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A. W. Tozer Cristo Evangelho

Por que o mundo não O pode receber? (A.W. Tozer)

“O Espírito da verdade, que o mundo não pode receber” (João 14:17).

A fé cristã, baseada no Novo Testamento, ensina o completo contraste entre a igreja e o mundo. Não é mais do que um lugar comum religioso dizer que o problema conosco hoje é que procuramos construir uma ponte sobre o abismo que há entre duas coisas opostas, o mundo e a igreja, e realizamos um casamento ilícito para o qual não há autorização bíblica. Na verdade, nenhuma união real entre o mundo e a igreja é possível. Quando a igreja se junta com o mundo, já não é mais a igreja verdadeira, mas apenas um detestável produto misturado, um objeto de gozação e desprezo para o mundo, e uma abominação para o Senhor.

A obscuridade em que muitos (ou deveríamos dizer a maioria dos?) crentes andam hoje não é causada por falta de clareza da parte da Bíblia. Nada poderia ser mais claro do que os pronunciamentos das Escrituras sobre a relação do cristão com o mundo. A confusão que campeia nessa matéria resulta da falta de disposição de cristãos professos para levar a sério a Palavra do Senhor. O cristianismo está tão emaranhado no mundo que milhões nunca percebem quão radicalmente abandonaram o padrão do Novo Testamento. A transigência está por toda parte. O mundo está suficientemente caiado, encobrindo as suas faltas, para passar no exame feito por cegos que posam como crentes; e esses mesmos crentes estão eternamente procurando obter aceitação da parte do mundo. Mediante mútuas concessões, homens que a si mesmos se denominam cristãos manobram para ficar bem como homens que para as coisas de Deus nada têm, senão mudo desprezo.

Toda esta questão é espiritual, em sua essência. O cristão é o que não é por manipulação eclesiástica, mas pelo novo nascimento. É cristão por causa de um Espírito que nele habita. Só o que é nascido do Espírito é espírito. A carne nunca pode converter-se em espírito, não importa quantos homens considerados dignos da igreja nela trabalhem. A confirmação, o batismo, a santa comunhão, a profissão de fé – nenhum destes, nem todos estes juntos, podem transformar a carne em espírito, e tampouco podem fazer de um filho de Adão um filho de Deus. “E, porque vós sois filhos”, escreveu Paulo aos gálatas, “enviou Deus aos nossos corações o Espírito de seu Filho, que clama: Aba, Pai.”. E aos Coríntios, ele escreveu: “Examinai-vos a vós mesmos, se realmente estais na fé; provai-vos a vós mesmos. Ou não reconheceis que Jesus Cristo está em vós? Se não é que já estais reprovados”. E aos romanos: “Vós, porém, não estais na carne, mas no Espírito, se de fato o Espírito de Deus habita em vós. E se alguém não tem o Espírito de Cristo, esse tal não é dele”.

A terrível zona de confusão tão evidente em toda a vida da comunidade cristã, poderia ficar esclarecida num só dia, se os seguidores de Cristo começassem a seguir a Cristo em vez de uns aos outros. Pois o nosso Senhor foi muito claro em Seu ensino sobre o cristão e o mundo.

Numa ocasião, depois de receber não solicitado e carnal conselho de irmãos sinceros, mas não esclarecidos, o nosso Senhor respondeu: “O meu tempo ainda não chegou, mas o vosso sempre está presente. Não pode o mundo odiar-vos, mas a mim me odeia, porque eu dou testemunho a seu respeito de que as suas obras são más”. Ele identificou os Seus irmãos na carne com o mundo e disse que Ele e eles eram de dois espíritos diferentes. O mundo O odiava, mas não podia odiá-los porque não podia odiar-se a si próprio. Uma casa dividida contra si mesma não subsiste. A casa de Adão tem que permanecer leal a si própria, ou se romperá. Conquanto os filhos da carne possam brigar entre si, no fundo estão unidos uns aos outros. É quando o Espírito de Deus entra, que entra um elemento estrangeiro. “Se o mundo vos odeia”, disse o Senhor aos Seus discípulos, “sabei que, primeiro do que a vós outros, me odiou a mim. Se vós fôsseis do mundo, o mundo amaria o que era seu; como, todavia, não sois do mundo, pelo contrário dele vos escolhi, por isso o mundo vos odeia.”. Paulo explicou aos gálatas a diferença entre o filho escravo e o livre: “Como, porém outrora, o que nascera segundo a carne perseguia ao que nasceu segundo o Espírito, assim também agora” (Gálatas 4:29).
Assim, através do Novo Testamento inteiro, é traçada uma aguda linha entre a igreja e o mundo. Não há meio termo. O Senhor não reconhece nenhum bonzinho “concordar para discordar” para que os seguidores do Cordeiro adotem os procedimentos do mundo e andem pelo caminho do mundo. O abismo que há entre o cristão e o mundo é tão grande como o que separou o rico de Lázaro. E, além disso, é o mesmo abismo, isto é, é o abismo que separa o mundo, dos resgatados do mundo; do mundo, dos que continuam caídos.

Bem sei, e o sinto profundamente quão ofensivo esse ensino deve ser para aquele bando de mundanos que mói e remói o rebanho tradicional. Não posso alimentar a esperança de escapar da acusação de fanatismo e intolerância que, sem dúvida, lançarão contra mim os confusos religionistas que procuram fazer-se ovelhas por associação. Mas bem podemos encarar a dura verdade de que os homens não se tornam cristãos associando-se com gente de igreja, nem por contato religioso, nem por educação religiosa; tornam-se cristãos somente por uma invasão da sua natureza, invasão feita pelo Espírito de Deus por ocasião do novo nascimento. E quanto se tornam cristãos assim, imediatamente passam a ser membros de uma nova geração, uma “raça eleita, sacerdócio real, nação santa, povo de propriedade exclusiva de Deus … que não tínheis alcançado misericórdia, mas agora alcançastes misericórdia” (I Pedro 2:9,10).

Com os versículos citados, não houve desejo de os citar fora do contexto, nem de focalizar a atenção num lado da verdade para desviá-lo de outro. O ensino desta passagem forma completa unidade com toda a verdade do Novo Testamento. É como se tirássemos um copo de água do mar. O que tiraríamos não seria toda a água do oceano, mas seria uma amostra real e em perfeito acordo como o restante.

A dificuldade que nós cristãos contemporâneos enfrentamos não é a de entender mal a Bíblia, mas a de persuadir os nossos indóceis corações a aceitarem as suas claras instruções. O nosso problema é conseguir o consentimento das nossas mentes amantes do mundo para termos Jesus como Senhor de fato, bem como de palavra. Pois uma coisa é dizer, “Senhor, Senhor”, e outra completamente diferente é obedecer aos mandamentos do Senhor. Podemos cantar, “Coroai-O Senhor de todos”, e regozijar-nos com os agudos e sonoros tons do órgão e com a profunda melodia de vozes harmoniosas, mas ainda não teremos feito nada enquanto não abandonarmos o mundo e não fizermos os nosso rostos na direção da cidade de Deus na dura realidade prática. Quando a fé se torna obediência, aí é de fato fé verdadeira.

O espírito do mundo é forte, e gruda em nós tão entranhadamente como cheiro de fumaça em nossa roupa. Ele pode mudar de rosto para adaptar-se a qualquer circunstância e assim enganar muito cristão simples, cujos sentidos não são exercitados para discernir o bem e o mal. Ele pode brincar de religião com todas as aparências de sinceridade. Ele pode ter acessos de sensibilidade de consciência , e até pode confessar os seus maus caminhos pela imprensa pública. Ele louvará a religião e bajulará a igreja por seus fins. ele contribuirá para as causas de caridade e promoverá campanha para distribuir roupas aos pobres. Basta que Cristo guarde distância e que nunca afirme o Seu senhorio sobre ele. Positivamente isso não durará. E para com o verdadeiro Espírito de Cristo, só mostrará antagonismo. A imprensa do mundo (que é seu real porta-voz) raramente dará tratamento justo a um filho de Deus. Se os fatos a compelem a uma reportagem favorável, o tom tende a ser condescendente e irônico. Ressoa nela a nota de desdém.

Tanto os filhos deste mundo como os filhos de Deus foram batizados num espírito, mas o espírito do mundo e o Espírito que habita nos corações dos homens nascidos duas vezes, acham-se tão distanciados um do outro com o céu do inferno. Não somente são o completo oposto um do outro, mas também estão em extremo combate um contra o outro, mas também estão em agudo antagonismo um contra o outro. Para um filho da terra as coisas do Espírito são, ou ridículas, caso em que ele se diverte, ou sem sentido, caso em que ele se aborrece. “Ora, o homem natural não aceita as cousas do Espírito de Deus, porque lhe são loucura; e não pode entendê-las porque elas se discernem espiritualmente.”

Na Primeira Epístola de João duas palavras são empregadas uma e outra vez,, as palavras eles e vós, e elas designam dois mUndos totalmente diversos; vós refere-se aos escolhidos, que deixaram tudo para seguir a Cristo. O apóstolo não se põe genuflexo, de joelhos, ante o deus de Tolerência (cujo culto se tornou na América uma espécie de religião de segunda capa); João é grosseiramente intolerante. Ele sabe que a tolerância pode ser simplesmente outro nome para a indiferença. Exige-se vigorosa fé para aceitar o ensino do experimentado João. É muito mais fácil apagar as linhas de separação e, assim, não ofender ninguém. Generalidades piedosas e o emprego de nós para significar tanto cristãos como descrentes, é muito mais seguro. A paternidade de Deus pode ser ampliada para incluir toda gente, desde Jack, o Estripador, até Daniel, o Profeta. Assim, ninguém fica ofendido e todos se sentem banhados e prontos para o céu. Mas o homem que se reclinara sobre o peito de Jesus não foi enganado assim tão facilmente. Ele traçou uma linha para dividir em dois campos a raça humana, para separar dos salvos os perdidos, dos que se afundarão no desespero final os que subirão para a recompensa eterna. De um lado estão eles — aqueles que não conhecem a Deus; de outro, vós (ou, com uma mudança de pessoa, nós), e entre ambos está um abismo moral largo demais para qualquer homem atravessar.

Eis aqui o modo como João o declara: “Filhinhos, vós sois de Deus, e tendes vencido os falsos profetas, porque maior é aquele que está em vós do que aquele que está no mundo. Eles procedem do mundo; por essa razão falam da parte do mundo, e o mundo os ouve. Nós somos de Deus; aquele que conhece a Deus nos ouve; aquele que não é da parte de Deus não nos ouve. Nisto reconhecemos o espírito da verdade e o espírito do erro”. Uma linguagem como esta é clara demais para confundir qualquer pessoa que honestamente queira conhecer a verdade. Nosso problema não é de entendimento, repito, mas de fé e obediência. A questão não é teológica: Que é que isto ensina?

É moral: Estou disposto a aceitar isto e arcar com as coseqüências? Posso agüentar o olhar frio? Tenho coragem de enfrentar os acerbos ataques movidos pelos modernistas? Ouso provocar o ódio dos homens que se sentirão apontados por minha atitude? Tenho suficiente independência mental para desafiar as opiniões da religião popular e de acompanhar um apóstolo? Ou, em resumo, posso persuadir-me a tomar a cruz com o seu sangue e com o seu opróbrio?

O cristão é chamado para ficar separado do mundo, mas precisamos ter certeza de que sabemos o que queremos dizer (ou, mais importante, o que Deus quer dizer) com o mundo. É provável que o façamos significar alguma coisa externa apenas, perdendo, assim, o seu significado real. Teatro, cartas, bebidas, jogos — estas coisas não são o mundo; são simples manifestações externas do mundo. A nossa luta não é apenas contra os procedimentos do mundo, mas contra o espírito do mundo. Porquanto o homem, salvo ou perdido, essencialmente é espírito. O mundo, no sentido neotestamentário do termo, é simplesmente a natureza humana não regenerada onde quer que esta se encontre, quer no bar, quer na igreja. O que quer que brote da natureza decaída, ou seja edificado sobre ela ou dela receba apoio, é o mundo, seja moralmente vil ou moralmente respeitável. Os antigos fariseus, a despeito da sua zelosa dedicação à religião, eram da própria essência do mundo. Os princípios espirituais sobre os quais eles contruíram o seu sistema foram retirados, não do alto, mas de baixo. Eles empregaram contra Jesus as táticas dos homens. Subornavam os homens para dizerem mentiras em defesa da verdade. Para defender Deus, agiam como demônios. Para proteger a Bíblia, desafiavam os ensinamentos da bíblia. Eles sabotavam a religião para salvá-la. Davam rédeas soltas ao ódio cego em nome da religião do amor. Vemos aí o mundo com todo o seu cruel desafio a Deus. Tão feroz foi esse espírito, que não descansou enquanto não levou à morte o próprio Filho de Deus. O espírito dos fariseus era ativa e maliciosamente hostil ao Espírito de Jesus, pois cada qual era uma espécie de destilação de ambos os respectivos mundos dos quais provinham.

Os mestres atuais que situam o Sermão do Monte nalguma outra dispensação que não esta e, assim, liberam a igreja do seu ensino, mal percebem o mal que fazem. Pois o Sermão do Monte dá em resumo as características do Reino dos homens regenerados. Os bem-aventurados pobres que choram seus pecados e têm sede de justiça são verdadeiros filhos do Reino. Com mansidão mostram misericórdia para com os seus inimigos; com sincera simplicidade contemplam a Deus; rodeados de perseguidores, abençoam, e não amaldiçoam. Com modéstia escondem as suas boas obras e com paciência aguardam a visível recompensa de Deus. Livremente renunciam aos seus bens terrenos, em vez de usar a violência para protegê-los. Eles acumulam os seus tesouros no céu. Evitam os elogios e esperam o dia da prestação final de contas para saber quem é maior no Reino do céu.

Se esta é uma visão bem precisa das coisas, que podemos dizer quando cristãos disputam entre si lugar e posição? Que podemos responder quando os vemos famintamente procurando homenagens e louvor? Como podemos desculpar a paixão por publicidade, tão claramente evidente entre os líderes cristãos? Que dizer da ambição política nos círculos cristãos? E das febris mãos estendidas para mais e maiores “oferendas de amor”? Que dizer do desavergonhado egoísmo entre os cristãos? Como explicar o grosseiro culto do homem que habitualmente infla um ou outro líder popular dando-lhe somas endinheiradas, beijo dado por aqueles que se propõe como fiéis pregadores do Evangelho?

Há só uma resposta a essas perguntas, é simplesmente que nessas manifestações vemos o mundo, e nada senão o mundo. Nehuma apaixonada declaração de “amor” às “almas” pode transformar o mal em bem. Estes são os mesmos pecados que crucificaram Jesus.

Também é verdade que as mais grosseiras manifestações da natureza humana decaída fazem parte do reino deste mundo. Diversões organizadas com ênfase em prazeres frívolos, os grandes impérios edificados em hábitos viciosos e inaturais, o irrestrito abuso dos apetites normais, o mundo artificial denominado “alta sociedade” – todas estas coisas são do mundo. Todas fazem parte daquilo de que a carne consiste, daquilo que se edifica sobre a carne e que há de perecer com a carne. E dessas coisas o cristão deve fugir. Todas essas coisas ele tem que pôr para trás e nelas não deve tomar parte. Contra eleas deve pôr-se serena, mas firmemente, sem transigência e sem temor.

Portanto, que o mundo se apresente em seus aspectos mais feios, quer em suas formas mais sutis e refinadas, devemos reconhecê-lo pelo que ele é, e repudiá-lo categoricamente. Precisamos fazer isso, se é que desejamos andar com Deus em nossa geração como Enoque o fez na sua. Um rompimento puro e simples com o mundo é imperativo. “Infiéis, não compreendeis que a amizade do mundo é inimiga de Deus? Aquele, pois, que quiser ser amigo do mundo, constitui-se inimigo de Deus” (Tiago 4:4). “Não ameis o mundo nem as cousas que há no mundo. Se alguém amar o mundo, o amor do Pai não está nele; porque tudo que há no mundo, a concupiscência da carne, a concupiscência dos olhos e a soberba da vida, não procede do Pai, mas procede do mundo” (I João 2:15,16). Estas palavras de Deus não estão diante de nós para nossa consideração; estão aí para nossa obediência, e não temos direito de nos entitular-mos cristãos se não as seguimos.

Quanto a mim, temo qualquer tipo de movimento religioso entre s cristãos que não leve ao arrependimento, resultando numa aguda separação do crente e o mundo. Suspeito de todo e qualquer esforço de avivamento organizado, que seja forçado a reduzir os duros termos do Reino. Não importa quão atraente pareça o movimento, se não se baseia na retidão e não é cuidado com humildade, não é de Deus. Se explora a carne, é uma fraude religiosa e não deve receber apoio de nenhum cristão temente a Deus. Só é de Deus aquele que horna o Espírito e prospera às expensas do ego humano. “Como está escrito: Aquele que se gloria, glorie-se no Senhor”.

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Dave Hunt Deus

Deus é amor (Dave Hunt)

Hoje em dia, exatamente como a Bíblia profetizou, o homem se torna cada vez mais atrevido em relação a Deus. Um elemento básico comum para a rejeição a Cristo neste mundo e para o desprezo pela sã doutrina na igreja é a falta de reflexão, isto é, de pensar e raciocinar cuidadosamente, de um modo especial sobre Deus, Sua Palavra e Sua vontade. Em vez disso, a preocupação maior do mundo e, infelizmente, de muitos cristãos, é o divertimento. Ficamos ocupados demais em nos entretermos para que possamos refletir sobre Deus. Do mesmo modo como o ateu rejeita o teísmo, assim o divertimento rejeita a reflexão.

Vamos nadar contra a maré e refletir juntos. Deus convocou Israel: “Vinde então, e argüi-me, diz o SENHOR: ainda que os vossos pecados sejam como a escarlata, eles se tornarão brancos como a neve; ainda que sejam vermelhos como o carmesim, se tornarão como a branca lã. Se quiserdes, e obedecerdes, comereis o bem desta terra. Mas se recusardes, e fordes rebeldes, sereis devorados à espada; porque a boca do SENHOR o disse.” (Isaías 1:18-20).

Um grito que parte constantemente do coração de Deus é “Ouvi, ó céus, e dá ouvidos, tu, ó terra; porque o SENHOR tem falado: Criei filhos, e engrandeci-os; mas eles se rebelaram contra mim. O boi conhece o seu possuidor, e o jumento a manjedoura do seu dono; mas Israel não tem conhecimento, o meu povo não entende” (Isaías 1:2,3).

Os constantes apelos divinos a Israel para que se arrependesse indicam claramente que Deus não era responsável pelo seu pecado. Ele não havia preordenado a sua rebelião nem o seu castigo. Israel não estava obedecendo à vontade de Deus. O Deus de Israel arrazoa em vão com o Seu povo escolhido: “E eu vos enviei todos os meus servos, os profetas, madrugando e enviando a dizer: Ora, não façais esta coisa abominável que odeio” (Jeremias 44:4). Obviamente Deus não havia predestinado o mau comportamento do seu povo nem a sua condenação, pois nesse caso não teria chamado a idolatria de “essa coisa abominável que odeio”.

Nem são também o egoísmo, o ciúme e o ódio; a fornicação, o adultério e o divórcio; o homossexualismo, o lesbianismo e a rejeição ao casamento uma ordenança divina; nem os abortos e assassinatos, as guerras étnicas e religiosas e todo tipo de violência rompante que tem grassado hoje em dia no mundo inteiro, assim como não existia, pela vontade divina, a iniqüidade do tempo de Noé. Aquele mundo foi destruído pelo dilúvio. Hoje o mundo está maduro para um derramamento mais sério da ira divina contra o pecado.

O homem foi criado à imagem de Deus (Gênesis 1:26-27), não física, mas espiritualmente. “Deus é Espírito” (João 4:24) sem forma física. O homem foi criado para refletir o caráter moral e espiritual de Deus em tudo que pensasse, falasse e fizesse. O Jardim do Éden não foi somente um paraíso de beleza física e de abundância além de toda imaginação, mas também um paraíso como um pedaço do céu na terra.  Que gloriosa relação Adão e Eva gozavam! O Jardim era uma sinfonia da glória de Deus expressa na exuberante singularidade de um homem e uma mulher reunidos pelo próprio Deus no primeiro matrimônio. A felicidade extática e indescritível do amor sem egoísmo demonstrado em palavras e atos de contínua gentileza, reflexão, graça, misericórdia, bondade e compaixão, cada um buscando apenas a alegria do outro, na maravilha do íntimo companheirismo.

Quando foi completada a criação divina do universo, dos animais e do homem, Deus viu que “tudo era muito bom” (Gênesis 1:31). Então, o que aconteceu para que tudo desse errado? Como pôde o homem criado à imagem de Deus ter um ódio tão profundo contra o seu Criador e tal determinação para trilhar o seu próprio caminho, expondo sua rebelião diante de um Deus compassivo e Santo, a Quem ele devia sua própria existência?

A Bíblia chama esse enigma de “o mistério da iniqüidade”  (2 Tessalonicenses 2:7) e declara que a sua fonte secreta se encontra nas profundezas do coração humano: “Porque do interior do coração dos homens saem os maus pensamentos, os adultérios, as prostituições, os homicídios, os furtos, a avareza, as maldades, o engano, a dissolução, a inveja, a blasfêmia, a soberba, a loucura. Todos estes males procedem de dentro e contaminam o homem” (Marcos 7:21-23).

O coração não é apenas o centro das emoções. Ele se assemelha a um castelo forte, do qual cada pessoa guarda a única chave: “Sobre tudo o que se deve guardar, guarda o teu coração, porque dele procedem as fontes da vida” (Provérbios 4:23).

Jamais esquecerei a entrevista na TV  de um canadense que havia sido preso na Arábia Saudita, falsamente acusado de terrorismo. Sob contínua tortura ele “confessou a sua culpa”, antes de ser posto em liberdade. Aquela experiência aterradora havia lhe ensinado duas coisas: 1. A tortura pode ser tão crucial que a pessoa mais forte pode ser levada a “confessar” qualquer coisa, até mesmo que assassinou a própria mãe. 2. Nenhuma tortura, sem importar quão insuportável seja, pode levar a vítima a crer no que ela é forçada a confessar.

Existe um recanto profundamente oculto, onde a pessoa real guarda os seus recônditos pensamentos e suas verdadeiras intenções. Salomão admoestou o seu filho dizendo que aquilo que o homem diz é sempre um engano para esconder o que ele realmente é no seu íntimo (Provérbios 23:6-8). A Bíblia sempre chama essa fortaleza interior de “o coração” ou “a vontade”. Sem ela é impossível ter a individualidade,  amar e ser amado. Deus nos criou de tal maneira que nem mesmo Ele pode nos forçar a crer em alguma coisa. Ele arrazoa conosco no evangelho, a fim de persuadir-nos da verdade. Mas, infelizmente, a maioria das pessoas não dá ouvidos à razão e insiste em palmilhar a estrada larga da destruição, embora sabendo aonde esta o conduzirá.

O mundo está repleto de jovens obstinados e desobedientes, criados na rebelião, não apenas contra os pais, mas contra toda autoridade, especialmente a autoridade divina. A variedade de divertimentos oferecida, até mesmo na igreja, somente os tem afastado de pensar profundamente, isto é, de raciocinar. O resultado, segundo 2 Tessalonicenses 3:2, é o aumento de “…homens dissolutos e maus; porque a fé não é de todos.”

O oculto bastião interior pode ser o trono de um tirano egocêntrico governando os outros, ou o trono do desprendimento se derramando sobre os outros em forma de genuíno amor e compaixão.

“Porque aquele que quiser salvar a sua vida, perdê-la-á, e quem perder a sua vida por amor de mim, achá-la-á (Mateus 16:25). “Na verdade, na verdade vos digo que, se o grão de trigo, caindo na terra, não morrer, fica ele só; mas se morrer, dá muito fruto (João 12:24).

Deus não criou robôs. Ele deu ao homem a vontade de escolher livremente entre o amor e o ódio, para receber a Cristo como Salvador ou então rejeitá-Lo. Deus quer que o homem Nele confie  totalmente e que O ame profundamente, a ponto de Lhe entregar a chave da fortaleza interior do seu coração, sem esconder coisa alguma: “Dá-me, filho meu, o teu coração, e os teus olhos observem os meus caminhos” (Provérbios 23:26). Deus não quer iludir-nos nem persuadir-nos superficialmente através de emoções. Ele deseja ganhar os nossos corações com a Sua Verdade e o Seu Amor: “Por isso hoje saberás, e refletirás no teu coração, que só o SENHOR é Deus, em cima no céu e em baixo na terra; nenhum outro há… Amarás, pois, o SENHOR teu Deus de todo o teu coração, e de toda a tua alma, e de todas as tuas forças …   Não ouvirás as palavras daquele profeta ou sonhador de sonhos; porquanto o SENHOR vosso Deus vos prova, para saber se amais o SENHOR vosso Deus com todo o vosso coração, e com toda a vossa alma. ” (Deuteronômio 4:39; 6:5 e 13:3).

Quando Deus nos comanda a amá-Lo de todo o coração, Ele prova o Seu Amor e desejo de que toda criatura humana seja salva. Seria absurdo que Ele ordenasse a todos que O amassem se Ele não os amasse o suficiente para os salvar, predestinando-os, em vez disso, para o inferno. Leiamos: “E estavam os homens de Israel já exaustos naquele dia, porquanto Saul conjurou o povo, dizendo: Maldito o homem que comer pão até à tarde, antes que me vingue de meus inimigos. Por isso todo o povo se absteve de provar pão. E todo o povo chegou a um bosque; e havia mel na superfície do campo” (1 Samuel 14:24,25). “Ainda assim, agora mesmo diz o SENHOR: Convertei-vos a mim de todo o vosso coração; e isso com jejuns, e com choro, e com pranto. E rasgai o vosso coração, e não as vossas vestes, e convertei-vos ao SENHOR vosso Deus; porque ele é misericordioso, e compassivo, e tardio em irar-se, e grande em benignidade, e se arrepende do mal(Joel 2:12,13). “… É lícito, se crês de todo o coração. E, respondendo ele, disse: Creio que Jesus Cristo é o Filho de Deus”(Atos 8:37). “… Se com a tua boca confessares ao Senhor Jesus, e em teu coração creres que Deus o ressuscitou dentre os mortos, serás salvo” (Romanos 10:9).

