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Vida cristã Watchman Nee

O tesouro no vaso de barro (Watchman Nee)

Poder na Fraqueza

Você já começou a entender o que significa ser um cristão? Ser um cristão é ser uma pessoa em quem aparentes incompatibilidades coexistem, mas em quem é o poder de Deus que muitas vezes triunfa. Um cristão é alguém em cuja vida há um inerente e misterioso paradoxo; e esse paradoxo é de Deus. Algumas pessoas concebem o cristianismo como todo o tesouro e não o vaso. Se, por vezes, o vaso de barro é visível em um servo de Deus, elas acham que esse servo é um caso perdido, enquanto a concepção de Deus é que, nesse mesmo vaso, Seu tesouro deveria ser encontrado.

Neste ponto devemos fazer uma cuidadosa distinção entre homem e “a carne” no homem – entre a limitação que é inerente em nosso ser humano e a natureza carnal do homem com sua inveterada tendência para pecar, uma tendência que nos deixa (à parte da ajuda do Espírito Santo) totalmente impossibilitados de agradar a Deus. Essa distinção é a mais importante por causa da facilidade com que, mesmo em um filho de Deus, alguém influencia o outro, e com que a natureza humana em nós cede à natureza carnal. Que fique bem claro, portanto, que eu definitivamente não tenho a intenção, neste capítulo, de justificar ou fechar os olhos para o pecado ou a carnalidade. A carne deve ser resistida e entregue à morte – a morte da cruz. No entanto, a fraqueza, neste outro sentido, deve permanecer. Nosso bendito Senhor foi, por nossa causa, “crucificado em fraqueza”, contudo vive pelo poder de Deus (2 Co 13.4); e, quanto a nós, é em nossa fraqueza que Seu poder se aperfeiçoa. Há, portanto, uma “enfermidade” na qual é possível gloriar-se (12.9).

Assim Paulo diz-nos que ele tinha “um espinho na carne” (12.7). O que era eu não sei, mas sei que esse espinho o enfraquecia muito, e que, por três vezes, ele orou para que o espinho fosse tirado. No entanto, em resposta, Deus apenas lhe assegurou: “A minha graça te basta” (12.9). Somente isso – mas isso era suficiente.

Como o poder do Senhor pode ser manifestado à perfeição em um homem fraco? Pelo cristianismo, pois o cristianismo é isso. O cristianismo não é a remoção da fraqueza, nem é simplesmente a manifestação do poder divino. É a manifestação do poder divino na presença da fraqueza humana. Sejamos claros neste ponto. O que o Senhor está fazendo não é algo meramente negativo – ou seja, eliminar a nossa enfermidade. Nem, quanto a isso, é meramente positivo – conceder força em qualquer situação, a esmo. Não, Ele nos deixa com a enfermidade e concede a força ali. Ele está concedendo Sua força aos homens, mas essa força é manifestada em sua fraqueza. Todo o tesouro que Ele dá é colocado em vasos de barro.

Fé Quando há Dúvida

O que acabamos de dizer é uma impressionante verdade sobre a fé. Inúmeras pessoas vieram a mim e contaram seus temores e preocupações mesmo enquanto buscavam confiar no Senhor. Faziam seus pedidos, tomavam posse das promessas de Deus e, não obstante, sempre surgiam dúvidas inesperadas. Deixe-me dizer-lhe que o tesouro da verdadeira fé aparece em um vaso que pode ser dolorosamente atacado pela dúvida, e o vaso de barro, por causa da presença da dúvida, não invalida o tesouro; pelo contrário, o tesouro nesse ambiente resplandece com uma beleza maior. Não me entenda mal: não estou incentivando a dúvida. A dúvida é uma marca da deficiência em um cristão, mas eu gostaria de deixar claro que o cristianismo não é só uma questão de fé, mas da fé que triunfa na presença da dúvida.

Gosto de lembrar-me da oração da igreja primitiva para que Pedro fosse liberto das mãos dos ímpios. Quando Pedro voltou da prisão e bateu à porta da casa onde a igreja estava reunida em oração, os cristãos exclamaram: “É o seu anjo!” (AT 12.15). Você vê? Havia fé ali, a verdadeira fé, o tipo de fé que poderia trazer uma resposta de Deus; e, não obstante, ainda havia a fraqueza do homem, e a dúvida estava bem ali perto, por assim dizer. Porém, hoje, a fé que muitas pessoas que fazem parte do povo de Deus declaram exercer é maior do que a exercida pelos cristãos reunidos na casa de Maria, mãe de João Marcos. E elas têm certeza disso! Estão certas de que Deus enviará um anjo, e que todas as portas da prisão se abrirão diante delas. Se uma rajada de vento soprar: “Há um Pedro batendo na porta!”. Se a chuva começar a balbuciar: “Há um Pedro batendo na porta de novo!”.

Essas pessoas são muito crédulas, muito confiantes. Sua fé não é necessariamente um objeto genuíno. Até no cristão mais consagrado, o vaso de barro sempre está ali, e, pelo menos para ele, está sempre em evidência, embora o fator determinante nunca seja o vaso, mas o tesouro dentro dele. Na vida de um cristão normal, só quando a fé aumenta positivamente de modo a agarrar-se a Deus é que pode surgir ao mesmo tempo uma questão quanto a se talvez ele possa estar enganado. Quando ele está mais forte no Senhor, muitas vezes está mais consciente da sua incapacidade; quando ele está mais corajoso, talvez esteja mais ciente do temor no íntimo; e no ponto em que ele está mais alegre, uma sensação de angústia prontamente lhe sobrevém novamente. Somente a excelência do poder o leva às alturas. Porém este paradoxo é, em si, uma evidência, tanto de que há um tesouro como de que é ali que Deus gostaria que ele estivesse.

Deveria ser um motivo de grande gratidão a Deus o fato de que nenhuma fraqueza meramente humana precisa limitar o poder de Deus. Somos inclinados a pensar que onde há tristeza não pode haver alegria; que onde há lágrimas não pode haver louvor; que onde a fraqueza é visível falta poder; que quando estamos cercados por inimigos seremos confinados; que onde há dúvida não pode haver fé. Entretanto, deixe-me declarar com força e com confiança que Deus está procurando levar-nos ao ponto onde tudo que é humano só tem por objetivo prover um vaso de barro para conter o tesouro divino. Daqui para frente, quando estivermos conscientes da depressão, que não cedamos a essa depressão, mas nos entreguemos ao Senhor; quando a dúvida ou o temor surgir em nosso coração, que não nos entreguemos a eles, mas ao Senhor, e o tesouro resplandecerá ainda mais gloriosamente, por causa do vaso de barro.

(Extraído do livro A Direção de Deus Para o Homem, de Watchman Nee, Editora dos Clássicos, julho de 2004)

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Vida cristã Watchman Nee

A porta e o caminho (Watchman Nee)

“Entrai pela porta estreita (larga é a porta, e espaçoso, o caminho que conduz para a perdição, e são muitos os que entram por ela), porque estreita é a porta, e apertado, o caminho que conduz para a vida, e são poucos os que acertam com ela” (Mt 7.13,14).

Hoje, nosso propósito não é explicar a passagem mencionada, mas demonstrar a trajetória da vida cristã, porque os versículos acima tratam de dois grandes princípios: (1) entrar pela porta e (2) percorrer o caminho. Enfatizar um deles e excluir o outro resultará em um extremo. Deus coloca, diante do cristão, uma porta e um caminho, ou um caminho e uma porta, a fim de mantê-lo em equilíbrio.

O que significa entrar pela porta? Entrar pela porta quer dizer passar por uma crise. Assim como a passagem tem uma porta que bloqueia o seu avanço, passar pela porta significa enfrentar algo que você nunca experimentou antes. Não importa quão espessa seja a porta, não se leva cinco minutos para atravessá-la. Quando alguém passa, está, de imediato, em um novo ambiente. Há uma diferença enorme entre o cenário anterior à passagem pela porta e a cena posterior. Cinco minutos antes, a pessoa estava em um mundo particular, mas, agora, está em um mundo diferente. Anteriormente, a pessoa estava do lado de fora da porta e, agora, encontra-se do lado de dentro. Por exemplo: do lado de fora do parque Jessfield, é possível vermos poeira e carros. Porém, ao entrar pela porta do parque, sentimos, de imediato, que estamos em uma área completamente diferente.Portanto, falando em termos espirituais, entrar pela porta significa que, em um curto período de tempo, surge uma diferença tremenda. Num período tão breve, o cristão passa por uma crise, e sua condição espiritual toma outro rumo no mesmo instante.

O cristão não apenas tem de atravessar uma crise, mas deve percorrer um caminho também. O caminho é longo, e é necessário muito tempo para percorrê-lo. Leva muito tempo para atravessar a porta? É óbvio que ela pode ser atravessada com rapidez. O que, então, requer mais tempo: entrar pela porta ou percorrer o caminho? Naturalmente, percorrer o caminho exige mais tempo. Surge um grande desequilíbrio se alguém entra pela porta sem dar um passo no caminho em seguida. Depois que o cristão atravessa a porta, ele deve seguir adiante, passo a passo. Percorrer o caminho significa prosseguir gradualmente – um passo depois do outro. Para atravessar a porta, é necessário apenas um passo, mas o ato de percorrer o caminho não pode ser realizado em apenas um passo. Assim, ao entrar pela porta, o cristão imediatamente sente uma mudança distinta. Ele segue adiante (mais uns cem passos) e, então, pode ter de atravessar outra porta. Talvez, após dar mil passos, outra crise ainda o espere. O cristão deve, portanto, estar preparado para percorrer o caminho sempre que decidir atravessar uma porta. Por isso, passar pela porta significa enfrentar uma crise, enquanto percorrer o caminho quer dizer progredir.

Hoje em dia, há muitas controvérsias sobre esse assunto entre os cristãos. Alguns enfatizam a crise, enquanto outros, o progresso. Alguns consideram que entrar pela porta deve ser uma experiência suprema, enquanto outros supõem que podem prosseguir sem qualquer necessidade de atravessá-la. Ambas as posições são desequilibradas. Devemos saber que, de um lado, precisamos passar por uma crise e, por outro, prosseguir no caminho. Entrar pela porta e percorrer o caminho são dois importantes princípios bíblicos; eles devem ser igualmente enfatizados.

De acordo com a Palavra de Deus, entrar pela porta, em nossa trajetória espiritual, antecede o ato de percorrer o caminho. Em primeiro lugar, a crise; depois, o progresso. Contudo, acontece o contrário para quase toda jornada terrestre, pois esta requer normalmente caminhar antes de entrar. Na jornada espiritual, porém, o caso é outro, pois pode ser semelhante a uma viagem rumo a um palácio ou mausoléu real cercado por uma muralha gigantesca. Você precisa passar pela entrada primeiro e, depois, andar por uma extensa trilha antes de chegar ao destino. Uma vez que a Bíblia sempre apresenta a porta e o caminho juntos, podemos vê-los em ação tanto na “fé” quanto na “obediência” – dois princípios-chave da vida cristã.

(Extraído do livro Vida Cristã Equilibrada, de Watchman Nee – Editora dos Clássicos)

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T. Austin-Sparks

O desejo de Austin-Sparks

THEODORE AUSTIN-SPARKS (1888-1971) deixou ao partir um tesouro de escritos repletos com a Sabedoria, a Vida e a Revelação de Cristo. Ele entendia que aquilo que era dado pelo Único Espírito de Deus devia ser livremente compartilhado com o Único Corpo de Cristo – o que pertence a um, pertence a todos. Ele não desejava seus escritos ou fitas com copirraite; dando livremente ao Corpo o que era livremente recebido do Cabeça. Tendo nós mesmos apreciado grandemente seus escritos, nós os oferecemos aqui na Internet para o conseqüente estabelecimento e fortalecimento do Corpo, para que em todas as coisas CRISTO possa ter a preeminência.

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Escatologia

Bruxas e armas nucleares

Há aquela frase em espanhol que diz: “Eu não creio em bruxas, mas que elas existem, existem”.

Há quem não creia em sua existência. Há quem se divirta com Halloween. Quem faz cursos de inglês sabe que as escolas adotam essa festa “inocente”. E há quem se dê por satisfeito com os alertas evangélicos sobre isso tudo, supondo que eles apresentem toda a verdade sobre o assunto. Ledo engano. Leiam, por favor, este artigo: http://news.yahoo.com/news?tmpl=story&u=/cdh/20041030/lo_cdh/realwitchestrytobreakoldmyths

Agora, para você ficar um pouco mais tranqüilo, aprendam como guardar material nuclear em casa: http://msnbc.msn.com/id/6389521/

Com certeza, nosso Senhor está próximo, muito próximo.

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Igreja Modernismos

Um templo ou um teatro? (Charles H. Spurgeon)

Os homens parecem nos dizer: “Não há qualquer utilidade em seguirmos o velho método, arrebatando um aqui e outro ali da grande multidão. Queremos um método mais eficaz. Esperar até que as pessoas sejam nascidas de novo e se tornem seguidores de Cristo é um processo demorado. Vamos abolir a separação que existe entre os regenerados e os não-regenerados. Venham à igreja, todos vocês, convertidos ou não-convertidos. Vocês têm bons desejos e boas resoluções: isto é suficiente; não se preocupem com mais nada. É verdade que vocês não crêem no evangelho, mas nós também não cremos nele. Se vocês crêem em alguma coisa, venham. Se vocês não crêem em nada, não se preocupem; a ‘dúvida sincera’ de vocês é muito melhor do que a fé”.

Talvez o leitor diga: “Mas ninguém fala desta maneira”.

É provável que eles não usem esta linguagem, porem este é o verdadeiro significado do cristianismo de nossos dias. Esta é a tendência de nossa época. Posso justificar a afirmação abrangente que acabei de fazer, utilizando a atitude de certos pastores que estão traindo astuciosamente nosso sagrado evangelho sob o pretexto de adaptá-lo a esta época progressista.

O novo método consiste em incorporar o mundo à igreja e, deste modo, incluir grandes áreas em seus limites. Por meio de apresentações dramatizadas, os pastores fazem com que as casas de oração se assemelhem a teatros; transformam o culto em shows musicais e os sermões, em arengas políticas ou ensaios filosóficos. Na verdade, eles transformam o templo em teatro e os servos de Deus, em atores cujo objetivo é entreter os homens. Não é verdade que o Dia do Senhor está se tornando, cada vez mais, um dia de recreação e de ociosidade; e a Casa do Senhor, um templo pagão cheio de ídolos ou um clube social onde existe mais entusiasmo por divertimento do que o zelo de Deus?

Ai de mim! Os limites estão destruídos, e as paredes, arrasadas; e para muitas pessoas não existe igreja nenhuma, exceto aquela que é uma parte do mundo; e nenhum Deus, exceto aquela força desconhecida por meio da qual operam as forças da natureza. Não me demorarei mais falando a respeito desta proposta tão deplorável.

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Igreja Vida cristã

O sacerdócio de todos os crentes (William McDonald)

William McDonald, in Cristo Amou a Igreja

Traduzido por Viriato Sobral, 1961

Todos os crentes são sacerdotes de Deus

Cada Igreja local devia, praticamente, testemunhar desta verdade recusando o reconhecimento de qualquer outro sacerdócio, e animando todos os crentes a exercerem os privilégios e responsabilidades deste cargo sagrado.

1º – No Velho Testamento lemos que a Lei de Moisés separou a tribo de Levi e a família de Aarão para serem os sacerdotes da Nação. Estes homens usavam vestes diferentes, tinham privilégios especiais e constituíam uma casta a parte, entre Deus e a congregação de Israel. Só eles podiam entrar no lugar santo e oferecer os sacrifícios prescritos pela Lei.

