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Entrevista sobre cessacionismo e continuismo (Augustus Nicodemus Lopes)

Fiquei imaginando o que eu diria se fosse entrevistado sobre a cessação e a continuação dos dons espirituais mencionados na Bíblia, e daí nasceu esta sessão fictícia de perguntas e respostas. As perguntas estão em negrito e itálico.
Pastor Augustus, os dons espirituais cessaram?
Primeiro é necessário definir a que dons nos referimos. Acredito que o Espírito continua até hoje a conceder à Igreja a maioria dos dons mencionados na Bíblia. Mas, tenho a impressão que outros dons foram concedidos somente por um tempo a determinadas pessoas, para atender aos propósitos de Deus para aquela época. Estes não estariam mais disponíveis hoje. Por isto, é necessário, antes de qualquer coisa, esclarecer a que dons estamos nos referindo quando dizemos que os dons cessaram ou que continuam.
Outra coisa a ser levada em consideração é que, de acordo com a história bíblica, Deus não agiu sempre da mesma maneira em todas as épocas. Há muitas ações miraculosas e sobrenaturais que ocorreram somente uma vez ou durante um tempo específico e não foram repetidas. Portanto, por princípio, devemos admitir que Deus é soberano para agir de diferentes maneiras através da história, e que dentro desta ação, ele concede diferentes dons a diferentes pessoas em diferentes épocas. Assim, não podemos nem restringir a ocorrência de determinados dons somente a um período da história e nem requerer que todos os dons terão necessariamente de ocorrer em todos estes períodos.
Então, você não se definiria como um cessacionista?
Se por cessacionista você quer dizer uma pessoa que não acredita que o Espírito Santo conceda dons espirituais à sua Igreja nos dias de hoje, é claro que não sou cessacionista. Se, por outro lado, um continuísta seria alguém que acredita que todos os dons espirituais mencionados na Bíblia estão disponíveis hoje à Igreja, bastando ter fé para recebê-los, é claro que também não sou um continuísta. Creio num caminho intermediário para o qual ainda não achei um nome. Não posso ser chamado de cessacionista e nem de continuísta, pois creio que alguns dons continuam como eram no Novo Testamento, outros cessaram e outros continuam apenas em parte.
Bem, a discussão moderna gira mais em torno dos dons chamados sobrenaturais, como curas, línguas, profecias… se Deus é o mesmo hoje, ontem e eternamente, estes dons não estariam disponíveis hoje, como estavam na época dos apóstolos?
Poderíamos perfeitamente aplicar a estes dons e outros o princípio acima, de que Deus age de maneiras diferentes em épocas diferentes. Não podemos confundir a imutabilidade de Deus – que significa que ele não muda em seu ser e seus atributos – com a “mesmice” de Deus, que significa que ele sempre age da mesma forma. Teoricamente, ele poderia ter concedido os dons relacionados com curas, línguas e profecias a algumas pessoas durante o período apostólico e uma vez cessado aquele período, suspendido a atuação dos mesmos. Não vejo em que admitir isto afeta a imutabilidade de Deus ou diminui o seu poder e sua glória. Querer que Deus sempre atue da mesma maneira, isto sim, engessa Deus num padrão rígido e não admite que Ele tenha maneiras diferentes de agir em épocas diferentes para atingir seus propósitos.
Mas o que havia de tão especial no período apostólico para Deus conceder estes dons sobrenaturais?
Foi o período de transição entre a antiga e a nova alianças. Teve a ver com a vinda de Jesus Cristo ao mundo e o cumprimento de todas as promessas que Deus havia feito a seu povo pelos profetas de Israel. Foi a inauguração dos últimos dias, do fim dos séculos, da última hora e do fim dos tempos. Foi a época em que o Espirito prometido foi derramado. Deus levantou os Doze e Paulo para através deles explicar e registrar estes fatos no Novo Testamento. Era necessário, portanto, que o período mais importante da história da redenção fosse marcado por sinais, prodígios e maravilhas feitos por pessoas extraordinárias como os apóstolos e seus associados. Era preciso deixar claro que era Deus quem estava por detrás daqueles acontecimentos e da mudança da aliança. Uma parte dos dons mencionados no Novo Testamento está relacionada diretamente com este período e com os apóstolos, como o dom de curar e fazer milagres e a profecia como veículo de novas revelações. O dom de línguas, aparentemente, estava também associado àquela época, como sinal externo da chegada do Espírito Santo aos diferentes grupos que compunham a Igreja em seu início (judeus, samaritanos, gentios e discípulos de João Batista). Mas, parece que ele servia a outros propósitos além deste mencionado.