O mais poderoso testemunho da criação se encontra no DNA. Instruções digitalmente organizadas para construir e operar trilhões de células, como um só corpo, estão inscritas no DNA em linguagem codificada, as quais somente certas moléculas de proteína podem decodificar. Tudo que é escrito tem um autor! E o Autor desse extraordinário conjunto de intricadas informações só poderia ser uma Inteligência Infinita, Aquela que criou e “sustenta todas as coisas pela palavra do seu poder” (Hebreus 1:3).

A rebelião de Satanás e do homem trouxe destruição a toda a ordem universal. O resultado em marcha tem sido os desastres naturais e um crescente aumento de moléstias e deformações entre homens e animais: “Na esperança de que também a mesma criatura será libertada da servidão da corrupção, para a liberdade da glória dos filhos de Deus. Porque sabemos que toda a criação geme e está juntamente com dores de parto até agora” (Romanos 8:21.22). Até mesmo algumas células já não obedecem às instruções codificadas no DNA, resultando no câncer.

Apesar da extraordinária e indisputável evidência que tem bombardeado o homem na atualidade, ele continua recusando-se a obedecer ao Criador, transformando-se, portanto, num câncer espiritual na terra “… cada um fazendo o que parece bem aos seus olhos” (Juízes 17:6).

Deus teria razão de sobra para destruir a humanidade. Ele quase fez isso com o dilúvio. Nós não existiríamos hoje se Noé não tivesse achado “graça aos olhos de Deus” (Gênesis 6:8). E porque Deus tem sido tão gracioso e misericordioso com os rebeldes? Somente por causa do Seu Amor revelado em Jesus Cristo! O sacrifício de Cristo pelo pecado dos homens é a grande  prova do Amor de Deus por toda a humanidade, pois “… Deus prova o seu amor para conosco, em que Cristo morreu por nós, sendo nós ainda pecadores” (Romanos 5:8).

O indescritível horror do pecado é revelado na zombaria, nos açoites e na crucificação do Salvador na cruz. E, assim, à medida em que o homem pecador e rebelde faz o pior, o Amor de Deus brilha mais intensamente: “E dizia Jesus: Pai, perdoa-lhes, porque não sabem o que fazem” (Lucas 23:34). Em resposta a esta oração o Pai castiga Cristo, totalmente, pelos pecados passados, presentes e futuros de toda a humanidade.

Em amorosa resposta ao homem rebelde, o qual deseja destroná-Lo, Deus enviou o Seu Filho ao mundo, através do nascimento virginal, a fim de pagar a penalidade devida pelo pecado à Sua própria justiça infinita. De fato, Ele não poderia ter agido de outro modo, pois Deus é Amor! (João 4:8,16).

Existe uma enorme diferença entre dizer que  Deus é amoroso e que Deus é Amor. A expressão “Deus é” está acoplada  às muitas gloriosas promessas e advertências: “Deus é eterno” (Dt 33:27); Ele é “A minha fortaleza e a minha força” (2 Samuel 22:33); “Misericordioso e compassivo” (2 Crônicas 30:9); “Socorro bem presente na angústia” (Salmos 46:1); “Minha defesa” (Salmos 59:17); “Verdadeiramente bom para Israel” (Salmos 73:1);”Fiel é Deus” (1 Coríntios 1:9; 10:13); “Deus é verdadeiro” (João 3:33); “Deus é um fogo consumidor” (Hebreus 12:29), etc.

Contudo, estas expressões falam de como Deus age e não de como Ele é. O Amor é a Sua exata essência. Ele simplesmente AMA! Embora o Amor totalmente livre de interesse seja raramente visto na terra, todo mundo sabe que esse tipo de Amor provém de Deus. Esse reconhecimento está guardado no mais recôndito da memória do coração do homem, como uma recordação do paraíso perdido.

Quando Adão e Eva se rebelaram contra Deus, logo descobriram que “estavam nus” (Gênesis 3:7). Não que estivessem sem roupas (Ver a TBC de fevereiro e outubro 2002), pois esse era um fato desde a criação. Feitos à imagem de Deus, eles deviam estar vestidos da verdadeira luz divina (1 João 1:5). Tem-se dito com razão que “somos como espelhos, cujo brilho depende completamente do sol (o Filho), que brilha através de nós”. O pecado desnudou o primeiro homem e a primeira mulher de tudo que Deus pretendia para eles como criaturas feitas à Sua gloriosa imagem. O reflexo de Sua glória deixou de brilhar através deles, deixando-os espiritual e moralmente despidos. Que tragédia! Hoje o homem continua nu diante do seu Criador, sem a glória da qual foram revestidos os primeiros pais, pois “Porque todos pecaram e destituídos estão da glória de Deus” (Romanos 3:23). O Amor, que é a perfeita essência de Deus, nos falta porque fomos de Deus separados por causa do pecado. Existe no coração do homem um profundo anseio que somente Deus pode preencher. Ele nos convoca a uma reconciliação com Ele: “E buscar-me-eis, e me achareis, quando me buscardes com todo o vosso coração”. (Jeremias 29:13). A maior parte dos membros de nossa trágica raça humana se volta para tudo, menos para Deus, na ânsia de satisfazer o vazio que somente Ele pode preencher: “Espantai-vos disto, ó céus, e horrorizai-vos! Ficai verdadeiramente desolados, diz o SENHOR. Porque o meu povo fez duas maldades: a mim me deixaram, o manancial de águas vivas, e cavaram cisternas, cisternas rotas, que não retêm águas” (Jeremias 2:12,13).

Assim, ninguém ficará satisfeito a não ser com o  próprio Deus. Como o salmista, eles vão clamar: “Assim como o cervo brama pelas correntes das águas, assim suspira a minha alma por ti, ó Deus! A minha alma tem sede de Deus, do Deus vivo; quando entrarei e me apresentarei ante a face de Deus?” (Salmos 42:1-2). Esse tipo de sede não pode ser saciado humanamente, nem com milagres que excitam a carne. É uma sede profunda de conhecer o próprio Deus, numa relação tão íntima que se transforma em tudo que Ele deseja que sejamos. Será essa a paixão do seu e do meu coração? Na oração de Cristo ao Pai, Ele expressa o desejo ardente de que o perfeito Amor de Deus habite e se manifeste através dos que O conhecem: “E eu lhes fiz conhecer o teu nome, e lho farei conhecer mais, para que o amor com que me tens amado esteja neles, e eu neles esteja” (João 17:26). Que oração do coração de Alguém que deseja “trazer muitos filhos à glória” (Hebreus 2:10), à Sua semelhança “Amados, agora somos filhos de Deus, e ainda não é manifestado o que havemos de ser. Mas sabemos que, quando ele se manifestar, seremos semelhantes a ele; porque assim como é o veremos” (1 João 3:2). Ouçamos a ansiosa expectação de Davi: “Quanto a mim, contemplarei a tua face na justiça; eu me satisfarei da tua semelhança quando acordar” (Salmos 17:15). Isso é mais do que uma restauração do amor que Adão e Eva experimentaram no Jardim. A relação íntima que eles tinham conhecido com o seu Criador poderia, como aconteceu, ser perdida.

Cristo falou a uma preocupada Marta: “E Maria escolheu a boa parte, a qual não lhe será tirada” (Lucas 10:42). Paulo orou pelos crentes de Éfeso “Tendo iluminados os olhos do vosso entendimento, para que saibais qual seja a esperança da sua vocação, e quais as riquezas da glória da sua herança nos santos”  (Efésios 1:18). Maravilha das maravilhas! Deus vai restaurar eternamente os pecadores desnudos através de Sua glória em Cristo Jesus: “E o Deus de toda a graça, que em Cristo Jesus vos chamou à sua eterna glória, depois de haverdes padecido um pouco, ele mesmo vos aperfeiçoará, confirmará, fortificará e fortalecerá” (1 Pedro 5:10).

O novo nascimento através da fé em Cristo dá início a uma nova  vida em nós. Cristo vive em nós, mas devemos compartilhar diligentemente com Ele: “De sorte que, meus amados, assim como sempre obedecestes, não só na minha presença, mas muito mais agora na minha ausência, assim também operai a vossa salvação com temor e tremor; porque Deus é o que opera em vós tanto o querer como o efetuar, segundo a sua boa vontade” (Filipenses 2:12,13). E “E para isto também trabalho, combatendo segundo a sua eficácia, que opera em mim poderosamente” (Colossenses 1:29).

Possa cada um de nós ter o mesmo firme propósito em nossos corações, enquanto aguardamos ansiosamente a Sua Vinda!

“The Berean Call Letter”, Abril 2004

Tradução de Mary Schultze

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Chamado para apóstolo (Dr. David Martyn Lloyd-Jones)

“Servo de Jesus Cristo, chamado para apóstolo, separado para o evangelho…” (Romanos 1:1)

Neste texto vemos três declarações:

1) SERVO DE CRISTO – Paulo enfatiza a pessoa de Cristo. Jesus é o centro da vida do apóstolo e por isso ele O serve. Antes ele o perseguia quando perseguia os cristãos (“Saulo, Saulo, por que me persegues?” Atos 9:4).

Mas Paulo não apenas fala de ser servo de Jesus, mas que Jesus é o Messias, O Cristo, O Ungido de Deus para realizar a obra salvífica do seu povo. Paulo sempre fala de Jesus como aquele que padeceu na cruz; era sua pregação: Cristo crucificado! Este era o propósito de Jesus ao vir ao mundo. Mas o apóstolo sempre dizia que este Jesus Salvador era o Messias prometido, o Cristo.

Por isso Paulo afirma que Jesus Cristo é o tema da sua pregação – Cristo e este crucificado. Este é um grande ensino para nós pois o que deve caracterizar um servo do Senhor é que ele proclame Cristo crucificado. Deve ser esta a nossa prova de fé. Ele é o centro da nossa vida? O centro da nossa mensagem ao mundo? Paulo era assim. Só nos primeiros 14 versículos da Epístola aos Efésios Paulo menciona a palavra Jesus 15 vezes. Acontece isso conosco? Ou preferimos contar nossas experiências achando que com isso pregamos o evangelho? Isto não é evangelho! Evangelho é Cristo. Quanto mais crescemos na graça, menos falamos de nós e mais falamos de Jesus Cristo.

Por isso Paulo se vangloriava em ser servo de Jesus . A palavra correta no original é “escravo” (servo). O que ele está afirmando é que é “escravo de Cristo”. Quando Paulo diz em I Co 6:19-20, que somos templo do Espírito Santo conclui dizendo que não somos mais de nós mesmos porque fomos “comprados por preço”. É como se ele estivesse dizendo: “Vocês não percebem que seus corpos são templo do Espírito Santo e não são de vocês mesmos? Que não têm o direito de fazer o que bem desejarem com seus corpos pois foram comprados pelo preço do sangue de Cristo? Não percebem que foram libertos da escravidão pelo precioso sangue de Cristo? Foram livres da escravidão de satanás para servirem ao Deus vivo e verdadeiro?”. Isto é o que significa ser redimido.

Nós nascemos escravos do diabo (Ef. 2:1-3) e fomos libertos por aquele que é o único que pode nos libertar por aquele que é o caminho que pode nos libertar – Cristo e seu precioso sangue. É o que Pedro diz em I Pedro 1:18-19. Somos agora livres de Satanás e pertencemos a Cristo. Ele nos comprou, agora somos cativos dEle. Ele é nosso Senhor. Concluímos que jamais somos livres. Livres, sim, de Satanás e do pecado, mas escravos de Cristo, a Ele servimos.

Possivelmente quando Paulo disse: “Vivo, não mais eu, mas Cristo vive em mim” (Cl 2:20), estava se referindo a esta escravidão à pessoa a quem se ama e se honra. Em II Co 2:14, Paulo usa a figura dos súditos de um grande general que depois de ter feito uma grande conquista, entra triunfante na cidade em um desfile militar com as pessoas capturadas na guerra por este general que estão em volta dele.

Paulo diz que ser escravo de Cristo o constrange a pregar e o que seria dele se não pregasse o evangelho. Tudo por devoção a Cristo, porque Ele o livrou do mercado de escravos, o conquistou para Si. Agora é um escravo voluntário. Um escravo que ama seu Senhor. Este é um grande exemplo para nós. Aliás esto aconteceu conosco. Aconteceu mesmo? Você sente-se assim? Você não mais se pertence, mas pertence ao seu Senhor?

2) “CHAMADO PARA SER APÓSTOLO”.

Temos de entender bem estas duas palavras. Isso por causa do contexto em que vivemos hoje. Há muita confusão na Igreja de hoje.

O que um apóstolo? Paulo, no sentido geral era um servo de Cristo, mas num sentido especial era um apóstolo.

Por que diz que foi “chamado” para ser apóstolo? Porque Paulo se preocupa logo no início desta Epístola em dizer que foi chamado para ser apóstolo? Bem, muitas pessoas naquela época estavam questionando Paulo como apóstolo, eram seus opositores e assim Paulo era difamado. Era considerado um falso apóstolo. Estava apenas representando. Diziam que ele nunca havia estado com Jesus. Mas Paulo diz claramente e com vigor que era tão apóstolo como os doze.

O que é um apóstolo? É um ofício muito especial e peculiar. Uma prova disto é que Jesus chamou os 12 discípulos (Mt 10) e “…deu-lhes poder sobre os espíritos imundos, para expulsarem, e para curarem toda enfermidade e todo mal”. No v.1, Mateus os chama de discípulos e no versículo 2 muda para apóstolos. Por que isso? Porque nem todo discípulo era apóstolo. Só alguns discípulos tornaram-se apóstolos.

Provamos isso ao ler Lucas 6:12-13. “…chamou a si os seus discípulos, e escolheu doze dentre eles, aos quias deu também o nome de apóstolos”. Somente doze dos discípulos foram nomeados e escolhidos.

A palavra “apóstolo” vista nos dicionários é alguém “enviado”. Às vezes este termo é usado com este significado no Novo Testamento, porém é mais que isto. O termo diz que é um enviado com uma missão a quem são dados poderes para cumpri-la. Na Bíblia, “apóstolo” é alguém escolhido e enviado a uma missão especial como representante autorizado de quem o envia.

Quais as marcas e sinais de um apóstolo?

1. Teria que ser testemunha do Senhor ressurreto.

Em Atos vemos os apóstolos reunidos no cenáculo conversando sobre quem substituiria a Judas Escariotes. No cap. 1:21-22 lemos: “É necessário pois, que, dos homens que nos acompanham todo o tempo que o Senhor Jesus andou entre nós , começando no batismo de João, até ao dia em que dentre vós foi levado às alturas, um destes se torne testemunha conosco da sua ressurreição”.

Paulo diz que viu Jesus ressurreto: “Não sou, porventura livre? Não sou apóstolo? Não vi a Jesus, Nosso Senhor?” (I Co 9:1). Era ele dizendo que vira Jesus ressurreto no caminho de Damasco e era testemunha disto.

2. O apóstolo tinha de ter um chamado especial para exercer este ofício. Ele foi chamado pelo próprio Senhor.

3. Era alguém a quem foi dada autoridade e comissão de operar milagres. Isso fica bem claro em II Co 12:12 – “Pois as credenciais do meu apostolado foram manifestados no meio de vós com toda a persistência, por sinais prodígios e poderes miraculosos”. Era como se ele dissesse: “Como vocês podem questionar meu ofício de apóstolo se as minhas credenciais foram apresentadas claramente entre vós”. Sinais, milagres e atos maravilhosos.

4. Os apóstolos tinham poder para dar e comunicar dons espirituais a outros; podiam transmitir o Espírito Santo pela imposição das mãos (Atos 8:17). Isso significava sinal de autoridade da sua comissão.

5. O apóstolo tinha autoridade para ensinar e definir a doutrina firmando as pessoas na verdade.

6. Tiveram autoridade para estabelecer a ordem nas igrejas. Nomeavam os presbíteros, decidiam questões disciplinares e questões doutrinárias ( ensino e doutrina. Falavam com autoridade do próprio Jesus: “…mas o Consolador, o Espírito Santo, a quem o Pai enviará em meu nome, esse vos ensinará todas as coisas e vos fará lembrar de tudo o que vos tenho dito”(Jo 14:26).

Tudo isso tem conseqüências importantes:

a) Falavam com autoridade vinda de Deus.

b) Eram representantes de Cristo e as pessoas os ouviam como quem falava da parte de Deus. Por isso Paulo diz aos crentes da igreja de Tessalônica: “…é que tendo vós recebido a palavra que de nós ouvistes, que é de Deus, acolhestes não como palavra de homens e, sim, como em verdade é a palavra de Deus…”(I Ts 2:13). Paulo está lembrando que eles não estavam ouvindo (lendo) palavras de homens. Deus dera autoridade para edificar não só aos crentes de Tessalônica, mas de Corinto: “…a respeito da nossa autoridade, a qual o Senhor nos conferiu para edificação…” (II Co 10:8). Ou ainda: “Portanto, escrevo estas cousas, estando ausente, para que, estando presente, não venha a usar de rigor segundo a autoridade que o Senhor me conferiu para edificação…” (II Co 13:10). Era uma autoridade excepcional que somente Deus podia dar; uma palavra inspirada, infalível.

Uma prova disso se vê quando Pedro diz: “…como igualmente o nosso amado irmão Paulo vos escreveu, segundo a sabedoria que lhe foi dada…nas quais há certas cousas difíceis de entender, que os ignorantes e instáveis deturpam, como também deturpam as demais Escrituras”… (outras Escrituras) – II Pedro 3:16. Aqui Pedro está igualando o que Paulo escreveu às demais Escrituras do VT. Pedro está dizendo que Paulo escreveu Bíblia.

As palavras escritas pelos apóstolos têm autoridade divina – Os apóstolos foram comissionados pelo Senhor Jesus Cristo e foram guiados e dirigidos pelo Espírito Santo. São palavras divinamente inspiradas. Lembremo-nos que foi Jesus que deu autoridade aos seus servos, os apóstolos, como Paulo. Se alguém disser que só crê no que Jesus disse, responda dizendo que esta afirmação é contraditória pois o próprio Jesus que deu autoridade ao Seu servo, aos apóstolos que reconheceram, como Pedro, que Paulo escrevera de forma tão inspirada como o VT.

Quando a igreja primitiva chegou a definir e determinar o Cânon do Novo Testamento, pois havia muitos escritos cristãos, o Espírito Santo levou a Igreja a decidir desta maneira: ela dizia que, se um documento que pretendesse ser um Evangelho ou Epístola, e não pudesse ser rastreado direta ou indiretamente, até as suas raízes num apóstolo, alguém com autoridade apostólica, ele não devia ser incluído. A prova era a apostolicidade, o caráter apostólico na determinação do Cânon do Novo Testamento. Por que? Porque um apóstolo é um homem dotado de autoridade única, autoridade de fazer doutrina, de fazer Bíblia. O Senhor guiou a Paulo pelo Seu Espírito Santo, o Senhor o chamou para ser apóstolo.

Por que Paulo se diz “chamado para apóstolo” e logo no início da Epístola? Sem dúvida Paulo queria deixar bem claro para os crentes de Roma que ele era verdadeiramente um apóstolo. Como seria bom que hoje, os que se dizem apóstolos mostrassem as credenciais que Paulo mostrou. Sem dúvida não teriam estas credenciais e por isso não são Apóstolos. Na carta que ele escreve à igreja da Galácia, Paulo é mais enfâtico ainda quando diz: “Paulo, apóstolo, não da parte de homens, nem por intermédio de homem algum, mas por Jesus Cristo e por Deus Pai, que o ressuscitou dentre os mortos…” (Gl. 1:1).

Paulo aqui está dizendo àqueles crentes que não pensem de forma errada que ele mesmo havia se declarado apóstolo como hoje se faz. Não! Os falsos mestres é que fazem isso. Ele diz claramente que é apóstolo, “não da parte de homens, nem por intermédio de homens, mas por Jesus Cristo e por Deus Pai”. Paulo foi “chamado”, escolhido pelo ato soberano de Jesus Cristo. Havia sido chamado da mesma forma que os doze e tinha a mesma autoridade. Paulo diz isso de si mesmo.

Há algo admirável aqui. O Senhor escolhe um homem para apóstolo, quando antes este mesmo homem tinha sido um dos seus maiores inimigos. Um homem com quem Jesus não estivera durante Seu período aqui no mundo, quando encarnado; alguém que não ouvira Seu ensino, não vira Seus milagres, que não O vira na cruz, que não estivera com os doze no cenáculo quando lhes apareceu após a ressurreição; era um blasfemador, um perseguidor do cristianismo. Como pode ser isto? Mas o Senhor se revela a Paulo e o chama, exatamente como chamou aos outros. Lemos em 1Co 15:7 – “Depois, foi visto por Tiago, mais tarde, por todos os apóstolos e, afinal, depois de todos, foi visto também por mim, como por um nascido fora de tempo”. Ele está dizendo como Jesus lhe aparecera e o comissionara para ser apóstolo, mesmo depois do Pentecoste, mesmo depois do Senhor fazer várias revelações a pessoas especialmente escolhidas. Paulo vai a Damasco “respirando ameaças e mortes” e o Senhor aparece e o comissiona dizendo: “Mas levanta-te e firma-te sobre teus pés, porque por isto te apareci, para te constituir ministro e testemunha, tanto das coisas em que me viste como daquelas pelas quais te aparecerei ainda, livrando-te do povo e dos gentios, para os quais eu te envio para lhes abrir os olhos e convertê-los das trevas para a luz e da potestade de Satanás para Deus, a fim de que recebam eles remissão de pecados e herança entre os que são santificados pela fé em mim” (Atos 26:16-18). Ele mesmo diz que não foi “desobediente à visão celestial” que teve. Um comissão de proclamar a verdade de forma autoritativa.

7. Não podemos esquecer desta outra marca do apostolado: A verdade lhe foi ensinada pessoalmente pelo Senhor. Em Gálatas 1:11-12 Paulo diz: “Faço-vos, porém, saber, irmãos, que o evangelho por mim anunciado não é segundo o homem; porque eu não o recebi, nem aprendi de homem algum, mas mediante revelação de Jesus Cristo”. Este evangelho não foi ensinado por outra pessoa,; se fosse ele não seria apóstolo. Ele ainda diz nesta epístola aos Gálatas que foi separado desde o ventre materno pela graça de Deus, quando revelou Jesus para que O pregasse entre os gentios e para isso não consultou a “carne e sangue”, nem subiu à Jerusalém para os que já eram apóstolos antes dele mas partiu para a Arábia e depois voltou para Damasco. Três anos depois vai à Jerusalém para avistar-se com Pedro (Gl.1:15-18). Ele vaia a Pedro, mas não para aprender com Pedro pois era igual aos demais apóstolos pois a verdade lhe fora dada pessoalmente por Cristo.

Por que isto é importante? Porque esta é uma credencial apostólica: “Porque eu recebi do Senhor o que também vos entreguei…” (Co.11:23). Recebe diretamente de Jesus. Ele se iguala aos demais apóstolos nisso: “Porque eu sou o menor dos apóstolos….mas pela graça de Deus sou o que sou…portanto, seja eu, ou sejam eles, assim pregamos e assim crestes” (I Co 15:9-11). Ele foi tão apóstolo como Pedro. Ao comissioná-lo o Senhor o chamou para ir aos gentios: “Dirijo-me a vós outros, que sois gentios! Visto, pois, que eu sou apóstolo dos gentios, glorifico o meu ministério” (Rm 11:13).

O que Paulo deseja, é que os crentes de Roma compreendam que ele é realmente apóstolo de fato e de direito. Por que esta ênfase? Porque muitos naquela época estavam se dizendo apóstolos. Em Apocalipse 2:2: “…puseste à prova os que a si mesmo se declaram apóstolos e não são, e os achastes mentirosos”. Isto ér muito prático pois estamos vivendo uma época em que muitos estão se dizendo apóstolos ou que são da sucessão apostólica. Isso não existe. A Igreja Católica não só afirma que o Papa é o vigário de Cristo, como também faz outra reivindicação: da sucessão apostólica. Mas não só a Igreja Católica, outros ramos ditos cristãos reivindicam esta sucessão apóstólica e isso é um grande argumento para terem bispos, terem um episcopado. É verdade que muitos que acreditam em bispos não aceitam a sucessão apostólica. Mas os Bispos da Alta Igreja Anglicana e Católicos costumam dizer que não existe igreja sem bispos, que isto é a essência da igreja.

Esta foi uma grande questão no século XVII e trouxe até divisão. Os bispos se diziam e ainda se dizem sucessores diretos dos apóstolos, mas “apóstolo’ é só aquele que viu e deu testemunho de Cristo ressurreto. A base para este pensamento não é bíblica e sim fruto da tradição. Isso é impossível. Além do mais Paulo diz que a Igreja Cristã é edificada “…sobre o fundamento dos apóstolos é profetas…” (Ef 2:20). Com certeza não continuamos a construir qualquer fundamento ou alicerce, pois é algo do começo da igreja. Esse alicerce que foi fincado sobre os apóstolos e profetas não continua sendo edificado. Desde que o Cânon se completou, não há mais necessidade de apóstolos. Não esqueçamos de que o ensino apostólico era autoritativo. Os apóstolos falavam como homens enviados por Deus de maneira tão inspirada como os profetas do Velho Testamento.

Por isso, ao termos as Escrituras do Novo testamento — O Cânon do NT — já temos todo ensino autorizado e não precisamos mais de apóstolos. Quando o Cânon não estava completo, os apóstolos e aqueles que estavam ligados a eles tinham uma função importantíssima: instruir a igreja que não tinha Bíblia completa. Uma vez completo o Cânon os apóstolos não mais existem.

Outra coisa interessante é que Paulo em I Co 1:1 diz: “Paulo, chamado pela vontade de Deus para ser apóstolo de Jesus Cristo, e o irmão Sóstenes”. Sóstenes aqui é apenas citado como irmão. Não estaria Paulo sendo muito egoísta? Por que ele não chamou “eu e Sóstenes?”. Paulo sabia que ele era apóstolo e que Sóstenes, apezar de excelente e santo homem, não era apóstolo. Por isso, a expressão; “e o irmão Sóstenes”. A mesma coisa acontece com Timóteo, quando Paulo o trata como irmão mas diz antes: “Paulo, apóstolo de Cristo Jesus, por vontade de Deus, e o irmão Timóteo” (Cl 1:1). Paulo não diz: “Timóteo é o homem que vem após mim, ele vai ser apóstolo por sucessão apostólica e assim pelos séculos afora”. Timóteo era apenas irmão e Paulo apóstolo, mas quando vemos em Fl.1:1 – “Paulo e Timóteo, servos de Cristo Jesus, a todos os santos …”. Quando Paulo se descreve como servo, ele e Timóteo são iguais, pois os dois são servos no mesmo nível. Mas quanto ser apóstolo, há uma diferença: Paulo o é e Timóteo não.

