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Um Deus que se oculta (T. Austin-Sparks)

O Deus que se oculta sempre se revela

“Verdadeiramente tu és o Deus que te ocultas, o Deus de Israel, o Salvador” (Is 45.15).

É como se o profeta tivesse sido subitamente intimidado e maravilhado com o que ele estava fazendo para profetizar! No meio de seu ministério, algo de maravilhoso abriu-se sobre ele e interrompeu essa declaração.

Deixando, por um momento, muito do que isso poderia implicar tanto como profecia quanto como previsão e sua vindicação, vamos ficar com a própria exclamação. Essa declaração é única, em princípio, com vários exemplos nas Escrituras. Olhando para o presente contexto, vemos que é a libertação de Israel do cativeiro e o retorno à Terra Prometida para reconstruir Jerusalém e o templo que está em vista. Sem dúvida, houve muita especulação e discussão a respeito de como as profecias do retorno dos judeus seria cumprida. Setenta anos tinham sido determinados e dados a conhecer como a duração do cativeiro. Os poderes gentios estavam em indubitável ascensão, e parecia muito pouco provável ou possível que Israel reconquistasse seu poder e glória nacionais entre as nações. O estado de coisas em seu próprio país – o templo destruído, a cidade queimada, a terra invadida por feras, os emissários do inimigo instalados – e a desintegração entre o povo no exílio criaram um panorama repleto de problemas aparentemente insuperáveis, e isso poderia muito bem ter levado à completa perplexidade e, até mesmo, ao desespero.

Então, o profeta é chamado para prever tudo o que ia acontecer – esta restauração – pelas mãos ou pela vontade do próprio poder gentio; que o Espírito soberano de Deus desceria sobre um homem que, por enquanto, não estava em posição de fazer isso e, provavelmente, cujo nome ainda não era totalmente conhecido. Babilônia ainda não fora derrubada: o império babilônico ainda não fora destruído; as profecias de Daniel ainda não haviam sido cumpridas. Mas aquele que faria isso foi mencionado pelo nome, e os detalhes de sua conquista são dados neste 45o. capítulo de profecias de Isaías. (Leia-o trecho por trecho.) E, em seguida, muito embora esse homem seja ignorante quanto a Deus, ele seria constrangido e compelido por Deus como um ungido para cumprir as Escrituras, libertar o povo, fornecer os meios e facilitar amplamente a restauração.

Como o profeta vê tudo em sua “visão” (“a visão de Isaías”, 1.1, uma visão que inclui tudo), ele está sobrecarregado com admiração. Todos os problemas são resolvidos, as perguntas, respondidas, as “montanhas”, aplainadas! Quem teria pensado nisso? Quem teria sonhado com tal coisa? Oh, quão profundos são os caminhos de Deus, inferiores a nossa imaginação, escondidos de nossas especulações mais intensas. “Verdadeiramente tu és o Deus que te ocultas, o Deus de Israel, o Salvador”.

Quem teria pensado na cruz para o Deus Encarnado como o método e os meios de resolver o maior problema já conhecido neste universo?

Houve vários outros grandes e notáveis exemplos do mistério dos caminhos de Deus no cumprimento de Seus principais propósitos. Toda a raça [humana] tinha se afastado Dele e se envolvido em impiedade e idolatria. Foi universal. Como Deus iria atender Sua própria necessidade? Bem, Ele moveu-se para colocar a mão sobre um homem, e desse homem Ele fez uma nação. Em graça soberana, Ele fez dessa nação Seu mistério, Seu segredo, entre as nações. Israel era o mistério de Deus, o caminho oculto de Deus. Sempre havia algo misterioso sobre Israel. Paulo, contemplando esse método de Deus e vendo-o erguer-se com tal poder esmagador, fez exatamente o que Isaías fez. Enquanto escrevia o verso a seguir, ele o interrompeu com uma exclamação forte e retumbante:

“Ó profundidade das riquezas, tanto da sabedoria como do conhecimento de Deus! Quão insondáveis são os seus juízos e quão inescrutáveis os seus caminhos!” (Rm 11.33).

Ele poderia muito bem ter acrescentado: “Tu és um Deus que te ocultas”. Quem poderia ter pensado na Encarnação, e nela, não em glória, mas em humilhação até ofender toda a expectativa do homem? Quem teria pensado na cruz para o Deus Encarnado como o método e os meios de resolver o maior problema já conhecido neste universo? Quem teria suspeitado que tudo isso estava incorporado naquele Homem de Nazaré, “o filho do carpinteiro” como O chamavam? Foi o maior mistério de Deus! Funcionou? Tem provado ser o caminho, o único caminho, e o caminho transcendentemente bem-sucedido?

E o que é verdade quanto ao mistério de Israel e ao mistério de Cristo, também é verdade quanto ao mistério da Igreja. Há um ocultamento sobre a verdadeira Igreja. Nenhum olho natural pode discerni-la. Nenhuma mente natural pode explicá-la. Reduza-a ao senso e à descrição humanos e você a perde, você capta a coisa errada. “A sabedoria de Deus (é) em mistério”, disse Paulo. Tente confiar a Igreja ao mundo sem fé, e você terá retirado da Igreja seu poder secreto! A menos que os homens consigam se dar bem vindo contra o Deus inescrutável que os esmaga, aquilo que afirma ser morada Dele é uma concha vazia.

E gostaríamos de lembrar você que aquilo que é verdadeiro nessas grandes épocas de progresso soberano ao longo dos séculos, essas intervenções e esses adventos na história da vida espiritual do mundo, é verdade na vida de cada um do verdadeiro povo de Deus. Eles serão constantemente confrontados com o “como?” de situações impossíveis, a fim de que sejam compelidos a repetidas exclamações na presença das soluções simples de Deus:

“Verdadeiramente tu és o Deus que te ocultas.”

“Profundamente, em minas insondáveis,
com perícia que nunca falha,
Ele entesoura Seus esplêndidos desígnios
e opera Sua vontade soberana.”1

“Dar-te-ei os tesouros escondidos, e as riquezas encobertas, para que saibas que eu sou o SENHOR, o Deus de Israel, que te chama pelo teu nome” (Is 45.3).

(Traduzido por Francisco Nunes. Original aqui. A maior parte dos textos de Austin-Sparks é transcrição de suas mensagens orais. Os irmãos que as transcrevem não fazem nenhuma edição ou aprimoramento. Por isso, o texto conserva bastante de sua oralidade, o que, em muitas circunstâncias, não permite uma tradução mais apurada. Se houver qualquer sugestão para aprimoramento deste trabalho, por favor, deixe um comentário. Este artigo pode ser distribuído e usado livremente, desde que não haja alteração no texto, sejam mantidas as informações de autoria, tradução e fonte e seja exclusivamente para uso gratuito.)

1 Segunda estrofe do hino God Moves in a Mysterious Way (Deus se move de uma maneira misteriosa), de William Cowper (1731–1800). (N.T.)

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Antes do inverno

Inverno na prisão

“Quando vieres, traze a capa que deixei em Trôade […] Procura vir antes do inverno” (2Tm 4.13,21).

Preso pela segunda vez em Roma, como um criminoso comum, na prisão Mamertina, uma prisão úmida e sombria, de acordo com a história, onde ninguém podia sequer ficar em pé, o apóstolo Paulo, que tanto havia proclamado o evangelho por todo o império, percorrendo caminhos, rios e desertos, havia chegado ao final de sua vida: “O tempo da minha partida está próximo” (v. 6).

Um após o outro, os companheiros de antes, com exceção de Lucas, haviam partido; uns, é verdade, para o serviço do evangelho; outros, como Demas, por terem amado “o presente século” (v. 10). Eu sua defesa, ninguém esteve a seu lado, todos o abandonaram. Paulo, sendo pregador, apóstolo e mestre dos gentios, havia cumprido seu serviço perfeitamente, combatendo o bom combate e guardando a fé. Paulo havia se alegrado muito vendo a assembléia em Roma, cujos irmãos, anos antes, o haviam animado (At 28.15). Agora ninguém parecia se preocupar com este pobre e velho prisioneiro, que não tinha com que se proteger do frio que estava por chegar. Precisou pedir que lhe trouxessem sua velha capa, que estava na longínqua Trôade. Na verdade, “o inverno” já havia chegado.

Apesar de o apóstolo estar consciente de sua solidão e do abandono em que se encontrava, a presença do Senhor predominava em seu coração.

E esta súplica se repete: a Timóteo, ele pede: “Procura vir ter comigo depressa […] Procura vir antes do inverno” (vs. 9,21). Em breve, os carrascos conduziriam o condenado ao suplício. Teria ele antes a ocasião e o consolo de ver seu “filho” Timóteo?