2º – No Cristianismo é tudo diferente. Todos os crentes são sacerdotes, segundo o ensino do Novo Testamento.

    a) “Vós também, como pedras vivas, sois edificados casa espiritual e sacerdócio santo para oferecer sacrifícios espirituais, agradáveis a Deus por Jesus Cristo” (1 Pedro 2:5).

    b) “Mas vós sois a geração eleita, o sacerdócio real, a nação santa, o povo adquirido, para que anuncieis as virtudes daquele que vos chamou das trevas para a Sua maravilhosa luz” (1 Pedro 2:9).

    c) “Àquele que nos ama, e em Seu sangue nos lavou dos nossos pecados, e nos fez reis e sacerdotes para Deus e Seu Pai; a Ele glória e poder para todo o sempre. Amém” (Apoc. 1: 5,6).

Um grande servo de Deus, pugnando pela verdade de que o sacerdócio é privilégio de todos os crentes, escreveu: “Todos os crentes são, indistintamente, sacerdotes, e quem disser que ha sacerdotes além dos crentes nascidos de novo, seja anátema, porque uma afirmação destas não teria base alguma na Palavra de Deus; seria baseada exclusivamente em afirmações meramente humanas ou nas tradições dos homens.”

3º – Um dos importantes deveres do sacerdote é oferecer sacrifícios. No Velho Testamento os sacrifícios consistiam em animais imolados. Nesta Dispensação da Graça, contudo, os sacrifícios dos crentes são:

    a) O sacrifício do seu corpo (Rom. 12:1); não um sacrifício morto, mas “vivo, santo e agradável”, oferecido exclusivamente a Deus.

    b) O sacrifício de bens materiais. “Não vos esqueçais da beneficência e comunicação, porque, com tais sacrifícios, Deus se agrada”. (Heb. 13:16).

    c) O sacrifício de louvor. “Portanto, ofereçamos sempre por Ele, a Deus, sacrifícios de louvor, isto é, o fruto dos lábios que confessam o Seu Nome”. (Heb. 13:15).

    Este sacrifício deve ser tanto individual como colectivo. Este último – o sacrifício de louvor – no qual os crentes gozam de liberdade para tomar parte na adoração pública, foi praticamente eliminado e substituído pelos monótonos serviços regulamentados e orientados dos nossos dias. Disto resulta uma multidão de sacerdotes mudos – um estado de coisas ignorado nas Escrituras.

4º – Os deveres dos sacerdotes incluem também oração, testemunho para glória de Deus, e o cuidado do Seu Povo. Portanto, os crentes deviam ter cuidado em exercer todas estas sagradas missões. O ensino das Escrituras sobre este assunto (Rom. 8:14; Gál. 5:18; João 16:13), revela que todos esses deveres devem ser postos em prática desde manhã até à noite, todos os dias da semana, e não só aos Domingos. Não se limitam as reuniões da Igreja, sejam reuniões de adoração, de estudo bíblico ou de oração, mas abrangem toda a vida do crente, tanto dentro como fora dos lugares das reuniões, sejam eles salões, capelas ou igrejas, no sentido pleno da palavra. Segundo o Novo Testamento, todo o povo de Deus é: “um reino sacerdotal e uma nação santa”, (Êxodo 19:6; 1 Pedro 2:5-9).

5º – Apesar de todos os crentes serem sacerdotes, o facto é que cada crente precisa dum Sacerdote diante de Deus. Esta necessidade é-lhe suprida plenamente no Senhor Jesus Cristo. A Epístola aos Hebreus apresenta-no-Lo como o nosso grande Sumo-Sacerdote, que se compadece das nossas fraquezas, porque em tudo foi tentado como nós, mas sem pecado. (Heb. 4:15).

6º – Portanto, cada igreja local devia reconhecer o Senhor Jesus como seu Grande Sumo-Sacerdote e, em cada crente, um sacerdote santo e real. Será isto que encontramos na cristandade hoje em dia? Ao contrário, a igreja, na sua maioria, voltou ao sistema judaico de sacerdotes. Apesar dos crentes professos dizerem que crêem no sacerdócio de todos os crentes, muitas religiões estabeleceram um sacerdócio todo seu, baseado em parte no sistema mosaico. Assim vemos:

    a) Um grupo de homens escolhidos para o Serviço Divino;

    b) Uma hierarquia eclesiástica com títulos honoríficos que os distingue dos leigos;

    c) Vestes especiais para indicar que eles pertencem a uma ordem diferente.

Além disso, muitas seitas e denominações vão buscar ao Judaísmo conceitos como estes:

    a) A consagração de templos com os seus altares, adornos eclesiásticos, e outras coisas materiais para o seu culto;

    b) Um ritualismo impressivo que apela para os sentidos do homem;

    c) Um calendário religioso com os seus dias santos e festas.

Acerca desta estranha mistura de Judaísmo e Cristianismo, o Dr. C. I. Scofield escreve: “Podemos afirmar seguramente que os judaizantes da Igreja. só por si, têm impedido o seu progresso, pervertido a sua missão e destruído a sua espiritualidade em maior escala do que todos os outros males juntos. Em vez de andar no caminho indicado da separação do mundo, e seguir o Senhor segundo a sua vocação celestial, a Igreja tem usado passagens das Escrituras, que só dizem respeito aos Judeus, para justificar a sua adaptação à presente civilização, a aquisição de fortunas fabulosas, a construção de igrejas (templos) magníficas, a divisão em clérigos e leigos dos que são iguais na fraternidade Cristã”. Deus ainda hoje chama o Seu povo a separar-se desta religião de símbolos e tipos para se unirem simplesmente no Nome do Senhor Jesus em quem encontramos toda a suficiência.

7º – Se todos os membros duma igreja actuarem segundo o ensino do Novo Testamento, em relação ao sacerdócio de todos os crentes, essa igreja será:

Uma igreja cheia do Espírito, onde os seus membros assistem regularmente ás reuniões de oração; uma igreja em que todos os membros são auxiliares práticos e colaboradores dos servos do Senhor na Sua Seara através do mundo; haverá actividade enérgica e perseverante na disseminação do Evangelho, por meio da distribuição de folhetos, testemunho pessoal e, sempre que é possível, trabalho ao ar livre.

Pelo amor de Cristo os membros de tal igreja serão constrangidos a viver num ambiente afável, no qual cada crente procura ajudar os outros em amor e num espírito de devotada consagração, estimulando-se uns aos outros ao amor e ás boas obras.

Em tais igrejas, as reuniões e serviços são dirigidos pelo Espírito Santo; e os dons do Espírito, distribuídos pelo próprio Senhor, serão desenvolvidos conforme a variedade da mesma, em comunhão fraternal e na dependência e liberdade de Cristo (1 Cor. 12:4-l1; 14:26). E quando a igreja se reúne em volta da mesa do Senhor para O louvar e adorar pelo Seu sacrifício no Gólgota, a adoração sacerdotal subirá até ao Santuário celestial, que é o mais alto privilégio do sacerdócio da Igreja.

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Vida cristã

Em que confiamos?

Em que depositava Saul mais confiança, no Senhor ou na armadura? Na armadura, sem dúvida; e é assim com todos aqueles que não andam verdadeiramente por fé; apoiam-se nos meios, e não em Deus.
O homem dos meios e o homem da fé estão realmente diante de nós, e nós percebemos imediatamente como o último está longe de agir segundo os meios. Ora Davi sentiu que os vestidos de Saul e a sua couraça não representavam esses meios, e portanto recusou-os. Se ele tivesse partido com eles, a vitória não teria sido tão claramente do Senhor. Mas Davi havia confessado a sua fé na libertação do Senhor, e não na armadura de Saul.

Tem-se dito, e muito bem, que o perigo para Davi não foi quando se encontrou com o gigante, mas quando se viu tentado a usar a armadura de Saul. Se o inimigo tivesse sido bem sucedido em o induzir a ir com ela, tudo estava perdido; mas, mediante a graça, ele rejeitou-a, e assim entregou-se inteiramente nas mãos do Senhor, e nós sabemos qual a segurança que encontrou nelas. É isto que a fé sempre faz; deixa tudo, inteiramente, ao cuidado de Deus. Não se trata de confiar no Senhor e na armadura de Saul, mas somente no Senhor.

E não podemos nós aplicar este princípio ao caso de um pobre pecador desamparado, a respeito do perdão dos seus pecados? Creio que sim. Satanás procura tentar o pecador a acrescentar alguma coisa à obra consumada de Cristo – alguma coisa que diminua a glória do Filho de Deus como o único Salvador de pecadores. Ora àqueles que assim fazem eu gostaria de dizer que seja o que for que se acrescente à obra de Cristo só consegue inutilizá-la.

Em resumo: devemos ter, por tanto, somente Cristo; e não Cristo e as nossas obras, mas simplesmente Cristo, porque Ele é suficiente; não precisamos de nada mais, e não podemos passar com menos. Desonramos a suficiência do Seu sacrifício expiatório sempre que procuramos ligar alguma coisa nossa com ele, precisamente como Davi teria desonrado o Senhor indo ao encontro do gigante filisteu com a armadura de Saul.

(Trechos extraídas do livro Exemplos da Vida de Fé na Vida e Época de David, de C.H. Mackintosh, do Depósito de Literatura Cristã)

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Escatologia

Métodos de investigação (H. L Heijkoop)

Se nos ocuparmos do assunto da profecia poderemos formular a seguinte pergunta: como se compreende que os resultados alcançados por alguns investigadores estejam em desarmonia?

Assim, por exemplo, vemos que o professor Greydanes (teólogo holandês) afirma que a primeira besta do Apocalipse 13 representa o conjunto das autoridades humanas de todos os tempos (na sua obra em holandês “Korte Verklaring”). Outro teólogo, O dr. J. Willemse, pretende ver nela uma figura do anticristo (na obra holandesa entitulada “Tekst en Uitleg”). Os adventistas ensinam que é o papado. E nós, nos capítulos seguintes, teremos ocasião de ver que é na realidade uma figura do Império Romano.

A resposta a estas opiniões é a seguinte: Devemos lembrar que há duas condições necessárias para compreender os pensamentos de Deus na profecia:
1. Que a Palavra de Deus é perfeita;
2. Que é Deus mesmo Quem dá a chave da sua interpretação.

Decerto, a Palavra de Deus é perfeita. Quer dizer, nada lhe falta; tudo quanto é preciso para compreendê-la se encontra nela mesma. Não necessitamos descobertas arqueológicas para compreender o significado espiritual do Grande Dia da Expiação (Lv. 16), ou dos utensílios do Tabernáculo (Êx. 25 a 40). A epístola aos Hebreus e outras epístolas nos dão a interpretação divina.

O mesmo acontece com a profecia. Nas profecias encontramos todos os pensamentos de Deus quanto ao futuro, comprove Lhe aprouve nos revelar, e não temos nenhuma necessidade da ciência humana para as compreender. Pelo contrário: Com o emprego dos recursos humanos, existe o perigo de perder de vista o verdadeiro significado da profecia. Quantas vezes elas têm sido torcidas por serem interpretadas segundo os livros de história ou postas em harmonia com determinados sistemas teológicos.

O único meio correto de investigação consiste em averiguar o significado da profecia na própria Palavra de Deus. E se, apesar de tudo, ainda se quiser consultar os livros de história humana, então isso deve ser feito com o fim de os confrontar com o que a Palavra de Deus já nos tem revelado na profecia. Este resultado só pode ser alcançado, se a profecia for estudada com a chave que Deus mesmo nos tem dado. “Sabendo primeiramente isto: que nenhuma profecia da Escritura é de particular interpretação; porque a profecia nunca foi produzida por vontade de homem algum, mas os homens santos de Deus falaram inspirados pelo Espírito Santo” (II Pe.1:20-21).

Ainda que as profecias tenham sido pronunciadas por homens escolhidos por Deus, estes não são os seus verdadeiros autores. Todos os homens santos de Deus, que falaram e escreveram as profecias, não o fizeram por iniciativa própria. Também não há nenhuma profecia que se explique por si própria. Atrás deles está o Autor – o Espírito Santo – que inspirou todos os profetas para proclamarem as profecias. A Escritura diz também que os profetas não compreenderam, muitas vezes, o significado da profecia (I Pe. 1:10). A Daniel é dito que não deve investigar a profecia, porque a profecia não lhe é destinada (Dn. 12:8-9).

AS PROFECIAS FORMAM UM TODO

Isto quer dizer que as profecias foram dadas pelo Espírito Santo e juntos constituem a totalidade dos desígnios de Deus, os quais Ele quis comunicar-nos. E se quisermos compreender os pensamentos de Deus, não basta escolher apenas um versículo, um capítulo ou um livro da Bíblia, porque nenhuma profecia é de particular interpretação. Que juízo faríamos nós de um homem que, de posse de apenas parte da planta de uma casa, pretendesse dar-nos uma descrição pormenorizada da construção completa? Poderíamos dizer que tinha uma imaginação exuberante, mas nada mais. Porque só o arquiteto sabe como há de edificar a casa. Nós só poderíamos fazer uma idéia no caso de ele expôr o projeto em uma maquete com todos os detalhes necessários, tendo, além disso, a descrição das especificações técnicas. Se nos déssemos ao estudo de todo o conjunto, estando aptos a compreendê-lo, poderíamos então formar uma idéia completa do que viria a ser a casa. Acaso alguém poderia deduzir, à vista de um simples esboço, o que seria todo o quadro? Poderia, quando muito, tentar adivinhar. Veja bem: tentar! E quantas vezes nos enganamos nas nossas confecturas. Mas, somando-se à planta o modelo, ser-nos–ia muito fácil reproduzi-lo, vendo então o lugar a que corresponde cada peça.

Acontece a mesma coisa com a profecia. Todas as profecias do Antigo Testamento como as do Novo revelam no seu conjunto os desígnios de Deus quanto ao futuro. É só quando conhecemos a estrutura geral desses desígnios que podemos comparar as profecias entre elas e cada uma com o conjunto. Examinando versículo por versículo ou porções das Escrituras, podemos compreender os pensamentos de Deus. Se todo aquele que estuda a profecia seguisse este método, não se faria juízos tão diversificados a seu respeito.

A questão importante agora é saber como havemos de encontrar as linhas mestres da profecia. A sua solução não é difícil, porque Deus no-la dá claramente em Sua Palavra. “O testemunho de Jesus é o espírito da profecia” (Ap. 19:10); “O Espírito de Cristo, que estava neles (nos profetas), indicava… os sofrimentos que a Cristo haviam de vir e a glória que lhes havia de seguir” (I P.1:11). Em Ef. 1:9-10 lemos que Deus propusera em Si mesmo tornar a congregar em Cristo todas as coisas, na dispensação da plenitude dos tempos, tanto as que estão nos céus como as que estão na terra; e em Hb. 1:13, lemos: “Assenta-te à minha destra até que ponha os teus inimigos por escabelo de teus pés”. “Depois virá o fim, quando tiver entregado o Reino a Deus, ao Pai, e quando houver aniquilado todo império, e toda a potestade e força. Porque convém que reine até que haja posto a todos os inimigos debaixo de seus pés” (I Co. 15:24-25)

O TESTEMUNHO DE JESUS É O ESPÍRITO DA PROFECIA!

O propósito de Deus é glorificar o Senhor Jesus Cristo – Aquela gloriosa Pessoa que se tornou homem para realizar a vontade de Deus (Hb. 10:7), e que, enquanto estava na terra, podia dizer: “Faço sempre o que lhe agrada” (Jo. 8:29) e “A minha comida é fazer a vontade daquele que me enviou e realizar a sua obra” (Jo. 4:34); que no fim da Sua carreira na terra, trasladando-se em espírito para além da cruz, pôde dizer: “Eu glorifiquei-te na terra, tendo consumado a obra que me deste a fazer” (Jo. 17:4).

Quem poderá sondar o gozo que Deus achou em Seu Filho? Aquele que “crescia em sabedoria, e em estatura, e em graça para com Deus e os homens”! (Lc. 2:52); Aquele sobre o qual o céu se abriu no começo do Seu serviço na terra, enquanto uma voz do céu dizia: “Tu és meu Filho amado; em ti me tenho comprazido” (Lc. 3:22); e de quem o Pai pôde dizer, no final do Seu serviço na terra: “Este é o meu Filho amado; a Ele ouvi”! (Lc. 9:35). Ele podia dizer: “Por isso, o Pai me ama, porque dou a minha vida” (Jo. 10:17).