Toda pretensão de ser apóstolo hoje vai de encontro com o ensino do Novo Testamento acerca do sentido do termo. Quando pulamos frases como esta que mostra que Paulo foi chamado para ser apóstolo como um ofício especial que não se repete, percebemos o quanto é grave negligenciar a doutrina e caímos nos argumentos falsos dos falsos mestres.

“Separado para o evangelho”

Não significa apenas que foi colocado à parte para pregar o evangelho, mas Paulo está colocando seu chamado a um nível mais alto. Ele já havia dito que Deus o chamara para ser servo, para ser apóstolo e agora para ser “separado para o evangelho”.

O que significa ser “separado”? Significa “posta à parte”. Paulo tinha sido “posto à parte” para o evangelho. O que significa isto? Bem, Paulo está lembrando que antes ele era um perseguidor de Cristo, um fariseu de fariseu. Ora a palavra “fariseu” significa “separado” e os fariseus se colocavam à parte, não queriam nem ter contato físico com ninguém para não se contaminarem, não queriam nada com publicanos e pecadores. Era como se Paulo estivesse: “antes eu me separei a mim mesmo como fariseu, mas a grande verdade sobre mim é que fui separado pelo próprio Deus para esta grande obra que tenho o privilégio de realizar, parte da qual estou realizando agora quando escrevo esta Epístola”. Paulo está dizendo que ele teve uma falsa separação e uma verdadeira separação. Uma foi feita pelo homem e a outra foi feita por Deus.

Paulo havia sido chamado, “separado” desde o ventre materno (“Quando, porém, ao que me separou antes de eu nascer e me chamou (“separou” – corrigida) pela sua graça, aprouve revelar seu Filho em mim, para que eu o pregasse entre os gentios…” (Gl 1:15-16). É isso que ele quer dizer. Que Deus o separou “para o evangelho de Deus”. Paulo foi separado desde o ventre materno para esta obra. O mesmo aconteceu com Jeremias (“Antes que eu te formasse no ventre materno, eu te conheci, e, antes que saísses da madre, te consagrei, e te constituí profeta às nações” – Jm 1:5). O mesmo nós vemos acontecer com João Batista.

Percebemos que esta separação é um grau muito maior do que um simples chamado para ser “servo” como acontece com todos os cristãos. É verdade que ele foi chamado para ser apóstolo, mas ele diz que não parou aí, Deus o “separou para para o evangelho”. Deus pré ordenou Paulo para ser um pregador do evangelho. Aqui chegamos à grandiosa doutrina da soberania de Deus. Deus na Sua soberania o escolhe como Lhe apraz para executar um plano que Ele mesmo elaborara. Não foi nada acidental que Paulo tivesse tido uma educação grega e hebraica, que tivesse adquirido a condição de cidadão do Império Romano. Tudo foi elaborado e decretado por Deus. E Deus fez isso no tempo determinado por Ele.

Podemos concluir dizendo que a mesma coisa acontece com nossa salvação. É algo maravilhoso e ao mesmo tempo humilhante. Segundo Paulo, nossa salvação foi determinada antes da fundação do mundo (Ef.1). Antes da fundação do mundo nossos nomes estavam escrito no livro da vida do Cordeiro (Ap 13:8). Isso é algo assombroso! Assim como Deus separou Paulo para ser pregador do evangelho antes dele mesmo nascer, o mesmo é verdadeiro em relação a nós Especialmente aos pregadores ainda hoje. Será que os pregadores de hoje estão advertidos quanto a isto? Será que estão exercendo esta função para a qual foram “separados”?. Será que estão cumprindo os propósitos de Deus? Será que estão se dando conta de que Deus está com Seus olhos sobre nós? Será que estamos pregando o evangelho de Cristo? “Arrependei-vos e crede no evangelho”!

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Cristo Vida cristã Watchman Nee

A Autoridade da Vida (Watchman Nee)

De acordo com Romanos 12.4, no Corpo de Cristo há muitos membros – cada um com seu lugar e função particulares, pois Deus fez todos os membros diferentes um do outro. A pergunta que precisamos analisar é: como podem todos esses membros, com suas funções variadas, serem ajustados e ligados como um só Corpo.

A Autoridade da Cabeça

O primeiro princípio do viver no Corpo de Cristo é estar em sujeição à autoridade da Cabeça, visto que a própria existência do Corpo, com suas funções e atividades variadas, depende da autoridade.

Sempre que a autoridade perde seu terreno em nós, o corpo é imediatamente paralisado. Aquela parte do corpo que é desobediente é a parte que experimenta a paralisia. O corpo que não se sujeita ao comando da cabeça é apenas um corpo paralisado. Onde existe a vida, existe autoridade. É inconcebível rejeitar a autoridade e ainda receber vida.

Todos os que estão cheios de vida são obedientes à autoridade. Como, por exemplo, minha mão física pode ter vida e ao mesmo tempo resistir ao controle da cabeça?

Minha mão está viva porque pode ser comandada pela cabeça. O próprio viver da mão significa que minha cabeça é capaz de dirigi-la e utilizá-la. O mesmo é verdadeiro com respeito ao relacionamento entre qualquer membro do Corpo de Cristo e a Cabeça. O primeiro princípio para cada membro que vive no Corpo de Cristo, portanto, é obedecer ao Senhor, que é a Cabeça.

Se você e eu não formos tratados até chegar ao ponto de nos tornarmos obedientes, então o que sabemos sobre o Corpo é meramente doutrinário por natureza, e não um assunto de vida. Que bênção é ter Deus tratando nossa vida natural, fazendo com que estejamos em sujeição a Cristo, a Cabeça!

Devemos buscar a obediência diariamente. Não só precisamos buscar oportunidades que nos façam avançar espiritualmente a fim de que nos tornemos santos e justos, mas também precisamos buscar diante de Deus cada oportunidade de obedecer, para que também aprendamos a obediência.

A Autoridade dos Membros

O segundo princípio do viver no Corpo é que nenhum membro tem qualquer autoridade, pois a autoridade está somente na Cabeça. Seria um sério erro se um membro alegasse possuir autoridade em si mesmo. Um membro não possui autoridade direta; ele tem apenas a autoridade que lhe foi delegada pela Cabeça. E essa autoridade não é apenas posicional, mas é totalmente decorrente da vida. Essa autoridade não vem por meio da nomeação, mas pelo ser.

Se um membro não é um olho, o Corpo não pode estabelecê-lo como olho. Se não é mão, o Corpo não pode fazer dele mão pelo simples fato de nomeá-lo como tal. Um membro tem a autoridade de segurar ou de ver somente porque ele pode segurar ou ver. E visto que ele atua de acordo com essa norma, as pessoas recebem ajuda.

É um erro muito estúpido se, em uma igreja, a autoridade está relacionada à posição e não à vida, se uma pessoa é nomeada por causa de sua posição social e não por sua espiritualidade. A Palavra de Deus claramente nos mostra que a autoridade está na vida, não na posição ou no histórico de alguém. A autoridade é estabelecida em uma pessoa em decorrência de seu viver, não por meio da nomeação. Essa pessoa, em sua vida pessoal e corporativa, experimentou tratamentos em questões práticas e aprendeu o que outras pessoas ainda estão por aprender. No Corpo de Cristo, toda autoridade procede da vida.

Ainda que, em uma assembléia local, haja nomeações pela direção de Deus, ainda assim não devem ser feitas de acordo com a posição, mas de acordo com a vida. Quando a vida e a nomeação concordam, você deve se submeter; de outro modo, a vida cessará em você e você será deslocado do Corpo – significando com isso que você não se mantém ligado firmemente à Cabeça. Se existe algo errado entre você e outro irmão, você não pode dizer que tem um relacionamento normal com a Cabeça. Se fez mal a outro membro do Corpo, pode ser que você não esqueça de nenhum ensinamento e pode até continuar em sua obra de ministério como antes, porém você perdeu a Palavra da vida.

Portanto, na Igreja, precisamos aprender a submetermo-nos uns aos outros. Se os membros não se submetem mutuamente, a vida mencionada em Romanos 8 não poderá se manifestar. Pelo contrário, os irmãos sentirão como se o ar lhes faltasse – dificilmente eles conseguirão prosseguir. Porém, aqueles que discernem o Corpo de Cristo consideram a submissão a mais jubilosa prática.

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A. W. Tozer Cristo Evangelho

Aceitar a Jesus? (A. W.Tozer)

Nosso relacionamento com Cristo é uma questão de vida ou morte. O homem que conhece a Bíblia sabe que Jesus Cristo veio ao mundo para salvar os pecadores e que os homens são salvos apenas por Ele, sem qualquer influência por parte de quaisquer obras praticadas.

“O que devo fazer para ser salvo?”, devemos aprender a resposta correta. Falhar neste ponto não envolve apenas arriscar nossas almas, mas garantir a saída eterna da face de Deus.

Os cristãos “evangelicais” fornecem três respostas a esta pergunta ansiosa: “Creia no Senhor Jesus Cristo”, “Receba Cristo como seu Salvador pessoal” e “Aceite Cristo”. Duas delas são extraídas quase literalmente das Escrituras (At 16:31; João 1:12), enquanto a terceira é uma espécie de paráfrase, resumindo as outras duas. Não se trata então de três, mas de uma só.

Por sermos espiritualmente preguiçosos, tendemos a gravitar na direção mais fácil a fim de esclarecer nossas questões religiosas, tanto para nós mesmos como para outros; assim sendo, a fórmula “Aceite Cristo” tornou-se uma panacéia de aplicação universal, e acredito que tem sido fatal para muitos. Embora um penitente ocasional responsável possa encontrar nela toda a instrução que precisa para ter um contato vivo com Cristo, temo que muitos façam uso dela como um atalho para a Terra Prometida, apenas para descobrir que ela os levou em vez disso a “uma terra de escuridão, tão negra quanto as próprias trevas; e da sombra da morte, sem qualquer ordem, e onde a luz é como a treva”.

A dificuldade está em que a atitude “Aceite Cristo” está provavelmente errada. Ela mostra Cristo suplicando a nós, em lugar de nós a Ele. Ela faz com que Ele fique de pé, com o chapéu na mão, aguardando o nosso veredicto a respeito dEle, em vez de nos ajoelharmos com os corações contritos esperando que Ele nos julgue. Ela pode até permitir que aceitemos Cristo mediante um impulso mental ou emocional, sem qualquer dor, sem prejuízo de nosso ego e nenhuma inconveniência ao nosso estilo de vida normal.

Para esta maneira ineficaz de tratar de um assunto vital, podemos imaginar alguns paralelos; como se, por exemplo, Israel tivesse “aceito” no Egito o sangue da Páscoa, mas continuasse vivendo em cativeiro, ou o filho pródigo “aceitasse” o perdão do pai e continuasse entre os porcos no país distante. Não fica claro que se aceitar Cristo deve significar algo? É preciso que haja uma ação moral em harmonia com essa atitude!

Ao permitir que a expressão “Aceite Cristo” represente um esforço sincero para dizer em poucas palavras o que não poderia ser dito tão bem de outra forma, vejamos então o que queremos ou devemos indicar ao fazer uso dessa frase.

“Aceitar Cristo” é dar ensejo a uma ligeira ligação com a Pessoa de nosso Senhor Jesus, absolutamente única na experiência humana. Essa ligação é intelectual, volitiva e emocional. O crente acha-se intelectualmente convencido de que Jesus é tanto Senhor como Cristo; ele decidiu segui-lo a qualquer custo e seu coração logo está gozando da singular doçura de Sua companhia.

Esta ligação é total, no sentido de que aceita alegremente Cristo por tudo que Ele é.

Não existe qualquer divisão covarde de posições, reconhecendo-o como Salvador hoje, e aguardando até amanhã para decidir quanto à Sua soberania.

O verdadeiro crente confessa Cristo como o seu Tudo em todos sem reservas. Ele inclui tudo de si mesmo, sem que qualquer parte de seu ser fique insensível diante da transação revolucionária.

Além disso, sua ligação com Cristo é toda-exclusiva. O Senhor torna-se para ele a atração única e exclusiva para sempre, e não apenas um entre vários interesses rivais. Ele segue a órbita de Cristo como a Terra a do Sol, mantido em servidão pelo magnetismo do Seu afeto, extraindo dEle toda a sua vida, luz e calor. Nesta feliz condição são-lhe concedidos novos interesses, mas todos eles determinados pela sua relação com o Senhor.

O fato de aceitarmos Cristo desta maneira todo-inclusiva e todo-exclusiva é um imperativo divino. A fé salta para Deus neste ponto mediante a Pessoa e a obra de Cristo, mas jamais separa a obra da Pessoa. Ele crê no Senhor Jesus Cristo, o Cristo abrangente, sem modificação ou reserva, e recebe e goza assim tudo o que Ele fez na Sua obra de redenção, tudo o que está fazendo agora no céu a favor dos seus, e tudo o que opera neles e através deles.

Aceitar Cristo é conhecer o significado das palavras: “pois, segundo ele é, nós somos neste mundo” (1 João 4:17). Nós aceitamos os amigos dEle como nossos, Seus inimigos como inimigos nossos, Sua cruz como a nossa cruz, Sua vida como a nossa vida e Seu futuro como o nosso.

Se é isto que queremos dizer quando aconselhamos alguém a aceitar a Cristo, será melhor explicar isso a ele, pois é possível que se envolva em profundas dificuldades espirituais caso não explanarmos o assunto.

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Cristo Dave Hunt

A Palavra Viva de Deus (Dave Hunt)

The Berean Call Newsletter – Janeiro de 2001
Tradução de Mario Sergio de Almeida – Abril de 2004

Inspirado pelo Espírito Santo, Paulo declarou: “Porque as suas [de Deus] coisas invisíveis, desde a criação do mundo, tanto o seu eterno poder, como a sua divindade, se entendem, e claramente se vêem pelas coisas que estão criadas, para que eles fiquem inescusáveis;” (Rom. 1:20). Deus providenciou para observadores humildes do universo ampla evidência de sua existência disponível em todas as culturas na história. Portanto, não há desculpa para rejeitar o testemunho da criação. Tanto é que os Salmos declaram duas vezes, bruscamente: “Disse o néscio no seu coração: Não há Deus.” (Sal. 14:1; 53:1).

Os cristãos há muito tempo têm apontado para a criação como prova de um projeto e, portanto, de um projetista, ou seja, um Criador. Ateus têm insistido que a ciência resolveria todas as questões sobre o cosmos e, desse modo, querem acabar com a necessidade de um Deus para explicar qualquer coisa. Eles persistem nesta ilusão, a despeito de que, para cada descoberta que a ciência faz, as evidências da existência de Deus se tornam mais irresistíveis.

Para cada porta que a ciência abre, são reveladas outras dez portas fechadas. Enquanto o conhecimento do universo está se expandindo exponencialmente, o desconhecido se expande ainda mais, como imagens refletidas numa sala de espelhos. Descobertas científicas, forçosamente, apontam para uma sabedoria e poder, sem começo ou fim e infinitamente além da compreensão humana, de um Ser que, sozinho, poderia ter trazido todas as coisas à existência.

Em parte alguma a evidência de Deus é mais forte do que nas formas de vida, especialmente desde a descoberta do microscópio eletrônico e da invenção dos computadores. Investigando a vida em nível molecular, descobrimos que o seu intrincado e engenhoso projeto funcionam além da imaginação. Refletindo sobre este fato 3.000 anos adiantado, Davi disse: “Eu te louvarei, porque de um modo assombroso, e tão maravilhoso fui feito; maravilhosas são as tuas obras, e a minha alma o sabe muito bem.” (Sl. 139:14). Observando o espantoso projeto e funcionamento, mesmo dos micróbios ou insetos, sem falar do corpo humano, somos forçados a admitir que Davi estava correto: Não poderíamos ter evoluído, mas sim, criados.

Até mesmo o determinado proponente da evolução, Richard Dawkins, confessa que as coisas vivas “dão a impressão de terem sido criadas com um propósito” (The Blind Watchmaker [Longman, England, 1986], 20). Ele admite, inclusive, que o núcleo de toda célula (a menor unidade viva; existem de células trilhões no corpo humano) contém “uma base digital de dados codificada maior, em informação e conteúdo, do que todos os 30 volumes da Enciclopédia Britânica juntos” (ibid 29). Apenas a probabilidade matemática de se colocar milhões de letras alinhadas na ordem correta por acaso está fora de questão. Para existir vida, alguma coisa mais impressionante está envolvida do que o acaso organizando bilhões de moléculas químicas na ordem certa. Dawkins faz referência a uma base digital de dados codificada! Esta é uma terminologia recente, nunca imaginada por Darwin. As moléculas de DNA não devem apenas ser colocadas na ordem correta, mas elas têm que, como letras, expressar informação numa linguagem, que provê instruções para serem seguidas.

Cada pessoa, no momento da concepção, começa como uma única célula. Como esta célula sabe o que fazer, para construir um corpo formado por trilhões de células individuais, de espécies e funções diferentes? A maior parte das crianças em idade escolar sabe a resposta: Impressa naquela célula original estão instruções para a construção e operação do corpo humano, que serão executadas sem erro. O DNA replica esta heliografia dentro de cada célula produzida. Estas, por sua vez, espantosamente, saberão qual parte das instruções deverão seguir.

As crianças hoje sabem que o DNA tem uma incrível capacidade de armazenar informação. Se na cabeça de um alfinete fossem colocadas informações contidas no DNA, seria o mesmo que empilhar livros a uma altura 500 vezes maior do que a distância entre a terra e a lua! Isto requer milhares de computadores pessoais para armazenar e processar tamanha quantidade de dados.

A construção do computador mais rápido do mundo está sendo terminada [em 2001]. Ele é chamado “Gene Azul” e fará um quatrilhão (1 com 15 zeros depois) de cálculos por segundo! Ele está sendo produzido para mapear os três bilhões de letras químicas impressas no genoma humano, iguais a 100.000 páginas de sentenças, com instruções operacionais de um ser humano. Tudo organizado por acaso?

A primeira tarefa do Gene Azul será entender como o corpo faz apenas uma molécula de proteína. Para resolver este problema, o computador funcionará 24 horas por dia, 7 dias por semana, durante 1 ano! Enquanto o corpo, seguindo as instruções impressas no DNA, cria uma molécula de proteína numa fração de segundo. Tais instruções, que este computador levará 1 ano para entender, foram geradas aleatoriamente? E tudo isto por causa de apenas uma molécula de proteína! “A probabilidade de se alcançar a ordem requerida, numa única e básica molécula de proteína, meramente por acaso, é estimada em uma chance em 1 seguido de 43 zeros. Considerando que milhares de moléculas de proteína são necessárias para construir uma única célula, a probabilidade se torna impossível.” ( Jerry R. Bergman, in In Six Days, John F. Ashton, ed. [New Holland Publishers, 1999], 29).

São necessárias várias espécies diferentes de enzimas (feitas de proteínas) para decodificar/traduzir a informação genética codificada no DNA, e as enzimas são independentemente codificadas para fazer o trabalho. Então, não seria vantagem para a evolução (mesmo se ela pudesse) imprimir informação genética no DNA; ao mesmo tempo, ela teria que codificar as enzimas para traduzí-las. Assim, o DNA e as enzimas para decodificá-las não poderiam ter “evoluído” por um período de tempo, ficando estagnadas no processo. Tudo deve estar funcionando perfeitamente em ordem desde o início. Em nível molecular, a evolução é uma piada de mal gosto!

Anos atrás, o dilema era: “O que veio primeiro, o ovo ou a galinha?” Hoje, o dilema é: “O que veio primeiro, a proteína ou o DNA?” É necessário proteína para construir o DNA, porém, é necessário DNA para fazer a proteína. Obviamente, ambos foram criados ao mesmo tempo; nenhum deles poderia ter evoluído.

Todavia, a lição do DNA aponta além da impossibilidade estatística, de algum modo colocando abaixo o processo aleatório, por um longo tempo. As três bilhões de letras químicas expressam informação numa linguagem, que deve ser lida para ser usada! A linguagem, necessariamente, envolve idéias compostas a partir de regras gramaticais, que podem ser criadas e expressadas apenas por uma inteligência. Isto nos leva além das estatísticas e matéria, colocando-nos noutra realidade, envolvendo questões que não podem ser compreendidas por tecidos feitos de células.

Linguagem expressa pensamentos, e pensamentos não são físicos! Eles podem ser articulados em formas físicas, tais como sons ou palavras e sentenças numa página, ou ainda em letras químicas codificadas no DNA. Obviamente, de qualquer forma, os pensamentos sendo comunicados pela linguagem são independentes do material através do qual são expressos. Necessariamente, tem que haver uma inteligência, uma fonte não física, independente dos meios físicos de armazenamento ou comunicação. A Bíblia, é claro, diz que Deus, que codificou o DNA, é Espírito (Jo. 4:24).

O fato de que a vida é criada e funciona por linguagem, originada por uma inteligência, proveniente de uma fonte não física, acaba de uma vez por todas com a evolução. A química não poderia colocar pensamentos inteligentes numa linguagem que contém as instruções para construir e operar uma única célula, muito menos as trilhões de células do corpo humano! O fato de que o DNA é construído para replicar a si mesmo precisamente, e falha apenas por causa de erros destrutivos, elimina até mesmo a evolução teísta.

Somos levados pela ciência e lógica a admitir que a vida, em qualquer forma, tem a sua fonte somente num Deus que é independente do universo material. Que não pode haver mais de uma fonte, isso é provado pela uniformidade e universalidade da linguagem. Estes fatos inevitáveis refutam não apenas o ateísmo, mas também o panteísmo e o politeísmo, as maiores ilusões do paganismo.

O DNA, é claro, não entende a informação codificada nele próprio. Ele é um mecanismo construído e programado pelo Originador da linguagem, para seguir Suas instruções automaticamente. E o mais complexo mecanismo construído pelo DNA é o cérebro humano. Mais avançado do que qualquer computador já produzido pelo homem, ele contém mais de 100 bilhões de células nervosas conectadas por 444 quilômetros de fibras nervosas, inter-relacionadas por 100 trilhões de conexões.

Com toda esta complexidade, o cérebro não origina ou entende o que está fazendo, tal como o próprio DNA. O cérebro não origina os pensamentos. Se o fizesse, teríamos que fazer qualquer coisa que ele decidisse. Ao contrário, nós (a pessoa real por dentro) produzimos as idéias, tomamos decisões, e nossos cérebros recebem estes pensamentos não físicos, traduzindo-os em ações físicas, através de uma conexão entre o espírito e o corpo, que a ciência não pode sondar.

Wilder Penfield, um dos mais renomados neurocirurgiões do mundo, descreve o cérebro como um computador programado por algo independente de si mesmo, a mente. A ciência não pode escapar ao fato de que o homem, como seu Criador, tem que ser não material para originar os pensamentos, a serem processados pelo cérebro. Mas o homem não origina o pensamento por si mesmo. Ele próprio não cria ou tem a capacidade de pensar. A Bíblia diz que Deus, o qual é Espírito, criou o homem “à sua imagem” (Gen. 1:27), que é uma “alma vivente” (2:7), sou seja, um ser não físico tal como seu Criador, capaz de pensar e tomar decisões. Esta habilidade faz dele moralmente responsável diante de Deus. Escapar desta responsabilidade é única razão do ateísmo.

Não apenas a ciência tem falhado em se esconder de Deus, mas os últimos dados de computadores e exames da vida em nível molecular também confirmam o que a Bíblia sempre disse. Cristãos se perguntaram por séculos o que significava dividir, pela Palavra de Deus, até mesmo “juntas e medulas” (Heb. 4 12). Agora sabemos que a linguagem codificada por Deus no DNA, no ato da criação, faz exatamente isto. Porém, Deus se comunica com o homem em seu espírito numa linguagem elevada, que “é apta para discernir os pensamentos e intenções do coração” (Heb. 4:12). Esta verdade é imutável porque “Para sempre, ó SENHOR, a tua palavra permanece no céu” (Sal. 119:89).

Muito antes da ciência moderna, Davi escreveu: “Os céus declaram a glória de Deus e o firmamento anuncia a obra das suas mãos. Um dia faz declaração a outro dia, e uma noite mostra sabedoria a outra noite. Não há linguagem nem fala onde não se ouça a sua voz. A sua linha se estende por toda a terra, e as suas palavras até ao fim do mundo.” (Sal. 19:1-4).

Tudo fica ainda mais emocionante, e aumenta a glorificação a Deus, quando permitimos as Escrituras exporem a respeito do papel essencial que a linguagem exerce em toda criação. Gênesis 1 nos mostra que Deus disse: “Haja luz”, etc. O Novo Testamento nos mostra que “a Palavra era Deus. Todas as coisas foram feitas por ele…” (Jo. 1:1-2). A diante, lemos: “os mundos pela palavra de Deus foram criados” (Heb. 11:3). E os céus, “pela mesma palavra… se reservam como tesouro, e se guardam para o fogo, até o dia do juízo, e da perdição dos homens ímpios.” (2 Ped. 3:7). Jesus disse: “Quem me rejeitar a mim, e não receber as minhas palavras, já tem quem o julgue; a palavra que tenho pregado, essa o há de julgar no último dia.” (Jo. 12:38).

A capacidade humana de estudar e entender a linguagem do DNA é prova de que ele é um ser não físico, como o Originador do DNA e, portanto, capaz de um relacionamento espiritual com o Criador, que é muito diferente de qualquer parte do corpo humano. Sua habilidade de formar idéias conceituais e expressá-las num discurso, o capacita a receber comunicação do seu Criador numa linguagem que o homem (não animais) pode entender e obedecer. A consciência nos mostra quando desobedecemos. A Bíblia diz que acreditar e obedecer esta comunicação de Deus é absolutamente essencial para a vida espiritual. Moisés declarou, há 3.500 anos: “o homem não viverá só de pão, mas de tudo o que sai da boca do SENHOR viverá o homem.” (Deut. 8:3).