Muitos servos do Senhor que estão entre nós chegaram a uma idade avançada. Para eles, o “inverno” chegou; as forças declinaram, a resistência física falta, freqüentemente seus pensamentos se anuviam. Seguramente, eles também desejam que os mais jovens vão vê-los. Ficarão muito gratos por ter amigos que, sem esquecer as necessidades materiais, pensem principalmente naqueles que poderiam alegrar seu coração. Então, esses irmãos em Cristo serão para eles como um raio de luz em circunstâncias muitas vezes sombrias.

Mas, apesar de o apóstolo estar consciente de sua solidão e do abandono em que se encontrava, a presença do Senhor predominava em seu coração. Alexandre lhe havia causado “muitos males; o Senhor lhe pague segundo as suas obras” (v. 14). Em seu processo, todos os abandonaram; “mas o Senhor assistiu-me e fortaleceu-me […] o Senhor me livrará” (vv. 17,18). “Acabei a carreira […] A coroa da justiça me está guardada, a qual o Senhor, justo juiz, me dará naquele dia” (vv. 7,8). Do caminho para Damasco até a prisão em Roma, o Senhor havia sido para ele o Amigo fiel que tantas vezes o havia animado: em Corinto, onde chegou com temor e tremor (At 18.9,10); em Jerusalém, na noite em que foi preso (23.11); durante a tempestade em alto mar (27.23-25), quando os passageiros haviam perdido toda a esperança de salvação. Havia chegado “o inverno” com seus tantos sofrimentos. Paulo estava desprovido de tudo, mas, uma vez mais, o Senhor se manteve a seu lado.

Que mensagem deixaria para seu jovem amigo Timóteo, a quem talvez nem sequer voltaria a ver? Uma última palavra, um último desejo: “O Senhor Jesus Cristo seja com o teu espírito” (2Tm 4.22). Timóteo, por sua vez, também teria de sofrer e cumprir plenamente seu serviço, e onde acharia forças senão naquele que era o conteúdo da visão de seu pai espiritual? Por isso, Paulo disse não apenas “o Senhor seja contigo”, mas “com teu espírito”, o qual tão facilmente poderia desfalecer e abandonar a fé.

Não ocorre o mesmo conosco hoje? Se aqueles que nos guiaram durante nossa infância e juventude partirem, um após o outro, se a tarefa que está diante de nós, com as numerosas necessidades, for pesada, se dificuldades reais aparecerem por todos os lados, a mesma promessa permanece: “O Senhor Jesus Cristo seja com o teu espírito”.

(G. A.)

Toda atividade exterior que não seja o fruto da vida interior tende a fazer-nos trabalhar sem Cristo e a substituí-Lo pelo ego.

A carreira final

O amado apóstolo nos dá uma comovedora idéia das condições finais de seu combate e de sua carreira: a prisão, o frio, a nudez (1Co 4.11; 2Co 11.27; em 2Tm 4.13 pede sua capa), a maldade e a oposição dos homens (vv. 14,15), seu comparecimento diante de César Nero e a ausência de todos os amigos (v. 16). Esses haviam se dispersado, e Demas o havia abandonado. Não é possível fazer parte do grupo dos que amam “o presente século” [este mundo] (v. 10) e também ser dos que amam a vinda do Senhor (v. 8). A epístola termina mencionando o supremo recurso em um tempo de ruína: a graça. Era a saudação do apóstolo (1.2) e também sua despedida (v. 22). Que essa graça esteja com cada um de nós.

(J. K.)

O serviço

O que é o serviço? É ter parte no ministério de amor de Cristo.

Uma vida interior com Deus é o único meio para viver em público por Ele. Toda atividade exterior que não seja o fruto da vida interior tende a fazer-nos trabalhar sem Cristo e a substituí-Lo pelo ego. Tenho muito temor de que se manifeste um grande ativismo quando há pouco comunhão com o Senhor.
Todo verdadeiro serviço deve resultar do conhecimento do próprio Cristo.

(John Nelson Darby)

 

(Traduzido por Francisco Nunes de Un mensaje bíblico para todos, 10/2014, publicado por Ediciones Bíblicas Para Todos (Suíça). Este artigo pode ser distribuído e usado livremente, desde que não haja alteração no texto, sejam mantidas as informações de autoria e de tradução e seja exclusivamente para uso gratuito.)

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Encorajamento Oração

Sobre oração

Não é tanto uma questão de tempo disponível como uma questão de coração. Se no coração quiseres orar, acharás tempo de fazê-lo.

(C. H. Spurgeon)

A melhor oração, com freqüência, tem mais gemidos do que palavras.

(John Bunyan)

Eu espero em Deus, continuo orando, e aguardo a resposta. Eles ainda não se converteram, mas vão.

(George Mueller. Ele começou a orar por cinco amigos seus. Depois de vários meses, um deles veio ao Senhor. Dez anos depois, dois outros se converteram. Demorou 25 anos antes de o quarto amigo ser salvo. Até morrer, Mueller perseverou em oração pelo quinto amigo, e por 52 anos jamais desistiu de esperar que ele aceitasse a Cristo! Sua fé foi recompensada: depois de Mueller ter sido enterrado, o último dos amigos foi salvo.)

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Irmãos Oração

Como orar?

Aprender a orar

“Amados, se o nosso coração não nos condena, temos confiança para com Deus; e qualquer coisa que lhe pedirmos, dele a receberemos, porque guardamos os seus mandamentos, e fazemos o que é agradável à sua vista. E o seu mandamento é este: que creiamos no nome de seu Filho Jesus Cristo, e nos amemos uns aos outros, segundo o seu mandamento” (1Jo 3.21,22).

A Palavra de Deus contém numerosas exortações concernentes à oração, mas nós as escutamos? Nós as colocamos em prática? E, se o fazemos, por que tiramos tão pouco proveito dela? Seguramente, todos temos experimentado algumas vezes que, depois de orar, erguemo-nos sem gozo no coração, com os mesmos sentimentos de antes. Se isso tem acontecido, é porque não sabemos orar. Talvez o tenhamos feito por rotina, rapidamente, sem tomarmos consciência da presença de Deus.

Como podemos remediar essa situação tão ruim para nosso progresso espiritual? Para saber como, é preciso conhecer as condições para a oração cristã. Aqui falarei de apenas três, que me parecem muito importantes.

Ter presente a grandeza e a santidade de Deus

A primeira condição consiste em saber a quem nos dirigimos. Nos países monárquicos, quando um súdito tem a honra de falar com seu rei, ele o faz com respeito, pesando cada uma de suas palavras, sem esquecer por nenhum instante diante de quem se encontra.

Com muito mais razão, quando orarmos, lembremos que Aquele a quem temos o privilégio de nos dirigirmos é o Rei dos reis e o Senhor dos senhores. É aquele que criou o universo, no qual a Terra, que nos parece tão grande, não é nada mais que um grão de pó. Lembremo-nos também de que diante Dele os serafins exclamam: “Santo, Santo, Santo é o Senhor dos Exércitos; toda a terra está cheia da sua glória” (Is 6.3). Em resumo, concentremo-nos em Sua grandeza e santidade; assim, evitaremos distrair-nos ou agir com leviandade em Sua presença.

Se nos deixamos guiar pelo Espírito e se, mediante a Palavra de Deus, aprendemos a conhecer Seus pensamentos, saberemos orar como Ele quer

Julgar-nos

A segunda condição é saber julgar-nos a nós mesmos. O grande obstáculo que nos priva da comunhão com o Senhor é a carne, o “velho homem” que está em nós. Sem uma comunhão profunda não pode haver orações verdadeiras. Comecemos, pois, confessando ao Senhor tudo o que naquele momento nos separa Dele: aquela cobiça que nos mancha, aquele pensamento orgulhoso, aquela atitude egoísta ou colérica, assim como as faltas que nos parecem insignificantes. Confessemos tudo isso a Ele. Façamos um juízo severo sobre nós, com uma sincera humildade, profundamente compenetrados de nossa miséria natural e de que não somos nada diante Dele, que é tão grande e santo. Então, a comunhão se estabelecerá entre nossa alma e Deus. Se confessarmos os nossos pecados, ele é fiel e justo para nos perdoar os pecados, e nos purificar de toda a injustiça” (1Jo 1.9). Com efeito, ao Deus Todo-poderoso e santo nós também conhecemos como Pai, um Pai cheio de amor e de misericórdia.