A questão é que estes dons aparecem em algumas das listas de dons espirituais do Novo Testamento como ferramentas do Espírito dadas a todos os crentes para edificar a igreja de Cristo. E agora?
Não vejo dificuldades. Estas listas aparecem em Efésios 4, Romanos 12, 1Coríntios 12 (2 listas) e 1Pedro 4. O que precisamos é definir com mais precisão o que significam cada um destes dons. O que significa, por exemplo, o dom de profetizar, que aparece nestas listas? Os crentes que tinham o dom de profetizar nas igrejas cristãs eram profetas iguais a Isaías e Jeremias, que foram capazes de predizer o futuro de Israel e das nações com incrível precisão? Ou será que os profetas cristãos se limitavam a edificar, exortar, consolar e instruir as igrejas, como Paulo diz em 1Coríntios 11:3 e 31? E o que significa o dom de curar e de realizar milagres? Por que só encontramos este dom associado ao ministério dos apóstolos? E por falar nisto, o que significa “apóstolo” na lista de Efésios 4? O termo pode significar tão somente enviados, missionários, sem qualquer relação com os Doze e Paulo. Infelizmente as pessoas não levam em conta que existem determinados aspectos da função do profeta, do ofício do apóstolo e mesmo do dom de línguas, os quais parecem estar relacionados somente àquela época. Se levarmos em conta estas coisas, podemos até dizer que todos os dons continuam hoje, mas que alguns aspectos ou atributos deles cessaram após o período dos apóstolos.
E qual seria então o critério para dizermos quais os dons que permanecem para os dias de hoje e quais os que cessaram?
Acredito que a regra de ouro é esta: todos os dons que foram veículos de novas revelações ou que estavam ligados diretamente aos instrumentos das revelações, que foram os apóstolos, cessaram com a morte deles. Ilustrando, o dom de profecia continua hoje, conforme entendo, mas somente enquanto exortação, consolo, confrontação pela Palavra. Já o aspecto revelatório da profecia que vemos, por exemplo, em João ao escrever Apocalipse, ou em Paulo e Pedro ao prever como será o futuro, a vinda de Cristo, a ressurreição dos mortos, etc., isso certamente não faz parte da profecia hoje. Já cessou.
Da mesma forma o dom do apostolado. Se entendermos apóstolo como missionário, enviado das igrejas para pregar o Evangelho aos povos (é este o sentido básico do termo em grego), não vejo problemas em dizer que ainda hoje temos apóstolos entre nós, que são os missionários que vão desbravar campos ainda não atingidos pelo Evangelho. Mas, certamente não existem mais apóstolos no sentido dos Doze e Paulo, que viram o Senhor Jesus ressurreto, foram chamados diretamente por Ele pessoalmente ou numa aparição após a ressurreição, e que receberam não somente poderes extraordinários de curar e realizar milagres, como foram também veículos da revelação divina, tendo profetizado acerca do futuro de Deus para seu povo e o mundo. E mais, seus escritos às igrejas foram inspirados pelo Espírito Santo, de forma que são infalíveis e inerrantes, sendo a própria Palavra de Deus. Obviamente, nenhum dos que se intitulam de apóstolo hoje tem estas credenciais. Portanto, não podem ser considerados apóstolos como Pedro, Tiago, João e Paulo. Este é um dos dons que permanece hoje somente em parte.
Por este critério o dom de línguas teria cessado também?
Não necessariamente, pois, até onde eu entendo, ele não era revelacional, isto é, não era veículo de novas revelações, como a profecia. Acredito que o relato de Atos e de 1Coríntios 14 nos dão informações suficientes de que o conteúdo das línguas era o louvor a Deus (Atos 2:11; 10:46). O dom consistia na capacidade de louvar e exaltar as grandezas de Deus num idioma que a pessoa desconhecia, e que tinha de se traduzido para a edificação da igreja. Portanto, teoricamente, este dom não precisaria ter cessado pois não era revelacional. Todavia, temos indícios significativos da história da igreja de que ele cessou após o período apostólico. Na eventualidade de uma ocorrência genuína deste dom hoje, esperaríamos que fosse de acordo com as regras bíblicas de 1Coríntios 14: dois ou três falando, em sequência, e com interpretação. Como normalmente não é este o caso nas igrejas que dizem ter este dom, continuo tendo dúvidas de que o que está acontecendo nelas é a manifestação do genuíno dom de línguas. Mas, em tese, estou aberto para a ocorrência do dom genuíno.