Desde a rebelião de Adão, seus descendentes estão, por natureza, todos “mortos em ofensas e pecados” (Ef. 2:1) e devem nascer de novo para a vida espiritual pela Palavra de Deus, através do Espírito de Deus, na Sua família: “O que é nascido da carne é carne, e o que é nascido do Espírito é espírito.” (Jo. 3:6); “Sendo de novo gerados, não de semente corruptível, mas da incorruptível, pela palavra de Deus, viva, e que permanece para sempre. Porque Toda a carne é como a erva, E toda a glória do homem como a flor da erva. Secou-se a erva, e caiu a sua flor; Mas a palavra do Senhor permanece para sempre.” (1 Ped. 1:23-25); “a palavra da fé, que pregamos” (Rom. 10:8). O salmista disse: “engrandeceste a tua palavra acima de todo o teu nome.” (Sal. 138:2).

Milagrosamente, os filhos do seu “pai, o diabo” (Jo. 8:44) podem se tornar os “filhos de Deus pela fé em Cristo Jesus” (Gal. 3: 26). Sim, “agora somos filhos de Deus…” (1 Jo. 3:2). Depois de recebermos vida espiritual dEle, pela fé na Sua Palavra, somos capazes de manter um relacionamento de adoração com o Pai, porque “Deus é Espírito, e importa que os que o adoram o adorem em espírito e em verdade.” (Jo. 4:24).

Qualquer um pode ver o sério erro de procurar por coisas físicas, como o batismo e a hóstia, para se obter vida espiritual. Sim, Jesus disse: “Na verdade, na verdade vos digo que, se não comerdes a carne do Filho do homem, e não beberdes o seu sangue, não tereis vida em vós mesmos.” (Jo. 6:53). Claramente, por “comer” e “beber”, Ele quis dizer “acreditar”: “quem crê em mim nunca terá sede…Porquanto a vontade daquele que me enviou é esta: Que todo aquele que vê o Filho, e crê nele, tenha a vida eterna;” (vv. 35-40). Como Ele explicou para aqueles que não puderam entender: “O espírito é o que vivifica, a carne para nada aproveita; as palavras que eu vos disse são espírito e vida.” (v. 63)

A existência do homem como um ser não físico não põe fim à morte do seu corpo material. Para o cristão, a morte significa a separação temporária de ambos, da alma e espírito, do corpo material: “Mas temos confiança e desejamos antes deixar este corpo, para habitar com o Senhor.” (2 Cor. 5:8). Tal separação acaba quando o “Senhor descerá do céu com alarido, e com voz de arcanjo, e com a trombeta de Deus; e os que morreram em Cristo ressuscitarão primeiro… Depois nós, os que ficarmos vivos, seremos arrebatados juntamente com eles nas nuvens, a encontrar o Senhor nos ares, e assim estaremos sempre com o Senhor.” (1 Tess. 4:13-18) e “carne e o sangue não podem herdar o reino de Deus, nem a corrupção herdar a incorrupção … todos seremos transformados; Num momento, num abrir e fechar de olhos, ante a última trombeta; porque a trombeta soará, e os mortos ressuscitarão incorruptíveis, e nós seremos transformados. Porque convém que isto que é corruptível se revista da incorruptibilidade, e que isto que é mortal se revista da imortalidade.” (1 Cor. 15:50-53). Ou seja, as almas e espíritos dos salvos, daqueles que estiveram em Sua presença enquanto seus corpos estavam dormindo no túmulo, serão reunidos novamente ao seu novo corpo glorificado, igual ao de Jesus Cristo (Filip. 3:21). Isto é fantástico? Não mais do que a criação!

Sua esposa, retirada da terra e levada à casa de Seu Pai, como Ele prometeu (Jo. 14:1-3), depois do “tribunal de Cristo” (2 Cor. 5:10), será “vestida de linho fino, limpo e branco” e casar-se-á com seu Senhor (Ap. 19:7-8). Aquele que retorna triunfantemente ao Monte das Oliveiras (de onde Ele ascendeu – Atos 1:9-12) liderando seus exércitos celestiais como “Rei dos reis, e Senhor dos senhores,” … vestido “de uma veste salpicada de sangue; e o nome pelo qual se chama é a Palavra de Deus .” (Ap. 19:11-16)

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Cristo Escatologia Watchman Nee

Desde Betânia

Este hino foi composto por Watchman Nee depois da invasão comunista na China, a qual resultaria em sua prisão em 1952. Ela expressa o mais sublime, profundo, doce, saudoso, real, desesperado anelo pela volta do Senhor. A melodia usada é Danny Boy. Impossível não ler sem sentir o coração apertar, tanto de saudade do Senhor quanto de vergonha por não termos o mesmo sentimento…

Desde Betânia

Desde Betânia, quando nos deixaste,
Saudade imensa inundou meu ser.
Não tenho mais tocado a minha harpa –
Como tocar, se a Ti não posso ver?
Na solidão da noite tão profunda,
Fico em silêncio e calmo a meditar
Nessa distância, pois de mim tão longe estás
E há quanto tempo prometeste regressar!

Sem lar, recordo Tua manjedoura,
Olhando a cruz não posso me alegrar.
E Tu me lembras o meu lar futuro,
Mas é a Ti quem mais quero encontrar.
Sem Ti não tem sabor minha alegria;
Doçura, encanto, aos hinos vêm faltar,
Vazios são meus dias, pois aqui não estás.
Senhor, Te peço, não demores a voltar.

Embora aqui Tua presença eu goze,
De Ti saudade estou sempre a sentir.
Mesmo gozando o Teu amor imenso,
Anseio pelo dia em que hás de vir.
Mesmo na paz me sinto tão sozinho;
Por Ti suspiro em meio do prazer.
Jamais minha alma tem satisfação total,
Pois o Teu rosto amado não consigo ver.

Com sua terra sonha o peregrino,
Com sua pátria, o exilado, além.
Distante, o noivo pensa em sua amada.
De amados pais, saudade os filhos têm.
Assim também anelo ver Teu rosto,
Ó meu querido e amado Salvador.
Ah! se eu pudesse, agora, a Tua face ver!
Té quando esperarei por Ti, ó meu Senhor?

Tu lembras que buscar-me prometeste,
E junto a Ti em breve me levar?
Mas tantos dias e anos já passaram,
Cansado estou e peço-Te lembrar.
Tuas pegadas vejo tão distantes,
E quanto tempo ainda vai passar?
Ansioso clamo a Ti, e peço, ó Salvador:
Oh, não demores! Vem, Senhor, me arrebatar.

O dia nasce e morre, e assim as noites.
E quantos santos já não estão aqui
Tanto esperaram pela Tua volta,
E há muito tempo estão dormindo em Ti.
Ó meu Senhor, por que não Te manifestas?
Espesso véu está a Te ocultar –
Quantos remidos Teus estão a Te esperar!
Será que a nossa espera não vai mais findar?

Sei que também anseias por voltares
E arrebatar os redimidos Teus.
Por isso peço não mais demorares;
Depressa vem levar-nos para Deus.
Ó vem, Senhor, a Tua Igreja clama;
Não ouves Tua Noiva a Te chamar?
Olhando o céu, saudosa, diz a suspirar:
“Amado Noivo, não demores a voltar!”

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Cristo T. Austin-Sparks

Cristo – tudo e em todos (Theodore Austin-Sparks)

“Ele é a cabeça do corpo, da igreja. Ele é o princípio, o primogênito de entre os mortos, para em todas as coisas ter a primazia” (Cl 1.18).
“No qual não pode haver grego nem judeu, circuncisão nem incircuncisão, bárbaro, cita, escravo, livre; porém Cristo é tudo em todos” (Cl 3.11).

Muito tem sido feito nos últimos dias para trazer as grandes magnitudes do universo à compreensão do homem e da mulher comuns. Isso significa que muitas pessoas estão interessadas na explicação do universo e, sem dúvida alguma, do curso desta Terra e da criação e história do homem; mas cremos ter a resposta final e positiva para esta investigação. Para nós há somente uma definida e conclusiva explicação do universo, e esta explicação é uma Pessoa – o Senhor Jesus Cristo, com tudo que é eternamente relacionado a Ele. Não importa quanto leiamos e estudemos, nunca teremos a explicação do universo, no todo ou em parte, até que venhamos a enxergar o lugar do Senhor Jesus no eterno propósito de Deus. As simples, contudo abrangentes, palavras “Cristo é tudo em todos” resumem toda a matéria desde a eternidade, ao longo de todos os estágios de tempo, até a eternidade.

Primeiramente, então, vemos que “Cristo é tudo em todos” significa:

1. A explicação da própria criação

Esta carta aos colossenses faz esta mesma declaração em outras palavras. Ela nos diz que “pois, nele, foram criadas todas as coisas, nos céus e sobre a terra, as visíveis e as invisíveis, sejam tronos, sejam soberanias, quer principados, quer potestades. Tudo foi criado por meio dele e para ele. Ele é antes de todas as coisas. Nele, tudo subsiste” (1.16,17). Esta é uma declaração abrangente, e claramente mostra que Cristo como tudo em todos é a explicação de toda a criação. Por que foram todas as coisas criadas? Por que Deus por meio Dele trouxe o universo à existência? Por que este grande sistema universal existe e se mantém? Qual é a explicação do mundo? A resposta é: para que Cristo possa ser tudo e em todos.

A intenção no coração de Deus ao ter trazido este universo à existência era que, ao final, toda a criação apresentasse a glória e a supremacia de Seu Filho, Jesus Cristo. E este específico pequeno fragmento “e nele tudo subsiste” diz muito claramente que, se não fosse o Senhor Jesus Cristo, o universo inteiro se desintegraria, desmembrar-se-ia; ele estaria sem seu fator unificador; ele cessaria de ter uma razão para ser mantido como uma completa e concreta unidade. Seu subsistir, sua falha em se desintegrar e acabar é por causa disto: Deus tem determinado que o Senhor Jesus será o centro – o centro governante – deste universo inteiro, e Ele, o Filho de Deus, é a explicação da criação. Se não fosse por Ele, nunca teria havido uma criação. Tire-O fora, e a criação perde seu propósito e seu objeto, e não precisa mais ir adiante. “Cristo é tudo, e em todos” era o pensamento – o pensamento dominante – na mente de Deus durante a criação do universo.

Isto pode deixá-los indiferentes em certa medida e não levá-los muito longe, mas eu arrisco pensar que o que irei dizer irá levá-los um pouco mais adiante e lhes aquecerá o coração. Pois a perspectiva é esta: que quando Deus tiver as coisas como na eternidade passada determinou tê-las – e Ele irá tê-las assim –, cada átomo deste universo inteiro irá mostrar a glória de Jesus Cristo. Vocês não serão capazes de olhar para algo ou alguém sem ver Cristo glorificado. Uma abençoada perspectiva!

É algo feliz quando, como um grupo de filhos do Senhor, nós podemos estar juntos por horas a fio ou mesmo dias a fio; quando nós estamos ocupados com o Senhor como nosso único interesse comum e todos estão enlevados Nele. Quando temos um tempo como este e voltamos ao mundo, que atmosfera diferente encontramos! Como nos sentimos frios! É algo agradável encontrar o Senhor em Seus filhos e estar enclausurado com Ele desta forma; contudo mesmo isto é apenas em parte. Todavia o eterno dia está chegando, quando não haverá o voltar para o mundo em uma manhã de segunda-feira depois de um dia nos átrios do Senhor; quando estaremos tocando ninguém mais além do Senhor, e o universo inteiro estará cheio Dele – “Cristo, tudo em todos”! Este é o alvo de Deus. Isto é o que Ele tem determinado; tudo mostrando o Senhor Jesus; tudo para Ele.

Agora vemos uns nos outros muitas outras coisas que não o Senhor Jesus; o dia está chegando quando vocês nada verão exceto o Senhor Jesus em mim, e eu nada verei exceto o Senhor Jesus em vocês; nós seremos “conformados à imagem do Seu Filho”: Sua glória moral brilhará e será mostrada; Cristo será “tudo em todos”. Deus o determinou, e, o que Deus determinou, Ele terá. Esta, então, é a explicação da criação: que Cristo seja tudo, e em todos, e sobre tudo tenha a preeminência.

Em Romanos, o apóstolo Paulo tem uma declaração muito notável dentro deste contexto: “A ardente expectativa da criação aguarda a revelação dos filhos de Deus. Pois a criação está sujeita à vaidade, não voluntariamente, mas por causa daquele que a sujeitou, na esperança de que a própria criação será redimida do cativeiro da corrupção, para a liberdade da glória dos filhos de Deus. Porque sabemos que toda a criação, a um só tempo, geme e suporta angústias até agora” (8.19-22).

Notem o que isto realmente diz e implica. A criação está imbuída por uma expectativa ardente. Esta expectativa é com gemidos tais como em árduo trabalho, uma expectativa de esperança – não da dissolução do universo, sobre o quê certos cientistas tanto falam. Contudo, a esperança e os gemidos até o momento estão deliberadamente colocados sob um reinado de vaidade – feitos para ser tudo em vão – até um tempo e alvo fixados. Este clímax é em duas partes: uma, a revelação dos filhos de Deus; a outra – ligada com aquela – o livramento da criação de estar sujeita à corrupção.

Tudo isto é levado de volta à eternidade passada e unido com o Senhor Jesus como Filho: “Porquanto aos que de antemão conheceu, também os predestinou para serem conformes à imagem de seu Filho, a fim de que ele seja o primogênito entre muitos irmãos” (8.29).

Na passagem anterior há uma declaração definida e uma clara implicação. A declaração é que a criação estava sujeita à vaidade, e seu estado é o cativeiro da corrupção. Claramente, a implicação é que houve um tempo definido quando, por causa de sua corrupção, a criação inteira foi levada a uma condição na qual é forçada a gemer e se esforçar em direção a um alvo que não pode ser alcançado. É em conexão com isto que surge espaço para toda a gama e natureza da interferência satânica na criação, a qual objetiva a desafiar o propósito divino final na criação e a frustrá-lo ao trazer corrupção. Tão universal foi esta corrupção que uma sentença de vaidade foi pronunciada sobre “toda a criação”. O efeito disto foi, e é, que a criação nunca pode atingir o objetivo de sua existência, salvo no campo da santidade e semelhança divina.

Aqui também se encaixa toda a gama da “redenção que está em Cristo Jesus”; a obra universal que Ele consumou por meio de Sua cruz destruindo a obra do diabo e, potencialmente, o próprio diabo; com todo o poder destruidor do pecado e destruidor da corrupção advindos de Sua natureza e vida sem pecado, a eficácia de Seu incorruptível sangue, e a provisão de justificação e santificação para todos os que crêem, estes por regeneração se tornando uma nova criatura em Cristo Jesus (2Co 5.17).

Apenas por este meio a criação pode ser liberta. Quando estes filhos de Deus forem manifestos – seu número completo – e todos que têm recusado esta salvação forem rejeitados do domínio de Deus, então, a criação será libertada e sua intenção original será atingida, Cristo sendo tudo e em todos.

2. A explicação do homem

Depois, em seguida, como uma parte central da criação, temos o homem. Qual é a explicação do homem? Qual é a explicação de Adão como o primeiro homem? Há uma pequena passagem da Escritura que responde a isto: “Adão, o qual prefigurava aquele que havia de vir” (Rm 5.14), que é Cristo. Uma figura Daquele que havia de vir – esta é a explicação do homem. Deus planejou que cada homem ingresso neste mundo seja conformado à imagem de Seu Filho, Jesus Cristo. Multidões perderão isto, mas haverá multidões tais que nenhum homem poderá enumerar, de cada tribo, raça, nação e língua, que alcançarão isto. Que alto chamamento! Que concepção diferente do homem esta é daquela que é popularmente aceita, e que tremenda coisa a ser perdida! E ainda assim, há muitos que dizem reclamando que, se tivessem podido escolher, nunca teriam vindo a este mundo. Tem havido aqueles que, numa hora de eclipse, maldizem o dia em que viram a luz. Ah! Mas algo deu errado aí; isto não é como o Senhor planejou que fosse. E não importa quantos dias depressivos tenhamos: quando nos perguntarmos depois de tudo se realmente vale a pena, retornemos em nosso íntimo ao pensamento de Deus. É nosso tremendo privilégio, a mais alta honra que podia ser conferida a nós do ponto de vista divino: que tenhamos nascido.

Nem sempre nos sentimos ou falamos deste jeito, mas constantemente somos compelidos a nos voltar ao ponto de vista de Deus sobre isto e a nos lembrar que Seu propósito é o de ter um universo povoado com tais que sejam conformados à imagem de Seu Filho, Jesus Cristo, um povo que é uma manifestação universal do Cristo glorificado com a glória do Pai. Este é um privilégio, uma honra, algo para o qual vale a pena ter nascido! Esta é a explicação do homem.

Podemos apenas tocar levemente muitos destes assuntos, e caminhar adiante.

3. A explicação da redenção

Além disso, esta palavra “Cristo é tudo em todos” é a explicação da redenção. As coisas, é claro, deram errado: o propósito de Deus sofreu interferência. Ele não poderia nunca ser frustrado completamente, mas houve outro que determinou, tanto quanto estivesse em seu poder, que aquela apresentação universal de Jesus Cristo – o “ser-tudo-em-todos” do Senhor Jesus – nunca acontecesse. Houve alguém que desejou ter aquilo para si mesmo – que ele pudesse ser o senhor universal da terra e céu. Esta interferência tem feito uma grande diferença por certo tempo. Ela tem interferido com o homem e o transformado em outro, aquém do que Deus pretendia que ele fosse. Ela tem arruinado a imagem.

No entanto, há redenção pela cruz do Senhor Jesus. Qual é a explicação da cruz? Por um lado, qual é a explicação de toda aquela expiação, aquela obra redentiva do Senhor Jesus ao tratar com o pecado, em tomar o pecado universal sobre Si, e ser feito uma maldição por nós, em nosso lugar?

E ainda, por outro lado, como complemento disto, qual é a explicação daquela cruz sendo operada no crente de forma que o crente se torne unido com Ele na semelhança de Sua morte e sepultamento como uma experiência espiritual? – toda aquela aplicação do Calvário que é tão dolorosa, tão terrível de passar por ela: sim, a desintegração do “velho homem”, o cortar fora do “corpo da carne”, aquele conhecimento interior do poder da cruz, tão terrível à carne. Qual é a explicação? Amados, é que Cristo seja tudo e em todos.

Por que somos quebrados? Para dar lugar ao Senhor Jesus. Por que somos trazidos ao pó pelo Espírito Santo quando Ele opera a morte do Calvário sobre nós? De forma que o Senhor Jesus possa tomar o lugar que nós na carne temos ocupado. Algumas vezes entendemos errado esta aplicação da cruz. O inimigo está sempre em nosso ombro, insinuando e sugerindo a inclemência de Deus em nos esmagar, nos humilhar, nos reduzir a nada, e dizendo que não há fim nisto, tentando assim nos derrubar.

Amados, a cruz foi pretendida somente para fazer o Senhor Jesus tudo em todos, para nós. Devido ao modo como o Senhor tem tratado conosco, o modo pelo qual Ele tem aplicado a cruz, nos plantando naquela morte e sepultamento, não é verdade que nós O conhecemos de um modo que nunca O conhecêramos antes? Não é por este modo que Ele se tem tornado o que é para nós, cada vez mais e mais amado do nosso coração? O aumento do Senhor Jesus em nós e para nós é pelo caminho da cruz. Sabemos muito bem que nosso principal inimigo é nosso eu, nossa carne. Esta carne não nos dá descanso, nem paz nem satisfação; não temos alegria nela. Ela é obsessiva, nos absorve, constantemente se pavoneia atravessando nosso caminho para nos roubar a verdadeira alegria de viver. O que deve ser feito com ela? Bem, na cruz e pela cruz somos libertados de nós mesmos; não apenas de nossos pecados, mas de nós mesmos; e, sendo libertados de nós mesmos, somos libertados para Cristo, e Cristo se torna muito mais que nós.

É um processo doloroso, mas gera um fim abençoado; e aqueles dentre nós que tenham tido a maior agonia ao longo deste caminho testificariam, eu creio, que o que isto nos trouxe do conhecimento e das riquezas do Senhor Jesus faz todo o sofrimento valer a pena. Assim é a obra do Senhor por nós! E a obra do Senhor em nós, pela cruz, somente é pretendida no pensamento divino para abrir espaço para o Senhor Jesus.

O altar de bronze do tabernáculo, assim como o do templo, era um altar bem grande. Era possível pôr toda a mobília restante do tabernáculo inteiro dentro dele. Sim, o altar tem que ser bem grande; deve haver um grande espaço para Cristo crucificado. Ele irá preencher todas as coisas e Ele será a plenitude de tudo, e não haverá lugar para nós no final de tudo. Isto o deixa atônito? Certamente não. Assim a cruz, a obra de redenção por meio daquela cruz, tem como sua explicação simplesmente isto: que Cristo seja tudo e em todos; que em todas as coisas Ele tenha a preeminência.

Isto, pois, é a explicação de nossas experiências – o porquê do Senhor tratar conosco como Ele trata; o porquê dos crentes passarem pelas experiências que atravessam; o porquê eles passam por coisas que ninguém mais parece chamado a atravessar; o porquê de algumas vezes eles quase invejarem os incrédulos pela vida fácil que tantos deles têm. Isto explica os tratamentos do Senhor com Israel no deserto. Mesmo após sua libertação do cativeiro e tirania do Egito, houve quebrantamento de corações e agonia. Por que esta disciplina? No deserto, eles ainda pensavam no Egito. A obra que o Senhor estava fazendo neles era de forma que Ele pudesse ser tudo neles e para eles. Se Ele cortava seus recursos naturais, era apenas para mostrar quais eram seus recursos celestiais. Se Ele cortava seu poder natural, era para que eles pudessem vir a conhecer o poder dos céus. O que quer que seja que Ele pudesse tirar deles ou os conduzir a, era com vistas a tirá-los de si mesmos e com vista a que Ele mesmo pudesse ser tudo em todos.

Esta é a explicação de nossas dificuldades. O Senhor conhece como melhor tratar com cada um de nós, e Ele não usa métodos padronizados. Ele trata com você de um modo e comigo de outro. Ele sabe como nos conduzir a experiências que são bem calculadas para nos trazer à posição onde o Senhor é tudo e em todos.

4. A explicação do crescimento cristão

O que é crescimento espiritual? O que é maturidade espiritual? O que é caminhar no Senhor? Temo que tenhamos idéias embaralhadas sobre isto. Muitos pensam que maturidade espiritual é um conhecimento mais abrangente da doutrina cristã, uma compreensão mais larga da verdade das Escrituras, uma ampla expansão do conhecimento das coisas de Deus; e muitas destas características são registradas como marcas de crescimento, desenvolvimento, maturidade espiritual. Amados, não é nada disso. A marca distintiva do verdadeiro desenvolvimento e maturidade espiritual é esta: que nós tenhamos crescido bem pouco e que o Senhor Jesus tenha crescido muito mais. A alma madura é aquela que é pequena a seus próprios olhos, mas em cujos olhos o Senhor Jesus é grande. Isto é crescimento. Nós podemos saber muitas coisas, podemos ter uma maravilhosa compreensão da doutrina, do ensino, da verdade, até mesmo das Escrituras, e ainda ser espiritualmente muito pequenos, muito imaturos, muito infantis. (Há muita diferença entre ser infantil e ser semelhante a uma criança.) O crescimento espiritual real é somente isto: eu diminuo, Ele cresce. É o Senhor Jesus se tornando mais. Vocês podem testar o crescimento espiritual por meio disso.

Então, de novo, esta palavra é

5. A explicação de todo o serviço

O que é o serviço cristão de acordo com a mente de Deus? Não é necessariamente termos uma programação cheia de atividades cristãs. Também não é que estejamos sempre ocupados naquilo que denominamos “coisas do Senhor”. Não é a medida e a quantidade de nossa atividade e trabalho nem o grau de nossa energia e entusiasmo nas coisas do reino de Deus. Não são nossos esquemas, nossos projetos para o Senhor. Amados, o teste de todo serviço é seu motivo. Será que o motivo é, do começo ao fim, que em todas as coisas Ele tenha a preeminência, que Cristo seja tudo em todos?

Vocês conhecem as tentações e a fascinação do serviço cristão; a fascinação de estar engajado, de estar ocupado com muitas coisas; ter sua programação, esquemas, projetos; estar envolvido nestas coisas e sempre presente a elas. Há um perigo aí que tem apanhado multidões dentre os servos do Senhor. O perigo é que isto os leva à projeção, torna-se a obra deles; é a obra deles, interesses deles e, quanto mais governam e caminham nisto, mais satisfeitos ficam.

Não, há uma diferença entre passar o dia no serviço cristão como mero desfrutar da atividade, com a fascinação disto e todas as vantagens e facilidades que isto provê para nós mesmos, e a gratificação disto à nossa carne – há uma grande diferença entre isto e “Cristo, tudo em todos”. Algumas vezes este último é alcançado ao sermos postos fora de ação. Pois então, este é o teste: se estamos ou não completamente satisfeitos de ser colocados totalmente fora de ação para que tão somente o Senhor venha a ser mais glorificado deste modo. Se tão somente Ele puder vir ao que é Seu, não importa nada se somos vistos ou ouvidos. Estamos alcançando um lugar, na graça de Deus, onde ficamos bem contentes em ser largados num canto, sem ser vistos ou notados, se deste modo o Senhor Jesus puder vir para o que é Seu mais rápida e completamente.

De algum modo temos sido pegos nisto e pensamos que o Senhor somente pode vir ao que é Seu se nós formos o instrumento. A rivalidade na plataforma e no púlpito; a sensibilidade porque um é posto antes do outro, porque o sermão de um recebe mais atenção que o do outro; os comentários favoráveis feitos todos em uma só direção, etc! Conheço bem tudo isto. Afinal de contas, o que nós estamos buscando? Estamos buscando impressionar nossa audiência pela nossa habilidade ou fazer conhecido nosso Senhor? É uma grande diferença! Algumas vezes o Senhor ganha mais de nossos maus momentos do que pensamos, e pode ser que quando temos bons momentos Ele não tenha obtido o máximo. É por causa disto que há a necessidade de sermos postos de lado, mantidos fracos e humildes, para que Ele tenha a preeminência.