Deus se revela por meio da Bíblia

A terceira condição consiste em acompanhar a oração com a leitura de uma passagem da Palavra de Deus. Nas Escrituras, Deus se revela a nós. Portanto, nós a lemos no momento de orar para que Seu Espírito nos encha e possamos conhecer Sua vontade. Há muitos cristãos que oram mal porque oram com uma disposição de coração puramente humana, ou porque o fazem como certos místicos em êxtase, que a consideram como uma influência divina. Tais orações não são segundo Deus. “Também o Espírito ajuda as nossas fraquezas; porque não sabemos o que havemos de pedir como convém, mas o mesmo Espírito intercede por nós com gemidos inexprimíveis” (Rm 8.26). Se nos deixamos guiar pelo Espírito e se, mediante a Palavra de Deus, aprendemos a conhecer Seus pensamentos, saberemos orar como Ele quer. Somente Lhe pediremos o que Ele queira nos dar, tendo sido despojados de nossa própria vontade e estando inteiramente submissos à Dele, que é santa, qualquer que ela seja. “Se vós estiverdes [permanecerdes] em mim, e as minhas palavras estiverem [permanecerem] em vós, pedireis tudo o que quiserdes, e vos será feito” (Jo 15.7).

Se essas três condições essenciais se cumprirem todas as vezes em que nos dirigirmos a Deus, nossas orações serão eficazes, nossa vida estará cheia de gozo, de certeza, e nosso testemunho poderá ser uma bênção para os que nos rodeiam. Porque o fato de alegrar-nos verdadeiramente da comunhão com o Senhor produz um efeito em nossa vida cotidiana. “Reconheceram que eles haviam estado com Jesus” (At 4.13) – isto foi dito de Pedro e João. Que seja realidade também para cada um de nós.

(Ch. F.)

“As vossas petições sejam em tudo conhecidas diante de Deus pela oração e súplica, com ação de graças. E a paz de Deus, que excede todo o entendimento, guardará os vossos corações e os vossos sentimentos em Cristo Jesus” (Fp 4.6,7).

“Esta é a confiança que temos nele, que, se pedirmos alguma coisa, segundo a sua vontade, ele nos ouve. E, se sabemos que nos ouve em tudo o que pedimos, sabemos que alcançamos as petições que lhe fizemos” (1Jo 5.14,15).

Essas passagens nos lembram primeiramente aquele em quem cremos (2Tm 1.12). Nossa fé se apoia nas promessas. Mas o valor de uma promessa está ligado à natureza de quem a fez. Pedro fala de “grandíssimas e preciosas promessas” (2Pe 1.4), pois é um grande Deus quem as fez, e elas têm Cristo como garantia, precioso para o coração de Deus e do crente.

A vontade divina – boa, agradável e perfeita – molda nosso entendimento e nos conduz a fazer petições sábias, de modo que possam ser ouvidas por Deus. Entre os versículos 14 e 15 de 1João 5 é possível que transcorra certo tempo, apropriado para exercer a paciência da fé. Mas a fé tem o privilégio de considerar a coisa pedida como já outorgada. Os verbos nos versículos estão no presente: desde o momento em que a petição foi apresentada, sabemos que temos as coisas que pedimos.

(J. K.)

(Traduzido por Francisco Nunes de Un mensaje bíblico para todos, 09/2014, publicado por Ediciones Bíblicas Para Todos (Suíça). Este artigo pode ser distribuído e usado livremente, desde que não haja alteração no texto, sejam mantidas as informações de autoria e de tradução e seja exclusivamente para uso gratuito.)

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Vida cristã

Um bolo pequeno

“Faze dele primeiro para mim um bolo pequeno” (1Rs 17.13).

A época era sombria. Por causa dos pecados de Acabe, rei de Israel, a fome assolava o país. O profeta de Deus permanecia escondido, assim como outros cem profetas. Além disso havia entre o povo sete mil homens conhecidos somente por Deus que não haviam dobrado os joelhos diante de Baal, o falso deus (19.18).

Os recursos faltavam por todo lado; no entanto, em uma família fora dos limites do país, não o alimento diário para toda a casa. Durante todo um ano, “da panela a farinha não se acabou e da botija o azeite não faltou, conforme a palavra do Senhor, que Ele falara pelo ministério de Elias” (v. 16). De onde provinha essa abundância? Era claramente uma bênção material; no entanto, segundo os ensinamentos da Palavra de Deus, podemos tomá-la em seu aspecto espiritual: a farinha nos lembra das perfeições do Senhor Jesus; o azeite é figura do Espírito Santo.

Por que justamente nessa casa, ao contrário de tantas outras, havia alimento e sustento? Um dia, o homem de Deus havia encontrado essa viúva e lhe havia pedido um pouco de água e um pedaço de pão. A água escasseava, mas ela estava disposta a dá-la; no entanto, o pão faltava totalmente. Ela não tinha mais que um punhado de farinha e um pouco de azeite. Assim, a morte os esperava, a ela e a seu filho. O profeta lhe disse: “Faze dele primeiro para mim um bolo pequeno e traze-mo aqui” (v. 13). Como? Desse pouco que lhe sobrava, de seus últimos recursos, devia preparar algo para o profeta, sem deixar nada para ela e seu filho? Sim, e era necessária a fé, a fé na palavra de Deus pronunciada por Seu servo. “Ela foi e fez conforme a palavra de Elias” (v. 15). Esse foi o segredo da bênção.

“Faze dele primeiro para mim um bolo pequeno”. O Senhor não nos tem feito freqüentemente este pedido? “Ao começar o dia, reserva primeiramente um momento para estar a Meus pés e ouvir Minha voz; para fazer silêncio e dizer como outrora disse o jovem Samuel: ‘Fala, porque o Teu servo ouve’ (1Sm 3.10)”. E no transcorrer de nossas ocupações comuns, provavelmente temos ouvido com freqüência uma voz nos dizer: “Você pensa primeiramente no Senhor?” Pode tratar-se de um assunto relativo à retidão, de realizar um trabalho com esmero, de prestar um serviço a favor de alguém, de pronunciar uma palavra ou, antes, de calar. Busquemos primeiramente a vontade do Senhor quando estamos diante de uma escolha, seja para o trabalho profissional ou com relação a reunir-se ao redor do Senhor, fazer um gasto supérfluo ou dedicar esse dinheiro para o Senhor e Sua obra ou a favor de algum necessitado…

“Faze dele primeiro para mim um bolo pequeno”. Parece pouca coisa; no entanto, um punhado de farinha e um pouco de azeite era muito para a viúva, pois era todo o sustento que tinha (comp. Lc 21.4). Quanto o profeta apreciou isso, e muito mais o próprio Deus! “Quem é fiel no mínimo, também é fiel no muito; quem é injusto no mínimo, também é injusto no muito” (16.10). Pode ser um escrito, uma palavra, uma oração que primeiramente tivemos o desejo de apresentar a Ele. E, se não tomamos o cuidado de fazê-lo, que perda!

A entrega de si mesmo nada mais é do que o simples fato de pôr à disposição constante de Deus aquilo que Lhe pertence.

Faze dele primeiro para mim um bolo pequeno”. “Eu te mostrarei a minha fé pelas minhas obras” (Tg 2.18). É bom, sem dúvida, expressar sua confiança em Deus, cantar hinos que celebrem Sua bondade e Sua fidelidade, mas a fé não consiste somente em palavras: ela se traduz em atos. Por exemplo: um jovem, em meio a seus estudos na época de provas, consagrará o domingo, dia do Senhor, ao Senhor ou aos estudos? Se ele dá provas de sua fé entregando primeiramente a Deus o lugar que Lhe pertence e deixando seu próprio trabalho para os dias da semana, certamente ele será recompensado. À primeira vista, é uma perda, como parecia acontecer com a farinha e o azeite da viúva. Mas Deus pode resolver uma prova ou um trabalho igual ou melhor se, por a Ele, Lhe é reservado o tempo que Ele pede, mesmo que essas horas tenham sido “perdidas” no que diz respeito ao estudo.

“Faze dele primeiro para mim um bolo pequeno”. Pela voz do profeta ouvimos a voz do Senhor e Seu desejo de que façamos primeiramente para Ele. As Escrituras relatam que os macedônios “se deram primeiramente ao Senhor” (2Co 8.5). Este é o ponto importante do assunto: “Dá-me, filho meu, o teu coração” (Pv 23.26). O punhado de farinha e o azeite no fundo de uma vasilha representavam todos os recursos da viúva. Dando-os primeiramente ao profeta, a viúva não tinha nada além da morte diante dela… ou a salvação de Deus. De fato, colocando-nos verdadeira e inteiramente à disposição do Senhor Jesus, conscientes de que fomos “comprados por preço” (1Co 6.20), parece que perdemos a vida ao entregá-la ao Senhor, mas “qualquer que quiser salvar a sua vida perdê-la-á, mas, qualquer que perder a sua vida por amor de mim e do evangelho, esse a salvará” (Mc 8.35). E essa entrega de si mesmo (que nada mais é do que o simples fato de pôr à disposição constante de Deus aquilo que Lhe pertence) se traduzirá, não por explosões de entusiasmo ou por sonhos de missões em terras distantes, mas pelo primeiro lugar que corajosamente Lhe daremos nos detalhes de nossa vida. Talvez seja um “bolo pequeno”, mas é o segredo da bênção que nos acompanhará dia após dia até que, tendo passado a “fome”, entraremos na casa do Pai.