Quanta honra para Deus quando esta gloriosa Pessoa foi voluntariamente para a cruz a fim de ali glorificá-Lo; quando na cruz restituiu o que não havia furtado (Sl. 69:4)! Quando glorificou, ali, da maneira mais sublime, tudo o que Deus é: justiça, santidade, verdade e amor – tudo quanto Adão havia negado (Gn. 3:5; Sl. 22; Zc. 13:7; Rm. 5:8); Quando Ele, o inocente, foi ferido e abandonado por Deus em lugar dos pecadores perdidos, porque Deus os queria salvar. Poderíamos imaginar quão grande é o anelo de Deus em glorificar esta Pessoa?

E não tem o Senhor Jesus o direito de que toda a criação Lhe esteja sujeita? Não tem o Criador direito ao que foi criado por Ele mesmo? Não O constituiu Deus, como Seu Filho, herdeiro de todas as coisas, e, como o Filho do homem, não pôs todas as coisas debaixo de Seus pés (Hb. 1:2; 2:6-9)?

E no livro de Apocalipse encontramos o Seu quarto direito – o direito de Redentor (Ap. 5:5). O Cordeiro foi imolado, resgatando a herança que havia sido entregue por Adão a satanás, quando este passou a ser o príncipe deste mundo. Ele pagou o preço com o Seu próprio sangue. É o verdadeiro Remidor, que pode tomar posse da Escritura de venda (Ap. 5:5; Jr. 32:7-12).

Estas, pois, são as linhas gerais de Apocalipse e de todas as profecias: O Pai dà posse da herança ao Filho. Cristo é o centro e o objetivo de todos os desígnios, caminhos e atos de Deus. O sofrimento de Cristo é revelado, mas a revelação das Suas glórias, perante o mundo, pertence ao futuro (I Pe.1:11). A última vez que o mundo O viu, foi quando O despregaram da cruz e O puseram em um sepulcro (I Co. 2:8); e, visto que o mundo O rejeitou e matou, a revelação da Sua glória só pode ser acompanhada do juízo.

Durante a vida do Senhor Jesus na terra, os discípulos só pensavam na Sua glória futura (I Pe. 1:11), mas não nos Seus sofrimentos. Esperavam que o Senhor expulsasse os romanos do país, que destruísse os inimigos fazendo do povo de Israel a cabeça das nações estabelecendo, assim, o Seu trono em Jerusalém. E certamente estas coisas deviam realizar-se; por consequência, as glórias das quais falaram os profetas virão. Mas eles não entendiam que tudo isso só viria depois dos sofrimentos. E por isso o Senhor teve que lhes dizer que devia padecer e ser morto (Mt. 16:21). Mas para que a sua fé não desfalecesse, Deus lhes deu uma confirmação preciosa no monte da transfiguração (Mc. 9:31). É notável a maneira como nos três evangelhos em que nos é relatado este acontecimento a ordem observada é a mesma. Primeiro, o Senhor fala dos Seus sofrimentos, e em seguida diz que haviam de ver o Filho do homem vir “na glória do seu reino”, simbolizado por um majestoso evento.

A TRANSFIGURAÇÃO

Neste evento não nos é apresentada propriamente uma comunicação profética. É um quadro no qual vemos a glória do reino do Filho do homem e de todos os que nele terão parte. Vemos, primeiro, o Senhor, cabeça e centro de todas as bênçãos e glórias; depois Moisés, figura dos santos que morreram, mas já ressuscitados; e então Elias, figura dos fiéis que entraram no céu sem experimentar a morte. E vemos também os crentes que estão no mundo, mas ainda não glorificados: o remanescente de Israel representado pelos três discípulos. Que impressão teria produzido em Pedro este acontecimento? Já idoso, ele escreve que a palavra profética é confirmada por este acontecimento (II Pe. 1:19a). Certamente, a glória será manifestada; o reino do Filho do homem será estabelecido na terra. Jesus Cristo aniquilará o reino das trevas até sua extinção (Dn. 7:13-14; Mt.24:30).

O diabo tentou destruir este testemunho; matou Tiago e procurou fazer o mesmo ao apóstolo Pedro (At. 12). Assim a confirmação da palavra profética seria prejudicada, visto que pela boca de duas ou três testemunhas toda palavra será confirmada (Mt. 18:16).

Mas Deus vela pelo Seu testemunho; Pedro é libertado e mais tarde relata nas suas epístolas o poder, a vinda e a glória do Senhor Jesus. E João nos dá, no Apocalipse, a descrição pormenorizada da vinda do Senhor para estabelecer o reino.

A ESTRELA DA ALVA

Mas Pedro acrescenta ao seu relato uma exortação de grande importância. Diz ele: “À qual bem fazeis em estar atentos, como a uma luz que alumia em lugar escuro, até que o dia esclareça e a estrela da alva apareça em vossos corações” (II Pe.1:19b). Este mundo é na verdade um lugar de trevas. A noite começou desde que Judas saiu do cenáculo para trair o Senhor, e desde então domina o poder das trevas. Quando o Cordeiro foi imolado pôs-se o sol.

Nestas trevas brilha no entanto uma luz, e todo aquele que conhece a profecia pode andar nesta luz, a despeito da iniquidade que há neste mundo. O mundo colocou-se debaixo do poder do diabo. Nele nada mais se encontra senão pecado, inimizade contra Deus e miséria, mas a profecia nos mostra que Deus está acima de tudo e que porá brevemente fim ao domínio das trevas, quando nascer o Sol da justiça, trazendo salvação debaixo das Suas asas para o Seu povo (Ml. 4:2-3) e juízo terrível sobre todos os ímpios. A profecia ilumina o crente, separando-o do mundo, porque prediz o juízo do mundo e a glória futura do reino (Ap. 18:4). Como poderá o crente, que sabe que o juízo sobre este mundo está prestes a cair, misturar-se com o mundo ou pensar em melhorá-lo?

Todavia, a profecia não é propriamente a esperança do cristão. O apóstolo mostra alguma coisa mais sublime: “Até que o dia esclareça e a estrela da alva apareça nos vossos corações”.

No coração de um crente consciente dos seus privilégios já não existe noite (I Pe. 2:9). É chamado das trevas para a luz admirável de Deus. Antes, era trevas, mas agora é luz no Senhor (Ef. 5:8). A Estrela da manhã apareceu em seu coração, e portanto nele há luz. Conhece o SEnhor Jesus Cristo como o Sol da justiça e também como a Estrela da alva, avistada por aqueles que estão vigiando antes do raiar da alva. O crente já não O espera só para julgar este mundo, mas, antes desse tempo, para tirar os Seus deste mundo (Ap. 2:28; 22:16-17; Rm. 13:11-12).

Portanto, se a noiva ouve anunciar o SEu nome como a Estrela da manhã, o seu coração se abre e ela diz, “Vem”! (Ap. 22:17). A sua porção consiste em ser a noiva do Cordeiro na intimidade da casa do Pai, embora esteja naturalmente ligada ao Senhor Jesus como participante na glória do Seu reino (Ap. 21:9-22:5). Em Lucas vemos que o gozo dos que estão em casa é vigiar (Lc. 12:36-38). Ali fala-se também da herança, mas atrelada à responsabilidade do serviço (Lc. 12:42-48). O coração que conhece o Senhor Jesus como a EStrela da manhã não quererá dizer com o Espírito e a noiva, “Vem”? Não será verdadeiramente livre e desejando trazer os pecadores ao Senhor e clamar: “Quem tem sede venha; e quem quiser, tome de graça da água da vida”? O poder atrativo do Senhor, como a Estrela da alva, produz o mesmo efeito da profecia: liberta-nos do mundo e leva-nos com ardor a ganhar almas para Cristo. “Qualquer que nele tem esta esperança purifica-se a si mesmo, como também Ele é puro” (I Jo. 3:3).

Porém, alguns já não estão interessados em ganhar almas para Cristo, mas em melhorar o mundo ou a sua própria posição no mundo. É esta a esperança do cristão? (Ef. 1:18). Outros têm a esperança de estar com Cristo quando a morte chegar; e isso seria uma coisa maravilhosa (Fp. 1:23). Mas por mais maravilhosa que seja, nessa posição estaremos ainda num estado imperfeito. Somente a nossa alma ali estará, mas não o nosso corpo. É certamente um estado infinitamente mais glorioso que a nossa condição no mundo de aflições e desgraças (Rm. 5:3); mas esta não é a esperança de que Deus fala. A esperança cristã não é morrer e estar com Jesus, mas, sim, que Jesus virá do céu para levar todos os que são Seus deste mundo, a fim de estarem para sempre com Ele (I Ts.4:17-18). Mas, dir-se-á, não faz diferença, porque em qualquer dos casos ficarei bem. Será o nosso bem-estar a única coisa importante? Na cruz não foi realizado tudo por nós? O sangue lavou-nos de todos os nossos pecados; fomos feitos reis e sacerdotes para Deus, que nos selou em Cristo com o Espírito Santo da promessa, o qual é o penhor da nossa herança, para a redenção da possessão de Deus, para louvor da Sua glória (Ap.1:6; Ef. 1:14). Não fomos libertados para nos ocuparmos com os Seus pensamentos e a Sua glória (Cl. 1:27)? E sobre quem faz Deus resplandecer a Sua glória? Sobre o leitor ou sobre mim? Graças a Deus, resplandece sobre Cristo – o único que é digno dela. Não é muito melhor olharmos para Cristo do que para nós mesmos, visto que em nós só vemos fraquezas, egoísmo, orgulho, etc? Deus não nos confiou a tarefa de formar a nossa própria esperança, nem nos encarregou de escolhermos o objetivo de nossa fé. Deu-nos Cristo, a nossa esperança e o alvo da nossa fé.

Não é verdade o que muitas vezes se diz e ainda mais se pensa, que a remissão dos nossos pecados e o fato de que somos salvos para sempre é o mais importante, e que tudo o mais é secundário. A Palavra de Deus diz que foi do agrado do Pai que toda a plenitude Nele habitasse. E que, havendo por Ele feito a paz, pelo sangue da Sua cruz, por meio dEle, reconciliasse Consigo mesmo todas as coisas, tanto as que estão na terra como as que estão nos céus (Cl. 1:19-21). Nunca houve nem haverá em toda a eternidade uma hora como essa do Calvário, na qual o Salvador morreu por nossos pecados!

Porém, que momento será aquele quando ao nome de Jesus se há de dobrar “todo joelho dos que estão nos céus e na terra, e dabaixo da terra, e toda língua confesse que Jesus Cristo é o Senhor, para a glória de Deus Pai” (Fp. 2:10-11)! Quando os filhos da perdição e até o próprio diabo e os seus anjos se hão de curvar diante de Jesus; quando o pecado for tirado do mundo e a justiça morar na terra; quando todas as coisas forem reconciliadas com Deus! Isto não prejudica a glória da cruz; pelo contrário, o poder e a plena bênção do precioso sangue do Cordeiro, que foi imolado, mostrar-se-ão em toda a sua plenitude (Ap.5:6-14; I Pe. 1:19-21). Deus aceitou o valor desse sacrifício e ressuscitou o Seu bendito Filho de entre os mortos, glorificando-0 à Sua destra. Isto também nós conhecemos mediante a fé, e regozijamo-nos por isso. Todavia, a vinda do Senhor Jesus será o primeiro ato mediante o qual Deus manifestará, nos céus e na terra, em toda a Sua criação, o poder reconciliador do sangue. Pode isso ser um fato de menos importância ou uma questão secundária?

(Extraído de Eventos Futuros: O Porvir, de H. L Heijkoop, Depósito de Literatura Cristã)

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Sobre a educação dos filhos (John Wesley)

‘Educa a criança no caminho em que deve andar; e até quando envelhecer não se desviará dele’. (Provérbios 22:6)

1. Nós não devemos imaginar que essas palavras devam ser entendidas, em um sentido absoluto, como se nenhuma criança que tivesse sido instruída no caminho em que ela deveria ir, jamais tenha se afastado dele. Os fatos, de modo algum, irão concordar com isto: Ao contrário, tem sido uma observação comum, que ‘alguns dos melhores pais têm os piores filhos’. É verdade, este poderia ser o caso, porque, algumas vezes, homens bons, nem sempre têm um bom entendimento, e, sem isto, dificilmente se deve esperar que eles vão saber como instruir seus filhos. Além disto, estes que são, em outros aspectos, homens bons, têm freqüentemente muito mais comodidade de temperamento; de modo que eles não vão restringir seus filhos do mal, além do que o velho Eli fez, quando ele disse gentilmente: ‘Não, meus filhos, o relato que ouvi de vocês não é bom’.

(I Samuel 2:22-23) Era, porém, Eli já muito velho, e ouvia tudo quanto seus filhos faziam a todo o Israel, e de como se deitavam com as mulheres que em bandos se ajuntavam à porta da tenda da congregação. E disse-lhes: Por que fazeis tais coisas? Pois ouço de todo este povo os vossos malefícios. Não, filhos meus, porque não é boa esta fama que ouço; fazeis transgredir o povo do Senhor’. Esta, então, não é uma contradição à afirmação; porque seus filhos não foram ‘instruídos no caminho onde deveriam ir’. Mas deve-se reconhecer que alguns têm sido instruídos com todo cuidado e diligência possível; e, ainda assim, antes que se tornem idosos; sim, no vigor da idade, eles se separam extremamente dele.

2. As palavras, então, devem ser entendidas com alguma limitação, e, então, elas conterão uma verdade inquestionável. Trata-se de uma promessa geral, embora que não universal; e muitos têm encontrado um feliz cumprimento dela. Como este é o método mais provável, que alguns pais podem adotar, para tornar seus filhos devotos, então, ele geralmente, embora que não sempre, atende com o sucesso desejado. O Deus de seus antepassados está com seus filhos; Ele abençoa a diligência deles, e eles têm satisfação em deixar sua religião, tanto quanto seus bens mundanos, para aqueles que descendem deles.

3. Mas qual é ‘o caminho em que uma criança deve seguir?’; e como nós devemos ‘instruí-la’ nele: O alicerce disto é admiravelmente bem colocado pelo Sr. Law, em seu ‘Um Chamado Sério para uma Vida Devota’. Partes de suas palavras é: –

“Tivéssemos continuado perfeitos, como Deus criou o primeiro homem, talvez, a perfeição de nossa natureza tivesse sido uma auto-instrutora suficiente para cada um. Mas assim como as enfermidades e doenças têm criado a necessidade de medicamentos e médicos, então, as desordens de nossa natureza racionais têm introduzido a necessidade de educadores e tutores”.

“E como a única finalidade de um médico é restaurar a natureza ao seu estado próprio; então, a única finalidade da educação é restaurar nossa natureza racional ao seu estado apropriado. Educação, portanto, deve considerada como razão usada como segunda-mão, para, tanto quanto ela puder, suprir a perda da perfeição original. E, como a Medicina pode justamente ser chamada de a arte de restaurar a saúde; então, a educação pode ser considerada, sob outro aspecto, como a arte de recuperar, para o homem, a sua perfeição racional”.

“Este foi o objetivo diligenciado, pelos jovens que atenderam junto a Pitágoras, Sócrates e Platão. As lições e instruções diárias deles eram tantas preleções sobre a natureza do homem; sua finalidade verdadeira, e o correto uso de suas faculdades; sobre a imortalidade das almas; sua relação com Deus; a concordância da virtude com a natureza divina; sobre a necessidade da temperança, justiça, misericórdia, e verdade; e a insensatez de favorecer nossas paixões”.

“Agora, como o Cristianismo tem criado, por assim dizer, o novo mundo moral e religioso, e estabelecido tudo que é razoável, sábio, santo e desejável em seu ponto de vista verdadeiro; então, alguém poderia esperar que a educação dos filhos pudesse ser tão melhorada pelo Cristianismo, como as doutrinas da religião são”.