O desafio do serviço conforme o pensamento de Deus é somente este – por que o estamos fazendo? Queremos estar na obra porque gostamos de estar ocupados? Ou é absolutamente e somente para que, por qualquer meio, Ele possa vir ao que é Seu, para que o alvo de Deus possa ser concretizado? Se Ele puder ser tudo, e em todos, pela nossa morte assim como pela nossa vida, será que chegamos ao ponto onde realmente desejamos que “Cristo seja glorificado em meu corpo, quer pela vida ou pela morte” (Fp 1.20)? Esta é a explicação do serviço do ponto de vista de Deus.

É claro, isto é a explicação de muitas outras coisas. É também…

6. A explicação de todo o Antigo Testamento

Nós não nos demoraremos examinando em detalhes como é isto, mas apenas o indicaremos e passaremos adiante. O que é o Antigo Testamento? Ele está todo resumido em grandes representações de Jesus Cristo. Veja as duas principais, o tabernáculo e o templo. Estas são representações abrangentes do Senhor Jesus tanto em Sua pessoa como em Sua obra e elas ocupam, desta forma, o lugar central na vida do povo escolhido, cuja vida é unida a elas. As duas são uma. Enquanto o povo eleito se mantém num relacionamento correto com aquele objeto central (o tabernáculo ou o templo), enquanto lhe dá seu lugar de honra e reverência e o mantém em seu lugar da mais alta santidade, enquanto eles são verdadeiros ao seu espírito, suas leis e seu testemunho, e embora sejam entre todos os povos da terra os menos capazes naturalmente de cuidar de seus próprios interesses, ainda assim são o povo supremo da terra: não há uma nação ou povo na terra capaz de permanecer diante deles. Eles nunca foram treinados na arte da guerra, não têm uma longa história de armas e estratégia militar, e são em si mesmos um povo indefeso, ainda assim eles tomam ascendência não apenas sobre nações individuais maiores e mais fortes que eles, mas sobre uma combinação de nações. E embora todos se unam contra eles, enquanto verdadeiros àquele objeto central, eles são supremos. Aquele objeto central é uma representação do Senhor Jesus em Sua pessoa e obra.

A interpretação espiritual disto é que quando o Senhor Jesus tem Seu lugar há supremacia; há absoluta supremacia quando Ele em todas as coisas tem a preeminência em, através e por meio de Seu povo. “Cristo é tudo em todos”. Quando isto é verdade em Seu povo não existem forças capazes de lhes resistir. O segredo da absoluta supremacia e soberania é o Senhor Jesus ter Seu lugar nas vidas e nos corações, em todos os afazeres e relacionamentos do Seu próprio povo; então os portões do inferno não poderão prevalecer.

Além disto, é também…

7. A explicação do Novo Testamento

O Novo Testamento traz diminutos grupos, pequenos entre os povos da terra, desprezados, expulsos, dificilmente permitidos a falar sem serem amargamente molestados, e sobre os quais eventualmente vinha a ira e o ódio organizado das nações deste mundo, culminando em que todos os recursos do grande império de ferro foram explorados e postos em operação para destruir a memória deste humilde e desprezado povo.

A história é exatamente esta: que os impérios quebraram, e os poderes mundiais cessaram de existir. Nós rodamos o mundo agora para olhar as relíquias e ruínas destes grandes impérios; mas onde está aquele povo do caminho do desprezado Nazareno? Uma grande multidão que nenhum homem pode numerar! O céu está cheio deles, e aqui na terra há dezenas de milhares que conhecem e amam o Senhor Jesus, que são deste Caminho. A explicação é que Deus determinou que Seu Filho seja tudo, e em todas as coisas tenha a preeminência.

Tenha um relacionamento vivo com o Filho de Deus, e homens e inferno podem fazer o que quiserem – Deus irá atingir Seu alvo e tal povo será triunfante.

Uma palavra mais. Isto também é…

8. A explicação da Igreja

O que é a igreja? O pensamento de Deus não é o Cristianismo; não é o de ter igrejas como centros organizados do Cristianismo; não é a propagação do ensino e empreendimento cristãos. O pensamento de Deus é o de ter um povo na terra no qual, e no meio do qual, Cristo é tudo em todos. Esta é a igreja. Temos que revisar nossas idéias. No pensamento de Deus a igreja começa e termina com isto – a absoluta supremacia do Senhor Jesus Cristo. E o que Deus está sempre buscando é juntar aqueles de Seu povo que mais completamente concretizarão este pensamento Dele, e serão para Ele a satisfação de Seu próprio desejo eterno: o Senhor Jesus em todas as coisas tendo a preeminência e sendo tudo em todos. Ele ignora a grande instituição, a assim chamada “Igreja”, e está com aqueles que em si mesmos são de um humilde e contrito espírito e que tremem diante de Sua palavra, e nos quais o Senhor Jesus é o único objeto de reverência e adoração. Estes satisfazem o coração de Deus. Estes, para Ele, são a resposta à Sua eterna busca.

Vocês percebem que a Palavra de Deus diz isto. Vejam novamente Cl 3:11: “No qual não pode haver grego nem judeu, circuncisão nem incircuncisão, bárbaro, cita, escravo, livre; porém Cristo é tudo em todos”. Eles têm se revestido “do novo homem, que se refaz para o pleno conhecimento, segundo a imagem daquele que o criou”. Observem atentamente estas palavras e vocês entenderão que este é o homem corporativo, a Igreja, o Corpo de Cristo, “a plenitude daquele que a tudo enche em todas as coisas” (Ef 1:23). E ali, naquele homem corporativo, não pode haver grego ou judeu. Note as palavras. Não diz que gregos e judeus se unem em uma abençoada comunhão. Não, não há nacionalidades na igreja; livramo-nos de todas as nacionalidades, e agora temos um novo homem espiritual, uma nova criação, onde não pode haver grego, judeu, escravo, livre. Todas as distinções terrenas se foram para sempre – é um novo homem. O braço direito não é um judeu e o braço esquerdo um grego!

Não, isto passou. Nesta Igreja há apenas um novo homem – não uma combinação onde anglicanos, metodistas, batistas, congregacionais e todo o resto se juntam e esquecem suas diferenças por um tempo; isto não é a Igreja. Na Igreja estas diferenças não são meramente cobertas por um tempo – elas não existem. Há um Corpo, um Espírito. A Igreja é isto: “Cristo é tudo em todos”. Tenha isto e tem-se a Igreja. Chamar qualquer outra coisa de Igreja e deixar isto de fora é uma contradição. Testem-na por meio disso.

Se é verdade que a vida cristã conforme o pensamento e a mente de Deus é somente isto, “Cristo, tudo em todos”, então somos eu e você verdadeiros cristãos? Pois temos visto que mediante a cruz nós desaparecemos para dar lugar para o Senhor Jesus. Agora, se professamos ter vindo pelo caminho do Calvário até o Senhor, a implicação é que desaparecemos por intermédio desta cruz, para que Cristo seja tudo em todos.

O que pensar? Queremos nós um pedacinho do mundo? Nós ainda voluntariamente nos apegamos a esta ou aquela coisa fora do Senhor, porque o Senhor Jesus não tem nos satisfeito plenamente e precisamos ter um contrapeso? Um cristão mundano é uma contradição de termos. Ter um pouquinho de algo fora de Cristo é negar o Calvário e permanecer diretamente em oposição ao eterno propósito de Deus referente a Cristo. Você assume esta responsabilidade? Deus determinou isto desde toda a eternidade no referente a Seu Filho. Podemos nós professar pertencer ao Senhor Jesus e ao mesmo tempo ainda não ser verdade que Ele é tudo em todos para nós? Se podemos, há algo errado, há uma negação, uma contradição. Estamos nos opondo ao pensamento e propósito de Deus. É verdade que Ele é tudo em todos? Ele será isto se tomarmos todo o caminho.

Oh! Estas sugestões sutis que estão sempre sendo sussurradas em nossos ouvidos, que se desistirmos disto ou daquilo iremos nos arruinar, e a vida será mais pobre, e seremos reduzidos até que nada tenha restado. É uma mentira! É isto que contrapõe o grande pensamento de Deus sobre nós. O pensamento de Deus sobre nós é que Alguém, nada menos que Seu Filho, Jesus Cristo, em Quem toda a plenitude da divindade habita em forma corpórea, seja a nossa plenitude. Toda a plenitude de Deus em Cristo para nós! Você nunca obterá isto ao rejeitá-Lo. A vida será muito menos do que precisa ser se você não for até o fim com o Senhor. E o que se obtém em matéria de nossa consagração ao Senhor, nosso inteiro e completo abandono a Ele em nossa vida, nosso deixar completamente tudo que não é do Senhor, isto se obtém no domínio do serviço. Esta carne ama se jactar na obra cristã, e nos diz que se passarmos a ser dependentes do Senhor nós passaremos a ter um tempo de ansiedade. Mas uma vida de dependência de Deus pode ser uma vida de contínuo romance. É ali que fazemos descobertas que são constantes maravilhas.

Você pode estar quase morto num minuto e no seguinte o Senhor lhe dá algo para fazer e você fica muito vivo, dependendo Dele para cada respiração sua. Assim você vem a conhecer o Senhor. Mas, depois daquela experiência, você se torna de novo inútil e morto por um tempo, contudo você se lembra de que o Senhor fez algo. Então Ele faz de novo; e a vida se torna um romance. Ninguém pensaria que você estava dependendo do Senhor para sua própria respiração. É algo muito abençoado saber que o Senhor está fazendo isto, quando você não pode fazê-lo de jeito nenhum – é humana e naturalmente impossível, mas o Senhor o está fazendo!

Prossigamos, amados, no assunto da Igreja. Apliquem o teste. Não estou falando com julgamento ou censura, nem tenciono discriminar num sentido errado, mas deixe-me ser fiel – para nós, nossa comunhão deve estar onde o Senhor Jesus é mais honrado. Nossa comunhão deve estar onde Deus tem o que é seu mais plenamente, onde Cristo é tudo em todos. Nós não podemos estar presos por tradições, por coisas que levantam um clamor e assumem uma denominação. Onde o Senhor é mais honrado, aí é onde nossos corações devem estar; onde tudo o mais é feito subserviente a apenas isto: “Cristo, tudo em todos”. Este é o pensamento de Deus sobre a Igreja, e este deve ser o lugar onde nosso coração gravita. O lugar onde Deus vai registrar Seu testemunho e trazer o impacto deste testemunho sobre outros será encontrado onde o Senhor Jesus é mais honrado. E vocês perceberão que onde houver pessoas famintas vocês terão oportunidade de ministério se vocês estiverem completamente em acordo com o propósito de Deus referente a Seu Filho.

9. Vivenciando tudo

Lembre-se que tudo relacionado ao cristão é experimental. Tudo em relação ao Senhor Jesus é essencialmente experimental. Não é apenas doutrina. Não é questão de credo. Não é que aceitemos certas declarações de doutrina ou credo, e que somente por isto sejamos trazidos a um relacionamento com o Senhor Jesus. Nós não nos tornamos cristãos por aceitar declarações doutrinárias ou credos ortodoxos, ou fatos sobre o Senhor Jesus. A Igreja não se constitui sobre estes parâmetros, embora a Igreja defenda certos princípios. A experiência tem que ser operada na vida, você deve ser tornar parte dela e ela parte de você. Não é suficiente crer que Cristo morreu na cruz. Isto deve se aplicar aqui em nossas vidas tornando-se uma experiência, uma poderosa e operante força e fator em nosso ser. A igreja não é constituída sobre uma base de declarações doutrinárias. Você não pode juntar pessoas e dizer: “isto parece perfeitamente confiável, constituiremos nossa igreja sobre esta base”. Você não pode fazer isto.

A Igreja é aquela na qual a verdade tem operado, na qual ela se tornou experimental. Credos não podem nos manter juntos quando o inferno se levanta para nos dividir. Não, o credo mais ultrafundamentalista não tem conseguido manter as pessoas juntas. A unidade do Espírito é algo trabalhado lá dentro. A menos que seja assim, nada pode resistir contra os espíritos de divisão e cismas que estão por aí. Tudo precisa ser experimental, não apenas doutrinário ou confessional.

Agora, é aqui onde você chega à realidade de Deus. Uma coisa é cantar hinos sobre Cristo ser tudo em todos, olhar para isto como algo objetivo e concordar com isto; mas é outra coisa ser trazido experimentalmente ao lugar onde a verdade realmente opera. Há muitos que dirão hoje: “Sim, isto está certo. Cristo é tudo em todos”, e amanhã de manhã, quando você os toca sobre algum assunto melindroso em que suas preferências estão envolvidas, você percebe que Cristo não é tudo em todos. Temos de chegar a isto pela experiência. Que o Senhor nos dê graça para isso.

O apelo final que faço é que nós todos busquemos novamente a entronização do Senhor Jesus como supremo Senhor em nosso coração, em cada parte de nossa vida, em todos os nossos relacionamentos; que se houver algo que temos segurado, que deixemos ir; se temos tido qualquer reserva, que a quebremos agora; se temos sido menos que completamente comprometidos com Ele, de agora em diante isto não seja mais assim, mas que Ele seja tudo em todos, a partir de agora. Este deve ser nosso entendimento, nosso compromisso com o Senhor. Fará você isto? Peça ao Senhor para quebrar cada amarra que está no caminho de Ele ser tudo em todos. Estamos preparados para isto?

Que o Senhor nos dê graça.

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Andrew Murray Cristo Encorajamento

Cristo, nosso exemplo de obediência (Andrew Murray)

“Assim, também, por meio da obediência de um único homem muitos serão feitos justos” (Rm 5.19). Estas palavras nos revelam o que recebemos graças à obra de Cristo. Da mesma forma como o fato de estarmos em Adão nos torna pecadores, por estarmos em Cristo somos feitos justos.

Essas palavras também nos revelam exatamente o que é em Cristo que nos torna justos. Assim como a desobediência de Adão nos deu a natureza de pecador, a obediência de Cristo nos faz justos. Nós devemos tudo à obediência de Cristo.

Entre todos os tesouros da nossa herança em Cristo, este é um dos mais ricos. Quantas pessoas nunca o estudaram, a tal ponto de amá-lo e se deleitar nele, e assim obter dele a bênção completa!

Ao estudarmos o papel da obediência de Cristo na sua obra para nos salvar, veremos nela a verdadeira raiz da nossa redenção e saberemos dar-lhe o devido lugar no nosso coração e na nossa vida.

“…por meio da desobediência de um só homem muitos foram feitos pecadores.” Como foi isso?

A única coisa que Deus pediu a Adão no paraíso foi obediência. A única coisa através da qual uma criatura pode glorificar a Deus ou gozar do seu favor e sua bênção é a obediência. A única causa do poder que o pecado conseguiu no mundo e da ruína que ele desencadeou – é a desobediência. Toda a maldição do pecado que recai sobre nós é devido à desobediência a nós imputada. Todo o poder do pecado que opera em nós nada mais é que isto: que ao recebermos a natureza de Adão, herdamos também a sua desobediência e, conseqüentemente, nascemos já como “filhos da desobediência”.

É evidente que a única obra para a qual seria necessário que Cristo viesse era, precisamente, remover essa desobediência – com sua maldição, seu domínio, sua natureza e suas obras más. A desobediência é a raiz de todo pecado e miséria. O primeiro objetivo da sua obra salvadora foi cortar de vez a raiz do mal e restaurar o homem para o seu destino original: uma vida em obediência ao seu Deus.

Como Cristo Fez Isso?

Em primeiro lugar, ele o fez vindo como o segundo Adão para desfazer o que o primeiro tinha feito. O pecado nos fez acreditar que era uma humilhação sempre ter que buscar e fazer a vontade de Deus. Cristo veio para nos mostrar a nobreza, a bênção, o caráter celestial da obediência.

Quando Deus nos deu o manto de criatura para usar, não sabíamos que sua beleza, sua pureza imaculada, era a obediência a Deus. Cristo veio e vestiu aquele manto para nos mostrar como usá-lo e como, através dele, podíamos entrar na presença e glória de Deus. Cristo veio para vencer e, assim, carregar para longe nossa desobediência, substituindo-a com sua própria obediência sobre nós e em nós. O poder da obediência de Cristo seria tão universal, tão poderoso e tão profundamente arraigado quanto a desobediência de Adão – sim, e muito mais ainda!

O objetivo da vida de obediência de Cristo era triplo: (1) Como um exemplo, para mostrar-nos o que é a verdadeira obediência; (2) Como nossa garantia, satisfazendo pela sua obediência toda a exigência da justiça divina por nós; (3) Como nossa Cabeça, para preparar uma natureza nova e obediente a ser comunicada para nós.

Obediência é Salvação

Cada pessoa que quiser compreender plenamente o que é obediência deve considerar bem o seguinte: é a obediência de Cristo que é o segredo da justiça e da salvação que encontro nele. A obediência é a verdadeira essência dessa justiça: obediência é salvação. Em primeiro lugar, preciso aceitar, confiar e regozijar-me na obediência de Cristo para cobrir, engolir e aniquilar terminantemente toda minha desobediência. Essa precisa ser a base inabalável, invariável, jamais esquecida, da minha aceitação por Deus. E, depois, a obediência dele torna-se o poder de vida da nova natureza em mim – assim como a desobediência de Adão era o poder que me governava até então.

A minha sujeição à obediência é a única maneira que posso manter a minha relação com Deus e com a justiça. A obediência de Cristo à justiça é o único começo de vida para mim; minha obediência à justiça é sua única continuação. Há somente uma lei para a cabeça e para os membros. Tão certamente como a desobediência e a morte foram a lei para Adão e sua semente, a obediência e a vida o são para Cristo e sua descendência.

O único vínculo, a única marca de semelhança, entre Adão e a sua semente é a desobediência. O único elo de ligação entre Cristo e sua semente, a única marca de semelhança, é a obediência.

Examine a Obediência de Cristo

Em Cristo, essa obediência era um princípio de vida. A obediência para ele não era um ato individual de obediência de vez em quando, nem mesmo uma série de atos, mas o espírito de toda sua vida. “Eu não vim para fazer a minha vontade.” “Eis que venho para fazer a tua vontade, ó Deus.” Ele veio ao mundo com um único propósito. Ele vivia somente para fazer a vontade de Deus. O poder supremo, a força mestre de toda sua vida, era a obediência.

Ele deseja produzir o mesmo em nós. Foi isso que prometeu quando disse: “Todo aquele que faz a vontade de meu Pai que está no céu, este é meu irmão e irmã e mãe.”

O vínculo dentro de uma família é a vida comum compartilhada por todos e uma semelhança familiar. O elo entre Cristo e nós é que ele e nós juntos fazemos a vontade de Deus.

Em Cristo, essa obediência era uma alegria. “Deleito-me em fazer a tua vontade, ó Deus.” “Minha comida é fazer a vontade daquele que me enviou.”

Nossa comida é refrigério e revigoramento. O homem saudável come seu pão com alegria. Mas comida é mais do que prazer – é uma necessidade vital. Da mesma forma, fazer a vontade de Deus era a comida da qual Cristo sentia fome e sem a qual ele não podia viver. Era a única coisa que satisfazia sua fome, que o refrescava, o fortalecia e o tornava feliz.

Em Cristo, essa obediência levava a uma espera pela vontade de Deus. Deus não revelou toda a sua vontade a Cristo de uma só vez e, sim, dia a dia, de acordo com as circunstâncias da ocasião. Na sua vida de obediência, havia crescimento e progresso; a lição mais difícil veio por último. Cada ato de obediência o preparava para a nova descoberta do próximo comando de Deus. Ele disse: “Tu abriste os meus ouvidos; alegro-me em fazer a tua vontade, ó Deus.”

É quando a obediência se torna a paixão da nossa vida que nossos ouvidos serão abertos pelo Espírito de Deus para aguardar os seus ensinamentos, e não nos contentaremos com nada menos que uma orientação divina para nos conduzir à vontade de Deus para nós.

Em Cristo, essa obediência foi até a morte. Quando ele disse: “Eu não vim para fazer a minha vontade, mas a vontade daquele que me enviou”, ele estava pronto para ir às últimas conseqüências para negar a sua própria vontade e fazer a vontade do Pai. Ele não estava brincando. “Em nada a minha vontade; a todo custo a vontade de Deus.”

Esta é a obediência para a qual ele nos convida e nos capacita. Essa entrega de coração à obediência em tudo é a única verdadeira obediência, a única força capaz de nos levar à vitória. Quem dera que os cristãos compreendessem que nada menos do que isso é o que traz alegria e força para a alma!

Em Cristo, essa obediência nascia da mais profunda humildade. “Tende em vós o mesmo sentimento que houve também em Cristo Jesus, que esvaziou-se a si mesmo… que tomou a forma de servo… que humilhou-se a si mesmo, tornando-se obediente até a morte.”

Ao homem que está disposto a se esvaziar por completo, a se tornar e a viver como servo, “um servo obediente”, a se humilhar profundamente diante de Deus e dos homens – é para este homem que a obediência de Jesus descortinará toda sua beleza celestial e seu poder constrangedor.

Pode ser que haja em nós uma vontade muito forte que secretamente confia em si mesmo e que falha nos seus esforços para obedecer. É quando caímos cada vez mais baixo diante de Deus em humildade, em mansidão, em paciência, em total resignação à sua vontade, dispostos a nos curvar em absoluta incapacidade e dependência dele, que nos será revelado que a única obrigação e bênção de uma criatura é obedecer a este glorioso Deus!

Em Cristo, essa obediência provinha da fé em total dependência da força de Deus. “Eu não faço nada por mim mesmo.” “O Pai que está em mim é quem faz as obras.”

A resposta à entrega sem reservas do Filho à vontade do Pai foi a concessão ininterrupta e irrestrita pelo Pai de todo o seu poder para operar nele.

Assim também será conosco. Se aprendermos que a proporção em que desistirmos da nossa própria vontade será sempre a mesma medida da concessão do seu poder a nós, veremos que uma rendição à obediência total nada mais é que uma fé completa de que Deus haverá de operar tudo em nós.

Vamos fixar a nossa atenção em Cristo, examinando-o como servo obediente e confiando nele como nunca antes. Seja este o Cristo que recebemos e amamos, e com quem procuramos nos parecer. Como a sua justiça é a nossa esperança, deixemos que a sua obediência seja nosso único desejo. Que nossa fé nele, com sinceridade e confiança no poder sobrenatural de Deus operando em nós, aceite Cristo, o obediente, verdadeiramente como nossa vida, aquele que habita em nós.

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Extraído de The School of Obedience (A Escola da Obediência), de Andrew Murray (1828-1917), ministro, missionário e autor na África do Sul.

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Espírito Santo

O Espírito Santo em relação ao nosso ministério (C. H. Spurgeon)

Preleção dada aos seus alunos, em sua Escola Bíblica para Pastores
(The Pastor’s College)

Escolhi um tópico sobre o qual seria difícil dizer algo que já não tenha sido dito antes muitas vezes. Mas, como o tema é da mais alta importância, é bom deter-nos nele com freqüência, e ainda que só
exponhamos velhas coisas e nada mais, talvez seja sábio fazer-vos lembrar-se delas. Nosso tema é: O Espírito Santo em Relação com o Nosso Ministério, ou – a obra do Espírito Santo concernente a nós
como ministros do evangelho de Jesus Cristo.

“CREIO NO ESPIRITO SANTO”. Tendo pronunciado esta frase como conteúdo do credo, espero que possamos repeti-la também como um solilóquio devoto impulsionado por nossa experiência pessoal aos nossos lábios. Para nós, a presença e a obra do Espírito Santo constituem a base da nossa confiança quanto à sabedoria e ao elemento de esperança da obra da nossa vida. Se não crêssemos no Espírito Santo, teríamos renunciado ao nosso ministério muito antes, pois, “quem é suficiente para estas coisas?” Nossa esperança de sucesso e nossa força para a continuidade do serviço jazem em nossa crença em que o Espírito do Senhor repousa sobre nós.

Por ora dou por certo que todos nós estamos cônscios da existência do Espírito Santo. Dissemos que cremos nEle. Na verdade avançamos além da fé, nesta questão, e penetramos na região da consciência. Houve tempo em que a maioria de nós cria na existência dos nossos amigos presentes, pois tínhamos ouvido falar deles com os nossos ouvidos, mas agora nos vemos uns aos outros, trocamos apertos de mão fraternais e experimentamos a influência do companheirismo agradável, e portanto agora não é tanto que cremos, como conhecemos. Igualmente experimentamos o Espírito de Deus operando em nossos corações, temos conhecido e percebido o poder que Ele exerce sobre os espíritos humanos, e O conhecemos por contato pessoal, freqüente e consciente.

Pela sensibilidade do nosso espírito tomamos consciência da presença do Espírito de Deus, do mesmo modo como tomamos consciência da existência da alma dos nossos semelhantes por sua ação sobre nossa alma, assim como estamos certos da existência da matéria pela sua ação sobre os nossos sentidos. Fomos elevados da obscura esfera daquilo que é apenas mente e matéria às fulgurâncias celestiais do mundo espiritual. Agora, como homens espirituais, discernimos as coisas espirituais, sentimos as forças superiores dos domínios do espírito, e sabemos que há um Espírito Santo, pois O sentimos operar em nosso espírito. Não fosse assim, certamente não teríamos direito de estar no ministério da igreja de Cristo. Deveríamos permanecer até como membros da igreja? Mas, irmãos, fomos vivificados espiritualmente.Temos definida consciência de uma vida nova, com tudo o que dela resulta; somos novas criaturas em Cristo Jesus e vivemos num mundo novo. Fomos iluminados e capacitados a contemplar coisas que os olhos não vêem. Fomos guiados para a verdade de tal natureza que a carne e o sangue jamais poderiam ter revelado. Temos sido consolados pelo Espírito. Muitíssimas vezes o santo Paráclito nos tem levantado dos abismos da tristeza às alturas da alegria. Em certa medida, também fomos santificados por Ele; e estamos cônscios de que a santificação vai sendo operada em nós por diferentes formas e meios. Portanto, dadas estas experiências pessoais todas, sabemos que o Espírito Santo existe, com a mesma certeza de que nós mesmos existimos.