G. A.

Para que em tudo [Jesus Cristo] tenha a preeminência” (Cl 1.18).

Quando Deus nos pede que façamos qualquer coisa (como, neste caso, a de alimentar o profeta Elias), ao mesmo tempo nos dá tudo o que é necessário para cumprir. Mas deve-se estar disposto a fazer primeiramente e sem discutir o que Deus pede. É o que nos ensina esse pequeno bolo, prova da fé daquela mulher e “primícias” de uma abundância divina em sua casa.

J. Kn.

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Devoção

Devoção demanda entrega total

A devoção se caracteriza pelo fato de não estar condicionada à necessidade, como a obediência. Ela é o resultado de um impulso do coração, do centro das inclinações e dos motivos profundos. Não é a resposta a um mandamento, e se encontra acima de toda forma de subordinação, quer seja a vontade de outra pessoa ou a obrigação que se deriva de um relacionamento.

A devoção de Cristo

“Cristo […] pelo Espírito eterno se ofereceu a Si mesmo imaculado a Deus” (Hb 9.14). Eis aqui a expressão da maravilhosa devoção que fez Cristo agir voluntariamente e que revelou, assim, o motivo profundo de Seu coração: “Deleito-Me em fazer a Tua vontade, ó Deus Meu” (Sl 40.8).

Essa maneira espontânea de nosso Senhor agir, seguindo o movimento de Seu próprio coração, é o pensamento dominante do Evangelho de João. Encontramos ali a obra da cruz sob o caráter do holocausto. “Por isto o Pai Me ama, porque dou a Minha vida para tornar a tomá-la. Ninguém ma tira de Mim, mas Eu de Mim mesmo a dou” (Jo 10.17,18). A morte do Senhor era necessária para nossa salvação, ambas são inseparáveis; mas o motivo específico do Evangelho de João é a devoção do Senhor. O holocausto evoca o que Deus encontrou na morte do Senhor, esse “cheiro suave” (Ef 5.2) que somente Ele podia apreciar e que, de uma maneira muito especial, respondia a Seu amor.

João 10 registra o restante do que o Senhor disse: “Tenho poder para a dar e poder para tornar a tomá-la. Este mandamento recebi de Meu Pai” (v. 18). Em virtude de Sua divindade, o Senhor era completamente livre com respeito à morte e à ressurreição, mas não fez nada de sua própria autoridade. Por isso, fala de um “mandamento”. Mas Seu ato de devoção se cumpria no perfeito acordo de Seu coração com o do Pai. Foi isso que o caracterizou em Sua vida de homem na terra.

A devoção de três valentes

Davi havia sido ungido rei, mas ainda não havia subido ao trono. Tinha de sofrer ainda a hostilidade de Saul e, além disso, lutar continuamente contra os filisteus para defender o povo de Deus. Um dia, durante o calor do tempo da sega, teve o desejo de beber da água do poço de seu povoado natal, ocupado pelos filisteus naquele momento, e deixou escapar as palavras: “Quem me dera beber da água da cisterna de Belém, que está junto à porta!” (2Sm 23.15). Três de seus homens o ouviram e, sem que ele os houvesse mandado, irromperam pelo acampamento dos filisteus e lhe trouxeram água daquele poço.

Por que essa água? Não havia água para tomar em outro lugar? Eles não se fizeram essas perguntas, pois, onde há verdadeira devoção, não é preciso fazer perguntas. Davi sentiu profundamente essa devoção. Viu nessa água a vida de seus companheiros, que a expuseram por ele. Por isso, “derramou-a perante o Senhor” (v. 16). E podemos estar certos de que seus homens o compreenderam muito bem. Precisamente porque essa água era preciosa para Davi, ela pertencia a Deus. Muitos anos depois, o Espírito Santo dá deles este testemunho eterno: “Isto fizeram aqueles três poderosos” (v. 17).

Onde há verdadeira devoção, não é preciso fazer perguntas.

Mas notemos ainda isto: se a devoção não tem relação com a necessidade, isso não quer dizer que o ato em si seja inútil. Não foi inútil regozijar o coração de Davi, o que é manifestado pelo testemunho do Espírito Santo. Também não foi inútil o ato de Maria quando derramou sobre o Senhor Jesus um perfume de nardo puro de muito preço, mesmo que alguns considerassem isso um desperdício (Jo 12.3-5).

A devoção do apóstolo Paulo

“Eu de muito boa vontade gastarei e me deixarei gastar por vossa alma, ainda que, amando-vos cada vez mais, seja menos amado” (2Co 12.15).

Se houve um servo do Senhor do qual podemos aprender o que seja um serviço de devoção, é o apóstolo Paulo. Desde o dia em que o Senhor glorificado lhe apareceu na estrada de Damasco, para ele viver nada mais era que Cristo. Em Paulo, encontramos todas as virtudes de um servo: o amor pelo Senhor e pelas almas, o zelo, a perseverança, a humildade… Estava pronto para sofrer e para dar tudo o que tinha e era. Nele havia uma devoção sem limites.

A devoção do servo: a devoção que entrega tudo, incluindo a si mesmo; não espera nada e, como conseqüência, está acima de toda decepção.

Paulo era plenamente consciente de que “cada um receberá de Deus o louvor” (1Co 4.5), e essa aprovação orientava sua vida. A idéia do tribunal de Cristo o motivava a procurar ser agradável a Deus (2Co 5.9,10). E a coroa da justiça que receberia naquele dia era um consolo para a última e difícil etapa de sua carreira na terra (2Tm 4.8). Mas jamais a aprovação dos homens.

O versículo citado mais acima é uma palavra especialmente comovente que Paulo escreveu aos coríntios, os quais lhe causavam tanta preocupação. Talvez seja a mais emocionante que ele tenha escrito sobre si mesmo, pelo menos nessa carta que, do princípio ao fim, é um combate para ganhar o corações dos coríntios. Aqui vemos a devoção do servo: a devoção que entrega tudo, incluindo a si mesmo; não espera nada e, como conseqüência, está acima de toda decepção. “Meu galardão [está] perante o Meu Deus”: essa palavra de Isaías 49.4, que aplicamos com gosto ao Senhor Jesus, também pode ser aplicada ao apóstolo Paulo.

 

(E. E. Hücking. Traduzido por Francisco Nunes de “Devoción”, da revista Creced 1/2015, publicada por Ediciones Bíblicas, da Suíça. Você pode usar esse artigo desde que não o altere, não omita a autoria, a fonte e a tradução e o use exclusivamente de maneira gratuita. Preferencialmente, não o copie em seu sítio ou blog, mas coloque lá um link que aponte para o artigo.)

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Pecado Salvação Sexo Sociedade

Teologia bíblica e crise de sexualidade

(Albert Mohler Jr.)

A sociedade ocidental experimenta, atualmente, o que pode se chamar de fato uma revolução moral. O código moral de nossa sociedade e a avaliação ética coletiva acerca de uma questão particular sofreram não apenas pequenos ajustes, mas uma completa inversão. O que antes era condenado, agora, é celebrado; e a recusa a celebrar, agora, é condenada.

O que torna a presente revolução sexual e moral tão diferente das revoluções morais anteriores é que ela está acontecendo a uma velocidade absolutamente sem precedentes. As gerações anteriores experimentaram revoluções morais ao longo de décadas, até mesmo séculos. A presente revolução está acontecendo à velocidade da luz.

À medida que a igreja responde a essa revolução, devemos nos lembrar de que os atuais debates acerca da sexualidade apresentam à igreja uma crise que é irredutível e inescapavelmente teológica. A crise é equivalente ao tipo de crise teológica que o gnosticismo apresentou à igreja primitiva, ou que o pelagianismo apresentou à igreja no tempo de Agostinho. Em outras palavras, a crise da sexualidade desafia o entendimento da igreja acerca do evangelho, do pecado, da salvação e da santificação. Advogados da nova sexualidade exigem uma completa reescrita da metanarrativa da Escritura, uma completa reordenação da teologia, uma mudança fundamental em como nós pensamos o ministério da igreja.