“Como ele introduziu um novo estado de coisas, e nos informou tão completamente da natureza do homem, e a finalidade de sua criação; como ele tem fixado todas as nossas bondades e maldades, nos ensinado os significados de purificar nossas almas, de agradar a Deus, sermos felizes eternamente; alguém poderia naturalmente supor que cada região cristã afluiu com escolas, não apenas para ensinar poucas questões e respostas de um catecismo, mas para formar, instruir e treinar as crianças, em tal curso da vida como as doutrinas mais sublimes do Cristianismo requerem”.

“E a educação sob a orientação de Pitágoras ou Sócrates teve nenhuma outra finalidade, a não ser ensinar as crianças a pensarem e agirem como Pitágoras e Sócrates faziam”.

“E não é razoável supor que uma educação cristã possa ter nenhuma outra finalidade, a não ser ensinar a elas como pensarem, julgarem, e agirem de acordo com as regras mais rigorosas do Cristianismo?”.

“De qualquer forma, alguém poderia supor que, em todas as escolas cristãs, o ensiná-las a começar suas vidas no espírito do Cristianismo, — em tal abstinência, humildade, sobriedade e devoção, como o Cristianismo requer, — não deveria ser apenas mais; mas cem vezes mais, considerado, mais ainda, que todas as outras coisas”.

“Porque aqueles que nos educam imitam nossos anjos guardiões; sugerem nada para nossas mentes, a não ser o que é sábio e santo; nos ajudam a descobrir todo julgamento falso de nossas mentes, e a conquistar toda paixão errada em nossos corações”.

“E é tão razoável esperar e requerer todo este benefício de uma educação cristã, como requerer que o médico possa fortalecer tudo o que é certo em nossa natureza, e remover todas as nossas doenças”.

4. Que seja cuidadosamente lembrado, todo este tempo, que Deus, e não o homem, é o médico das almas; que é Ele, e ninguém mais, que dá o medicamento para curar nossa doença natural; que toda ‘a ajuda que é feita sobre a terra, é Ele quem faz’; que nenhum dos filhos dos homens é capaz de ‘trazer uma coisa limpa do que é sujo’; e, em uma palavra, que ‘é Deus quem opera em nós, o desejar e o fazer o que lhe agrada’. Mas é geralmente seu prazer trabalhar pelas suas criaturas; ajudar o homem através do homem. Ele honra os homens para serem, em um sentido, ‘trabalhadores junto com Ele’. Por esses meios, a recompensa é nossa, enquanto a glória resulta para Ele.

5. Isto sendo estabelecido como premissa, com o objetivo de ver distintamente qual é este caminho, em que nós devemos instruir uma criança, vamos considerar: Quais são as doenças de sua natureza? Quais sãos essas doenças espirituais que cada um que é nascido de uma mulher traz consigo para o mundo?

A primeira, não se trata do Ateísmo? Afinal, isto tem sido tão plausivelmente escrito, concernente ‘a idéia inata de Deus’; afinal, isto tem sido dito de sua existência comum a todos os homens, em todas as épocas e nações; não parece que o homem tem naturalmente alguma idéia a mais de Deus, do que alguma das bestas do campo; afinal, ele não tem conhecimento de Deus; nem temor de Deus; nem Deus está em todos os seus pensamentos. Qualquer que possa ser a mudança a ser forjada, mais tarde, (se pela graça de Deus, ou pela sua própria reflexão, ou pela educação); pela sua natureza, ele é um mero Ateísta.

6. De fato, pode ser dito que todo homem, pela sua natureza, é, por assim dizer, seu próprio deus. Ele adora a si mesmo. Ele é, em sua própria concepção, absoluto Senhor de si mesmo. O herói de Dryden [O grande poeta inglês, John Dryden, nasceu em 09 de Agosto de 1631] fala apenas de acordo com a natureza, quando ele diz: ‘Eu mesmo sou o rei de mim’. Ele busca a si mesmo em todas as coisas. Ele agrada a si mesmo. E, por que não? Quem é o Senhor sobre ele? A sua vontade própria é sua única lei; ele faz isto ou aquilo, porque é do seu bom prazer. No mesmo espírito, como o ‘filho da manhã’ diz do velho tempo, ‘Eu irei ocupar os lados do Norte’, diz ele, ‘Eu farei desta ou daquela maneira’. E nós não encontramos homens conscientes, de todos os lados, que são do mesmo espírito? Que, se perguntados, ‘Por que vocês fizeram isto?’, irão rapidamente responder, ‘Porque eu estava decidido a fazê-lo’.

7. Uma outra doença, que toda alma humana traz consigo para o mundo, é o orgulho; uma propensão contínua para pensar em si mesmo mais altamente do que deveria. Cada homem pode discernir, mais ou menos dessa doença em cada um – a não ser em si mesmo. E, realmente, se ele pudesse discerni-la em si mesmo, ela não iria subsistir muito tempo, porque ele iria, então, em conseqüência, pensar de si mesmo, justamente como deveria pensar.

8. A próxima doença natural a cada alma humana, nascida com cada homem, é o amor ao mundo. Cada homem é, pela natureza, um amante da criatura, em vez do Criador; um ‘amante do prazer’, de todo tipo, ‘mais do que um amante de Deus’. Ele é um escravo dos desejos tolos e danosos, de um tipo ou de outro, tanto para o ‘desejo da carne, o desenho dos olhos, quanto do orgulho da vida’. ‘O desejo da carne’ é uma propensão a buscar felicidade no que gratifica um ou mais dos sentidos exteriores. ‘O desejo dos olhos’, é a propensão a buscar a felicidade no que gratifica o sentido interno da imaginação, quer pelas coisas grandiosas, ou novas, ou belas. ‘O desejo da vida’ parece significar uma propensão a buscar felicidade no que gratifica o senso de honra. A este assunto, usualmente se refere, ‘o amor ao dinheiro’, uma das paixões mais básicas que pode ter lugar no coração humano. Mas pode-se duvidar, se esta não é uma intemperança adquirida, em vez de uma doença natural.

9. Quer isto seja uma doença natural ou não, o certo é que a ira é. O filósofo antigo a defina como ‘um sentido da injúria recebida, com um desejo de vingança’. Agora, existiu alguém nascido de uma mulher que não se afligiu debaixo disto? Na verdade, como outras doenças da mente, ela é muito mais violenta em uns, do que em outros. Porém é um furor breve, como fala o poeta; é uma loucura real, embora que breve, onde quer que esteja.

10. Um desvio da verdade é igualmente natural a todos os filhos dos homens. Alguém disse em sua precipitação, ‘Todos os homens são mentirosos’; mas nós podemos dizer, numa reflexão moderada: Todos os homens naturais irão, numa tentação pessoal, mudar, ou dissimular a verdade. Se eles não transgredirem a veracidade; se eles não disserem o que é falso; ainda assim, eles freqüentemente irão transgredir a simplicidade. Eles usam de artimanhas; eles expõem cores falsas; eles praticam tanto a simulação, quanto a dissimulação. De modo que você não pode dizer verdadeiramente de alguma pessoa viva, até que a graça tenha alterado a natureza, “Observe um israelita, em quem, de fato, não existe fraude!”. (João 1:47) ‘Jesus viu Natanael vir ter com ele, e disse dele: Eis aqui um verdadeiro israelita, em quem não há dolo’.

11. Cada um é igualmente propenso, pela natureza, a falar ou agir contrário à justiça. Esta é uma das doenças que nós trazemos conosco para o mundo. Todas as criaturas são naturalmente parciais a si mesma, e, quando a oportunidade oferece, têm mais consideração ao seu interesse ou prazer próprios do que a justiça estrita permite. Nem algum homem é, pela natureza, misericordioso, como nosso Pai celeste é misericordioso; mas todos, mais ou menos transgridem aquela regra gloriosa da misericórdia, assim como justiça: ‘O que quer que queira que os homens façam a você, faça o mesmo a eles’.

12. Agora, se essas são as doenças gerais da natureza humana, não é a grande finalidade da educação curá-las? E não cabe a todos esses a quem Deus tem confiado a educação dos filhos, tomar todo cuidado possível, primeiro, para não aumentar, não alimentar alguma dessas doenças, (como a generalidade dos pais constantemente fazem), e, depois, usar todos os meios possíveis para curá-las?

13. Para ser mais específico. O que os pais podem fazer, e as mães mais especialmente, para cujos cuidados nossas crianças estão necessariamente comprometidas em suas tenras idades, com respeito ao Ateísmo que é natural a todos os filhos dos homens? Como isto é alimentado, pela generalidade dos pais; mesmo aqueles que amam, ou, pelo menos, temem a Deus; quando eles passam horas, talvez dias, com seus filhos, e dificilmente mencionam o nome Dele! Neste meio tempo, eles falam de milhares de outras coisas no mundo que estão em volta deles. E as coisas do mundo atual, que circundam essas crianças, não irão, então, naturalmente tomar seus pensamentos, e colocar Deus a uma distância maior deles (se isto for possível) do que Ele estava antes? Os pais não alimentam o Ateísmo de seus filhos, mais além, atribuindo as obras da criação à natureza? Não é a maneira comum de falar a respeito da natureza deixar Deus completamente fora da questão? Eles não alimentam essa doença, quando quer que eles falem, nos ouvidos de seus filhos, de alguma coisa acontecendo deste ou daquele modo? Das coisas vindas por acaso? Pela boa ou má sorte? Como também, quando eles se referem a este ou aquele evento, pela sabedoria ou poder dos homens; ou, realmente, a alguma outra segunda causa, como se esses governassem o mundo? Sim, eles, sem perceberem, não a alimentam, enquanto eles falam de sua própria sabedoria, ou bondade, ou poder para fazer isto ou aquilo, sem expressamente mencionar que todos esses são o dom de Deus? Tudo isto, tende a confirmar o Ateísmo de seus filhos, e manter Deus fora de seus pensamentos.

14. Mas nós estamos, de modo algum, limpos do sangue deles, se nós apenas formos assim tão longe, se nós meramente não alimentamos a sua doença. O que pode ser feito para curá-la? Da primeira alvorada da razão, inculcar, continuamente, que Deus está nisto e em toda parte. Deus fez você e a mim, e a Terra, e o sol, e a lua, e todas as coisas. E todas as coisas são Dele; céu e terra, e tudo que nela existe. Deus ordena todas as coisas. Ele faz o sol brilhar, e o vento soprar, e as árvores produzirem frutos. Nada vem por acaso; esta é uma palavra tola; não existe tal coisa como acaso. Já que Deus criou o mundo, então, Ele governa o mundo e todas as coisas que estão nele. Nem um pardal cai no chão, se não for pela vontade de Deus. E como Ele governa todas as coisas, então, ele governa todos os homens, bons e maus, pequenos e grandes. Ele dá a eles todo o poder e sabedoria que eles têm. E Ele governa tudo. Ele nos dá toda a bondade que temos; todo bom pensamento e palavra, e obra são Dele. Sem Ele, nós não podemos pensar coisa alguma certa, ou fazer coisa alguma correta. Assim é que nós inculcamos neles que Deus é tudo em tudo.

15. Assim, nós podemos neutralizar, e, pela graça de Deus nos assistindo, gradualmente curar o Ateísmo natural de nossas crianças. Mas o que podemos fazer para curar a vontade própria dela? Ela está igualmente enraizada em sua natureza, e é, de fato, a idolatria original, que não está confinada a uma época ou região, mas é comum a todas as nações debaixo do céu. E quão poucos são os pais, que não são culpados neste assunto, mesmo em meio aos cristãos que verdadeiramente temem a Deus! Quem não alimenta, e aumenta continuamente essa intemperança em seus filhos? Permitir-lhes a vontade própria faz isto mais efetivamente. Permitir a eles seguirem seu próprio caminho é o método certo de aumentar a vontade própria sete vezes mais. Mas quem tem a resolução de fazer o contrário? Um pai em cem! Quem pode ser tão singular, tão cruel, para não condescender, mais ou menos, a seu filho? ‘E por que você não poderia? Que dano pode haver nisto, que todos fazem?’. O dano é que isto fortalece a vontade deles, cada vez mais, até que ela não se submeta nem a Deus, nem ao homem. Condescender aos filhos é, tanto quanto em nós se coloca, fazer a doença deles, incurável. Os pais sábios, por outro lado, devem começar a coibir a vontade deles, no primeiro momento em que ela aparece. Em toda a sabedoria da educação cristã, não existe coisa alguma mais importante do que isto. A vontade dos pais está, para o filho pequeno, no lugar da vontade de Deus. Portanto, cuidadosamente os ensine a se submeterem a isto, enquanto são crianças, para que eles possam estar prontos a submeterem-na à vontade de Deus, quando forem homens. Mas, com o objetivo de conduzir este ponto, você irá precisar de firmeza e resolução incríveis; porque, depois de você ter começado, uma vez, você não deverá mais desistir. Você deverá manter-se firme ainda no mesmo curso; você nunca deverá intermitir sua atenção por uma hora, do contrário você perderá seu trabalho.

16. Se você não está disposto a perder todo o trabalho que tem tido, para coibir a vontade de seu filho, e trazê-la, em sujeição, à sua, para que ela possa estar, mais tarde, sujeita à vontade de Deus, existe um conselho que, embora pouco conhecido, deve ser particularmente observado. Pode parecer uma circunstância pequena; mas tem uma conseqüência maior do que alguém pode facilmente imaginar. É este: Nunca, de maneira alguma, dê para a criança alguma coisa, pela qual ela chorou. Porque é uma observação verdadeira (e você poderá fazer o experimento, tão freqüentemente quanto lhe agradar) que, se você der a uma criança o que ela pede a você chorando; ela certamente irá chorar novamente.

‘Mas, se eu não dou a ela, quando ela chora, ela irá gritar o dia todo’.

Se ela fizer isto, será por sua culpa; uma vez que está em seu poder efetivamente impedi-la: Porque nenhuma mãe precisa suportar um filho gritando alto, depois que ele tem um ano de idade.

‘Porque é impossível impedi-la’.

Assim, muitos supõem, mas trata-se de um completo equívoco. Eu sou testemunha, exatamente do contrário; e assim muitos outros são. Minha mãe teve dez filhos, cada um tinha vitalidade o suficiente; ainda assim, nenhuma delas era ouvida gritar alto depois que tivesse um ano de idade. A senhora de Sheffield (diversas dessas crianças, eu suponho, ainda estão vivas) me afirmou que ela teve o mesmo sucesso com respeito aos seus oito filhos. Quando alguns estavam contestando a possibilidade disto, o Sr. Parson Greenwood (bem conhecido no norte da Inglaterra) replicou:

‘Isto não pode ser impossível: Eu tive prova disto em minha família. Mais do que isto. Eu tenho seis filhos de minha primeira mulher; e ela não aceitou que algum deles chorasse alto, depois que eles tivessem dez meses de idade. E ainda assim, nenhum vigor deles foi tão coibido, de maneira a incapacitá-los para algum, dos ofícios da vida’.

Isto, portanto, pode ser feito por alguma mulher de bom-senso, que pode, por meio disto, evitar a si mesma uma abundância de problema, e prevenir aquele barulho desagradável; os berros das crianças jovens, que podem ser ouvidos debaixo do telhado dela. Mas eu admito que ninguém, a não ser uma mulher de juízo será capaz de efetuar isto; sim, e uma mulher de tal paciência e resolução, que somente a graça de Deus pode dar. De qualquer modo, isto é sem dúvida, o caminho mais excelente: e ela que é capaz de recebê-lo, que o receba!

17. É difícil dizer se a vontade própria ou orgulho seja a mais fatal intemperança. Foi principalmente o orgulho que atirou para baixo, tantas estrelas do céu, e tornou anjos em demônios. Mas o que os pais podem fazer, com o objetivo de parar isto, antes que ele possa ser radicalmente curado?