Sinto-me tentado a demorar-me aqui, pois este ponto merece maior consideração. Os descrentes pedem fatos. A velha doutrina comercial de Gradgrind entrou na religião, e o cético brada: “O que quero são fatos!” Estes são os nossos fatos: não nos esqueçamos de usá-los. Um cético me desafia com esta observação: “Não posso fixar minha fé num livro ou numa história. Quero ver fatos reais.” Minha resposta é: “Você não os pode ver porque os seus olhos estão vendados. Mas os fatos estão aí, nem mais nem menos. Aqueles dentre nós que têm olhos vêem coisas maravilhosas, embora você não as veja”. Se ele ridiculariza a minha afirmação, não fico espantado nem um pouco. Já o esperava. Ficaria espantado, e muito, se não o fizesse. Mas exijo respeito por minha posição como testemunha de fatos, e dirijo ao meu oponente a pergunta: “Que direito tem você de recusar a minha prova? Se eu fosse cego, e você me dissesse que possui uma faculdade chamada visão, eu seria irracional se o ofendesse chamando-lhe otimista convencido. Tudo que você tem direito de dizer é que nada sabe sobre isto – mas não está autorizado a chamar-nos de mentirosos ou bobos. Você pode juntar-se aos ofensores do passado e declarar que o homem espiritual é louco, mas isso não desfaz as afirmações deste.” Irmãos, para mim, os fatos produzidos pelo Espírito de Deus demonstram a veracidade da religião cristã com a mesma clareza com que a destruição de Faraó no Mar Vermelho, ou o maná caído no deserto, ou a água saltando da rocha ferida, podiam provar a Israel a presença de Deus no meio das suas tribos.

Chegamos agora ao cerne do nosso assunto. Para nós, ministros, o Espírito Santo é absolutamente essencial. Sem Ele o nosso ofício não passa de um nome. Não nos arrogamos sacerdócio além e acima daquele que pertence a todos os filhos de Deus. Mas somos sucessores daqueles que, nos velhos tempos, foram movidos por Deus a proclamar a Sua Palavra, a dar testemunho contra as transgressões e a dirigir a Sua causa. A menos que o espírito dos profetas esteja repousando sobre nós, o manto que usamos não passa de um traje tosco e enganoso. Como objetos dignos de aversão, devíamos ser expulsos da sociedade dos sinceros por ousarmos falar em nome do Senhor – se é que o Espírito de Deus não repousa sobre nós. Cremos que somos arautos de Jesus Cristo, designados para continuar o Seu testemunho na terra. Mas, sobre Ele e sobre o Seu testemunho sempre repousou o Espírito de Deus, e se Este não repousa sobre nós, é evidente que não somos enviados ao mundo como Cristo foi. No dia de Pentecoste, o início da grande obra de converter o mundo foi com línguas flamejantes e com um forte e impetuoso vento, símbolos da presença do Espírito. Portanto, se pretendemos ter bom êxito sem o Espírito, não estamos seguindo a norma pentecostal. Se não temos o Espírito que Jesus prometeu, não podemos cumprir a comissão que Jesus deu.

Não seria preciso advertir algum irmão aqui sobre a ilusão de que podemos ter o Espírito de Deus no sentido de sermos inspirados. Contudo, os membros de certa seita litigiosa moderna precisam ser
advertidos sobre essa loucura. Defendem a idéia de que as suas reuniões são realizadas sob “a presidência do Espírito Santo” – noção sobre a qual só posso dizer que fui incapaz de descobrir na Escritura Sagrada tanto a expressão como a idéia. Encontro, sim, no Novo Testamento, um grupo de coríntios notavelmente dotados, que gostavam de falar e dados a lutas partidárias – verdadeiros representantes daqueles a quem me referi. Mas, como Paulo disse deles, “dou graças porque a nenhum de vós batizei”, também dou graças ao Senhor que poucos daquela escola alguma vez se acharam em nosso maio. Poderia parecer que as suas assembléias possuem um dom peculiar de inspiração, não chegando inteiramente à infalibilidade, mas aproximando-se bem dela. Se vocês se meteram nessas reuniões, pergunto enfaticamente se foram mais edificados pelas preleções produzidas sob a presidência celestial, do que pelas preleções de comuns pregadores da Palavra. Estes se consideram sob a influência do Espírito Santo somente como um espírito está sob a influência de outro espírito, ou como uma mente sob a influência de outra. Não somos passivos transmissores de infalibilidade. Somos sinceros instruidores de coisas que aprendemos, na medida em que as pudemos captar. Como as nossas mentes são ativas e têm existência pessoal enquanto o Espírito age sobre elas, transparecem as nossas fraquezas bem como a Sua sabedoria. E enquanto revelamos aquilo que Ele nos fez saber, somos grandemente humilhados pelo temor de que a nossa ignorância e os nossos erros se manifestem em certo grau ao mesmo tempo, porque não nos sujeitamos mais perfeitamente ao poder divino. Não desconfio que vocês se extraviem na direção a que aludi. Certamente não é provável que os resultados de experiências anteriores induzam sábios a essa loucura.

Eis nossa primeira pergunta: Onde havemos de buscar o auxílio do Espírito Santo? Quando tivermos falado sobre este ponto, consideraremos mui solenemente um segundo: Como podemos perder essa
assistência? Oremos no sentido de que, pela bênção de Deus, a consideração deste ponto nos ajude a retê-la. Onde havemos de buscar o auxílio do Espírito Santo? Devo responder:
por sete ou oito meios.

1. Primeiro, Ele é o Espírito de conhecimento

“Ele vos guiará a toda a verdade”. Nisto, precisamos do Seu ensino. Temos urgente necessidade de estudar, pois o mestre de outros precisa instruir-se. Subir ao púlpito normalmente despreparado é presunção imperdoável. Nada poderá rebaixar-nos mais efetivamente, e ao nosso ofício. Depois de um discurso que o bispo de Lichfield fez em visita oficial, discurso sobre a necessidade de zeloso estudo da Palavra, certo clérigo disse à sua reverendíssima que não podia crer em sua doutrina, “pois”, disse ele, “muitas vezes, quando estou no gabinete pastoral, pronto para pregar, não sei sobre o que vou falar, mas vou para o púlpito, prego, e não penso em nada disso.” O bispo respondeu: “E você está certo em não pensar nada disso, pois os oficiais da igreja me disseram que partilham da sua opinião.”

Se não somos instruídos, como podemos instruir outros? Se não nos dedicamos a pensar, como podemos levar outros a pensar? É em nosso labor de estudar, nesse bendito trabalho em que estamos a sós com o Livro diante de nós, que precisamos da ajuda do Espírito Santo. Com Ele está a chave do tesouro celeste, e pode enriquecer-nos além da nossa imaginação. Com Ele está o guia da doutrina mais labiríntica, e pode conduzir-nos no caminho da verdade. Pode romper os portais de bronze e picar em pedaços as barras de ferro, e dar-nos os tesouros das trevas e as riquezas ocultas dos lugares secretos. Se vocês estudarem os originais, consultarem comentários e meditarem profundamente, mas deixarem de clamar vigorosamente ao Espírito de Deus, o seu estudo não lhes trará proveito. Entretanto, ainda que lhes seja vedado o emprego daqueles recursos (o que confio não lhes
suceda), se esperarem do Espírito Santo em simples dependência do Seu ensino, aprenderão muito da intenção divina.

O Espírito de Deus nos é peculiarmente precioso, porque de modo muito especial Ele nos instrui sobre a pessoa e a obra de nosso Senhor Jesus Cristo; e este é o ponto principal da nossa pregação. Ele toma coisas de Cristo e no-las mostra. Se tomasse coisas de doutrina ou preceito, ficaríamos contentes por essa bondosa assistência. Mas, visto que se deleita especialmente nas coisas de Cristo, e focaliza a Sua sagrada luz na cruz, regozijamo-nos ao ver o centro do nosso testemunho iluminado tão divinamente, e nos asseguramos de que a luz se difundirá sobre todo o restante do nosso ministério. Busquemos ao Espírito de Deus com este brado: “Ó Espírito Santo, revela-nos o Filho de Deus, e assim mostra-nos o Pai.”

Como Espírito de conhecimento, não só nos instrui quanto ao evangelho, mas também nos leva a ver o Senhor em todas as outras coisas. Não devemos fechar os nossos olhos para Deus na natureza, ou na história geral, ou nas ocorrências providenciais diárias, ou em nossa experiência pessoal. E em todas estas coisas, o nosso Intérprete da mente de Deus é o bendito Espírito. Se clamamos: “Ensina-me o que queres que eu faça”; ou, “mostra-me o motivo pelo qual contendes comigo”; ou, “dite-me qual é a Tua intenção nesta rica providência de misericórdia”; ou, “revela-me o Teu propósito naquela outra dispensação mista de juízo e graça” – seremos bem instruídos em cada caso. Pois o Espírito é o candeeiro de sete braços do santuário, e pela Sua luz todas as coisas podem ser vistas corretamente. Como Goodwin observa bem: “É preciso haver luz acompanhando a verdade, se temos de conhecê-la. Prova-nos isto a experiência de todos os homens envoltos na graça de Deus. Qual a razão por que vocês vêem algumas coisas num capítulo numa ocasião, e não em outra; alguma porção cia graça em seus corações numa ocasião, e não em outra; têm um vislumbre das realidades espirituais numa ocasião, e não em outra? Os olhos são os mesmos, mas é o Espírito Santo que abre e fecha esta lanterna de furta-fogo, como eu poderia chamar-lhe. Conforme Ele a abre mais, ou a aperta, ou a fecha, estreitando-a, temos maior ou menor visão. E às vezes Ele a fecha totalmente, e então a alma fica na escuridão, embora seus olhos nunca tenham estado tão bons.”
Amados irmãos, não deixem de ir a Ele em busca desta luz, ou ficarão nas trevas e serão guias cegos de cegos.

2. Em segundo lugar, o Espírito é chamado Espírito de sabedoria, e
precisamos enormemente dEle nesta capacidade

Sim, pois o conhecimento pode ser perigoso, se não for acompanhado pela sabedoria, que é a arte de usar acertadamente o que conhecemos. Manejar bem a Palavra de Deus é tão importante como compreendê-la plenamente. Alguns que evidentemente compreenderam uma parte do evangelho, deram indevida proeminência a essa porção isolada e, portanto, exibiram um cristianismo deformado, para prejuízo daqueles que o receberam, visto que, em conseqüência disso, exibiram por sua vez um caráter deformado. O nariz é um traço proeminente do rosto do homem. É possível, porém, fazê-lo tão grande que os olhos, a boca e tudo mais sejam lançados à insignificância. Um desenho assim é caricatura, não retrato. Do mesmo modo, certas doutrinas importantes do evangelho podem ser proclamadas com tal excesso que se lança o restante da verdade à sombra, e a pregação já não é o evangelho em sua beleza natural, mas uma caricatura do evangelho. Contudo, deixem-me dizê-lo, algumas pessoas parecem fortemente apegadas a essa caricatura. O Espírito de Deus lhes ensinará o emprego da faca sacrificial para dividir as ofertas. E lhes mostrará como usar as balanças do santuário, para pesarem e misturarem as preciosas especiarias em quantidades certas. Todo pregador experimentado sente que esse é o momento supremo, e bom será que seja capaz de resistir à tentação de negligenciá-lo. Que lástima, alguns dos nossos ouvintes não desejam ouvir todo o conselho de Deus! Têm as suas doutrinas favoritas e gostariam de fazer-nos calar em tudo mais. Muitos são como a escocesa que, depois de ouvir um sermão, disse: “Estaria muito bem, se não fosse aquela droga de deveres no fim.” Há irmãos dessa espécie. Desfrutam da parte consoladora – as promessas e as doutrinas – mas só de leve se deve tocar na santidade prática. A fidelidade requer que entreguemos o evangelho sob todos os ângulos, sem omitir nada e sem exagerar em nada. Para isto requer-se muita sabedoria. Com seriedade indago se algum de nós tem o tanto desta sabedoria que necessitarmos. Provavelmente somos afligidos por algumas parcialidades inescusáveis e inclinações injustificáveis. Ponhamo-las para fora e acabemos com elas. Talvez tenhamos consciência de que passamos por alto certos textos, não porque não o compreendemos (o que poderia justificar-se), mas porque os compreendemos e raramente gostamos de dizer o que eles rios ensinaram, ou porque talvez haja alguma imperfeição em nós, ou algum preconceito entre os nossos ouvintes que aqueles textos revelariam de modo demasiado claro para que nos sentíssemos bem. Esse silêncio pecaminoso tem que ser eliminado imediatamente. Para sermos sábios mordomos e repartirmos as porções certas de alimento para os membros da casa do divino Senhor, precisamos do Teu ensino, ó Espírito de Deus!

Tampouco isso é tudo, pois mesmo que saibamos manejar bem a Palavra de Deus, carecemos de sabedoria para a seleção da porção particular da verdade que é mais aplicável à ocasião e às pessoas reunidas. Como também de igual discrição no tom e na maneira de apresentar a doutrina. Creio de muitos irmãos que pregam sobre a responsabilidade humana, lançam-se de modo tão legalista que causam desgosto a todos os que amam as doutrinas da graça. Por outro lado, receio que muitos pregam a soberania de Deus de modo tal que afastam inteiramente da ala calvinista todas as pessoas que crêem na livre ação do homem. Não devemos ocultar a verdade por um momento sequer, mas devemos ter sabedoria para pregá-la sem que haja choque ou ofensa, e, sim, um esclarecimento gradativo daqueles que não conseguem vê-ia de todo, e um processo pelo qual se conduzam os irmãos mais fracos ao pleno círculo da doutrina do evangelho.

Irmãos, precisamos de sabedoria também no modo de colocar as coisas para diferentes pessoas. Pode-se demolir um ser humano com a mesma verdade destinada a edificá-lo. Pode-se causar enjôo a alguém com o mel com que se pretendia adoçar-lhe a boca. Tem-se pregado a grande misericórdia de Deus sem cuidado, o que tem levado centenas à licenciosidade. Por outro lado, tem-se ocasionalmente apregoado a terribilidade do Senhor com violência tão fulminante que tem levado muitos ao desespero, e daí a um decidido desafio ao Altíssimo. A sabedoria é proveitosa para dirigir, e aquele que a tem expõe a verdade na ocasião certa e trajada com as suas vestes mais apropriadas. Quem pode dar-nos esta sabedoria, senão o bendito Espírito de Deus? Irmãos, vejam que, com a mais humilde reverência,
esperem a Sua direção.

3. Terceiro, precisamos do Espírito doutra maneira, a saber, como a
brasa viva tirada do altar, tocando os nossos lábios

Assim, quando temos conhecimento e sabedoria para escolher a porção certa da verdade, podemos desfrutar liberdade de expressão quando vamos entregá-la. “Eis que ela tocou os teus lábios.” Quão gloriosamente fala o homem quando os seus lábios estão empolados pela brasa viva do altar – sentindo o poder de fogo da verdade, não apenas no recôndito da alma, mas nos próprios lábios com os quais está falando! Reparem nessas ocasiões como estremece a sua fala. Não notaram agora mesmo, na reunião de oração, em dois dos irmãos que elevaram súplicas, como era trêmulo o tom da sua voz, e como tremiam as estruturas dos seus corpos? Porque não somente os seus corações foram tocados, como espero tenham sido todos os outros corações, mas os seus lábios foram tocados, e esse tocar fluiu em seu falar. Irmãos, precisamos do Espírito de Deus para abrir as nossas bocas, para podermos proclamar os louvores do Senhor, ou então não falaremos com poder.

Necessitamos da influência divina para impedir que digamos muitas coisas que, caso saíssem de fato das nossas línguas, estragariam a nossa mensagem. Aqueles dentre nós que têm o perigoso talento para o humorismo, às vezes precisam parar, pegar a palavra ao sair da boca, olhar bem para ela, e ver se presta bem para a edificação. E aqueles cujo viver anterior os conduziu entre os grosseiros e rudes, precisam vigiar com olhos de lince a falta de delicadeza. Longe de nós, irmãos, dizer uma sílaba que sugira um pensamento impuro ou que desperte uma lembrança duvidosa. Precisamos do Espírito de Deus para pôr freio e cabresto em nós para impedir que falemos coisas que levem a mente dos ouvintes para longe de Cristo e das realidades eternas, fazendo-os pensar em coisas vis da terra.

Irmãos, também precisamos do Espírito Santo para nos impulsionar, em nossa tarefa de comunicar a Palavra. Não duvido que vocês estejam todos conscientes dos diferentes estados mentais que ocorrem na pregação. Alguns desses estados decorrem das diferentes condições físicas. Um resfriado não só tira a clareza da voz, mas também congela o fluxo dos pensamentos. Da minha parte, se eu não posso falar com clareza, também fico incapaz de pensar com clareza, e o conteúdo a transmitir fica rouco também, como a voz. Igualmente o estômago e todos os órgãos do corpo afetara a mente. Mas não me refiro a essas coisas. Terão vocês consciência das alterações completamente independentes do corpo? Quando estão robustos, não se sentem um dia pesados como os carros de Faraó cora as rodas retiradas, e noutra ocasião com tanta liberdade como “uma corça deixada solta”? Hoje o ramo brilha com o orvalho, ontem foi crestado pela seca. Quem não sabe que o Espírito de Deus está nisso tudo? Às vezes o Espírito divino age em nós de molde a livrar-nos completamente de nós mesmos. Em tais ocasiões, do começo ao fim do sermão podíamos dizer: “Se no corpo ou fora do corpo, não sei, Deus o sabe”. Tudo foi esquecido, menos certo absorvente assunto em mãos. Se me fosse proibido entrar no Céu, mas me fosse dado escolher a condição em que passarei a eternidade, escolheria aquela em que às vezes me sinto quando prego o evangelho. Nesse estado presencio o Céu: a mente cerrada para todas as influências perturbadoras, adorando o majestoso Deus, com plena consciência de Sua presença, todas as faculdades elevadas e jubilosamente cheias de vigor no máximo de sua capacidade, todos os pensamentos e poderes da alma alegremente ocupados em contemplar a glória do Senhor e exaltando com as multidões atentas o Bem-amado da nossa alma; e durante todo esse intervalo, a mais pura benevolência concebível para com as demais criaturas a incentivar o coração a pleitear com elas em prol do nome de Deus – que estado mental pode rivalizar-se com este? Pena é que alcançamos este ideal, porém, sem o podermos manter sempre, pois também sabemos o que é pregar em cadeias ou dar murros no ar.

Não podemos atribuir santas e felizes mudanças ocorridas em nosso ministério a nada menos que a ação do Espírito Santo em nossa alma. Estou certo de que o Espírito Santo realiza esta obra. Vezes sem conta, quando me assaltam dúvidas sugeridas pelo infiel, posso arremessá-las aos ares com total desdém, porque tenho definida consciência de um poder que opera em mim quando fato em nome do Senhor, poder que transcende infinitamente a qualquer capacidade ou eloqüência pessoal, e que sobrepuja em muito qualquer energia derivada do entusiasmo que sinto quando faço uma preleção secular ou um discurso. Aquele poder é tão diferente deste, que tenho toda a certeza de que não é da mesma ordem ou classe do entusiasmo dos políticos ou do ardor da oratória pura e simples. Oxalá experimentemos com muita freqüência a energia divina, e falemos com poder.

4. Mas então, em quarto lugar, o Espírito de Deus age também como
óleo que unge, e isto se relaciona com todo o trabalho da pregação – não simplesmente com a alocução oral, mas com toda a transmissão do discurso

Ele pode fazê-los sensíveis ao assunto, até ao ponto de ficarem dominados por ele, quer achatados na terra, quer elevados às alturas como em asas de águias. Acresce que, além do assunto, Ele os faz sensíveis ao seu objeto, até anelarem pela conversão dos homens e pelo despertamento dos cristãos, para que se elevem a algo mais nobre do que tudo que já conhecem. Ao mesmo tempo, outro sentimento estará com vocês, a saber, um intenso desejo de que Deus seja glorificado mediante a verdade que estão proclamando. Vocês ficam conscientes de um profundo e compassivo interesse pelas pessoas a que estão falando, lamentando que alguns saibam pouco, e que outros saibam muito e, contudo, o recusam. Vocês fitam alguns semblantes e, em silêncio, o seu coração lhes diz: “Ali cai orvalho”, e, voltando-se para outros, com tristeza percebem que são como as partes áridas da montanha de Gilboa.

Tudo isto se dá durante o sermão. Não podemos contar quantos pensamentos passam pela mente de uma vez. Uma vez contei oito grupos de pensamentos que ocupavam o meu cerébro simultaneamente, ou ao menos dentro do espaço do mesmo segundo. Estava pregando o evangelho com todas as minhas forças, mas não pude deixar de sensibilizar-me por uma senhora que estava evidentemente prestes a desmaiar, e também fiquei procurando o irmão encarregado das janelas, para que nos desse mais ar. Estava pensando na ilustração que omitira na primeira divisão, procurando dar forma à segunda divisão, perguntando-me se este sentira o peso da minha reputação, se aquele se fortalecera com a observação consoladora, e ao mesmo tempo estava louvando a Deus por desfrutar eu pessoalmente da verdade que estava proclamando. Alguns intérpretes consideram os querubins de quatro rostos como emblemas dos ministros. Eu certamente não vejo dificuldade na forma quádrupla, pois o Espírito Santo pode multiplicar os nossos estados mentais, e fazer de nós homens muito superiores além do que somos por natureza. O quanto pode Ele fazer de nós, e quão grandiosamente pode elevar-nos, não ouso conjeturar. Certamente Ele pode fazer muitíssimo acima do que pedimos ou pensamos.

Especialmente faz parte da obra do Espírito Santo manter em nós uma disposição devocional enquanto estamos entregando a mensagem. Esta é uma condição que se deve ambicionar grandemente – continuar a orar enquanto estamos ocupados com a prédica; cumprir os mandamentos do Senhor, dando ouvidos à voz da Sua Palavra; manter os olhos postos no trono, e as asas em constante movimento. Espero que saibamos o que isto significa. Estou certo de que sabemos o seu oposto, ou de que logo o experimentaremos, isto é, o mal de pregar sem espírito de devoção. Que pode ser pior do que falar sob a influência de um espírito arrogante ou irritado? Que é mais debilitante do que pregar num espírito incrédulo? Por outro lado, que bênção arder fervorosamente enquanto brilhamos diante dos olhos de outros! Esta é a obra do Espírito de Deus. Adorável Consolador, opera em nós!

Em nossos púlpitos precisamos unir o espírito de dependência com o de devoção, de modo que, durante a pregação toda, desde a primeira palavra até a última sílaba, olhemos ao alto para o Forte em busca de força. E bom lembrar que, embora tivessem chegado até o presente ponto, se o Espírito Santo os deixasse, fariam papel de tolos antes de acabar o sermão. Elevando os olhos para os montes de onde vem o socorro durante o sermão inteiro, com absoluta dependência de Deus, vocês pregarão com espírito de bravia confiança o tempo todo. Talvez eu esteja errado ao dizer “bravia”, pois não é coisa bravia confiar em Deus; para os verdadeiros crentes é simples questão de doce necessidade – como podem deixar de confiar nEle? Por que haveriam de duvidar do seu Amigo sempre fiel?

Outro dia de manhã, pregando à minha igreja sobre o texto “A minha graça te basta”, disse aos irmãos que pela primeira vez em minha vida tinha experimentado o que Abraão sentiu quando se inclinou sobre o seu rosto e riu. Voltava para casa depois de uma semana de trabalho intenso, quando veio à minha mente o texto: “A minha graça te basta.”

Veio, porém, com a ênfase posta em duas palavras: “A Minha graça te basta.” Minha alma disse: “Sem dúvida é assim. Seguramente, a graça do Deus infinito é mais que suficiente para um simples inseto como eu.” E ri, e tornei a rir, ao pensar em quanto o suprimento excedia a todas as minhas necessidades. Parecia que eu era um pequeno peixe no mar, e na minha sede dizia: “Viva, vou beber o oceano inteiro.” Então o Pai das águas ergueu sublime a cabeça e disse a sorrir: “Pequenino peixe, a ilimitada vastidão marina te basta.” Este pensamento fez com que a descrença parecesse supinamente ridícula, como de fato é.

Irmãos, devemos pregar cientes de que Deus pretende abençoar a Palavra proclamada, pois temos Sua promessa neste sentido. E ao termos pregado, devemos procurar as pessoas atingidas pela bênção.
Dirão vocês: “Fico dominado pelo espanto ao ver que Deus converte almas por meio do meu pobre ministério”? Falsa humildade! O seu ministério é pobre de verdade. Toda gente sabe disso, e vocês devem sabê-lo mais que ninguém. Mas, ao mesmo tempo, é coisa para espantar que, o Deus que disse: “A minha palavra não voltará para mim vazia”, cumpra o que prometeu? A refeição irá perder o seu valor nutritivo porque o prato é barato? A graça divina haverá de ser sobrepujada por nossa fraqueza? Não. Mas temos este tesouro em vasos de barro, para que a excelência do poder seja de Deus e não nossa.

Precisamos ainda do Espírito Santo durante o sermão todo para manter nosso coração e mente em condição apropriada. Sim, porque, se não tivermos o espírito certo perderemos a entonação que persuade e prevalece, e o povo descobrirá que a força de Sansão o deixou. Uns pregam como quem está ralhando, e assim põem à mostra o seu mau gênio. Outros se pregam a si próprios, e assim revelam o seu orgulho.

Alguns discursam como se estivessem condescendendo em ocupar o púlpito, enquanto outros pregam como se estivessem pedindo desculpa por existirem. Para evitar erros nas maneiras e no tom da prédica, precisamos ser guiados pelo Espírito Santo, posto que só Ele nos ensina com proveito.

5. Em quinto lugar, dependemos inteiramente do Espírito de Deus para produzir efeito concreto decorrente do evangelho, o que deve sempre constituir o nosso objetivo

Não nos levantamos em nossos púlpitos a fim de desfraldar a nossa habilidade na esgrima esportiva da espada espiritual, mas, sim, para empreender luta de verdade. O objeto que temos em mira é fazer a espada do Espírito traspassar o coração dos homens. Se em algum sentido se pode pensar na pregação como uma exibição pública, há de ser como a exibição do jogo do cultivo, que consiste em cultivar realmente a terra. A competição não está na aparência dos arados, mas no trabalho feito. Dessa forma sejam julgados os ministros pelo modo como manejam o arado do evangelho, e como sulcam o solo da lavoura, de ponta a ponta.