Mas, então, isto quer dizer que os crentes que falam em línguas são mentirosos ou estão sendo influenciados pelo diabo?
Claro que não. Seria uma temeridade afirmar este tipo de coisa. Prefiro pensar que em boa parte das ocorrências são irmãos em Cristo sinceros que pensam estar de fato falando em línguas por terem sido ensinados desta forma dentro de determinados ambientes. Eles foram ensinados que falar em línguas é balbuciar palavras sem sentido num êxtase emocional. Há alguns que inclusive foram ensinados por seus pastores a como fazer isto, tipo “relaxe a língua, forme uma palavra desconhecida em sua mente e repita até que saia espontaneamente da sua boca…”
Não consigo perceber qual é o mal em se falar em línguas hoje nas igrejas. Qual o problema?
Se as línguas faladas não forem de Deus, a imitação delas deve trazer algum prejuízo ou perigo de natureza espiritual. Não posso afirmar ao certo, mas imagino que pode produzir arrogância, falsa espiritualidade, e abrir a porta para a atuação de demônios ou da natureza pecaminosa do homem. Na verdade, estes perigos estão presentes em qualquer manifestação que seja meramente humana, e não somente línguas.
Alguns diriam que você nunca falou em línguas porque nunca foi realmente batizado com o Espírito Santo…
Hehe, eu sei, já me disseram isto na cara, num congresso de irmãos pentecostais onde estive como visitante. Bom, a minha resposta é que acordo com Paulo todos os crentes verdadeiros já foram batizados com o Espírito Santo (1Cor 12:13) mas nem todos falam em línguas (1Cor 12:30). Se não for assim, terei de dizer que os reformadores e os grandes missionários da história da igreja nunca foram batizados com o Espírito Santo, pois nunca falaram em línguas. Todavia, se formos fazer uma comparação, eles fizeram mais pelo Reino de Deus do que estes que hoje insistem em dizer que as línguas são o sinal inequívoco do batismo com o Espírito Santo…
Mudando de assunto… Deus cura hoje?
Sem dúvida alguma. Eu mesmo já fui curado por Deus. Todavia é preciso fazer a diferença entre o dom de curar e as curas que Deus faz em resposta à oração. Aqueles que tinham o dom de curar – e parece que estava restrito aos apóstolos e seus associados – nunca falhavam. Cada vez que determinavam a cura, ela acontecia. Não há caso registrado de alguém com dom de curar, como Paulo e Pedro, terem comandado a cura que ela não tenha acontecido. E estamos falando da cura de cegos, coxos, aleijados, surdos e mudos, muitos dos quais nem tinham fé. E mesmo da ressurreição de mortos. Obviamente não apareceu depois dos apóstolos ninguém na história da Igreja, até os dias de hoje, com este mesmo poder. E estou falando de homens como Agostinho, Lutero, Calvino, Wesley, Whitefield, Hudson Taylor, Spurgeon, Moody e outros homens de Deus, que não podem ser acusados de não terem fé ou de serem carnais.
Isso não quer dizer que Deus deixou de curar depois dos apóstolos. Ele cura sim, ao responder as orações por cura quando quiser. E nem sempre ele responde positivamente. Se fosse feita uma pesquisa, aposto que ela revelaria que existe proporcionalmente o mesmo número de doentes entre aqueles que dizem acreditar que o dom de curar existe hoje e aqueles que acham que já cessou. Isto é, vamos encontrar nos leitos dos hospitais proporcionalmente o mesmo número de membros doentes de igrejas que dizem ter o dom de curar e daquelas que não pensam assim.
Jesus disse certa feita que quem cresse nele faria os mesmos sinais que ele fez. Esta promessa é verdadeira ou não?
O que Jesus disse foi que eles fariam as mesmas obras. Ele não disse que fariam os mesmos sinais (ver João 14:12). Embora o termo “obras” possa se referir aos milagres dele, é mais provável que Cristo se referia à obra de evangelização e conquista de almas, que foi efetivamente a única obra que os apóstolos fizeram que era maior do que as realizadas por ele. Sobre isto, escrevi um post aqui no blog O Tempora, O Mores, dando as razões exegéticas para esta interpretação. A verdade é que nunca ninguém conseguiu superar os milagres de Jesus ao longo de dois mil anos de história do Cristianismo.
E quanto a sonhos e visões?
De acordo com o autor da carta aos Hebreus, Deus de fato se revelou de maneira extraordinária antes de Cristo, falando através dos profetas por meio de visões e sonhos, conforme encontramos no Antigo Testamento. Com a vinda do Senhor Jesus, que é a Palavra encarnada e portanto a última e maior revelação de Deus, estes modos de revelação cessaram, à medida que os apóstolos e escritores no Novo Testamento registraram de maneira infalível e definitiva esta última revelação.