Primeiro: Cuide de não acrescentar combustível à chama; de alimentar a doença que você deve curar. Quase todos os pais são culpados de fazerem isto, por elogiarem seus filhos na frente deles. Se você está consciente da tolice e crueldade disto, veja que você inviolavelmente abstenha-se de fazê-lo. E, a despeito do temor ou complacência, dê um passo adiante. Não apenas não encoraje, mas não aceite que outros façam o que você mesmo não se atreve a fazer. Quão poucos pais estão suficientemente atentos a isto, — ou, pelo menos, suficientemente resolutos a praticar isto, — parar cada um, na primeira palavra, dos que forem elogiá-los na frente deles! Mesmo estes que, de modo algum, estariam solícitos ao elogio próprio; todavia, não hesitariam de estarem solícitos ao elogio de seus filhos; sim, e isto na frente deles! Oh! Reflitam! Isto não é espalhar armadilha para os pés deles? Este não é um incentivo grave ao orgulho, mesmo se eles forem elogiados pelo que é verdadeiramente louvável? Não é duplamente danoso, se eles são elogiados por coisas não verdadeiramente elogiáveis; — coisas de uma natureza indiferente, como razão, boa conduta, beleza, elegância de vestuário? Isto esta sujeito, a não apenas ferir os corações deles, mas seu entendimento também. Isto tem uma tendência manifesta e direta a infundir orgulho e insensatez juntos; a perverter ambos seu gosto e julgamento; ensinando-os a valorizarem o que é esterco e refugo aos olhos de Deus.

18. Se, ao contrário, você deseja, sem perda de tempo, golpear na raiz do orgulho deles, ensinar seus filhos, tão logo quanto possível, que eles são espíritos caídos; que eles caíram daquela gloriosa imagem de Deus, na qual eles foram primeiro criados; que eles não são agora, como eles foram uma vez, imagens incorruptíveis do Deus da glória; carregando a semelhança explícita da sabedoria, da bondade, do santo Pai dos espíritos; mas mais ignorantes, mais tolos, e mais pecaminosos, do que eles podem possivelmente conceber. Mostrar a eles que no orgulho, paixão, e vingança, eles são agora como o diabo. E que, nos desejos tolos e apetites rastejantes, eles são como as bestas do campo. Zele diligentemente neste respeito, para que, sempre que a ocasião oferecer, você possa ‘identificar o orgulho, em seus primeiros movimentos’, e impedir a mesma primeira aparição dele.

Se você me perguntar: ‘Mas como eu posso encorajá-los, quando eles fazem o certo, se eu nunca os aprovo?’.

Eu respondo, que eu nunca afirmei isto. Eu nunca disse tal coisa como: ‘Você não deve nunca elogiá-los!’. Eu conheço muitos escritores que afirmam isto, e escritores de devoção eminente. Eles dizem que elogiar o homem é roubar a Deus, e, por conseguinte condenam isto completamente. Mas o que dizem as Escrituras? Eu li que o próprio nosso Senhor freqüentemente elogiava seus discípulos; e o grande Apóstolo não hesita em elogiar os Corintos, Filipenses, e concorda com outros a quem ele escreve. Ele não pode, portanto, condenar isto completamente. Mas eu digo, use isto muito moderadamente. E, quando o fizer, faça-o, com a mais extrema precaução, dirigindo-os, ao mesmo tempo, a verificarem que tudo que eles têm é dom gratuito de Deus, e com a mais profunda humilhação própria diga: ‘Não a nós! Não a nós! Mas a teu nome seja dado o louvor!’.

19. Próximo à vontade própria e ao orgulho, a doença mais fatal com o que somos nascidos, está o ‘amor ao mundo’. Mas quão cuidadosamente a generalidade dos pais cuida disto, em suas diversas ramificações! Eles alimentam ‘o desejo da carne’, ou seja, a tendência a buscarem a felicidade, em agradarem aos sentidos exteriores, arquitentando ampliarem o prazer do paladar de seus filhos ao extremo; não apenas dando a eles, antes que eles desmamem, outras coisas além do leite, o alimento natural dos filhos, mas dando a eles, ambos, antes e depois, toda sorte de carnes ou bebidas que eles terão. Sim, eles os seduzem, muitos antes que a natureza requeira isto, a tomarem vinho ou bebidas fortes; e os fornecem com frutas cristalizadas, bolo de gengibre, uva-passa, e qualquer fruta a que eles estejam inclinados. Eles alimentam ‘o desejo dos olhos’, a propensão a buscarem a felicidade no prazer da imaginação, dando a eles lindos brinquedos reluzentes, fivelas ou botões brilhantes, roupas finas, sapatos vermelhos, chapéus com laços, ornamentos supérfluos, como fitas, colares, franzidos; sim, e propondo estes como recompensa por fazerem a obrigação que lhes cabe, o que imprimi um grande valor sobre estas coisas. Com igual cuidado e atenção eles estimulam neles, a Terceira ramificação do amor ao mundo, ‘o orgulho da vida’; a propensão a buscarem a felicidade na ‘honra que vem dos homens’. Nem o amor ao dinheiro é esquecido; eles ouvem muita exortação sobre aproveitarem a melhor chance; muitas leituras concordam exatamente com aquele antigo ateu: ‘Ganhe dinheiro, honestamente se você puder; mas, se não puder, ganhe dinheiro!’. E eles são cuidadosamente ensinados a buscarem as riquezas e honras como a recompensa para todos os trabalhos deles.

20. Em oposição direta a tudo isto, pais sábios e verdadeiramente amorosos tomam cuidado extremo, para não nutrirem, em seus filhos, o desejo da carne; a propensão natural deles de buscarem felicidade, no gratificarem os sentidos exteriores. Com esta visão, a mãe não irá permitir que eles provem alimento algum, a não ser leite, até que eles sejam desmamados; o que milhares de experimentos mostram, é feito, mais seguramente e facilmente, no final do sétimo mês. E, então, acostumá-los a um alimento mais simples, principalmente de vegetais. Ela pode habituá-los a provar apenas uma espécie de alimento, além do pão, no jantar, e, constantemente para o café da manhã, e jantar, com o leite, tanto frio ou aquecido, mas não fervido. Ela pode acostumá-los, a que se sentem à mesa consigo, às refeições; e a não pedirem por nada, a não ser o que lhes é dado. Ela não precisa fazer com que eles conheçam o gosto do chá, até que eles tenham, pelo menos, nove ou dez anos de idade; ou fazerem uso de alguma outra bebida às refeições, a não ser água ou ninharia [small beer]. E eles nunca desejarão provar carne ou bebida, entre as refeições, se não forem acostumados a isto. Se frutas, confeitos, ou alguma coisa do tipo forem dados a eles, que eles não toquem neles, a não ser às refeições. Nunca proponha alguma dessas coisas como uma recompensa; mas os ensinem a ver mais alto do que isto.

Mas uma dificuldade irá surgir nisto; e vai precisar de muito mais resolução para vencer. Seus criados, que não irão entender seu plano, irão continuamente dar pequenas coisas para seus filhos, e, por meio disto, irão desfazer de todo seu trabalho. Isto você deve evitar, se possível, advertindo-os, quando eles primeiro vieram para sua casa, repetindo o aviso de tempos em tempos. Se eles, não obstante, fizerem isto, você deve mandá-los embora. Melhor perder um bom criado do que estragar uma boa criança.

Possivelmente, você pode ter outra dificuldade para enfrentar, e uma de natureza mais penosa. Sua mãe, ou a mãe de seu marido pode morar com você; e você fará bem em mostrar a ela todo respeito possível. Mas não a deixa ter, de maneira alguma, a mínima participação no manejo de seus filhos. Ela poderia desfazer tudo o que você teria feito; ela iria fazer a vontade deles em todas as coisas. Ela poderia permitir a eles a destruição de suas almas, se não, de seus corpos também. Em oitenta anos, eu nunca encontrei uma mulher que soubesse manejar com um neto. Minha própria mãe, que governou seus filhos tão bem, nunca pode governar uma neta. Em todos os outros pontos, obedeça a sua mãe. Desista da sua vontade pela dela. Mas, com respeito ao manejo de seus filhos, firmemente mantenha as rédeas em suas próprias mãos.

21. Pais sábios e amorosos serão igualmente cautelosos em não alimentarem ‘o desejo dos olhos’ em seus filhos. Eles não darão a eles brinquedos bonitos e resplandecentes, fivelas e botões brilhantes, roupas finas e alegres; nem ornamentos desnecessários de qualquer tipo; nada que possa atrair os olhos. Nem eles irão permitir que alguma outra pessoa dê a eles o que eles mesmos não darão. Alguma coisa do tipo que é oferecida pode ser tanto civilmente recusada, quanto recebida e guardada. Se eles ficam insatisfeitos com isto, você não pode fazer nada. Complacência, sim, e interesse temporal, necessitam ser colocados de lado, quando o interesse eterno de seus filhos está em jogo.

Suas dores serão bem retribuídas, se você puder inspirá-los, logo cedo, com um desprezo a todos os ornamentos; e, por outro lado, com um amor e estima a uma simplicidade e modéstia de vestuário: Ensinando a eles a associarem as idéias de simplicidade e modéstia; e aquelas de uma mulher refinada e relaxada. Igualmente, instile neles, tão logo quanto possível, um temor e desdém à pompa e grandeza; uma aversão e horror ao amor ao dinheiro; e uma profunda convicção de que as riquezas não podem trazer felicidade. Desacostumá-los, portanto, de todas esses objetivos falsos; habituá-los a fazerem de Deus seu objetivo em todas as coisas; e acostumá-los, em tudo que eles façam, a objetivar conhecer, amar e servir a Deus.

22. Novamente: A generalidade dos pais alimenta a ira em seus filhos; sim, a pior parte dela; ou seja, a vingança. A mãe tola diz: ‘O que feriu meu filho? Vingue-se, por mim’. Que trabalho horrível é este! Um antigo assassino irá ensinar-lhes, rápido o suficiente, esta lição? Que os pais cristãos não poupem dores em ensiná-los justamente o contrário. Lembrar a eles das palavras de nosso abençoado Senhor: (Mateus 5:38-40) ‘Ouvistes que foi dito: Olho por olho, e dente por dente. Eu, porém, vos digo que não resistais ao mal’; não retornando o mal pelo mal. Preferivelmente a isto, ‘se qualquer te bater na face direita, oferece-lhe também a outra; e, ao que quiser pleitear contigo, e tirar-te a túnica, larga-lhe também a capa’. Lembre-se das palavras do grande Apóstolo: (Romanos 12:19) ‘Não vos vingueis a vós mesmos, amados, mas dai lugar à ira, porque está escrito: Minha é a vingança; eu recompensarei, diz o Senhor’.

23. A generalidade dos pais alimenta e aumenta a falsidade de seus filhos. Quão freqüentemente eles podem ouvir aquela palavra absurda: ‘Não, não foi você; não foi meu filho que fez isto; diga, foi o gato’. Que tolice espantosa é esta! Você não sente remorso, enquanto está colocando uma mentira na boca de seu filho, antes que ele possa falar claramente? E por acaso você pensa que isto terá boa proficiência, quando chegar a maioridade [direito inglês aos 14 anos]? Outros os ensinam a tanto dissimularem quanto mentirem, através de sua severidade desarrazoada; e, ainda outros, por admirarem e aplaudirem suas mentiras engenhosas e embuste astuto. Que os pais sábios, ao contrário, os ensinem a ‘descartarem toda mentira’, nas pequenas e nas grandes coisas; na galhofa e na sinceridade, falando a mesma verdade de seus corações. Que ensinem a eles que o autor de toda falsidade é o diabo, que ‘é um mentiroso e o pai da mentira’. Ensinem a abominar e a desdenhar, não apenas toda mentira, mas todas as expressões ambíguas, toda a astúcia e dissimulação. Que usem de todos os meios para fazê-los amar a verdade, — veracidade, sinceridade, e simplicidade, e a franqueza do espírito e comportamento.

24. A maioria dos pais aumenta, em seus filhos, a tendência natural à injustiça, por serem coniventes, nas transgressões um ao outro; se não rindo, ou mesmo aplaudindo sua engenhosa sagacidade para enganar um ao outro. Tomem cuidado, com todas as coisas deste tipo; e, em suas infâncias, semeiem as sementes da justiça em seus corações, e os eduquem na prática mais exata dela. Se possível, os ensinem a amar a justiça, e isto nas coisas menores, assim como, nas coisas maiores. Imprimam, em suas mentes, um velho provérbio: ‘Aquele que é capaz de roubar um lápis, será capaz de roubar uma libra’. Habituem seus filhos a devolverem tudo que eles devem, mesmo que um centavo.

25. Muitos pais são coniventes igualmente na maldade de seus filhos, e, por meio disto, a fortalecem. Porém, os pais verdadeiramente afetuosos não irão ter indulgência com eles, de qualquer tipo, ou grau de crueldade. Eles não irão aceitar que eles aflijam seus irmãos ou irmãs, quer por palavras ou ações. Eles não irão permitir que eles firam ou causem dores à coisa alguma que tem vida. Eles não irão permitir que eles roubem ninhos de pássaros; muito menos matem alguma coisa sem necessidade, — nem mesmo cobras que são tão inocentes quanto minhocas, ou sapos, o que tem sido provado, sempre e sempre, não obstante a feiúra e a má fama deles, serem tão inofensivos quanto insetos. Que eles ampliem, na sua medida, a qualquer animal que seja, a regra de fazer a eles o que eles gostariam que lhes fosse feito. Vocês que são pais verdadeiramente amorosos, de manhã, de tarde, e em todo o dia, pressionem todos os seus filhos ‘a caminharem no amor, como Cristo também os amou, e deu a Si mesmo por nós’; a ter em mente um ponto, ‘Deus é amor; e aquele que habita no amor, habita em Deus, e Deus nele’.

[Editado por Keith Millar, estudante na Northwest Nazarene College (Nampa, ID), com correções por George Lyons para a Wesley Center for Applied Theology.]

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Nota do tradutor para o português

Desde que esta advertência foi escrita em 1896, e a introdução seguinte foi escrita em 1963, muitas coisas aconteceram, e hoje temos como dizer que o Conselho Mundial de Igrejas (www.oikoumene.org/index.php?id=645&L=5; www.wcc-coe.org/wcc/espanol.html), presidido na época pelo pentecostal David Du Plessis, tornou-se algo ainda mais sério e seus frutos ainda mais suspeitos do que se supunha em 1963… David Du Plessis, amigo de três papas, várias vezes condecorado pelo Vaticano e a quem foi dedicado um memorial no seminário Teológico Fuller, nos Estados Unidos, descendia da mesma família do cardeal Richelieu Du Plessis. Ou seja, um Du Plessis, o cardeal, foi agente de Roma na missão de reunificar a França, influenciou na definição das potências européias e consolidou o que viria a ser o poderio tremendo do reinado de Luis XIV, o Rei Sol, francês; outro Du Plessi pode bem ter sido um agente de Roma infiltrado no meio dos protestantes para brilhantemente articular alianças, aproximações, diálogos que, num futuro não muito distante, serão colhidos numa real e nunca imaginada reunificação de toda a cristandade sob a bênção do Pontifice Máximus.

Realmente vivemos tempos enganadores
Alexandre Rodrigues, tradutor, 08/04/2005

Nota do editor em espanhol


Desde que esta advertência foi escrita em 1896, o clamor pela reunificação da cristandade tem aumentado dentro de círculos cada vez mais amplos, e também tem crescido em volume e intensidade, pela inciativa de líderes religiosos e políticos. A Escritura prediz, efetivamente, que a coalizão será formada e florescerá exteriormente por um tempo, porém está condenada a uma espetacular destruição pelo juízo do Senhor. As solenes advertências de William Kelly de novo brilham com o fervente desejo de que seus leitores evitem todo contato com este esquema ímpio.

A repentina ascensão do chamado “movimento ecumênico”, fomentado pelo modernista e liberal Conselho Mundial de Igrejas, junto com o chamado do papa João XXIII a uma maior tolerância e orações para a reunião conjunta dos corpos católicos e protestantes, fazem com que este artigo seja ainda mais relevante para nossos dias.
Primavera de 1963

O ECUMENISMO: Reunificação ou Juízo contra a Cristandade?