Sempre visem ao efeito. “Ora”, dirá alguém, “entendi que você teria dito: “Nunca faça isso.” Digo também que nunca visem ao efeito, no sentido infeliz dessa expressão. Nunca visem ao efeito segundo o modo dos artífices de clímax, dos declamadores de poesia, dos manipuladores de lenços, e dos sopradores de palavrório bombástico. Para o homem que degrada o púlpito reduzindo-o a um palco de teatro para exibir-se, muito melhor que não tivesse nascido. Visem à correta espécie de efeito: inspirar os crentes para coisas mais nobres; levá-los para mais perto do seu Senhor; fortalecer os que vacilam até que se livrem dos seus temores; levar os pecadores ao arrependimento e ao exercício da fé incondicional em Cristo. Sem que se sigam estes sinais, para que servem os nossos sermões? Seria uma lástima dizer com certo arcebispo: “Passei por muitas posições de honra e de confiança, tanto na igreja como no estado, mais do que qualquer colega da minha ordem na Inglaterra, durante os últimos setenta anos. Mas se tivesse a certeza de que, por minha pregação, ao menos uma alma tivesse sido convertida a Deus, teria nisso maior consolo do que em todos os honrosos ofícios que me deram.” Milagres da graça devem constituir os selos do nosso ministério. Quem pode dá-los, senão o Espírito de Deus? Converter uma alma sem, o Espírito de Deus! Ora, vocês não podem nem fazer um inseto. Muito menos criar um novo coração e um espírito reto. Tentem conduzir os filhos de Deus a uma vida mais elevada, sem o Espírito Santo. É indizivelmente mais provável que os levem à segurança carnal, se procurarem elevá-los por seus próprios métodos, sejam estes quais forem. Não poderemos alcançar os nossos fins se omitirmos a cooperação do Espírito do Senhor. Portanto, com forte clamor e lágrimas, ponham nEle a sua esperança, dia a dia.

A falta de reconhecimento definido do poder do Espírito Santo jaz na raiz de muitos ministérios vãos. As violentas palavras de Robert Hall são tão verdadeiras agora como quando as esparramou como lava
derretida sobre uma geração semi-sociniana. “Por um lado, merece atenção o fato de que os mais eminentes e bem sucedidos pregadores do evangelho – um Brainerd, um Baxter, um Schwartz – foram os mais notáveis pela simples dependência em que se colocavam do auxílio espiritual. Por outro lado, nenhum sucesso acompanhou as ministrações daqueles que têm negligenciado ou negado esta doutrina. Estes encontraram a maior censura à sua presunção no total fracasso dos seus esforços, em que ninguém lutara pela realidade da interferência divina, no que a eles se refere; pois, quando o braço do Senhor se revela àqueles pretensos mestres do cristianismo, quem acreditará que não haja tal braço? Foi preciso deixá-los trabalhar num campo a respeito do qual Deus ordenou que não caísse chuva nele. Como se conscientes disso, por último voltaram os seus esforços para um novo canal e, sem esperança de conversão de pecadores, limitaram-se à sedução dos fiéis. Nisto, é preciso confessar, eles têm agido de modo perfeitamente coerente com os seus princípios. Pois que, ao menos, a propagação da heresia não requer a assistência divina.”

6. Em seguida, necessitamos do Espírito de Deus como o Espírito de
súplicas, que faz intercessão pelos santos de acordo com a vontade de Deus

Uma parte muito importante da nossa vida consiste em orar no Espírito Santo, e o ministro que não pensa assim, melhor seria que abandonasse o ministério. É preciso que abundante oração acompanhe a pregação zelosa. Não podemos estar sempre de joelhos fisicamente, mas a alma jamais deve abandonar a postura da devoção. O hábito de orar é bom, mas o espírito de oração é melhor. Deve-se manter o retiro periódico, mas a contínua comunhão com Deus deve ser o nosso objetivo. Em regra, nós ministros, nunca devemos ficar muitos minutos sem erguer de fato os nossos corações em oração. Alguns de nós poderíamos dizer com sinceridade que raramente passamos um quarto de hora sem falar com Deus, e isto não como dever, mas como instinto, como um hábito da nova natureza pelo qual não reclamamos maior crédito do que o bebê por chorar em busca da mãe. Como poderíamos agir doutro modo? Agora, se devemos estar intensamente no espírito de oração, temos necessidade de que o óleo secreto seja derramado no fogo sagrado da devoção dos nossos corações. Oxalá queiramos ser mais e mais visitados pelo Espírito de graça e de súplicas.

Quanto às nossas orações em público, queira Deus que nunca digam com verdade que elas são oficiais, formais e frias. Contudo, é o que serão se o suprimento do Espírito for deficiente. Não julgo os que usam liturgia. Mas aos que estão acostumados a fazer oração espontânea, digo – vocês não podem orar em público de modo aceitável, ano após ano, sem o Espírito de Deus. As orações mortas serão ofensivas ao povo muito antes de correr um ano. Como há de ser, então? De onde virá o nosso socorro? Certos fracotes dizem: “Tenhamos liturgia!” Em vez de procurar o auxílio divino, descem ao Egito, em busca de socorro. Em vez de colocar-se na dependência do Espírito de Deus, vão orar seguindo um livro! De minha parte, quando não consigo orar, prefiro estar ciente disso e ficar gemendo por causa da aridez da minha alma, até que o Senhor me visite com a bênção de uma devoção frutífera.

Se vocês estiverem cheios do Espírito Santo, lançarão fora com alegria todos os grilhões formais para se entregarem à corrente sagrada e serem levados até encontrarem águas profundas. Às vezes
gozarão mais íntima comunhão com Deus pela oração no púlpito do que em qualquer outro lugar. Quanto a mim, a minha mais grandiosa hora secreta de oração muitas vezes dá-se em público. A minha mais genuína experiência de estar a sós com Deus tem-me ocorrido enquanto elevo súplicas em meio a milhares de pessoas. Abro os olhos no fim de uma oração e volto ao povo reunido com uma espécie de choque ao ver que me acho na terra, entre os homens. Essas ocasiões não estão sob o nosso comando. Tampouco podemos elevar-nos a essas condições mediante quaisquer adestramentos ou esforços. Nenhuma língua pode descrever quão benditas são para o ministro e para os demais irmãos essas condições! Quão repleta de poder e de bênçãos há de ser também a prática habitual da oração não posso deter-me aqui para proclamar.

Mas para isso tudo temos que elevar os olhos para o Espírito Santo. E, louvado seja Deus, não olharemos em vão, pois dEle se diz especificamente que Ele ajuda as nossas fraquezas na oração.

7. Além do mais, é importante estar sob a influência do Espírito
Santo, uma vez que Ele é o Espírito de Santidade. Sim, porquanto uma parte muito considerável e essencial do ministério cristão consiste em servir de exemplo

Nossa gente observa com muita atenção o que dizemos do púlpito e o que fazemos na esfera social e em tudo mais. Meus irmãos, acham fácil ser santos? – santos que outros possam considerar como exemplos? Devemos ser maridos tais, que todos os maridos da igreja possam ser como somos, sem risco. É assim conosco? Devemos ser os melhores pais. Lástima! Alguns ministros que conheço estão longe disto pois, com referência às suas famílias, guardam bem as vinhas alheias, porém não guardam bem as suas. Seus filhos são negligenciados e não crescem como semente santa. É assim com os seus? Nas conversas com nossos semelhantes, somos inculpáveis e inofensivos, como filhos de Deus irrepreensíveis? É o que nos cabe ser. Respeito as razões pelas quais o sr. Whitefield mantinha sempre o terno de linho escrupulosamente limpo. “Não, não”, costumava dizer, “isto não é ninharia. O ministro não deve ter mancha, nem mesmo em sua roupa, se possível.”

Não há como exagerar a pureza num ministro. Vocês conhecem algum colega infeliz que apareceu salpicado, e afetuosamente o ajudaram a remover as manchas, mas perceberam que teria sido melhor se as roupas estivessem alvas sempre. Oh, mantenham-se imaculados do mundo! Como pode ser assim estando nós num cenário de tentação e vivendo cercados de pecados? Somente se formos preservados por um poder superior. Se vocês hão de andar em toda a santidade e pureza, como convém aos ministros do evangelho, devem ser diariamente enchidos do Espírito Santo.

8. Uma vez mais, precisamos do Espírito Santo em Sua qualidade de
Espírito de discernimento, pois Ele conhece a mente dos homens como conhece a de Deus, e necessitamos muito disto quando lidamos com personalidades difíceis

Há neste mundo alguns indivíduos que talvez pudessem receber permissão para pregar, mas que nunca deveríamos tolerar que se tornassem pastores. São desqualificados mental ou espiritualmente. Na igreja de São Zeno, em Verona, vi uma estátua daquele santo, representando-o sentado. O artista lhe deu pernas acima dos joelhos tão curtas que ficou sem colo para abrigar crianças, de modo que ele não poderia ser um pai bom para aconchegar os filhos. Receio que haja muitos outros que trabalham com semelhante falta de habilitação. Não podem levar a sua mente a entrar de coração nos cuidados pastorais. São capazes de dogmatizar sobre uma doutrina e de polemizar sobre uma ordenança, mas, entrar em compassiva empatia com uma experiência alheia está longe deles. Uma pessoa assim só pode prestar frio consolo às consciências aflitas. Seu conselho terá o mesmo valor do conselho dado pelo montanhês escocês que, segundo contam, viu um inglês afundando num pântano em Ben Nevis. “Estou afundando!”, gritou o viajor. “Você pode dizer-me como sair daqui?” O montanhês calmamente replicou: “Acho que é provável que você não vá conseguir sair daí nunca”, e seguiu seu caminho. Conhecemos ministros dessa laia. Ficam confusos e quase perdem a paciência com os pecadores, lutando à beira do desânimo. Se eu e você, despreparados para a arte do pastoreio, fôssemos colocados entre ovelhas e cordeiros no início da primavera, que haveríamos de fazer com eles? Na mesma perplexidade se acham os que nunca foram ensinados pelo Espírito Santo sobre a maneira de cuidar das almas. Oxalá as Suas instruções nos livrem de tão desditosa incompetência!

Sobretudo, irmãos, por mais ternura de coração ou amorosa preocupação que tenhamos, não saberemos tratar da imensa variedade de casos, a não ser que o Espírito de Deus nos dirija, pois não existem dois indivíduos iguais. E mesmo um caso idêntico a outro requererá tratamento diferente em diferentes ocasiões. Num período poderá ser melhor consolar, noutro repreender. E a pessoa de quem você se compadeceu empaticamente até às lágrimas hoje, talvez necessite que a enfrente com olhar carrancudo amanhã, por dizer tolices da consolação que você lhe deu. Os que curam os quebrantados de coração e proclamam libertação aos cativos precisam ter sobre si o Espírito do Senhor.

Na supervisão e direção de uma igreja é necessário o auxílio do Espírito. No fundo, o principal motivo da divisão de nossa denominação está na dificuldade proveniente do nosso governo eclesiástico. Tem-se dito que “tende à intranqüilidade do ministério.” Sem dúvida, é muito penoso para quem suspira pelas
dignidades oficiais e sente necessidade de ser o Excelentíssimo Senhor Oráculo, diante de quem até um cachorro fica proibido de latir. Os incapazes de dirigir algo além de bebês são justamente as pessoas que têm maior sede de autoridade e, vendo-se mal aquinhoados dela nestas partes, procuram outras regiões. Se você não pode governar-se a si próprio, se não é varonil e independente, se não é superior quanto ao peso moral, se não tem maior dom e graça do que os seus ouvintes comuns, poderá vestir uma toga e ter a pretensão de ser o líder da igreja – mas, não numa igreja de governo batista ou neotestamentário. De minha parte, detestaria ser pastor de pessoas que nada têm que dizer, ou que, se chegam a dizer algo, bem podiam ter ficado caladas, pois o pastor é Sua Excelência, o Soberano, e os demais são leigos – cada qual um joão-ninguém. Preferiria antes ser líder de seis homens livres, cujo entusiástico amor fosse o meu único poder sobre eles, do que bancar ditador de uma vintena de nações escravizadas.

Que posição é mais nobre do que a do pai espiritual que não se arroga autoridade e, todavia, é estimado por todos, e cuja palavra é dita apenas como terno conselho mas é recebida como tendo força de lei? Ao consultar os desejos de outros, vê que o primeiro desejo deles é saber o que ele recomenda e, cedendo sempre aos desejos de outros, vê que se alegram em ceder aos seus. Amorosamente firme e generosamente gentil, é o chefe de todos porque é servo de todos. Isto não requer sabedoria do Alto? Que poderia ter maior necessidade dela? Quando Davi se estabeleceu no trono, disse: “E Ele que submete a mim o meu povo.” E assim pode falar todo feliz pastor quando vê tantos irmãos de temperamentos diversos querendo alegremente estar sob disciplina e aceitar a sua liderança na obra do Senhor. Se o Senhor não estivesse entre nós, logo haveria confusão. Ministros, diáconos e presbíteros, todos precisam ser sábios, mas se o pombo sagrado parte, e o espírito de contenda entra, é o fim para nós. Irmãos, o nosso sistema não funcionará sem o Espírito de Deus, e me alegra que não funcione, pois as suas paralisações e suas roturas chamam a nossa atenção para o fato da Sua ausência. Nunca se teve a intenção de que o nosso sistema promovesse a glória de sacerdotes e pastores, mas é planejado para educar cristãos varonis, que não releguem a sua fé à segundo plano. Que sou eu, e que são vocês, para que devamos ser senhores dominando a herança de Deus? Algum de nós se atreverá a dizer com o rei francês, “L état, c’est moi” – o estado sou eu” – eu sou a pessoa mais importante da minha igreja? Se for assim, não é provável que o Espírito Santo faça uso desses instrumentos inadequados. Mas se conhecemos nosso lugar e desejamos conservá-los com toda a humildade, Ele nos ajudará, e as igrejas florescerão sob os nossos cuidados.

Dei-lhes um alongado catálogo de pontos nos quais o Espírito Santo nos é absolutamente necessário. Contudo, a lista está muito longe de ser completa. Deixei-a intencionalmente imperfeita porque, se eu
tentasse completá-la, todo o nosso tempo expiraria antes de podermos responder à pergunta: Como podemos perder esta assistência necessária?

Que nenhum de nós jamais faça esta experiência, mas é certo que os ministros podem perder o auxílio do Espírito Santo. Cada pessoa aqui presente pode perdê-lo. Vocês não perecerão, uma vez que são crentes, porque a vida eterna está em vocês. Podem, porém, perecer como ministros, de quem não se ouça mais falar que são testemunhas em prol do Senhor. Se suceder isso, não será sem motivo. O Espírito reclama soberania semelhante à do vento que sopra onde quer. Entretanto, jamais sonhemos que soberania e capricho são a mesma coisa. O bendito Espírito age como quer, mas sempre de modo justo, sábio, e com motivo e razão. Às vezes Ele dá ou retira a Sua bênção, por razões relativas a nós mesmos. Notem o curso de um rio como o Tâmisa – como torce e retorce a seu bel prazer. Contudo, há razão para cada volta ou curva. O geólogo, estudando o solo e observando a forma da rocha, vê a razão pela qual o leito do rio se desvia para a direita ou para a esquerda. Assim, apesar de que o Espírito de Deus abençoa um pregador mais que outro, e a razão não pode ser tal que algum homem possa congratular-se consigo por sua própria bondade, todavia há certas coisas concernentes aos ministros cristãos que Deus abençoa, e certas outras coisas que impedem o bom êxito. O Espírito de Deus cai como o orvalho, com mistério e poder. Mas, no mundo espiritual é como no mundo natural: certas substâncias se molham com a umidade celestial, ao passo que outras estão sempre secas.

Porventura não existe uma causa? O vento sopra onde quer, mas se desejamos sentir uma forte viração, temos que ir ao mar ou subir as colinas. O Espírito de Deus tem lugares favoritos para a demonstração do Seu poder. Ele é simbolizado por uma pomba, e a pomba tem os seus retiros preferidos. Freqüenta as correntes de águas, os lugares pacíficos e calmos. Não a encontramos no campo de batalha, nem a vemos pousar na carniça. Há coisas congruentes com o Espírito e coisas contrárias à Sua mente. O Espírito de Deus compara-se com a luz. A luz pode brilhar onde quiser, mas uns corpos são opacos, enquanto que outros são transparentes. Assim, há homens através dos quais nunca aparece o Seu brilho. Portanto, deste modo se pode demonstrar que, embora o Espírito Santo seja o “livre Espírito” de Deus, de modo nenhum age por capricho.

Entretanto, diletos irmãos, o Espírito de Deus pode ser entristecido, contrariado, e pode mesmo sofrer resistência. Negar isto é opor-se ao testemunho freqüente da Escritura. Pior de tudo, podemos menosprezá-lo e insultá-lo a tal ponto que Ele não fale mais por nosso intermédio, mas nos deixe como deixou o rei Saul antigamente. Seria lamentável se existissem homens no ministério cristão aos quais sucedesse isto; temo, porém, que existam.

Irmãos, quais serão os males que entristecem o Espírito? Respondo: tudo que vos desqualifique como cristãos comuns para a comunhão com Deus também vos desqualifica para experimentarem o poder
extraordinário do Espírito Santo como ministros. A parte disso, porém, há obstáculos especiais.

Dentre os primeiros, devemos mencionar a falta de sensibilidade, ou seja, aquele estado de frieza emocional que nasce da desobediência às ternas influências do Espírito. Devemos ser delicadamente sensíveis ao Seu mais leve movimento, e então poderemos esperar a Sua presença em nós. Mas, se somos como o cavalo e a mula que não têm entendimento, segundo a expressão bíblica, sentiremos o chicote, mas não desfrutaremos das ternas influências do Consolador.

Outro defeito entristecedor é a falta de veracidade. Quando um grande músico pega um violão ou toca harpa e vê que as notas falseiam, detém a mão. As almas de alguns homens não são sinceras. Eles são sofisticados e hipócritas. O Espírito de Cristo não será cúmplice de homens aplicados à desprezível ocupação de iludir e enganar. Será este o caso aqui – que vocês preguem certas doutrinas, não porque crêem nelas, mas porque a sua igreja espera que as preguem? Estarão vocês dando tempo ao tempo até poderem, sem risco, renunciar ao seu credo atual e apregoar o que a sua mente covarde realmente sustenta ser verdadeiro? Neste caso vocês são decaídos de fato, e estão abaixo dos escravos mais indignos. Deus nos livre dos homens traiçoeiros, e se estes chegam a formar em nossas fileiras, oxalá sejam rapidamente expulsos ao som da Marcha do Velhaco (Rogue’s March). Se nós sentimos aversão por eles, quanto mais os detestará o Espírito da verdade

Vocês poderão contristar grandemente o Espírito Santo com uma geral escassez de graça. A frase é temível, mas descreve certas pessoas melhor do que todas as outras que me ocorrem. A família Graça-Escassa geralmente tem um dos seus membros no ministério. Conheço o tipo. Não é insincero nem imoral, não tem mau gênio nem é auto-indulgente, mas algo lhes falta. Não seria fácil provar essa ausência por meio de alguma ofensa ostensiva de sua parte. O que lhe falta, porém, falta à sua personalidade toda, e essa carência arruína tudo. Falta-lhe aquilo que por excelência é necessário. Ele não é espiritual. Não há nele o aroma de Cristo. O seu coração nunca se inflama no seu interior. Sua alma não vive. Falta-lhe a graça. Não podemos esperar que o Espírito de Deus abençoe um ministério que jamais devia ter sido exercido, e certamente um ministério não revestido da graça é dessa natureza.

Outro mal que expulsa o Espírito divino é o orgulho. O modo de ser bem grande consiste em ser bem pequeno. Ser muito notável em sua própria estima é não ser notado por Deus. Se você tem profunda
necessidade de viver nos lugares elevados da Terra, achará frios e áridos os pontos culminantes das montanhas. O Senhor habita com os humildes, mas de longe conhece o soberbo.

A preguiça também contraria o Espírito Santo. Não posso imaginar o Espírito esperando à porta do mandrião, e suprindo às deficiências criadas pela indolência. A ociosidade na causa do Redentor é um mal para o qual não se pode inventar desculpa. Nós mesmos sentimos arrepios ao vermos os movimentos vagarosos dos preguiçosos, e estejamos certos de que o Espírito Santo, ativo como é, fica igualmente contrariado com os que agem levianamente na obra do Senhor.

A negligência na oração particular, como muitos outros males, produzirá o mesmo resultado infeliz. Todavia, não é preciso alongar o assunto, pois as suas próprias consciências, irmãos, lhes dirão o que entristece o Santo de Israel.

Agora lhes rogo que atentem para esta palavra: Vocês sabem o que poderá acontecer se o Espírito de Deus for grandemente contristado e retirar-se de nós? Há duas suposições.

A primeira é que nunca fomos verdadeiros servos de Deus, mas apenas usados temporariamente por Ele, como Balaão, e até a jumenta cavalgada por ele. Suponhamos, irmãos, que eu e vocês continuemos pregando por um tempo sem que nem nós nem outros suspeitemos que fomos destituídos do Espírito de Deus. Todo o nosso ministério pode acabar-se de um golpe, e nós com ele. Talvez sejamos derribados na primavera, como aconteceu com Nadabe e Abiú, para não mais ministrarmos perante o Senhor, ou talvez sejamos removidos nos anos do amadurecimento, como Hofni e Finéias, não podendo continuar servindo no tabernáculo da congregação. Não temos nenhum analista inspirado que nos registre a súbita eliminação de homens que prometem muito. Se o tivéssemos, porém, talvez lêssemos aterrorizados – sobre zelo sustentado por bebidas fortes, sobre farisaísmo associado a corrupção secreta, sobre ortodoxia declarada ocultando infidelidade absoluta, ou sobre alguma outra forma de fogo estranho apresentado no altar, até que o Senhor não o suporte mais e elimine os ofensores com repentino golpe. Caberá a algum de nós essa terrível condenação?

É uma pena, mas vi alguns que, como Saul, foram abandonados pelo Espírito Santo. Está escrito que o Espírito de Deus veio sobre Saul. Entretanto, ele não foi fiel à influência divina, esta o deixou, e um espírito mau lhe tomou o lugar. Notem como o pregador de quem o Espírito se retirou banca jeitosamente o cínico, critica todos os demais, arremessa o dardo da calúnia a alguém melhor do que ele. Saul esteve uma vez entre os profetas, mas se sentia mais à vontade entre os perseguidores. O pregador frustrado procura destruir o verdadeiro evangelista, recorre aos encantos da filosofia, e busca o auxílio de heresias mortas, mas o seu poder se foi e logo os filisteus o encontrarão entre os mortos. “Não o noticieis em Gate, nem o publiqueis nas ruas de Ascalom… Vós, filhas de Israel, chorai por Saul… Como caíram os valentes no meio da peleja!”

Também alguns que foram abandonados pelo Espírito de Deus se tornaram semelhantes aos filhos de Ceva, um judeu. Estes presunçosos tentaram expulsar demônios em nome de Jesus, a quem Paulo pregava, mas os demônios saltaram sobre eles e o subjugaram. Assim, enquanto certos pregadores pregavam contra o pecado, os próprios vícios que denunciavam os derrotaram. Os filhos de Ceva têm estado entre nós. Os demônios da bebedice prevaleceram sobre o próprio indivíduo que denunciava o cálice fascinante, e o demônio da impureza saltou sobre o pregador que aplaudia a castidade. Se o Espírito Santo estiver ausente, de todas as posições a nossa é a mais perigosa. Cautela, pois!

É lamentável, mas alguns ministros ficaram como Balaão. Era um profeta, não era? Não falava em nome do Senhor? Não se lhe chamou “homem de olhos abertos… que tem a visão do Todo-poderoso”? Apesar disso, Balaão lutou contra Israel e com astúcia arquitetou um plano pelo qual o povo escolhido poderia ser vencido. Ministros do evangelho há que se tornaram súditos do papa, infiéis, livre-pensadores, e conspiraram para a destruição daquilo que antes professavam pregar. Podemos ser apóstolos, mas como Judas, terminar sendo filhos da perdição. Ai de nós, se for este o caso!

Irmãos, presumirei que somos realmente filhos de Deus. E então? Ora, mesmo neste caso, se o Espírito de Deus nos deixar, poderemos ser eliminados de um golpe, como se deu com o iludido profeta que deixou de obedecer à ordem do Senhor nos dias de Jeroboão. Era sem dúvida um homem de Deus, e sua morte física de modo algum prova que tenha perdido a alma, mas rompeu aquilo que sabia ser uma ordem de Deus dada especialmente para ele. Seu ministério terminou ali e naquela exata ocasião, pois um leão o encontrou no caminho e o matou. Queira o Espírito Santo proteger-nos dos enganadores e manter-nos fiéis à voz de Deus.

Pior ainda, podemos reproduzir a vida de Sansão, sobre quem veio o Espírito de Deus nos campos de Dá. Mas, no regaço de Dalila perdeu a força, e na masmorra perdeu os olhos. Concluiu com bravura a
carreira, cego como estava, mas quem de nós deseja tentar destino tal?

Ou – e este último me estristece além de toda a expressão, porque tem maior probabilidade de acontecer do que qualquer de todos os restantes – o Espírito de Deus pode retirar-se de nós, em penoso grau, para estrago do encerramento da nossa carreira, como foi no caso de Moisés. Não perderemos as nossas almas, não, nem mesmo as nossas coroas no Céu ou ainda a nossa reputação na terra, porém ficaremos sob uma nuvem em nossos últimos dias por termos falado uma vez imprudentemente com os nossos lábios.

Recentemente estudei os últimos dias do grande profeta do Horebe, e ainda não me recuperei da profunda tristeza de espírito que me sobreveio. Qual foi o pecado de Moisés? Não há por que inquirir. Não foi grosseiro como a transgressão de Davi, nem chocante como o fracasso de Pedro, nem fraco e tolo como a grave falta do seu irmão Arão. Na verdade, parece uma ofensa infinitesimal quando pesada na balança do julgamento usual. Mas então, vocês vêem, foi o pecado de Moisés, homem favorecido por Deus mais que todos os outros, o pecado de um líder do povo, de um representante do Rei divino. O Senhor o podia ter passado por alto em qualquer outro, não porém em Moisés. Moisés teve que ser punido com a proibição de introduzir o povo na terra prometida. E certo que teve gloriosa visão do alto de Pisga, e tudo mais que podia mitigar o rigor da sentença, mas foi grande desapontamento nunca entrar na terra da herança de Israel, e isso por ter falado uma vez impensadamente.