Não digo que Deus não possa hoje se manifestar de maneira extraordinária a um crente. Mas, então, seria o caso de uma experiência pessoal, que não pode ter validade e utilidade pública e nem ser usada como meio para se impor alguma prática ou doutrina aos demais. A maneira geral, normal e esperada de Deus se comunicar conosco hoje é pelo Espirito falando pelas Escrituras e pela sua Providência, que é a maneira sábia pela qual Deus controla e governa os acontecimentos.
Vamos voltar ao dom de profecia. Afinal, ele existe hoje ou não?
Depende do que estamos falando. Os profetas do Antigo Testamento, como Isaías e Ezequiel por exemplo, receberam de Deus revelações quanto ao futuro de Israel, nas nações daquela época e da humanidade em geral. Estas revelações foram registradas em livros com o nome destes profetas e fazem parte da Bíblia. Além da profecia preditiva, os profetas exortavam o povo de Deus a que se arrependessem de seus pecados e voltassem à obediência da aliança. Na verdade, os livros deles trazem proporcionalmente muito mais exortações e advertências do que predições do futuro.
Os sucessores dos profetas do Antigo Testamento foram os apóstolos do Novo Testamento. Paulo, Pedro, João e os demais apóstolos também receberam revelações de Deus quanto ao futuro, a saber, a vinda de Cristo, a ressurreição dos mortos, o novo céu e a nova terra.
Os profetas das igrejas locais no período apostólico não eram iguais aos profetas do Antigo Testamento como Isaías, Jeremias, Oséias, Joel, Amós, etc. Entendo que o dom de profecia que aparece nas listas de dons do Novo Testamento se refere à capacidade dada por Deus a determinadas pessoas para trazerem uma palavra de Deus à igreja, baseada nas Escrituras, em momentos de crise e necessidade. O profeta exortava, edificava e instruía os crentes reunidos. Não vejo qualquer base para dizermos que o dom de profetizar no Novo Testamento é o poder para revelar o que está acontecendo na vida íntima dos outros ou anunciar o futuro da vida das pessoas. Se fosse feito um registro da quantidade de profecias deste tipo que se mostraram falsas, não cumpridas ou que são tão gerais que cabe tudo nelas, já teríamos concluído de vez que o dom de profetizar não é isto.
Mas, e o caso do profeta Ágabo no livro de Atos que profetizou por duas vezes acontecimentos futuros?
Ágabo profetizou por duas vezes fatos que estavam relacionados com a vida e o ministério do apóstolo Paulo, durante o período em que as Escrituras estavam sendo feitas e no qual Paulo era o principal protagonista. Me parece claramente uma situação excepcional e bastante diferente do período atual da história da igreja.
Não acha que essa sua posição acaba por extinguir e apagar o Espírito e impedir a ação de Deus no meio de seu povo? Não é este o pecado imperdoável, a blasfêmia contra o Espírito Santo?
Acho que o maior pecado contra o Espírito é desobedecer as orientações que Ele nos deu na Bíblia para examinarmos todas as coisas. Ele orientou os escritores bíblicos a escreverem aos crentes dizendo que eles deveriam estar atentos contra manifestações espirituais que não procediam de Deus, contra a ação de falsos profetas e falsos irmãos e mesmo contra a ação de espíritos enganadores que são capazes de realizar sinais e prodígios (Apocalipse 16:14). O Espírito nos chama a discernir os espíritos, a exercitar o bom senso e usar a razão. Pecamos contra o Espírito ao aceitarmos as manifestações espirituais de maneira crédula, sem exame ou análise, renunciando às orientações bíblicas e à nossa razão. É pela omissão dos crentes que os falsos profetas entram nas igrejas e disseminam heresias perniciosas.
Qual o seu comentário final aos nossos ouvintes?
Não considero a questão da contemporaneidade dos dons como sendo uma daquelas que se acham no coração do cristianismo. Não estou negando a importância da discussão se todos os dons que aparecem na Bíblia estão disponíveis hoje ou não. A verdade é que cristãos verdadeiros que são cessacionistas ou continuístas têm o mesmo desejo, que é servir a Deus de todo coração e serem instrumentos de bênção para os outros. Por outro lado, se não tivermos uma compreensão clara de um assunto como este, poderemos não somente nos privar da verdade como também promover a mentira – em ambos os casos, mesmo que o prejuízo não seja fatal, certamente afetará a nossa vida e das pessoas ao nosso redor.
(Fonte)
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Espírito Santo Salvação Steven Lawson