Não há de surpreender a ninguém o fato de que, em uma carta dirigida ao arcebispo de York (em 1896), um experimentado e hábil político da atualidade tenha expressado a esperança daqueles que buscam uma reunificação de toda a cristandade. Alguns não estavam preparados para isso, e estão emocionados e com uma disposição muito respeitosa em relação ao papa, para dizer o mínimo. Sem dúvida, o sr. Gladstone [provavelmente William Ewart Gladstone, três vezes primeiro-ministro da Inglaterra – NR], na realidade, é mais consistente consigo mesmo que com a maioria das questões pendentes das quais ele jamais tratou. A cristandade tem sido sempre um ídolo mimado. Nisto ela ainda não mudou.

Mas se cremos nas Escrituras, a cristandade, se a julgarmos espiritualmente, é uma ruína[1]; e isto é confessado por todos quantos falam segundo a sua consciência. Para início de conversa, o papa reconhece essa ruína em seus multiplos anátemas; e assim também o faz o sr. Gladstone e todos os que aspiram pela “reunificação” ou pretendida restauração da cristandade. Se as coisas fossem segundo Deus, não haveria necessidade de nada disso. Aqueles que sentem a ruína muito mais profundamente confessam os pecados que a causaram e, geralmente, se vestem de pano de saco e cinzas. Por mandamento divino, todos os santos desde o Pentecostes tiveram originalmente uma só comunhão. Podiam ser centenas ou milhares os que creram (Atos 21:20); porém todos eles eram “a igreja de Deus em Jerusalém”, em Antioquia, em Corinto, em Éfeso. Assim era em todas as partes nos tempos apostólicos. Havia, naturalmente, igrejas em distintas províncias ou países (Gálatas 1:2). Porém o Evangelho era então pregado em todas as partes, e o Senhor operava juntamente com aqueles que pregavam (Marcos 16:20; Colossenses 1:6,23). E os crentes por toda a terra eram edificados juntos como “a casa de Deus, a Igreja do Deus vivo, coluna e baluarte da verdade” (1 Timóteo 2:15).

Segundo um cálculo aproximado da fé cristã, se estima que haja uns 216 milhões de católicos romanos; porém há 137 milhões de anglicanos, luteranos, reformados e outros protestantes, e 97 milhões de gregos ortodoxos ou outros, junto com nestorianos, cóptas, abissínios, etc. [dados da época em que o texto foi escrito – NR]. Há portanto pelo menos um igual número entre os que levam o nome de cristãos tanto dentro quanto fora do catolicismo, ainda que este sozinho contenha um maior número se comparado a qualquer outra denominação sozinha. Porém quanto à unidade, ela não existe. Pode alguém ainda vacilar diante desses fatos? É igualmente certo que a santa unidade na verdade deveria sempre ter sido uma realidade, mas há séculos cessou de existir. A pretensão de unidade, portanto, se demonstra agora que é falsa, e a ausência desta unidade uma prova certa da ruína[1].

A universalidade da Igreja visível é um sonho orgulhoso. E se a sucessão apostólica, no sentido histórico, tivesse de ser levada em conta, é claro que Roma não pode rivalizar com as igrejas orientais, as quais, plantadas por um ou outro apóstolo, foram dirigidas por João [o apóstolo], o último. Roma nunca teve apóstolos, salvo como prisioneiros ou para morrer; a assembléia em Roma não foi plantada nem governada por nenhum deles. A respeito disto a Escritura é decisiva.

Muito se argumenta, de maneira humana, a favor da sucessão apostólica. Porém o que confronta o crente, de um extremo ao outro da Escritura, é a vaidade e a queda do ser humano, sem importar quanto, onde ou como Deus o tenha provado, sem importar quais tenham sido os privilégios conferidos ao homem. Assim ocorreu com Adão, com Noé, com Abraão, com Moisés, com Arão e com Israel; com Saul, com Davi e com Salomão; com Nabucodonosor ou com qualquer outro dos gentios. Em nada Deus fracassou; pelo contrário, Deus sustentou a fé, apesar do fracasso dos Seus. Sem dúvida, o homem, sob cada uma das provas, fracassou. Entretanto, Deus tinha por alvo o Segundo Homem, o qual não só permaneceu em perfeição, como, por fim, manifestará em forma gloriosa os títulos que o primeiro homem e sua descendência puseram a perder: O Último Adão, o Primogênito de toda a Criação, o Governador da terra, a Semente da mulher e da Promessa, Sacerdote em Seu trono, Rei em Sião, Filho do Homem a quem todos os povos, nações e línguas servirão no século e terra habitáveis vindouros.

Porém, não é a igreja uma exceção à lei do fracasso e da miséria do homem? De modo algum! Por isso, está a solene advertência (que o grande apóstolo da incircuncisão faz de forma notável precisamente aos santos de Roma, no capítulo 11) de que não sejam sábios em sua própria opinião: “Sede unânimes entre vós; não ambicioneis coisas altas, mas acomodai-vos às humildes; não sejais sábios em vós mesmos” (Rm 12:16).

Se o gentio que professa a fé cristã não continuou na bondade de Deus, “tu também serás cortado” – Considera, pois, a bondade e a severidade de Deus: para com os que caíram, severidade; mas para contigo, benignidade, se permaneceres na sua benignidade; de outra maneira também tu serás cortado (11:22) – da mesma maneira como havia sido cortado o judeu. Haverá alguém tão cego, tão duro e tão soberbo para dizer que a cristandade “tem permanecido na bondade” de Deus? Poderia afirmar isto o papa da metade dos batizados? Isso diriam os protestantes da maioria católica? Dirão isto os piedosos anglicanos de sua própria comunidade? Acaso um dissidente que teme a Deus insistirá que sua sociedade, ou qualquer outra, não é culpável? Mas, se for assim, [os homens não têm permanecido na bondade de Deus], então, a Escritura (sem uma só palavra amenizadora em nenhuma outra passagem, e com muitas e ainda mais solenes advertências em outras passagens) sentencia inexoravelmente: “Tu também serás cortado” (Rm 11:22).

A cristandade, mãe e filhas (Apocalipse 17:5) caem debaixo da sentença universal. Os caminhos de Deus com os fiéis nunca mais fracassarão; o propósito de Deus será estabelecido em Cristo e na Igreja nos céus além de todo poder do inimigo. Porém o gentio não tem nenhuma diferença com respeito ao judeu no que diz respeito a responsabilidade de confessar sua fé na terra. A única exceção é o Senhor Jesus, o qual porá isto em execução, assim como todos os demais desígnios de Deus no dia vindouro. Ele – não o papa – é a Cabeça do Corpo, a Igreja; Ele, que é o Princípio, o Primogênito de entre os mortos (porque nesta condição, e não meramente como encarnado, é que teve início Seu relacionamento [redentor] com a Igreja) para que em tudo tenha a preeminência – E ele é a cabeça do corpo, da igreja; é o princípio e o primogênito dentre os mortos, para que em tudo tenha a preeminência (Cl 1:18).

“Que ninguém vos engane de nenhuma maneira.” Como assegura o apóstolo, o dia do Senhor não virá sem antes vir a apostasia (não a “reunificação”, mas sim a apostasia, a menos que ambas as coisas se unam simultaneamente), e tenha sido revelado o homem do pecado, o filho da perdição (2 Tessalonicenses 2). Aqueles que, com Martinho Lutero, João Calvino, John Knox, com Cranmer, Jewel e Parker, com Richard Baxter, Howe e John Owen, crêem que o catolicismo romano é a apostasia, e que o papado é o homem do pecado, deveriam lamentar profundamente que o velho estadista se incline ante o papa Leão XIII, e desaprovar aquelas coisas que o poder por detrás do Vaticano exigirá em seu infalível orgulho e a sempre vigilante sede de domínio universal por intermédio de seu chefe. Porém, se bem que é pura incredulidade duvidar que Roma seja a prostituta do Apocalipse, podemos fazer um ainda mais ousado prognóstico com respeito ao disputado tema dos batizados – que incluirá o papado, o protestantismo bem como os judeus – que resultará em uma mais completa apostasia, e na exaltação do Iníquo, a quem o Senhor destruirá pelo resplendor de Sua vinda, e que assim introduzirá os dias do céu na terra, já que somente Ele é capaz e digno de fazê-lo e foi designado de antemão para isto.

Com isso concordam todas as profecias do Novo Testamento bem como as do Antigo. O joio (Mateus 13) arruinou a plantação. Porém não se assegura nenhuma solução até que o Filho do homem julgue na consumação do século (13:27-43). Como nos dias de Noé e de Ló, assim será quando o Filho do homem for revelado (Lucas 17): não haverá a reunificação, mas sim o juízo dos vivos. A Primeira Epístola a Timóteo 4 e, ainda com mais força, 2 Timóteo 3, provam que a cristandade não continuou na bondade de Deus, e, por isso, se faz necessário cortar fora (Romanos 11). E que querem dizer 2 Pedro 2, 1 João e o Apocalipse? Também 1 Pedro 4:17 declarou que vem o tempo em que o juízo começará pela casa de Deus.

Os indivíduos podem ser livrados pela graça. Porém o mal em seu conjunto, outrora insinuado, seguirá piorando até que chegue o juízo divino, que, seguramente está perto, assim como o Senhor está preparado para julgar os vivos e os mortos. A esperança de uma reunião da cristandade não só carece de total apoio escriturístico, como também é contrária ao testemunho unânime do Senhor e de Seus apóstolos. Esta esperança surge da vontade do homem caído, que primeiro se aparta da vontade de Deus e em seguida passa por alto ou diretamente se opõe a Sua Palavra, não abandonado jamais a vã confiança no homem. Os profetas declaram que Deus em Sua soberana graça restaurará a Israel. O Novo Testamento é igualmente explícito em afirmar que Ele não restaurará, mas destruirá a Babilônia dos gentios.

Como pode um homem sóbrio esperar que aquela que “diz em seu coração: Eu estou sentada como rainha, e não sou viúva, e não verei pranto” (Apocalipse 18:7) abandone seu espúrio trono e se ajoelhe no pó em arrependimento? E mais especialmente nesse tempo quando erigiu uma mulher impecável e um homem infalível como seus novos bezerros de ouro?

Acaso ela “em sua fronte” se ruboriza por adorar, de uma ou outra forma, a virgem e aos anjos, aos ossos e as roupas de defuntos, o crucifixo e a hóstia? Acaso está ela envergonhada de um sacerdócio celibatário com sua confissão auricular e outros horrores diretos e indiretos? Acaso repudia ela sua pretendida transubstanciação e sua real inimizade em relação à leitura das Escrituras? Acaso Roma tem-se livrado desta mentira em sua mão direita: a missa? Por sua própria declaração, a missa “é um sacrifício propiciatório pelos vivos e pelos mortos”. Isso, segundo a Escritura, seria um sacramento, não da remissão de pecados (como a ceia do Senhor anuncia), mas sim de sua “não-remissão”. Não é a missa um sacrifício que admitidamente continua dia a dia, com exatamente a mesma prova de ineficácia que caracterizava os sacrifícios judeus, aos quais a Epístola aos Hebreus põe em contraste com “a oferta do corpo de Jesus Cristo feita de uma vez por todas” (Hebreus 9; 10) e com seus resultados atuais para o crente? “Pois onde há remissão dos pecados não há mais oferta pelo pecado” (10:18). É isso que o evangelho proclama, e o que a missa contradiz. Esta última é “um evangelho diferente”, que também é outro (Gálatas 1:6,7).

Que, pois, pode alguém pensar do fato de que os anglicanos estejam ouvindo Roma, quando seus próprios “Artigos de fé da Religião” declaram que “os sacrifícios das missas (…) são fábulas blasfemas e enganos perigosos” (artigo 31), e que “a igreja de Roma tem errado, não somente quanto à vida e às cerimônias mas também em matérias de fé” (artigo 19)? As alterações profundas e progressivas que se foram levando a cabo no último meio século dentro do corpo anglicano não têm sido um retorno, não “ao que era no princípio”, mas sim aos ritos e doutrinas da cristandade “não reformada” no Oriente e no Ocidente? Não foi isso que levou o sr. Gladstone a redigir essa retrógrada carta?

Se você valoriza as Escrituras, se se ajusta ao Evangelho, se possui a redenção que é em Cristo Jesus, se honra ao Filho assim como honra ao Pai, se sabe que, corporativamente, você é templo de Deus e seu corpo, templo do Espírito Santo, guarde-se de toda reunificação com a “cidade da confusão”, condenada à destruição, tão certamente como “Deus é verdadeiro”. Guarde-se inclusive de olhar para trás, para que não aconteça de se converter em uma estátua de sal. Porque Deus não se deixa escarnecer (Gálatas 6:7) e o Senhor poder se “irritar” (1 Coríntios 10:22).

Traduzido, por Alexandre Rodrigues da versão espanhola do original THE JUDGMENT, NOT REUNION, OF CHRISTENDOM

NOTAS

[1] N. do T.: Para um detalhado estudo sobre “a ruína da cristiandade”, veja o artigo de J. N. Darby, em espanhol A RUÍNA DA IGREJA em relação à sua responsabilidade na terra.

Quem sabe inglês pode baixar os extensos comentários críticos de William Kelly à Carta encíclica do papa Leão XIII sobre a unidade da igreja: ENCYCLICAL LETTER OF POPE LEO XIII. ON THE UNITY OF THE CHURCH, por W. Kelly, Junho 29 de 1896

Como comprovação dos fatos apresentados por Kelly, especialmente sobre a aproximação entre o anglicanismo e o catolicismo, o tradutor recomenda a leitura deste artigo contemporâneo entitulado A Estranha Morte da Inglaterra Protestante.

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A purificação do templo

“Estando próxima a Páscoa dos judeus, subiu Jesus para Jerusalém. E encontrou no templo os que vendiam bois, ovelhas e pombas e também os cambistas assentados; tendo feito um azorrague de cordas, expulsou todos do templo, bem como as ovelhas e os bois, derramou pelo chão o dinheiro dos cambistas, virou as mesas e disse aos que vendiam as pombas: Tirai daqui estas cousas; não façais da casa de Meu Pai casa de negócio. Lembraram-se os discípulos de que está escrito: O zelo da Tua casa Me consumirá” (Jo 2.13-17).

Creio que, de tempos em tempos, todos consideramos o estado e a condição do mundo em que vivemos, com apreensão na mente e no coração, e este fato é inevitável e certo1. A fé cristã não é um conto de fadas. Não é algo que ignora o mundo, mas é sempre muito prática. Assim, estamos conscientes de que vivemos num mundo em constante crise, cheio de problemas. Novamente, lembramo-nos da natureza precária de qualquer tempo de paz que estejamos desfrutando, já que somos, uma vez mais, confrontados pelos conflitos, que estão longe de serem apenas conflitos de idéias e podem, a qualquer momento, se tornar embates físicos2. Então, recordamo-nos do tipo de mundo em que vivemos: um mundo de guerras, de discórdias e derramamento de sangue.

E, claro, a grande pergunta para nós é: Qual é a mensagem do Cristianismo? O que a Igreja tem a dizer? Qual é a mensagem da Bíblia à luz de tudo isso? Ainda vivemos neste mundo e temos de compartilhar as conseqüências das quais a raça humana é herdeira. Porém, somos distintos por possuir uma visão diferente de todas as coisas, e nossa tarefa é descobrir, exatamente, o que deveríamos estar pensando e falando aos nossos vizinhos que não conhecem a Cristo e estão fora da Igreja.

Bem, não há dificuldade alguma em se responder às questões que mencionei acima. Está tudo muito claro. Pregamos que a Bíblia, por si só, nos dá a compreensão de por que as coisas são como são. Não há outra explicação para o mundo e sua condição, fora daquilo que a Palavra de Deus nos fornece. Conhecemos muito bem, como um fato puramente histórico, que o discurso ufanista e otimista dos homens de Estado e outros ilustres, particularmente no século 19, não se cumpriu. O mesmo ocorre com os estadistas do século 20. Sabemos que o mesmo pode ser dito sobre os pensadores e suas filosofias idealistas, sobre a teoria da evolução e do avanço. Quão ridículo tudo isso parece quando olhamos para os problemas globais! O mesmo pode ser dito a respeito dos humanistas e outros que depositam toda a sua fé na humanidade.