Eu não poderia fugir ao serviço do Mestre, mas tremo em Sua presença. Quem pode estar sem culpa, quando até Moisés errou? E coisa terrível ser amado de Deus. “Quem dentre nós habitará com o fogo consumidor? Quem dentre nós habitará com as labaredas eternas? O que anda em justiça, e o que fala com retidão.” – Somente este pode enfrentar as devoradoras chamas do amor.

Rogo-lhes, irmãos que procurem ocupar o lugar de Moisés, mas tremam ao fazê-lo. Temam e tremam por todo o bem que Deus faça passar diante de vocês. Quando estiverem transbordando de frutos do Espírito, inclinem-se até o pó perante o trono, e sirvam ao Senhor com temor. “O Senhor nosso Deus é Deus zeloso.” Lembrem-se de que Deus veio a nós, não para exaltar-nos, mas para exaltar-Se, e temos que atentar para o fato de que a glória de Deus é o único objetivo de tudo que fazemos. “Importa que Ele cresça, e eu diminua.” Oxalá Deus nos induza a isto e nos faça andar muito cuidadosa e humildemente diante dEle. Deus nos sondará e nos provará, pois o juízo começa em Sua casa, e nessa casa começa com os Seus ministros. Quererá algum de nós ser achado em falta? Retirará o abismo do inferno uma parte dos seus infelizes habitantes do meio do nosso grupo de pastores? Será terrível a sentença de um pastor decaído. A sua condenação causará espanto aos transgressores comuns. “Das profundezas o inferno se move por ti para encontrar-te em tua vinda.” Todos eles te dirão: “Também tu te tornaste fraco, igual a nós? Ficaste parecido conosco?”.

Clamemos ao Espírito de Deus, que nos faça e nos mantenha vivos para Deus, fiéis ao nosso ofício e úteis à nossa geração – e limpos do sangue das almas.

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Extraído de Lições aos Meus Alunos, volume 1, Editora PES.
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A soberania de Deus

A. W. Tozer

A soberania de Deus é o atributo pelo qual Ele governa toda a Sua criação, e para ser o Deus soberano, Ele tem de ser onisciente, todo-poderoso e totalmente livre. Estas são as razões:

Se houvesse vestígios de conhecimento, ainda que pequenos, estranhos para Deus, Seu domínio acabaria naquele ponto. Para ser Senhor sobre toda a criação, Ele deve possuir todo o conhecimento. E se Deus perdesse um infinitésimo desse poder, esta perda poria fim ao Seu reinado e destruiria Seu Reino; este átomo de força desprovido de Deus pertenceria a outra pessoa, e Deus seria um governante limitado e, consequentemente, não soberano.

Além disso, Sua soberania exige que Ele seja totalmente livre, o que significa simplesmente que Ele deve ser livre para fazer o que bem entender em qualquer lugar, em qualquer momento, a fim de cumprir o Seu propósito eterno em cada um dos pormenores sem interferência. Se não fosse totalmente livre, Deus não seria completamente soberano.

Para compreender a idéia de liberdade irrestrita, é necessário um enorme esforço da mente. Não estamos psicologicamente condicionados a entender o conceito de liberdade a não ser em suas formas imperfeitas. Nossos conceitos sobre ela foram formados em um mundo em que não existe a liberdade total. Aqui, cada objeto natural depende demuitos outros objetos, e esta dependência limita sua liberdade.

Wordsworth, no início de seu “Prelude”, alegrou-se por ter fugido da cidade em que ficara por muito tempo confinado e estava “agora livre, livre como um pássaro para ir onde bem quisesse”. No entanto, estar livre como um pássaro não é, de fato, livre. O naturalista sabe que o pássaro supostamente livre, na verdade, vive toda a vida em uma gaiola de receios, fomes e instintos; está limitado pelas condições climáticas, pelas diversas pressões do ar, pelo suprimento de comida do local, pelos predadores e pela ligação mais estranha de todas: a irresistível compulsão a permanecer naquele pequeno pedaço de terra e ar que lhe foram destinados pelo sistema da terra dos pássaros. O pássaro mais livre está, com todas as outras criaturas, constantemente envolvido por um conjunto de necessidades. Somente Deus é livre.

Diz-se que Deus é totalmente livre porque ninguém e nada pode impedí-Lo. Ele é capaz de agir como sempre lhe agrada, em todos os lugares, eternamente. Portanto, ser livre significa também que Ele deve possuir autoridade universal. Sabemos pelas Escrituras e podemos concluir a partir de outros de Seus atributos lque Deus tem poder ilimitado. E quanto à Sua autoridade?

O simples fato de discutir a autoridade do Deus Todo-Poderoso parece algo um pouco sem sentido, e questioná-la seria sem sentido. É possível imaginar o Senhor Deus dos Exércitos tendo de pedir permissão a alguém ou algo a um ser maior? A quem Deus recorreria para obter permissão? Quem é maior do que o Altíssimo? Quem é mais forte do que o Todo-Poderoso? Que posição preceda a do Eterno? Perante quel trono Deus se ajoelharia? Onde está o maior de todos a quem Deus deve apelar? “Assim diz o Senhor, Rei de Israel, Seu Redentor, o Senhor dos Exércitos: Eu Sou o primeiro e Eu Sou o último, e além de mim não há Deus” (Is. 44:6).

A soberania de Deus é fato bastante evidente nas Escrituras, e está declarado em alto som pela lógica da verdade. No entanto, reconhece-se que há certos problemas que até agora não foram solucionados de maneira satisfatória. São dois os principais problemas.

O primeiro é a presença de coisas que não têm a aprovação de Deus na criação, tais como o mal, a dor e a morte. Se Deus é soberano, Ele poderia ter impedido que essas coisas existissem. Por que Ele não o fez?

O Zendavesta, livro sagrado do Zoroastrismo, a mais imponente das principais religiões contrárias à Bíblia, concentrou-se nitidamente nesta dificuldade o suficiente para admitir a possibilidade de um dualismo teológico. Existiam dois deuses, Ormazd e Ahriman, e esses entre si criaram o mundo. O bom Ormazd criou todas as coisas boas e o mau Ahriman criou o restante. O princípio é bastante simples. Sem soberania, Ormazd não tinha com o que se preocupar e, ao que parece, não se importava em dividir seus privilégios com o outro.

Para o cristão, esta explicação não vale, uma vez que claramente contradiz a verdade ensinada de forma tão enfática por toda a Bíblia: que há um Deus e que somente Ele criou o céu e a terra e todas as coisas que nela há. Os atributos de Deus são constituídos de tal forma que é impossível a existência de outro Deus. O cristão admite que não tem a última palavra para o enigma da existência do mal. Contudo, ele sabe o que esta resposta não é. E sabe que o Zendavesta também não tem a resposta.

Embora não tenhamos uma explicação completa sobre a origem do pecado, pouco sabemos. Em Sua soberana sabedoria, Deus permitiu que o mal existisse em áreas cuidadosamente restritas de Sua criação, um tipo de foragido cujas atividades são temporárias e limitadas em termos de expansão. Ao fazer isto, Deus agiu de acordo com Sua infinita sabedoria e bondade. O que passa disto, ninguém sabe no momento; e mais do que isso, ninguém precisa saber. O nome de Deus é suficiente para garantir a perfeição de Suas obras.

Outro problema real criado pela doutrina da soberania divina está relacionado à vontade do homem. Se Deus rege o universo por meio de Seus soberanos desígnios, como é possível ao homem exercer o livre-arbítrio? E se este não pode exercer o livre-arbítrio, como pode ser responsabilizado por sua conduta? Será que ele não é um simples títere cujas ações são determinadas por um Deus ;que vive escondido e que puxa os fios como bem entende?

A tentativa de responder a estas perguntas resultou em uma nítida divisão da Igreja cristã em dois campos que deram destaque ao nome de dois renomados teólogos, Jacobus Armínios e João Calvino. Grande parte dos cristãos está satisfeita em fazer parte de um campo ou de outro, negando ou a soberania de Deus ou o livre-arbítrio do homem. Parece possível, no entanto, reconciliar estas duas posições sem prejudicar qualquer uma delas, embora o esforço resultante possa mostrar-se insuficiente aos sectários de um campo ou de outro.

A minha opinião é a seguinte: Deus soberanamente ordenou que o homem fosse livre para exercer a escolha moral, e o homem, no princípio, cumpriu este mandamento fazendo sua escolha entre o bem e o mal. Ao optar pelo mal, ele não vai de encontro à vontade soberana de Deus, mas a cumpre, visto que o desígnio eterno não se refere à escolha que deve ser feita pelo homem, mas à sua liberdade para fazê-la. Se, em sua total liberdade, a vontade de Deus foi a de dar ao homem a liberdade limitada, quem está lá para erguer a mão e dizer: “O que fizeste?”. O homem tem o livre-arbítrio porque Deus é soberano. Um Deus que não seja totalmente soberano não pode conceber liberdade moral a Suas criaturas. Ele teria receio de fazê-lo.

Talvez uma simples ilustração possa nos ajudar a entender esta questão. Um transatlântico deixa Nova York rumo a Liverpool. Seu destino foi determinado pelas autoridades competentes.Nada pode alterá-lo. Esta é, ao menos, uma rápida descrição de soberania.

A bordo do navio estão vários passageiros. Estes não estão nas poltronas, nem suas atividades são, por lei, determinadas por eles. Eles têm total liberdade para irem onde bem quiserem. Comem, dormem, divertem-se, descansam no convés, lêem, conversam, fazem o que bem entendem; no entanto, o tempo todo estão sendo levados pelo grande navio ao porto predeterminado.

Tanto a liberdade como a soberania estão ilustradas neste exemplo e não se contradizem. Creio que o mesmo acontece com a liberdade do homem e a soberania de Deus. O imponente transatlântico do soberano plano de Deus mantém seu curso firme sobre o mar da História. Deus move-se tranquilo e desimpedido com o objetivo de realizar estes propósitos eternos que foram planejados em Cristo Jesus antes do início do mundo. Não sabemos se tudo isto está incluído nestes propósitos; no entanto, o suficiente foi revelado para nos munir de um amplo conjunto de coisas que estão por vir e nos dar uma boa esperança e firme convicção de bem-estar no futuro.

Sabemos que Deus cumprirá todas as promessas feitas aos profetas; sabemos que os pecadores, um dia, serão tirados da terra; sabemos que um povo remido entrará no gozo de Deus e que os justos brilharão no Reino de seu Pai; sabemos que as perfeições de Deus ainda serão proclamadas por todo o universo, que todas as formas de inteligência criadas pertencerão ao Senhor Jesus Cristo para a glória de Deus Pai, que a presente ordem imperfeita será revertida e que um novo céu e uma nova terra serão estabelecidos para sempre.

Com relação a todas estas coisas, Deus está agindo com infinita sabedoria e perfeita precisão de ação. Ninguém pode dissuadí-Lo de Seus propósitos; nada pode desviá-Lo de Seus planos. Uma vez que Ele é onisciente, é impossível haver circunstâncias imprevistas, ou acidentes. Como Ele é soberano, é impossível haver ordens contrárias ou fim da autoridade, e como Ele é onipotente, é impossível não haver todo o poder para realizar Seus desígnios estabelecidos. Deus é auto-suficiente para realizar todas essas coisas.

Enquanto isso, as coisas não são tão fáceis quanto parece sugerir essa rápida descrição. O mistério da iniquidade já opera. Dentro do vasto campo da vontade permissiva e soberana de Deus, o terrível conflito entre o bem e o mal continua crescendo com total fúria. Deus ainda está no controle do vendaval e da tempestade, mas a tempestade e o vendaval estão presentes e, como seres responsáveis, devemos fazer nossa escolha na presente situação moral.

Algumas coisas foram ordenadas pela determinação livre de Deus, e uma delas é a lei da escolha e consequências. Deus ordenou que todos os que prontamente se submetem ao Seu Filho Jesus Cristo na obediência da fé recebem a vida eterna e se tornam filhos de Deus. Outrossim, ordenou que todos os que amam as trevas e continuam em rebelião contra a autoridade superior dos céus permanecem em um estado de alienação espiritual e, por fim, passam pela morte eterna.

Colocando toda a questão em termos individuais, chegamos a algumas conclusões importantes e extremamente pessoais. No conflito moral que agora assola o mundo à nossa volta, quem está do lado de Deus está do lado vitorioso e não tem como perder; quem está do outro lado está do lado da derrota e não pode vencer. Neste ponto, não há chance nem como arriscar. Há liberdade para escolher de que lado deveremos estar, mas não para negociar as consequências da escolha uma vez que ela tenha sido feita. Pela misericórdia de Deus, podemos nos arrepender de uma escolha errada e mudar as consequências por meio de uma escolha nova e acertada. Não podemos ir além disso.

Toda questão da escolha moral está centrada em Cristo Jesus. Ele claramente afirmou: “Quem não é por mim é contra mim” (Mt. 12:30), e: “Ninguém vem ao Pai senão por mim” (Jo.14:6). A mensagem do Evangelho incorpora três elementos distintos: um anúncio, uma ordem e um convite. Anuncia as boas novas da redenção consumada com misericórdia, ordena que todos os homens de todas as partes do mundo se arrependam e convida a todos para que submetam às condições da graça por meio da fé em Jesus Cristo como Senhor e Salvador.

Todos nós temos duas opções: obedecer ao Evangelho ou nos desviar dele, incrédulos, e rejeitar sua autoridade. A escolha é toda nossa,mas as consequências resultantes dessa escolha já foram determinadas pela vontade soberana de Deus, e não há como recorrer.

O Senhor desceu do alto
E baixou dos mais altos céus,
E sob os pés tinha
A escuridão dos céus.

Cavalgava um querubim e serarim
Que Ele levou majestosamente,
E nas asas dos poderosos ventos
Veio voando.

Sentou-se sereno sobre as águas,
Para conter Sua fúria;
E Ele, como Senhor e Rei soberano,
Reinará para todo o sempre.

(Paráfrase do Salmo 18, por Thomas Sternhold)

(Extraído de Verdadeiras Profecias, de A. W. Tozer – Editora dos Clássicos)

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Espírito Santo Vida cristã

Não resista, não entristeça, não extinga

G. Campbell Morgan

Novos privilégios sempre trazem novas responsabilidades e resulta que estas responsabilidades criam novos riscos. Se esta era é a mais favorecida da história dos homens, ela tem, portanto, que enfrentar o maior e mais sério risco. Estes riscos são os de resistir, entristecer e extinguir o Espírito. Estes termos não se referem ao mesmo risco. Existem os que não resistem ao Espírito que ainda assim O entristecem; existem também aqueles que não resistem e não O entristecem no sentido em que o apóstolo usou a palavra, no entanto estão em perigo perpetuo de O extinguir. O perigo de resistir ao Espírito é daqueles que não nasceram de novo; o perigo de entristecer o Espírito é daqueles que nasceram do Espírito e são habitados por Ele; o perigo de extinguir o Espírito é daqueles sobre os quais Ele depositou algum dom para o serviço.
Em João 3:7 Jesus disse a Nicodemos: “É preciso nascer de novo”. Isto se refere ao primeiro ato do Espírito em uma pessoa. Para a mulher Samaritana Ele disse em João 4:14: “Aquele que beber da água que eu lhe der nunca terá sede; pelo contrário, a água que eu lhe der se fará nele uma fonte de água que jorre para a vida eterna”. Isto se refere ao segundo aspecto da obra do Espírito no crente, como um perene e perpétuo jorrar. Para a multidão que estava na festa Ele disse em João 7:38: “Quem crê em mim, como diz a Escritura, do seu interior correrão rios de água viva”, referindo-se à obra do Espírito, em seu fluir através do crente a fim de renovar outras vidas.

Os três aspectos da obra do Espírito – regeneração, habitação e provisão – revelam os riscos destes tempos.

Em relação à regeneração o perigo é definido pela palavra resistir. Em relação à habitação o perigo é definido pela palavra entristecer. Em relação à provisão para a obra o perigo é definido pela palavra extinguir.

A primeira destas palavras ocorre na defesa de Estevão. Depois de ter enumerado os atos de rebelião que tinham caracterizado a história do povo, ele exclamou em Atos 7:51: “Homens de dura cerviz, e incircuncisos de coração e ouvido, vós sempre resistis ao Espírito”. Resistir ao Espírito Santo consiste em uma hostilidade determinada a Seus propósitos e obra. Naquele momento nem sempre era evidentemente intencional; o pecado está no fato de que eles não perceberam a oportunidade quando ela veio.

Quando seus irmãos venderam José, eles não entenderam que estavam vendendo o seu libertador para a escravidão. Foi um pecado de cegueira. Quando o povo falhou em entender Moisés, o rejeitaram e murmuraram contra ele, eles não compreenderam toda a missão divina para a qual ele foi levantado. Eles foram hostis à obra do Espírito Santo de Deus e sua hostilidade foi o resultado da cegueira. Resistir ao Espírito Santo, no entanto, não é necessariamente intencional; pode ser o resultado da cegueira; mas quando Deus trata com as pessoas Ele leva em conta a causa da cegueira, e onde esta causa é criada por eles mesmos. Ele os responsabiliza. O ciúme e o ódio de sua legítima posição cegaram os irmãos de José; e o mesmo espírito de malícia estava na raiz da oposição a Moisés. Eles estavam cegos, e por causa da cegueira cresceu a hostilidade.

Os crentes precisam continuamente examinar a si mesmos se estão na fé. Existem muitos que negariam veementemente a acusação de serem hostis aos propósitos divinos, cujas vidas estão fora de toda a harmonia com os movimentos do Espírito. Aquele que veio para estabelecer o reino de Deus no coração do povo, Aquele que veio para trazer para a vida humana justiça e amor como forças que transformam e transfiguram, ainda não está apto para concluir tais propósitos neles, porque o Espírito Santo está sendo resistido. Aos Corintios (II Co 13:5) o apóstolo escreveu: “Examinai-vos a vós mesmos se permaneceis na fé”. É um alerta solene, que ocorre depois da expressão de um temor de sua parte (II Co 12:20): “Porque temo que, quando chegar,… haja contendas, invejas, iras,…, tumultos”. Todo tipo de impureza pode ser resumido em um pensamento de falta de amor. Dentre as coisas que o apóstolo estava temendo, não havia nenhuma que fosse obra de notória impureza. Era o espírito de facção, sismo e divisão que ele temia; e seu temor provocou sua advertência. “Examinai-vos a vós mesmos se permaneceis na fé”. Esta foi a palavra dita, não para o mundo lá fora, mas para os que professam ser Cristãos. A questão, tanto para as pessoas que resistem ao Espírito, quanto para as que são uma parte da força no mundo que é hostil ao Espírito, está estabelecida, não pelo julgamento que os vizinhos fazem, mas pelo julgamento claro como a luz e penetrante como o fogo, quando no lugar da intimidade com Deus a oração é sinceramente oferecida: “Sonda-me, ó Deus, e conhece o meu coração; prova-me, e conhece os meus pensamentos, vê se há em mim algum caminho perverso, e guia-me pelo caminho eterno”. (Sl 139:23-24).

O segundo perigo é o de entristecer o Espírito Santo. Não há palavra no Novo Testamento que mais clara e graciosamente revele a ternura do coração de Deus. A palavra ‘entristecer’ significa literalmente ‘causar mágoa’ e é revela um caso extraordinário da forma na qual Deus graciosamente usa o ser humano para a ilustração de Sua própria atividade de afeição e pensamento. Há um entendimento de que é difícil pensar que Deus se entristece, e ainda se curva para esta grande palavra, a fim de ensinar que é possível aos Seus filhos, habitados pelo Espírito, causarem tristeza ao Seu coração. Não deixe ninguém minimizar o valor desta palavra. Não aflija, não cause tristeza, não magoe o coração de Deus.

As palavras ocorrem em meio ao mais magnífico argumento a respeito da sublime chamada de Deus para o Seu povo, e está conectada com a declaração (Ef 1:13-14), “No qual também vós, tendo ouvido a palavra da verdade, o evangelho da vossa salvação, e tendo nele também crido, fostes selados com o Espírito Santo da promessa, o qual é o penhor da nossa herança, para redenção da possessão de Deus, para o louvor da sua glória”. O Espírito Santo sela para o dia da redenção. Quando Ele faz morada no coração da alma confiante, não é somente para a benção presente, mas é também para a consumação. Quando o Espírito Santo toma posse de uma alma e concede vida, aquela vida é a profecia e a promessa para uma eventualidade. Para aqueles que são filhos de Deus o completo significado do fato ainda não existe (I Jo 3:2), “Amados, agora somos filhos de Deus, e ainda não é manifesto o que havemos de ser. Mas sabemos que, quando ele se manifestar, seremos semelhantes a ele; porque assim como é, o veremos”.

Ninguém pode imaginar qual será a glória da Sua vinda, nem mesmo pode saber qual será a glória dos filhos de Deus quando a obra de Deus estiver acabada em suas vidas. O Espírito Santo no interior sela até aquele glorioso fim. A selagem não consiste em simplesmente colocar uma marca de possessão sobre uma propriedade, mas no trabalhar na vida de toda a beleza e graça do Próprio Cristo. Como quando nosso abençoado Senhor foi transfigurado na montanha, não foi a transfiguração de uma glória que veio sobre Ele, mas a da glória que já era residente em Seu interior, brilhando através do véu da Sua carne. Deste modo, quando o Espírito sela, Ele assim faz pelo dom da vida, que é capaz de transformar o caráter.

É deste segundo aspecto da obra do Espírito que surge o segundo risco. Sempre que Ele é impedido, sempre que Ele é desobedecido, sempre que Ele dá alguma nova revelação de Cristo que não traz resposta, Ele é entristecido. O coração de Deus está triste quando, pela desobediência de Seus filhos, Seu propósito de graça neles é obstruído. Que tristeza! Quão freqüentemente o Espírito Santo tem sido entristecido; quão freqüentemente Ele traz alguma visão do Mestre que exige devoção, reivindicando uma nova consagração; e porque o caminho da devoção e da consagração é sempre o caminho do altar e da cruz, os filhos do Seu amor retrocedem. O Espírito tem sido entristecido porque, impedido em Seus propósitos, o dia do aperfeiçoamento dos Seus santos tem sido postergado e a vinda do Reino de Deus tem sido atrasada. É um pensamento muito terrível o de que o entristecimento do Espírito dentro da Igreja posterga a vinda do Reino de Deus ao mundo. Na medida em que os homens são obedientes ao Espírito interior e permitem a Ele ter Seu caminho em todas as áreas da vida, nessa proporção estão apressando a vinda do dia de Deus, trazendo o Reino de Paz.

O terceiro e último perigo é o descrito pelas palavras (I Ts 5:19), “Não extingais o Espírito”. A palavra extinguir não se refere à morada interior do Espírito para vida e desenvolvimento no crente. Ela se refere inteiramente à Sua presença como um poder em serviço. A palavra em si é sugestiva. Resistir pressupõe a vinda do Espírito Santo para atacar a fortaleza da alma. Entristecer pressupõe a residência do Espírito como o Consolador interior. A palavra extinguir pressupõe a presença do Espírito como um fogo. Esta sugestão do fogo traz de volta as palavras (At 2:3), “E lhes apareceram umas línguas como que de fogo, que se distribuíam, e sobre cada um deles pousou uma”. Fogo era o símbolo de poder para adorar, orar e profetizar. No argumento do apóstolo as duas coisas estão ligadas (I Ts 5:19-20). “Não extingais o Espírito; não desprezeis as profecias”. Aqui está o terceiro perigo. O Espírito, que veio sobre o crente para adorar, orar e profetizar, pode ser extinto. É possível que o dom do Espírito Santo, concedido para o serviço, possa ser perdido. É possível que aqueles sobre os quais tenha caído, desapercebida pelos olhos mortais, a Língua de Fogo, aqueles que têm sido chamados por Deus para o lugar do verdadeiro serviço na Igreja, possam extinguir o Espírito e assim perderem o seu poder de testemunho.

Há muita extinção do Espírito Santo pelo serviço que não espera, mas se apressa, e pela queima de fogo estranho sobre os altares de Deus. A tentativa de conduzir a obra do Reino de Deus por meios mundanos, a permanente profanação das coisas santas pela aliança com coisas que são impuras, a pressão do espírito de cobiça (mamom) no serviço de Deus, têm causado a extinção do Espírito. Porque Deus jamais permitirá que o Fogo do Espírito Santo seja misturado com fogos estranhos sobre Seus altares. O que é verdade para as Igrejas é verdade para o indivíduo. Deus tem equipado o Seu povo para o serviço com dons espirituais. Para cada um algum Fogo do dom de pregar ou de influir tem sido dado; mas tem sido perdido quando cessado de ser usado na lealdade para com Cristo. Muitos perdem seu dom de poder para o serviço e se tornam estéreis de resultados no trabalho para Deus porque prostituem um dom celestial para um serviço sórdido e egoísta, para a glorificação de suas próprias vidas, ao invés de exercitarem o dom somente para a sua verdadeira finalidade.

Os crentes constantemente extinguem o Espírito por tentarem trabalhar em sua própria força, esperando que Deus intervenha e complemente suas deficiências. Deus não virá e ajudará homens a fazerem suas próprias obras. Ele pede que eles se doem a si mesmos a Ele para fazer a Sua obra. Este não é um jogo inútil de palavras, a diferença é radical. Se os homens fazem os seus planos de serviço e então pedem a Deus para ajuda-los, eles podem, pela própria afirmação do ego, extinguir o Espírito. Se, por outro lado, esperam a visão e a voz Divina, eo caminho divinamente apontado, se esperam até que ouçam Deus dizendo, ‘Estou indo para lá, precisaria que você fosse comigo’, então o Espírito Santo pode exercitar Seu dom em suas vidas. O Espírito é extinto pela deslealdade a Cristo, ou quando Seu dom é usado em algum outro propósito além daquele n o qual o coração de Deus está posto.

Não resista, não entristeça, não extinga o Espírito!

De O Espírito de Deus (The Spirit of God). (www.editorarestauracao.com.br)

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