“Transgênero” está na concordância bíblica?

Textos-prova são a primeira reação de protestantes conservadores em busca de uma estratégia de resistência e reafirmação teológica. Essa reação hermenêutica ocorre naturalmente com os cristãos evangélicos porque nós cremos na Bíblia como a inerrante e infalível Palavra de Deus. Nós entendemos, como B.B. Warfield disse, que “quando a Escritura fala, Deus fala”. Eu devo deixar claro que essa reação não é inteiramente errada, mas também não é inteiramente certa. Não é inteiramente errada porque certas Escrituras (isto é, “textos-prova”) falam acerca de questões específicas de um modo direto e identificável.

Contudo, existem óbvias limitações a esse tipo de método teológico – o que eu gosto de chamar de “reação da concordância bíblica”. O que acontece quando você lida com uma questão teológica para a qual nenhuma palavra correspondente aparece na concordância? Muitas das questões teológicas mais importantes não podem ser reduzidas meramente a encontrar palavras relevantes e seus versículos correspondentes em uma concordância bíblica. Tente encontrar “transgênero” em sua concordância. Que tal “lésbica”? Ou “fertilização in vitro”? Elas certamente não estão no final da minha Bíblia.

Não é que a Escritura seja insuficiente. O problema não é uma falha da Escritura, mas uma falha de nossa abordagem da Escritura. A abordagem-concordância da teologia produz uma Bíblia rasa, sem contexto, sem aliança ou pacto, sem uma narrativa principal – três fundamentos hermenêuticos essenciais para entender a Escritura corretamente.

Uma teologia bíblica do corpo

A teologia bíblica é absolutamente indispensável para que a igreja molde uma resposta apropriada à presente crise sexual. A igreja precisa aprender a ler a Escritura de acordo com o seu contexto, envolta em sua narrativa principal e progressivamente revelada em linhas pactuais. Nós precisamos aprender a interpretar cada questão teológica por meio da metanarrativa bíblica da criação, queda, redenção e nova criação. Especificamente, os evangélicos precisam de uma teologia do corpo que esteja ancorada no próprio desvelar do drama da redenção ao longo da Bíblia.

Criação

Gênesis 1.26-28 indica que Deus criou o homem – diferentemente do resto da criação – à sua própria imagem. Essa passagem também demonstra que o propósito de Deus para a humanidade era uma existência corporal. Gênesis 2.7 também enfatiza esse ponto. Deus criou o homem do pó da terra e, depois, soprou nele o fôlego de vida. Isso indica que éramos corpo antes de sermos pessoa. O corpo, como se vê, não é incidental à nossa personalidade. Adão e Eva recebem a comissão de multiplicarem-se e sujeitarem a terra. Os seus corpos lhes permitem, pela criação de Deus e por seu plano soberano, cumprirem aquele mandato como portadores da imagem divina.

A narrativa de Gênesis também sugere que o corpo vem com necessidades. Adão sentiria fome, então Deus lhe deu o fruto do jardim. Essas necessidades revelam, no bojo da ordem criada, que Adão é um ser finito, dependente e derivado.

Além disso, Adão teria a necessidade de companhia, então Deus lhe deu uma esposa, Eva. Tanto Adão como Eva deveriam cumprir o mandato de multiplicar-se e encher a terra com portadores da imagem divina, mediante o uso apropriado das habilidades reprodutivas com as quais foram criados. Ligado a isso está o prazer corporal que ambos experimentariam ao se tornarem uma só carne – isto é, um só corpo.

A narrativa de Gênesis também demonstra que o gênero é parte da bondade da criação de Deus. Gênero não é meramente uma construção sociológica imposta a seres humanos que, de outro modo, poderiam negociar um número indefinido de permutas.

Ao contrário, Gênesis nos ensina que o gênero é criado por Deus para o nosso bem e para a sua glória. O gênero é planejado para o florescimento humano e é estabelecido pela determinação do Criador – assim como ele determina quando, onde e que nós devemos existir.

Em suma, Deus criou sua imagem como uma pessoa corpórea. Como seres corpóreos, recebemos do próprio Deus o dom e a mordomia da sexualidade. Nós somos feitos de um modo que testifica os propósitos de Deus a esse respeito.

Gênesis também molda toda essa discussão em uma perspectiva pactual. A reprodução humana não é simplesmente para propagar a raça. Em vez disso, a reprodução enfatiza que Adão e Eva devem multiplicar-se a fim de encher a terra com a glória de Deus refletida nos portadores de sua imagem.

Queda

A queda, o segundo movimento na história da redenção, corrompe a boa dádiva divina do corpo. A entrada do pecado traz a mortalidade ao corpo. Em termos de sexualidade, a Queda subverte os bons planos de Deus para a complementaridade sexual. O desejo de Eva é de dominar o seu marido (Gênesis 3.16). A liderança de Adão será cruel (3.17-19). Eva experimentará dor ao dar à luz filhos (3.16).

As narrativas que seguem demonstram o desenvolvimento de práticas sexuais aberrantes, desde a poligamia até o estupro, as quais a Escritura aborda com notável franqueza. Esses relatos em Gênesis são seguidos pela entrega da Lei, a qual é planejada para refrear o comportamento sexual aberrante. Ela regula a sexualidade e as expressões de gênero ao fazer pronunciamentos claros acerca da moralidade sexual, travestismo[1], divórcio e uma miríade de outras questões corporais e sexuais.

O Antigo Testamento também associa o pecado sexual à idolatria. Adoração por meio de orgias, prostituição cultual e outras horrendas distorções da boa dádiva divina do corpo são todas vistas como parte da adoração idólatra. As mesmas associações são feitas por Paulo em Romanos 1. Havendo mudado “a glória do Deus incorruptível em semelhança da imagem de homem corruptível, bem como de aves, quadrúpedes e répteis” (Romanos 1.23), e havendo mudado “a verdade de Deus em mentira, adorando e servindo a criatura em lugar do Criador” (Romanos 1.25), homem e mulher mudaram suas relações naturais um com o outro (Romanos 1.26-27).

Redenção

No tocante à redenção, precisamos notar que um dos mais importantes aspectos de nossa redenção é que ela vem por meio de um Salvador com um corpo. “E o Verbo se fez carne e habitou entre nós” (João 1.14; cf. Filipenses 2.5-11). A redenção humana é realizada pelo Filho de Deus encarnado – que permanece encarnado eternamente.

Paulo indica que esta salvação inclui não meramente a nossa alma, mas também o nosso corpo. Romanos 6.12 fala do pecado que reina em nosso “corpo mortal” – o que implica a esperança da futura redenção corporal. Romanos 8.23 indica que parte de nossa esperança escatológica é a “redenção do nosso corpo”. Mesmo agora, em nossa vida de santificação, nós somos ordenados a apresentar o nosso corpo como um sacrifício vivo a Deus, em adoração (Romanos 12.1). Além disso, Paulo descreve o corpo redimido como um templo do Espírito Santo (1Coríntios 6.19) e, claramente, devemos entender a santificação como tendo efeitos sobre o corpo.

A ética sexual no Novo Testamento, assim como no Antigo, regula as nossas expressões de gênero e sexualidade. Porneia, a imoralidade sexual de qualquer espécie, é categoricamente condenada por Jesus e os apóstolos. Semelhantemente, Paulo claramente indica à igreja de Corinto que os pecados sexuais – pecados cometidos no corpo (1Coríntios 6.18) – são o que traz má reputação à igreja e ao evangelho, porque proclamam ao mundo que nos observa que o evangelho não possui qualquer eficácia (1Coríntios 5-6).

Nova criação

Finalmente, chegamos ao quarto e último ato do drama da redenção – a nova criação. Em 1Coríntios 15.42-57, Paulo nos aponta não apenas a ressurreição de nosso próprio corpo na nova criação, mas também o fato de que a ressurreição corporal de Cristo é a promessa e o poder dessa esperança futura. Nossa ressurreição será a experiência da glória eterna, no corpo. Esse corpo será uma continuação transformada e consumada da nossa existência corporal presente, do mesmo modo como o corpo de Jesus é o mesmo corpo que ele possuía na terra, embora absolutamente glorificado.

A nova criação não será simplesmente uma recomposição do jardim. Será melhor do que o Éden. Como Calvino observou, na nova criação, nós conheceremos a Deus não apenas como Criador, mas como Redentor – e essa redenção inclui nosso corpo. Reinaremos com Cristo corporalmente, assim como ele também está reinando corporalmente como o Senhor do cosmo.