E nós, cristãos, o que temos a dizer? O que a Bíblia diz para todos os que acreditam nisso? Desejo mostrar a vocês que a resposta encontra-se nessas palavras do Evangelho de João. No relato de João sobre a purificação do templo, uma explicação é fornecida e somente uma única solução para o problema é apresentada a nós.

A resposta está em uma Pessoa abençoada. Ele é a resposta para todas as coisas. É Sua chegada a este mundo que faz a diferença e marca o ponto de transformação da História. Finaliza uma era e dá início a outra. É a “plenitude do tempo” (Gl 4.4). A resposta está em Sua vinda a este mundo, em todas as maravilhas que realizou enquanto esteve aqui e em tudo o que continua a fazer, pois desde então temos a chave para o problema. Jesus, e somente Ele, é a única solução.

Porém, devo apressar-me em acrescentar que é muito importante que O escutemos como Ele é, que permitamos que Ele fale a nós. Muitos se extraviam e falham na percepção das bênçãos e dos benefícios da vida cristã apenas porque não O escutaram. Creio ser este o principal problema do presente tempo. Em vez de dar a palavra a Cristo, as pessoas preferem falar. Acrescentam suas próprias idéias ao ensino do Senhor. Distorcem e pervertem Seus ensinamentos. As pessoas estão tão ansiosas para falar que tomam emprestadas algumas de Suas idéias e imaginam que isto é Cristianismo. Por conseguinte, claro, essas pessoas perdem a bênção.

Nos Evangelhos, pode ser claramente percebido que Jesus sempre controla toda a situação quando surge em cena. Estamos estudando a festa de casamento de Caná da Galiléia, onde a situação ficou tensa e problemática pela falta de vinho e nada se podia fazer para remediá-la. Então, Ele começa a agir e o problema é solucionado. A resposta está sempre Nele. Ele comanda a situação. Afirmo que a essência da sabedoria consiste em escutá-Lo quando Ele fala. Esta é a suprema necessidade do mundo. Literalmente, não há esperança em nenhum outro lugar.

Uma das primeiras coisas que precisamos compreender é que Jesus apresenta muitas facetas. Essa falta de compreensão explica, em parte, porque muitas pessoas se extraviam. Elas sempre procuram moldar Jesus às suas próprias imagens. Algumas enfatizam somente um dos aspectos: há as que destacam apenas Sua morte na cruz, o que, para elas, é a suprema ilustração do pacifismo; há aquelas que acentuam o aspecto estético de nosso Senhor, enquanto outras focalizam, talvez em demasia, o aspecto severo. O que pretendo sublinhar é que devemos aceitar Jesus como Ele é e não tentar enquadrá-Lo a certos pontos de vista. Ele supera todos os limites que as pessoas sempre procuram impor-Lhe.

Bem, aqui este ponto é apresentado a nós de uma forma interessante e dramática. Detivemos nosso olhar sobre Jesus na festa de casamento em Caná da Galiléia, onde, naquela ocasião festiva, transformou água em vinho. Que quadro mais feliz é este! Temos discorrido sobre como este evento nos ensina a respeito da plenitude da bênção que Ele pode dar a todo aquele que, verdadeiramente, enxerga sua necessidade, cai aos pés do Senhor, obedece a tudo quanto o Senhor lhe ordena e espera Nele. Que bem-aventurança e alegria esta passagem nos transmite!

No entanto, isto é o que lemos neste outro episódio: “Tendo feito um azorrague de cordas, expulsou todos do templo, bem como as ovelhas e os bois, derramou pelo chão o dinheiro dos cambistas, virou as mesas e disse aos que vendiam as pombas: Tirai daqui estas cousas; não façais da casa de Meu Pai casa de negócio.” É um quadro bem diferente daquele primeiro, não é mesmo? A mesma pessoa, mas um contraste impressionante.

João Batista viu tudo isso e resumiu o que viu em uma afirmação notável. Quando as pessoas começaram a pensar que ele, João, era o Cristo, ele negou dizendo: “Eu, na verdade, vos batizo com água, mas vem O que é mais poderoso do que eu, do Qual não sou digno de desatar-Lhe as correias das sandálias; Ele vos batizará com o Espírito Santo e com fogo” (Lc 3.16). Encontramos estas palavras: “Espírito Santo! Fogo!” As bênçãos da plenitude, o batismo do Espírito Santo – que maravilha e glória! Porém, não se esqueça de que há também o fogo. Então, João prossegue: “A Sua pá, Ele a tem na mão, para limpar completamente a Sua eira e recolher o trigo no Seu celeiro; porém queimará a palha em fogo inextinguível” (v. 17).

Infelizmente, esse é o grande equívoco dos nossos tempos. Nosso Senhor tem sido considerado apenas como o Príncipe da Paz, mas nos esquecemos de que Ele também é o Rei da Justiça. Ele exerce os dois papéis. Jesus é o perfeito Salvador da humanidade – e, repito, a essência da sabedoria está em cair a Seus pés, olhar para Sua face e ouvir o que Ele tem a nos dizer. Nunca antes a Igreja e o mundo necessitaram ouvir com tamanha atenção. Não se esqueça do mundo em que você vive. Olhe-o de forma direta e justa. Não pisque diante de nada. Não encubra nada.

E qual é a mensagem que o mundo tanto precisa ouvir? Deixe-me, primeiro, colocar o que ela não é. A mensagem do Senhor e Sua Palavra não são um pensamento emocional ou geral. Há pessoas que se deixam levar pelas emoções. Normalmente, elas só pensam no Senhor em determinadas ocasiões, quando estão apenas buscando uma vaga e emocional mensagem de conforto. Claro que Ele tem consolo a nos oferecer, mas é Seu consolo, é Sua paz. Ele afirmou: “Deixo-vos a paz, a Minha paz vos dou; não vo-la dou como a dá o mundo. Não se turbe o vosso coração, nem se atemorize” (Jo 14.27). O Senhor não oferece uma paz que o mundo já conhece. Sua paz é composta pelos elementos da retidão, justiça e verdade. Não é simplesmente a ausência de guerras. Tampouco é uma conversa geral e vaga sobre sacrifício e seu valor intrínseco. O sacrifício é uma atitude grandiosa, maravilhosa e nobre, mas não como o mundo a utiliza. Freqüentemente, o Evangelho é transformado em um tipo de mensagem terrena sobre sacrifício, dever e coragem. Todas estas coisas são corretas, nos seus devidos lugares, mas não devem ser elevadas a tão suprema posição. Não estamos interessados em nenhuma idéia sobre sacrifício, dever e coragem que não seja diretamente derivada dos ensinamentos do Filho de Deus.

Nem mesmo o Evangelho é uma mensagem de conselho aos estadistas e líderes mundiais. Não é a pregação do pastor, pois este não é meu negócio. A Igreja não está aqui para dizer aos estadistas o que eles devem fazer ou não. Ela possui um chamado muito maior e mais profundo, como pretendo mostrar a você. Assim, não desperdicemos o tempo expressando nossa opinião a respeito de como as coisas deveriam estar acontecendo em períodos de crises políticas, dividindo a Igreja em grupos de posições diferentes. Tampouco é função do pregador apelar aos líderes do mundo para que promovam a paz e terminem as guerras. Sempre haverá guerras e rumores de guerras. Não é isso de modo algum! O pastor deve proclamar a verdade.
Então, qual é a mensagem do Evangelho? É uma mensagem radical a proclamar a única esperança e o único caminho de salvação. É exatamente o que nosso Senhor fez quando foi a Jerusalém por ocasião da Páscoa, e é muito interessante que este episódio apareça aqui, nos capítulos iniciais do Evangelho de João, no começo do ministério de Jesus Cristo. Este é um dos mais significativos e cruciais eventos ocorridos durante a vida e o ministério do Senhor na terra.

Na purificação do templo, vemos o Senhor dando aos judeus uma advertência final. Ele lhes estava fornecendo uma indicação de que, a menos que obedecessem ao que Ele lhes veio anunciar, não haveria salvação para a nação judia. De fato, Jesus estava dizendo: “Ouçam as Minhas palavras e as coloquem em prática, ou estejam preparados para o ano 70 d.C.” A História nos mostra que, neste ano, as tropas romanas marcharam sobre Jerusalém e a saquearam, destruindo o templo e forçando os judeus a se espalharem entre as nações. Neste episódio, o Senhor está-lhes mostrando a única maneira de evitar aquela catástrofe.
Grande parte do ministério de Jesus foi devotada a essa palavra. O Senhor apresentou aos judeus essa única possibilidade, essa singular esperança, e eles a rejeitaram. Então, nada lhes restou a não ser o cumprimento da destruição que fora predita. Assim, no final de Seu ministério, Jesus olhou para a cidade de Jerusalém e disse: “Jerusalém, Jerusalém, que matas os profetas e apedrejas os que te foram enviados! Quantas vezes quis Eu reunir os teus filhos, como a galinha ajunta os seus pintinhos debaixo das asas, e vós não o quisestes!” (Mt 23.37).

Aqui, então, está a mensagem do Senhor, que permanece inalterada para nós, hoje. Por essa razão é que desejo mostrá-la a vocês. Longe de ser uma mensagem dos líderes da Igreja aos estadistas, dizendo-lhes o que devem fazer em suas funções, ela é, primariamente, uma palavra aos cristãos e seus líderes, a fim de dizer-lhes o que eles devem fazer em sua própria esfera. Esta é a tragédia quando a Igreja tenta dizer ao mundo o que fazer e a pergunta que surge é: “A Igreja está em uma condição apropriada para agir assim?” Por isso, não deve causar surpresa o fato de o mundo não nos dar ouvidos.
A primeira ênfase da mensagem cristã reside na verdade de que a coisa mais importante na vida de uma pessoa ou nação é o relacionamento de cada um com Deus. E tudo isso é tipificado pelo templo. Afinal de contas, o templo era o maior e mais grandioso de todos os palácios e edificações em Jerusalém. Os judeus eram o povo de Deus e era naquele lugar que o povo se reunia para cultuá-Lo e para se relacionar com Ele. Aquele local era o centro da vida da nação. Eis por que nosso Senhor não somente foi ao templo, mas reagiu daquela maneira e disse o que disse, naquela ocasião.

Se você ler a história dos filhos de Israel no Antigo Testamento, descobrirá que quando tudo estava em seus devidos lugares no templo e os filhos de Israel eram leais a Deus, todos os outros aspectos da vida da nação iam bem – nas guerras, na prosperidade material, e assim por diante. Porém, a partir do instante em que havia um declínio na qualidade de culto, via de regra essa deterioração também ocorria na vida das pessoas, ou seja: tais pastores, tal povo. Este tema surge ao longo de todo o Antigo Testamento. Portanto, neste incidente nosso Senhor está, como estava, indicando que esta verdade ainda é relevante, que as leis de Deus não mudam nunca e que são a única forma de as pessoas viverem em segurança e paz.

No Antigo Testamento, há muitas frases gloriosas que expressam a mesma verdade. Aqui estão algumas delas: “Não havendo profecia, o povo se corrompe” (Pv 29.18), não importa quanta riqueza possuam ou quão poderosos sejam seus armamentos. “Não havendo profecia” – isso é o que controla tudo o mais. A História mostra que é possível para uma pessoa ou nação caminhar por longo tempo na visão daqueles que vieram antes deles. A queda não ocorre de forma súbita. Sempre há um declínio gradual. Porém, uma vez que essa visão se perde, você pode esperar o que estamos colhendo hoje.

Veja outro versículo: “A justiça exalta as nações, mas o pecado é o opróbrio dos povos” (14.34). O mais importante não são as possessões, nem as riquezas ou o poder material, mas a “justiça”. E quando uma nação ou qualquer indivíduo pratica a justiça, todas as outras coisas são supridas. Nosso Senhor resumiu tudo isso em uma frase, proferida durante o Sermão do Monte: “Buscai, pois, em primeiro lugar, o Seu reino e a Sua justiça, e todas estas cousas vos serão acrescentadas” (Mt 6.33).

Talvez, a ilustração mais notável seja a história de Eli, o sacerdote, encontrada em 1 Samuel. Eli era um bom homem, porém muito brando e indulgente. Ele permitia que seu sentimento e temperamento o guiassem, em lugar de ser guiado pela lei de Deus. Por conseguinte, seus dois filhos eram maus. No livro de 1 Samuel capítulo 2 você poderá ver como os filhos de Eli abusaram de suas funções de sacerdotes. Aquele pai idoso sentia-se débil para deter os filhos, de modo que eles prosseguiram no erro, juntando bens e privilégios para si mesmos por meio de seus santos ofícios, vivendo de maneira imoral e indigna. Observamos ali o declínio começar a cair sobre a casa de Deus e logo atingir toda a nação. O exército filisteu veio, e Israel foi fragorosamente derrotado, tendo o inimigo até mesmo levado embora a Arca da Aliança.

Esta é a mensagem típica do Antigo Testamento, e agora a encontramos no Novo. Quando as coisas não vão bem no templo, tudo o mais começa a declinar. A chave para tudo é nosso relacionamento com Deus.

Este é o princípio controlador e, inevitavelmente, surge o segundo princípio – estou apenas expondo o que encontramos aqui em João 2.13-17 –: o maior perigo que corremos é interpretar mal e abusar dos meios da graça, mediante os quais Deus fortalece nosso culto individual e nossa caminhada com Ele. Nós os usamos para alcançar nossos próprios fins e propósitos. Esta é a grande lição que os filhos de Israel colocam diante de nós, de forma dramática, aqui e mais tarde, nos acontecimentos do ano 70. O problema dos judeus é que eles sempre usavam mal o que Deus lhes dava. Como mostrado por nosso Senhor neste episódio, eles abusaram do templo. Este não foi apenas seu problema, mas a causa do trágico fim que atingiu a nação.

E eu, solenemente, sugiro que a explicação para a condição crítica de muitas nações nos dias de hoje é o abuso e mau uso do “templo”: a apropriação indébita das coisas que Deus lhes deu e a utilização desta dádiva para fins indignos e egoístas. Esta sempre é a causa de todos os problemas e, com o passar do tempo, não somente será uma atitude errada, mas insana.
Do que estou falando? Bem, com extrema freqüência em Israel, a primeira coisa que começava a dar errado quando os judeus perdiam o Espírito vivente é que eles transformavam o culto no templo em algo formal e exterior. Não existe nada mais terrível na vida de uma pessoa ou nação do que uma religião calcada no formalismo, apenas agindo de acordo com as conveniências, sem qualquer sentimento, sopro do espírito ou fé real, indo à igreja em ocasiões especiais porque é uma boa atitude. O formalismo e a ênfase no que é exterior é uma grande maldição. E não somente a história dos judeus demonstra isso, mas se você ler a história subseqüente da era cristã, encontrará exatamente a mesma coisa.

O que é extraordinário nesse incidente de João 2 é que a presença de bois, ovelhas, pombas e de cambistas, por si só, não deveria ser considerada como imprópria, mas, ao contrário, até mesmo necessária. Por ocasião destas festas, as pessoas iam a Jerusalém de muito distante e não podiam trazer os animais consigo na longa viagem. Assim, era legítimo que houvesse vendedores de bois, ovelhas e pombas. Ainda, para lá afluíam pessoas de diferentes partes do mundo que traziam diferentes moedas e era necessário que houvesse cambistas para viabilizar a troca. Não havia nada de errado com isso.

