecer” ocorre mais de cinqüenta vezes. Nosso Senhor afirmou que “a vida eterna é esta: que Te conheçam, a Ti só, por único Deus verdadeiro, e a Jesus Cristo, a quem enviaste” (17.3). Isso não significa que a vida eterna é dada meramente com base em conhecê-la. Pode haver vida com conhecimento muito limitado. Mas vida em plenitude é intimamente relacionada com aquele conhecimento, e o aumento crescente dele se manifesta em vida crescente. Isso funciona nos dois sentidos: do conhecimento para a vida e da vida para o conhecimento.
Isso explica todas as experiências, provações, os sofrimentos, as perplexidades, fraquezas, situações desagradáveis ou difíceis, os becos sem saída, as confusões, pressões que sofremos. Mesmo que o refinamento do espírito, o desenvolvimento das graças, a remoção das impurezas sejam propósito do fogo, no entanto, acima e por meio de todas essas situações há um único objetivo: que conheçamos o Senhor. Há somente uma maneira de realmente conhecermos o Senhor, e é experimentalmente.
Nossa mente está, com muita frequência, ocupada com serviço e obras; pensamos que fazer coisas para o Senhor é o principal objetivo da vida. Estamos preocupados com a obra à qual consagramos a vida, com nosso ministério. Pensamos em equipar-nos para isso em termos de estudo e de conhecimento de coisas. Ganhar almas ou ensinar os crentes ou capacitar pessoas para a obra estão mais no primeiro plano. Estudo da Bíblia e conhecimento das Escrituras, com eficiência na questão de liderar no serviço cristão como o fim em vista, são assuntos de importância premente para todos. Está tudo bom e correto com essas importantes questões, mas, acima de tudo, o Senhor está mais interessado em nosso conhecimento Dele do que com qualquer outra coisa.
Muitas vezes o Senhor tem de tirar nossa obra para que possamos descobri-Lo. O valor último de qualquer coisa não é a informação que sobre ela damos, não é a ortodoxia da doutrina, não é a quantidade de obra que fazemos, não é a medida da verdade que possuímos, mas apenas o fato de conhecermos o Senhor de modo profundo e poderoso.
Isso é o que permanecerá quando tudo o mais passar. Isso é o que fará a permanência de nosso ministério depois de nós termos ido. Embora possamos ajudar outros de muitas maneiras e por muitos meio por toda a duração da vida deles, nosso real serviço a eles é baseado em nosso conhecimento do Senhor.
O maior dos problemas da vida cristã é o problema da direção
Quanto tem sido disso e escrito sobre esse assunto! A última palavra para muitos é: “Ore sobre isso, confie isso a Deus, faça o que parece ser certo e confie que Deus vai fazer tudo dar certo.” Isso nos parece fraco e inadequado. Não vindicamos a capacidade de estabelecer as bases abrangentes e conclusivas da direção, mas temos a forte convicção de que a única coisa para nos dar direção para os eventos, incidentes e contingências da vida, mais do que qualquer outra, é um conhecimento permanente, pessoal e interior do Senhor. Uma coisa é chamar um amigo em situações de emergência ou em ocasiões especiais para aconselhamento sobre o caminho a ser tomado; outra bem diferente é viver com aquele amigo de modo que aquilo que é derivado da percepção da mente dele em relação a todas as coisas é que vai governar em questões particulares.
Nós queremos instruções, ordens; o Senhor quer que tenhamos uma “mente”. “Haja em vós o mesmo sentimento”1 (Fp 2.5). “Nós temos a mente de Cristo” (1Co 2.16). Cristo tem uma consciência e, por meio do Espírito Santo, Ele nos deu e desenvolve em nós essa consciência. A afirmação inspirada é que “vós tendes a unção do Santo, e sabeis tudo [‘que vos ensina com respeito a todas as coisas’, na tradução usada pelo autor]” (1Jo 2.20). Não somos servos, somos filhos. Ordens, como tais, são para servos; uma mente é para filhos.
Há um assustador estado de coisas entre o povo do Senhor hoje. Há muitos cristãos que têm a vida quase inteiramente naquilo que é exterior a eles: em seus conselhos e direção, no que os sustêm e apoia, em seu conhecimento, em seus meios de graça. Inteligência pessoal, interior, espiritual é algo muito raro. Não é de admirar que o inimigo seja tão bem-sucedido em ilusões, falsificações e imitações. Nossa maior salvaguarda contra isso é um profundo conhecimento do Senhor por meio da disciplina.
Conhecer o Senhor de modo real significa manter-se constante quando outros estão perdendo o controle – constância nos tempos de ardente provação. Aqueles que conhecem o Senhor não fazem as coisas por si mesmos nem tentam começar as coisas. Eles são cheios de amor e de paciência, e não são abalados quando tudo parece estar se espatifando. Confiança é um fruto essencial e inevitável desse conhecimento, e naqueles que conhecem o Senhor há uma quieta força serena que fala de uma grande profundidade de vida.
Para concluir, indico que em Cristo “estão escondidos todos os tesouros da sabedoria e da ciência [conhecimento]” (Cl 2.3), e que a vontade do Senhor para nós é que haja uma percepção sempre crescente e uma apreciação pessoal Dele, em quem toda a plenitude habita.
Temos apenas apresentado fatos sobre a vontade do Senhor para todos os Seus e a maior necessidade deles.
Cada novo nascer de uma condição anormal tem revelado a apavorante fraqueza entre o povo do Senhor por causa dessa falha. Ondas de erro, o balançar do pêndulo para alguma aceitação popular nova, uma grande guerra com seus horrores e seus multifacetados testes da fé: tudo isso tem assolado multidões e as deixado em ruínas espirituais.
Essas coisas estão sempre à mão, e nós escrevemos essa mensagem para instar com os filhos de Deus para ter cada trato definido com Ele a fim de que Ele possa tomar todas as medidas necessárias com eles para que O conheçam.
1A palavra grega aqui, na ACF, traduzida por sentimento é traduzida em inglês por mente. A mesma palavra é vertida para pensar em Rm 12.3 e em Cl 3.2. (N. do T.)
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