Em termos de nossa sexualidade, embora o gênero permaneça na nova criação, o mesmo não ocorrerá com a atividade sexual. Não é que o sexo seja nulificado na ressurreição; em vez disso, ele é cumprido. A ceia escatológica de casamento do Cordeiro, para a qual o casamento e a sexualidade apontam, terá finalmente chegado. Nunca mais haverá qualquer necessidade de encher a terra com portadores da imagem divina, como era o caso em Gênesis 1. Em vez disso, a terra estará cheia do conhecimento da glória de Deus, como as águas cobrem o mar.

A indispensabilidade da teologia bíblica

A crise da sexualidade tem demonstrado o fracasso do método teológico adotado por muitos pastores. A “reação da concordância” simplesmente não pode alcançar o tipo de pensamento teológico rigoroso que se exige nos púlpitos hoje. Pastores e igrejas devem aprender a indispensabilidade da teologia bíblica e devem praticar a leitura da Escritura de acordo com a sua própria lógica interna – a lógica de uma história que se move da criação para a nova criação. A tarefa hermenêutica diante de nós é imensa, mas é também indispensável para um fiel engajamento evangélico com a cultura.

Notas:

[1]: N.T.: Usar roupas do sexo oposto.

Tradução: Vinícius Silva Pimentel
Revisão: Vinícius Musselman Pimentel

(O leitor tem permissão para divulgar e distribuir esse texto, desde que não altere seu formato, conteúdo e/ou tradução e que informe os créditos tanto de autoria, como de tradução e copyright. Em caso de dúvidas, faça contato com a Editora Fiel.)

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Firme e fiel como Daniel

(G. Setzer)

O profeta Daniel é mencionado na Bíblia, pela primeira vez, quando era ainda adolescente. E desaparece do cenário bíblico quando já era muito idoso. Durante os anos de seu cativeiro em Bailônia, Daviel viveu muitas experiências difíceis. Mas há algo que sempre o caracterizou: sua fidelidade a Deus.

Neste artigo, veremos como o profeta Daniel deu provas de sua fé nas diferentes e duras etapas pelas quais teve de passar.

Tempos de exaltação: Em primeiro lugar, Daniel pertencia à linhagem real, era bem aparentado e inteligente. Mas a beleza não era só física, pois também manifestava uma atitude interior excelente: desde jovem se mostrava diligente, idôneo e trabalhador (Dn 1.3,4).

Tempos de humilhação: Mas este jovem cheio de esperança foi deportado para o cativeiro babilônico. Mesmo como escravo em um país estrangeiro, ele dá grande importância à lei de seu Deus. Por isso, propõe no coração não se contaminar com comidas nem bebidas, mesmo que fossem os finos manjares do rei (vv. 6-16).

Exaltação: Ao fim de uma preparação de três anos em Babilônia, Daniel presta o exame final diante do grande rei Nabucodonosor e supera em dez vezes os intelectuais babilônicos (vv. 17-21).

Humilhação: Pouco depois, Daniel é um condenado à morte: Nabucodonosor decide matar a todos os sábios de Babilônia porque são incapazes de contar-lhe o sonho que tivera e de interpretá-lo. Ao tomar conhecimento da terrível ordem, Daniel reage com tranqüilidade e com sensatez: reúne-se com seus amigos e ora a Deus. Então, o Senhor lhe revela o sonho do rei e sua interpretação. Quando explica tudo a Nabucodonosor, ele o faz humildemente e dá a honra somente a Deus (2.1-45).

Exaltação: Pelo fato de Daniel ter interpretado o sonho de Nabucodonosor, este o enaltece: coloca-o por governador sobre toda a província de Babilônia e o promove a chefe supremo de todos os seus sábios (vv. 46-49). No entanto, essa ascensão não lhe sobe à cabeça. Na primeira ocasião, vemos que atesta fielmente a verdade a Nabucodonosor e não teme anunciar-lhe o juízo de Deus (4.1-24).

Humilhação: Depois da morte de Nabucodonosor, Daniel cai no esquecimento: Belsazar, neto de Nabucodonosor, não o conhece (5.7-12). No entanto, durante o tempo em que Daniel não é mais o centro da atenção e do poder, vive em íntima comunhão com Deus e recebe Dele profecias grandiosas (7.1ss; 8.1ss. No livro de Daniel, os acontecimentos nem sempre são narrados na ordem cronológica. Isso pode ser visto claramente nas indicações de tempo no começo dos capítulos em questão.). Quando Daniel é levado à presença de Belsazar para interpretar uma misteriosa escritura que apareceu na parede, anuncia, de novo, fiel e valentemente, a mensagem do juízo divino (5.17-28).

Exaltação: O rei Belsazar ficou impressionado com a interpretação que Daniel lhe dá da escritura divina na parede. Então, ordena que ele seja vestido de púrpura, que se lhe ponham um colar de ouro no pescoço e proclamem que ele é o terceiro senhor do reino de Babilônia (5.29). Mas Daniel não se deixa impressionar com as homenagens daquele homem mau.

Humilhação: Essa exaltação dura muito pouco tempo, pois nessa mesma noite Babilônia foi conquistada pelos medo-persas. Assim, o poder de Daniel é anulado. Mas o profeta também permanece fiel durante o reinado de Dario, da Média, que estava envolvido na conquista de Babilônia. No primeiro ano do reinado de Dario, Daniel estudava diligentemente as Santas Escrituras e compreendeu que o cativeiro de 70 anos dos judeus estava prestes a chegar ao fim (9.1ss).

Exaltação: Por esse tempo, Dario estabeleceu 120 sátrapas para que administrassem o reino, e, sobre eles, três governadores, dos quais um era Daniel. Nessa posição, Daniel também se comportou impecavelmente e superou a todos os seus companheiros e súditos, o que despertou a inveja daqueles governadores (6.1-10).

Humilhação: Os invejosos conseguiram fazer com que Dario promulgasse um edito insolente: por trinta dias, ninguém podia fazer qualquer petição a “qualquer deus ou homem” que não fosse o próprio rei. Era uma armadilha astuta em que aquele que orava fielmente a seu Deus cairia, pensaram os governadores e os sátrapas. E, de fato, com as janelas abertas para o lado de Jerusalém, Daniel continuava orando três vezes ao dia e expunha suas petições diante de Deus. Como castigo, foi lançado na cova dos leões. O ponto mais humilhante de sua vida havia chegado. Mas, também nesse momento, confia em Deus, e um anjo enviado pelo Senhor fecha a boca dos leões famintos (vv. 11-23).

Exaltação: Dario se alegra em ver que Deus havia livrado dos animais selvagens o melhor homem de seu reino, e ordena que o Deus de Daniel fosse reconhecido em toda a terra. Após isso, o nome de Daniel é mencionado esparsamente, e ele tem êxito durante o reinado de Dario e o de Ciro (vv. 26-29). A glória não mudou de nenhuma maneira a atitude desse servo de Deus: ele continuou andando com Deus incansavelmente. Deus pôde revelar-se novamente a ele, como mostram os capítulos 10 e 11.

Humilhação: Por fim, em Daniel 12, vemos sua última “humilhação”: sua morte. “Tu, porém, vai até o fim” (v. 13). Estamos convencidos de que o “homem muito amado” (10.11) viveu para Deus até seu último suspiro.

Exaltação: Mas sua história ainda não terminou. “E te levantarás na tua herança, no fim dos dias” (12.13). O livro termina mencionando a exaltação definitiva de Daniel. Na ressurreição, ele será recompensado por sua fidelidade e consagração, por sua firmeza e perseverança.

Nós nunca estivemos numa cova de leões, tampouco reinamos sobre nações; no entanto, na vida de cada um também há tempos bons e tempos ruins. Nossas circunstâncias variam, as situações mudam, mas uma coisa deve nos caracterizar constantemente: nossa fidelidade, assim como a vista em Daniel.

Você está bem e tem sucesso? Então, não se afaste ingratamente de seu Senhor. Sua vida está num vale contínuo? Descanse em Deus e não perca a confiança. Animemo-nos todos com o testemunho de Daniel, para que marchemos com fidelidade imperturbável.

(Traduzido por Francisco Nunes de “Firme y fiel como Daniel”, Un mensaje bíblico PARA TODOS, no. 01/2015. Publicado na Suíça por Ediciones Bíblicas PARA TODOS. Esse artigo pode ser reproduzido, desde que não haja alteração, sejam conservadas as informações de autoria e de tradução e seja usado exclusivamente de modo gratuito.)

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Andrew Murray Encorajamento Vida cristã

Deus aceita sua entrega (Andrew Murray)

Deus a opera no secreto de nosso coração, Deus exorta-nos, pelo poder oculto de Seu Espírito Santo, a vir e falar dela, e nós temos de trazer e dar a Ele essa entrega absoluta. Mas lembre-se: quando você vir e trouxer a Deus a entrega absoluta, isso pode, conforme seus sentimentos ou sua consciência avançam, ser algo de grande imperfeição, e você pode duvidar, hesitar e perguntar-se: “É absoluta?”