Mas eis o que estava errado: o comércio ocorria dentro do templo, e para muitas pessoas esta atividade era o único motivo para que estivessem ali. Homens estavam enriquecendo com ela. Nosso Senhor estava preocupado com o mau uso daquilo que era correto e adequado. Deus tem indicado a forma de culto para nós. Na época do Antigo Testamento, Deus instituiu os rituais exteriores do templo e o cerimonial que deveria ser obedecido. Em nossos dias, nós O cultuamos de uma forma mais interior, espiritual. Porém, o princípio permanece o mesmo, e Deus tem ordenado estas coisas.
Aqui é que está o perigo. Corremos o risco de nos apropriarmos das coisas que o próprio Deus nos tem indicado e utilizá-las para servir nossos próprios objetivos, da nossa maneira, adequando-as aos nossos interesses e conveniências. Eis contra o que o Senhor se revolta daquela majestosa e dramática maneira.

Vamos ser práticos a esse respeito. Você está realmente preocupado com a condição do mundo? Se estiver, este não é o momento para sentimentalismos, mas para ouvir o Filho de Deus e Sua mensagem. E creio que, nos dias em que vivemos, Ele está falando de uma forma mais intensa e urgente, especialmente à luz dos recentes acontecimentos mundiais. Isto é um assunto muito sério. É um indicativo de que algo profundo está em marcha, e acho que a principal causa é o uso, em causa própria, daquilo que Deus nos tem dado, especialmente em Sua Igreja e em Seu culto. O uso da igreja, como parte da vida da nação, é como um departamento de Estado, um cenário para grandes ocasiões e para cerimônias de batismos, casamentos e enterros. O cerimonial, dado por Deus, está sendo utilizado para nossos próprios fins e propósitos. Assim, por exemplo, cultos cristãos comemorativos são mantidos por homens e mulheres não-cristãos, conhecidos escarnecedores da fé cristã. O uso da Igreja desta maneira e a boa vontade desta em ser assim usada são abusos daquilo que Deus nos deu.

Isso é importante? Bem, creio que é importante por estas razões: sustenta e fortalece a razão alegada por muitas nações nominalmente ateístas. Em tais países, o Estado e a Igreja estavam ligados de tal forma que, quando o povo desejou uma mudança no Estado, a Igreja foi envolvida. Foi a associação entre a família real russa e a Igreja Ortodoxa, especialmente representada pelo diabólico Rasputin, que levou à revolução russa. O povo abominava a Igreja. As pessoas diziam que, se aquilo fosse Cristianismo, elas não o queriam. Eis a razão pela qual elas se voltaram ao comunismo ateu. Os franceses fizeram o mesmo, por ocasião da sua revolução.

Certamente, tudo isso tem muito a nos dizer. Podem os ingleses alegar inocência da acusação de terem utilizado a Igreja como parte de sua política de colonização? Hoje, este fato assume grande relevância porque as outrora colônias têm-se tornado nações independentes e, em muitas delas, estamos vendo a mesma história se repetir. Nesses países, a política colonial é identificada com o Cristianismo. A Igreja e o Estado estiveram juntos. A espada e o bispo, assim como o foram no passado, estão entrelaçados, e quando um é rejeitado, o outro sofre o mesmo tratamento. Estes assuntos são vitais e muito sérios. Se a Igreja for utilizada como parte de uma política colonialista ou como parte de uma tentativa de impor a civilização ocidental a essas nações, então, quando houver uma rebelião contra o Ocidente, a Igreja também será envolvida no conflito. Colhemos apenas o que plantamos e os resultados não devem nos surpreender.

Houve o risco, especialmente na Primeira Guerra Mundial, de usar a Igreja como um tipo de posto glorificado de recrutamento. A mensagem cristã foi transformada em apelos para heroísmo, sacrifício e coragem, em benefício dos interesses do Estado. Por isso, não deve ser motivo de espanto o fato de multidões estarem fora da Igreja. As pessoas não são tolas. Elas observam estas coisas e muitas reagiram de modo violento ao que aconteceu na Primeira Grande Guerra.

Porém, à parte de tudo isso, há muitos que utilizaram a Igreja, e ainda o fazem, simplesmente para propagar teorias e ensinamentos humanos. Alguns até mesmo defendem o comunismo em nome do Cristianismo. Eles passam adiante suas próprias filosofias, sempre pregando a política e lidando com assuntos materiais, mas usando as Escrituras, a terminologia e idéias fora de seu verdadeiro significado, sempre visando a seus próprios interesses. Além disso, com freqüência, a Igreja tem sido inocente o suficiente para permitir-se ser usada pela cultura. Muitas pessoas vão aos cultos cristãos apenas para ouvir as músicas, sem demonstrar interesse por nada mais. E a Igreja tem-se permitido ser utilizada pela música, pela arte e por outros movimentos artísticos. Outros têm usado a Igreja para servir à sua ambição pessoal, buscando uma carreira bem-sucedida e avanços mundanos. Quantas vezes se disse no passado, que nas famílias tradicionais, o filho mais velho ia servir a Marinha, o segundo, o Exército e, então, lá no fim da linhagem, o mais novo ia servir a Igreja?

Mas tudo isso é, simplesmente, apropriação indébita. Aqui nós vemos a ovelha, os bois, as pombas e os cambistas. E esta é a razão pela qual multidões estão fora da Igreja. As pessoas argumentam: “Se isto é Cristianismo, não temos interesse.”
Portanto, a história de nosso Senhor no templo é relevante, não acha? Foi Jesus quem expulsou os animais e cambistas do interior do templo. Não estou expressando aqui minhas próprias opiniões. Estamos estudando Suas reações quando foi a Jerusalém, por ocasião da Páscoa.

Assim, meu próximo princípio é que, nos dias de hoje, é de suprema necessidade que as pessoas conheçam a presença do Senhor em poder, na Igreja. Eis por que não estou pregando sobre fatos políticos. A necessidade não é para que algo aconteça no meio governamental, mas no meio da Igreja. Por que razão os estadistas a ignoram? Porque a Igreja não detém nenhum poder. Já houve tempos em que os estadistas davam ouvidos a ela. Pense em John Knox pregando a mensagem e, sentada na audiência, a rainha da Escócia ouvindo e tremendo. Esta é a ordem certa. Porém, isto somente acontece quando Cristo está presente no templo, com poder. Assim, ao olhar para o mundo e lembrar das duas guerras mundiais e toda a devastação que trouxeram, ao ver o que está acontecendo a multidões de pessoas, padecendo de dores diferentes em muitos lugares, quando percebo as sombrias possibilidades existentes, eu afirmo que a mensagem necessária é esta que surge quando Cristo entra no templo e começa a falar e a agir. E, portanto, se você e eu estamos sinceramente preocupados com a situação atual e os rumos que o mundo está tomando, nossa primeira tarefa é orar pedindo um reavivamento na Igreja. Não é dizer coisas ao mundo, mas buscar este poder que nos tornará capazes de falar ao mundo de tal maneira que as pessoas temerão ao nos ouvir.

A seguir, devemos examinar o que Ele faz quando aparece em cena. “Estando próxima a Páscoa dos judeus, subiu Jesus para Jerusalém” – e as coisas começaram a acontecer. E o que descobrimos? Imediatamente, vemos a manifestação de Sua glória, de Sua autoridade, de Seu zelo e poder. Você percebeu, ao ler esta passagem, que isto é um milagre? Foi tão milagroso como a transformação da água em vinho, na festa de casamento em Caná da Galiléia. Olhe para esses homens, ricos e espertos, comercializando no interior do templo e, ainda assim, uma pessoa indefesa, somente munida com uma espécie de chicote feito de cordas, os expulsou a todos daquele lugar, com suas ovelhas e bois. Após ter feito isso, voltando-se para os homens que vendiam pombas, disse: “Tirai daqui estas cousas.” Então, Ele vira as mesas dos cambistas, e joga ao chão todo o dinheiro.

Mas como uma coisa dessas pode acontecer por meio de uma única pessoa, munida de um chicote improvisado? Há somente uma resposta possível, qual seja: é a manifestação de Sua glória, assim como na festa de casamento. Lembre-se do que lemos ao final daquela passagem: “Com este, deu Jesus princípio a Seus sinais em Caná da Galiléia; manifestou a Sua glória” (2.11). A palavra de Cristo tem poder. Ele é o Filho de Deus encarnado. Ele falava com autoridade, e os homens sentiam isso em seu íntimo.

Encontramos o mesmo fato acontecer em inúmeras outras passagens nas páginas dos quatro Evangelhos. Quando Jesus falava, ou mesmo olhava para homens e mulheres, eles reconheciam esse poder e autoridade, pois não conseguiam sequer fitá-Lo. Jesus é o Filho de Deus, detentor de toda a autoridade e poder. Eis por que devemos orar para que esse poder seja conhecido hoje. Foi Ele que nos constituiu e é o único que pode nos capacitar, conforme Sua promessa. Nossa maior necessidade está Nele, em Sua força, para que possamos falar com igual autoridade.

Nesse incidente, vemos Jesus agindo como sempre faz. Ele anuncia e executa julgamento. Ele vê esta situação acontecendo: “E encontrou no templo os que vendiam bois, ovelhas e pombas e também os cambistas assentados”. E sente indignação. O zelo pela Casa do Pai O consome. Ele está tomado de um santo senso de justiça e, desta forma, anuncia o julgamento sobre todos.
Eu me desespero só de pensar que você não tem consciência do julgamento de Deus sobre a Igreja de nossos dias. Você não consegue ouvir isso? Não consegue sentir ou ver? Por que essa tremenda confusão? Por que pessoas comuns de todos os países vêem a Igreja como algo ridículo? Este é o julgamento de Deus. Deus está permitindo que a Igreja seja ridicularizada em virtude do abuso e mau uso dos quais todos nós somos culpados.

E o que mais? Bem, nosso Senhor institui a reforma. Ele lança fora as coisas que não pertencem ao lugar. E, repito, a maior necessidade de nossos dias é uma reforma na Igreja e sua doutrina, é lançar fora todo o traço de paganismo. Ouça as palavras do Senhor: “Tirai daqui estas cousas.” Todos os ornamentos e parafernália, todo o incenso e as tentativas de oferecer sacrifícios e ofertas queimadas, a liturgia vazia, devem ser lançados fora. Este é o exemplo dado pelo Senhor. Deve haver uma ampla reforma, abrangendo a doutrina, todas as superstições e mentiras. Tudo aquilo que torna os homens grandes e importantes, que encobrem o Senhor e Sua glória eterna, deve ser lançado fora. Foi isso o que aconteceu na Reforma Protestante e se repete em cada um dos outros períodos de reforma e reavivamento. Ele extirpa o que é falso, seja na doutrina, na prática ou no comportamento. Em suma, o que Ele faz? Ele restaura a simplicidade original.

Mais tarde, o Senhor falou algo muito similar porque as pessoas não Lhe deram atenção. Ao fim de Seu ministério, Jesus diz que os homens haviam transformado a casa do Pai em covil de salteadores (Mt 21.13). Porém, a casa do Pai deveria ser um lugar de oração! A função da Igreja é trazer homens e mulheres a Deus, mantendo-os em comunhão com Ele. A Igreja deveria ser tão repleta do poder de Deus que todas as pessoas, em certo sentido, seriam forçadas a ouvir. A partir do instante em que você simplifica sua religião, o poder aumenta. Todas as outras coisas, a falsidade doutrinária, a mentira na conduta, colocam-se entre a verdade e as multidões e precisam ser removidas. Temos de retornar àquela simplicidade que está em Cristo Jesus.
O que acontece quando se faz isso? Procure conhecer a história da Igreja, leia sobre a Reforma Protestante. O que resultou destes movimentos? Bem, entre outras coisas, levou ao período Elizabetano.

O mesmo aconteceu na época do Movimento Puritano. Você pode rir dos puritanos, se quiser, mas lembre-se de que o período correspondente ao governo de Oliver Cromwell, o período do Commonwealth – referente ao governo republicano na Inglaterra, de 1649 a 1660 –, foi um dos melhores períodos de toda a história da Inglaterra e País de Gales. Todos concordam, inclusive historiadores seculares, que a base da grandeza destes países está naquela época, quando havia uma ética moral na nação, quando homens e mulheres colocavam Deus em primeiro lugar em sua vida. Assim, toda a nação foi elevada, como está escrito: “A justiça exalta as nações” (Pv 14.34).

É correto e verdadeiro dizer-se que tudo o que era glorioso e grandioso no século 19 foi resultado direto do Despertamento Evangélico, ocorrido no século 18. Isso pode ser estabelecido historicamente. Certo historiador afirma que foi este fato, e apenas ele, que salvou o país de experimentar algo semelhante à Revolução Francesa. Outros historiadores confirmam que o movimento evangélico deu origem, não somente ao engrandecimento da nação, mas também ao esclarecimento do povo. O movimento sindicalista, por exemplo, resultou diretamente deste reavivamento. Tudo o que eleva homens e mulheres, tudo o que os faz compreender quem e o que são, que os faz lembrar de que possuem mente e os inspira a aprender e a progredir, tudo isso resulta da bênção original de ouvir o Filho de Deus e permitir que Ele lide com a Igreja e, individualmente, conosco.

Uma vez que a pessoa certa esteja no centro e que o templo esteja purificado, reformado e renovado, a mudança começa a permear toda a vida e um novo tom surge. Não havendo profecia, o povo se corrompe. Havendo profecia, o povo é bem-sucedido. Esta é a suprema necessidade de nossos dias. Precisamos recapturar a visão, voltarmo-nos a Ele, permitir que Ele atue e fale a nós, purificar e lançar fora.

Portanto, para mim, esta é a mensagem da Bíblia para este mundo. Que este Cristo volte e, novamente, com Sua autoridade enfrente os oportunistas, vire as mesas, lance fora e purifique o templo, dando-nos a conhecer, uma vez mais, em simplicidade e pureza de coração, Sua fé e o poder que, inevitavelmente, cai sobre todos aqueles que crêem e se submetem a Ele, todos os que desejam ser cheios do abençoado Espírito Santo. Ah! Que Jesus venha mais uma vez ao templo! Vamos começar a oferecer aquela oração. Tudo bem, ore pelos outros, mas esta não é a oração primordial. A principal oração não é pelos estadistas, parentes ou amigos, tampouco pelas nações. Em primeiro lugar, devemos orar para que Jesus volte ao Seu templo, que manifeste Sua glória e nos mostre um pouco de Sua autoridade e poder, enchendo-nos com este poder.

1 Este sermão foi pregado no domingo, Dia do Armistício, 1965.
2 Em novembro de 1965, a comunidade branca da antiga Rodésia do Sul, atual Zimbábue, recusou-se a aceitar as regras impostas pela maioria negra e proferiu uma declaração de independência unilateral e ilegal.

(Extraído do livro O segredo da bênção celestial, cap. 6, de Martin Lloyd-Jones, co-edição Editora Textus e Editora dos Clássicos, 2002, com permissão da Editora Textus para publicação no sítio Campos de Boaz.)

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Hinos & Poesia

A obra que salva (hino de Horatius Bonar)

Feita está a obra que salva!
De uma vez e para sempre feita.
Cumprida a justiça
Que reveste o injusto homem.
O amor que nos abençoa
Está fluindo livremente para nós agora.

O sacrifício acabou,
O véu está rasgado ao meio,
O propiciatório está vermelho
Com o sangue da vítima imolada;
Por isso estamos nós, então, sem temor.
O sangue divino convida-nos a nos aproximar.

O portão está totalmente aberto,
O novo e vivo caminho
É claro e gratuito e brilha,
Com amor e paz e luz do dia;
Para o Santo dos Santos nós agora vamos,
Nosso lar presente e eterno.

No trono da graça
O Sumo Sacerdote assenta-se;
O sangue está em Sua mão
O qual faz-nos e mantém-nos limpos.
Com ousadia vamos agora nos aproximar,
Pois o sangue baniu todo medo.

Então, ao Cordeiro uma vez morto
Seja a glória, o louvor e o poder,
A Ele que morreu e vive novamente,
Que vive para sempre,
Que nos amou e nos lavou em Seu sangue,
Que nos fez reis e sacerdotes para Deus.

(Horatius Bonar. traduzido por Francisco Nunes para Editora dos Clássicos, 2003)

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