Mas, oh, eu lembro que houve uma vez um homem a quem Cristo disse: “Se tu podes crer, tudo é possível ao que crê.” E o coração do homem estava com medo, e ele gritou: “Senhor, eu creio! Ajuda a minha incredulidade.”

Essa foi uma fé que triunfou sobre o diabo, e o espírito maligno foi expulso. E, se você disser: “Senhor, eu me entrego em entrega absoluta a meu Deus”, mesmo que seja com um coração trêmulo e com a consciência que diga: “Eu não sinto o poder, eu não sinto a determinação, eu não sinto a certeza”, ela será realizada. Não tema, mas apenas venha como você é, e até mesmo no meio de seu tremor o poder do Espírito Santo irá operar.

Você ainda não aprendeu a lição de que o Espírito Santo trabalha com grande poder enquanto, no lado humano, tudo parece fraco? Olhe para o Senhor Jesus Cristo no Getsêmani. Nós lemos que Ele, “pelo Espírito eterno”, ofereceu a Si mesmo como sacrifício a Deus. O Todo-poderoso Espírito de Deus estava habilitando-O a fazê-lo. E, ainda que agonia, medo e excessiva tristeza tenham se apoderado Dele, como Ele orou! Externamente, você pode não ver sinal algum do grande poder do Espírito, mas o Espírito de Deus estava ali. Do mesmo modo, quando você estiver fraco e lutando e tremendo, com fé na operação oculta do Espírito de Deus, não tenha medo, mas renda-se.

E quando você entregar-se em absoluta rendição, faça-o na fé de que Deus irá aceitá-la. Este é o grande ponto, e é isso que tantas vezes esquecemos: que os crentes devem estar ocupados com Deus neste assunto de rendição. Eu oro para que você esteja ocupado com Deus. Queremos obter ajuda, cada um de nós, de modo que em nossa vida diária Deus seja claramente por nós, que tenha o lugar correto e seja “tudo em todos”. E, se quisermos ter isso ao longo da vida, vamos começar agora e olhar para longe de nós mesmos e olhar para Deus. Que cada um creia que, mesmo sendo um pobre verme na terra e um temeroso filho de Deus, cheio de falhas e de pecado e de medo, ajoelhando-se aqui, e ninguém sabendo o que se passa em seu coração, e, na simplicidade, disser: “Ó Deus, eu aceito Teus termos; tenho implorado por bênção para mim e para os outros, eu aceitei a Teus termos para a rendição absoluta – enquanto seu coração diz isso em profundo silêncio, lembre-se de que existe um Deus presente que toma nota disso e o escreve em Seu livro, que existe um Deus presente que naquele exato momento toma posse de você. Você pode não sentir isso, você pode não perceber isso, mas Deus toma posse, se você confiar Nele.

Deus não só vindica minha rendição, e a opera e a aceita quando levo a Ele, mas Ele a mantém.

(Traduzido de God Accepts Your Surrender por Francisco Nunes. O uso deste artigo é livre desde que seja feito de forma gratuita, conservando-se as informações de autoria, tradução e endereço do original, sem alterações no texto.)

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A Palavra (Steven Lawson)

Quanto mais fundo cavarmos na Palavra, mais elevada será nossa adoração e mais perseverantes seremos nas provações.

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Um pensamento sobre a comunhão cristã

Recentemente, num domingo à tarde, rodeado de muitos amados irmãos, enquanto eu lavava louça me vieram dois pensamentos.

1) Nosso ajuntamento cristão não tem aquilo que o mundo tem.
Quando cristãos – e aqui me refiro a cristãos sérios, bíblicos, que levam a santidade a sério, que têm temor do Senhor, que honram Seu nome por meio do viver prático que têm – estão juntos, em ambiente informal (num almoço ou numa convivência, por exemplo), não há aquilo que caracteriza eventos mundanos semelhantes: bebedeira, palavrões, insinuações maldosas, piadas de baixo calão, fofocas, adultérios, crianças largadas a si mesmas, etc. Cristãos que honram a Deus em todos os aspectos da vida, começando com a linguagem, reúnem-se e conversam amenidades, trocam idéias sobre as questões mundiais, dicas sobre educação de filhos, riem de si mesmos, buscam orientação profissional, trocam receitas, dicas de tratamento médico, corujices sobre os filhos… É aquilo que chamam de ambiente saudável.

Isso é, sem dúvida, para quem teme a Deus, mil vezes melhor do que um ambiente mundano. (Infelizmente, sei de muitos cristãos que se sentem completamente à vontade em ambientes mundanos, que os preferem àqueles “crentes”, que estão plenamente conformados a este mundo, pensando, falando, rindo e vivendo como se a ele pertencessem.) Há ali segurança, respeito mútuo, alegria saudável, domínio próprio, ambiente propício para as crianças e tantas outras vantagens. É muito bom, é muito vantajoso estar em um lugar assim. E eu estava alegre com essa percepção e grato a Deus por estar ali.

Mas algo mais me veio ao coração:

2) Mas será que nosso ajuntamento cristão tem aquilo que o mundo não tem?
Isso me foi um choque instantâneo. O que há de distintivo, único, exclusivo dos cristãos? O que há nos cristãos que não há, de modo algum, naqueles que não obedecem à fé? A presença do Senhor Jesus, por meio do Espírito; a vida de Cristo Jesus habitando naqueles que Lhe pertencem. E é isto que faz a verdadeira e prática comunhão cristã: Cristo ser “servido” pelos cristãos uns aos outros. Quando Cristo é nosso centro e a esfera de nossa comunhão, podemos dizer que, de fato, estamos em comunhão. Do contrário, teremos, talvez, apenas um bom ajuntamento cristão (que, repito, é muito melhor do qualquer ambiente mundano).

Mas, tenho de reconhecer, é tão difícil termos genuína comunhão! É tão difícil sairmos da esfera natural, das coisas desta vida, e partilharmos das celestiais, daquilo que é nossa rica herança em Cristo, das riquezas insondáveis Daquele que nos salvou! Parece pouco espontâneo (perdoem-me se generalizo; falo, em primeiro lugar, de mim mesmo) voltar-se de um assunto desta vida para a Bíblia, como se fosse possível mantê-los separados, como se fossem antagônicos.

Como cristãos, temos algo único: um relacionamento vivo e real com Deus por meio de Seu Filho, Jesus Cristo! Isso nenhum ajuntamento secular tem. No entanto, é possível que um ajuntamento de cristãos também não o tenha, caso não falemos entre nós “com salmos, e hinos e cânticos espirituais”, que é modo de nos enchermos do Espírito (Ef 5.19); se não tivermos um falar que denuncie que estivemos com Jesus (At 4.13). Os primeiros discípulos não podiam deixar de falar do que tinham visto e ouvido (4.20). E nós, cristãos do século 21, por que deixamos tão facilmente? É possível que seja resultado de vermos e ouvirmos pouco nosso Senhor, de termos pouca comunhão com Ele, por Sua Palavra não habitar em nós ricamente (Cl 3.16), e como a boca fala do que está cheio o coração…

Os primeiros cristãos caíram na graça de todo o povo (At 2.47), pois seu viver diário e prático não tinha aquilo que o mundo tinha, era distinto, atraente. No entanto, “dos outros [os não-cristãos], porém, ninguém ousava ajuntar-se a eles” (5.13), certamente porque naquele ajuntamento havia algo que no mundo não havia: Deus mesmo, real, manifestado palpavelmente por meio de Seus filhos – um Deus tão santo que não tolerava mentira entre eles (vv. 1-11). As pessoas de fora viam, naquele novo grupo, características que as atraíam, mas viam que havia também uma realidade interior, um padrão dela derivado, que impedia que qualquer um se achegasse e por ali ficasse se não fosse um “deles”, um discípulo, um nascido do alto, um filho de Deus.

No que depender de mim e de você, que tipo de ajuntamento cristão o mundo verá?

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Casamento Conselho aos pais Conselho às mulheres casadas Família

Conselho às mulheres casadas (1)

Se você não tem nada de bom para falar sobre o casamento, cale a boca!

 

Não acabe com o casamento das outras

 

Uns 20 anos atrás conheci dois jovens cristãos; vou chamá-los de Débora e de Moreira (nunca gravei o nome dele). Formavam um daqueles casais de capa de revista de moda, de anúncio de chinelo Havaianas, de comercial de plano de saúde: eram ambos lindos. Ela tinha longos cabelos loiros cacheados, um sorriso contagiante, era simpática ao máximo, cristã séria, nem um pouco exibida por sua beleza. Ele era um cara alto, de ombros largos, um sorriso branquíssimo, amplo, quase infantil de tão sincero, cabelos pretos bem arrumadinhos.

Não lembro exatamente em que ocasião os conheci, mas sei que fui próximo de ambos, principalmente dela, que conviveu mais comigo e com minha esposa a ponto de me chamar de pai. Pois lá estávamos, em uma grande conferência cristã. E lá eles entenderam ser de Deus o que já sentiam um pelo outro, e Moreira pediu a Débora em casamento.

Um dia ou dois depois disso, Débora nos procurou chorando, falando em terminar tudo com o Moreira. Perguntei a razão. “O que as pessoas estão falando! A Sílvia, esposa do presbítero Daniel, me disse que teve um sonho e que isso não é de Deus. E ela é minha amiga! Outras irmãs me disseram que hoje é tudo assim, cheio de amor, porque eu tô bonita, com tudo em cima, mas é só casar, ficar gorda, ter filhos, que a paixão toda vai acabar. Que o Moreira tá bonitão agora, mas é só casar que fica barrigudo, não tem mais carinho, só exigência.” Então, com os olhos vermelhos de chorar, me perguntou: “Será que todo casamento é assim?”

(Eu não recordo as palavras exatas ditas, mas o que ela me disse tinha exatamente esse teor.)

Fiquei furioso! Pensei em distribuir uns murros e uns puxões de cabelo neemiásticos (Ne 13.25) entre aquelas aves agoureiras. Mas preferi, com minha esposa, consolar a Débora.

“Será que todo casamento é assim?”

“Filha, ignore absolutamente o que essas frustradas estão falando. As casadas, por não viverem um casamento decente, satisfatório, por não se empenharem em ter um bom ambiente conjugal, por acharem que é assim mesmo, não conseguem ver um casal feliz sem achar que terá de terminar como elas. As solteiras estão, na verdade, doidinhas pra casar… com o Moreira! Você escolheu o cara; você acha que elas iam deixar barato? O Moreira deve estar ouvindo a mesma coisa por parte daqueles cretinos que estavam de olho em você. Estão torcendo pra vocês dois terminarem pra terem alguma chance. Débora, ignore essas pessoas que não têm um bom casamento porque não querem, porque não se submetem à orientação da Bíblia, porque não dependem do Senhor e de Sua graça, porque não fazem a lição de casa e querem só o bom resultado. Case e esfregue na cara delas, por anos a fio, que é possível, sim, ter um casamento constantemente cheio de alegria, prazer, satisfação mútua, respeito, carinho, doçura.”

(Eu não recordo as palavras exatas ditas, mas o que eu lhe disse tinha exatamente esse teor.)

Eles casaram. Infelizmente, o casamento não durou muito, pois Moreira não obedeceu à ordem bíblica de deixar pãe e mãe: permitiu que sua mãe se intrometesse na vida deles, a tal ponto que tiveram de se divorciar. A essa época, eu já havia perdido o contato com eles e não pude ajudá-los de modo algum. Só fiquei sabendo de tudo muitos anos depois. Mas mesmo isso confirma o que eu havia dito a ela: quem não se submete à orientação bíblica tem um casamento frustrado. Ou arruinado.

Com tristeza eu observo que aquilo que Débora sofreu acontece constantemente hoje em dia entre cristãos. Nada muda: mulheres frustradas com o casamento, em alguma área, em alguma medida, não suportam ver namorados ou recém-casados se acarinhando, se mimamdo, servindo-se mutuamente, sentindo prazer e alegria na presença um do outro, chamando-se de apelidos carinhosos, que logo precisam desfilar sua “experiência” na forma de alertas: “Isso só dura até chegarem os filhos! Ih, isso é fogo de recém-casado! Ainda estão na lua-de-mel, é? Cuidado, hein! Ele tá te explorando, querendo que você faça tudo pra ele. Não seja boba, não. Dê-se valor, minha filha!” E daí para baixo.

Querida irmã casada, vou dizer de novo: se você não tiver nada de bom para falar do casamento, cale a boca! Não peque com a boca (Mt 12.34), não amaldiçoe o relacionamento dos outros, não envenene quem está vivendo o que você gostaria de estar vivendo, mas não quer. Sim, você não quer! (Sei que há as responsabilidades de seu marido, mas falo com ele depois. Estou falando com você agora.) Deus abençoa abundantemente aqueles que se submetem a Sua vontade, que dependem Dele, que fazem o que lhes é exigido. E isso inclui um bom casamento.

Querida irmã casada, vou dizer de novo: se você não tiver nada de bom para falar do casamento, cale a boca!

Paulo escreveu algumas coisas interessantes a Tito, seu cooperador. Ele menciona a “sã doutrina” (1.9) e alerta para aqueles que, em lugar da sã doutrina, ensinam o que não convém (v. 11). Ele diz destes: “Aos quais convém tapar a boca” (v. 11a). No capítulo 2, ele ordena a Tito: “Tu, porém, fala o que convém à sã doutrina” (v. 1). Talvez você esperasse, a seguir, que o apóstolo mencionasse coisas como soteriologia, escatologia, discussão sobre a Trindade divina, mas não é o que ele faz. “As mulheres idosas, semelhantemente, que sejam sérias no seu viver, como convém a santas, não caluniadoras, não dadas a muito vinho, mestras no bem; para que ensinem as mulheres novas a serem prudentes, a amarem seu marido, a amarem seus filhos, a serem moderadas, castas, boas donas de casa, sujeitas a seu marido, a fim de que a palavra de Deus não seja blasfemada” (vv. 3-5; grifos acrescentados).

Leu com atenção? A mulher que já é casada deve ensinar as que casaram há pouco tempo. Se você alegar que a orientação de Paulo é para mulheres idosas e você não se encaixa na categoria, eu lhe pergunto: se você hoje é incapaz de ser um exemplo para as mais novas e continuar alimentando suas frustrações no casamento, será que vai ser diferente quando for mais velha?

Leia com atenção! Amor é coisa que se ensina! E você só pode ensinar o que aprendeu, o que pratica. Como você ama seu marido? Queixando-se dele sempre? Falando mal dele pelas costas? Revelando seus segredos para outras mulheres? Desrespeitando-o diante dos filhos? Ignorando a opinião e a orientação dele? Fazendo greve de sexo como reprimenda por qualquer mágoa não resolvida? É isso que você tem a ensinar àquela mulher ainda apaixonada pelo marido? É assim que você espera que ela proceda futuramente?

Como você ama seus filhos? Apenas dando-lhes presentes? Comprando-lhes o mais cedo possível um celular ou um tablet? Levando-os para a Disney? Mas se você os culpa por terem estragado seu corpo, sua vida sexual com seu marido, suas noites de descanso… Isso é amor? Será que sua atitude com os filhos não é um altissonante recado para as casadas jovens: “Muito cuidado para não procriarem! Vocês vão destruir seu casamento!”?

Amor é coisa que se ensina!

Você leu com atenção? O que você ensina com suas atitudes pode ornar a doutrina de Deus ou pode fazer com que sua Palavra seja blasfemada (vv. 10,5). Seus comentários ácidos, desencorajadores, frutos de sua frustração, blasfemam da Palavra de Deus, a qual dá perfeitas e práticas instruções para um casamento feliz. Sua vida de casamento frustrada está dizendo a todos que a Bíblia mente, que aquilo que ela promete não é realizável, que não passa de um ideal inalcançável. Se você não o tem é porque ainda não fez tudo que devia, não lutou até o sangue contra o pecado (Hb 12.4) da falta de perdão, da falta de submissão, da falta de busca pelo poder do Espírito, da falta de alimentar-se espiritualmente, da falta de alimentar interiormente uma boa disposição com respeito a seu marido e a seus filhos, da preguiça, da má vontade, da ira…

As jovens cristãs precisam ver e ouvir muitas mulheres casadas que, com realidade e satisfação, falem quão bom é estarem casadas, quão satisfeitas estão, quão felizes são por fazerem o que está a seu alcance para satisfazer o marido e os filhos. As jovens cristão precisam ser ajudadas a crer que o casamento não é uma instituição falida, que o sexo sem compromisso não é uma opção, que vale a pena, sim, se guardarem para seu futuro marido. E são as já casadas que podem ensinar isso a elas. Mas, para tal, devem viver o que ensinam. E viver com alegria e satisfação.

Abraço.

(Este artigo inaugura uma sub-categoria de Conselho para os pais. Se você quiser saber a razão desta série de artigos, clique aqui.)

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