O agir do Espírito Santo (Steven Lawson)

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A cessação dos dons apostólicos (Nathan Busenitz)

A opinião de dez líderes da história da Igreja:

1. João Crisóstomo (344–407)

A passagem inteira (falando sobre 1 Coríntios 12) é muito obscura, mas a obscuridade é produzida por nossa ignorância dos fatos referidos e por sua cessação, fatos que ocorriam, mas agora não tem mais lugar.

(Fonte: João Crisóstomo, Homilias em I Coríntios, 36.7 Crisóstomo está comentando 1 Co. 12:1-2 como introdução ao capítulo inteiro. Citado de 1-2 Coríntios in: Ancient Christian Commentary Series, 146.)

2. Agostinho (354-430)

Nos tempos antigos o Espírito Santo veio sobre os crentes e eles falaram em línguas, que não haviam aprendido, conforme o Espírito concediam que falassem. Estes foram sinais adaptados ao tempo. Pois aquilo foi o sinal do Espírito Santo em todas as línguas [idiomas] para mostrar que o Evangelho de Deus era para ser espalhado a todas as línguas sobre a terra.  Isto foi feito por um sinal, e o sinal findou.

(Fonte: Agostinho. Homilias sobre a Primeira Epístola de João, 6.10. Cf. Schaff, NPNF, First Series, 7:497-98)

3. Teodoreto de Ciro (393-466)

Em tempos antigos, aqueles que aceitaram a divina pregação e que foram batizados para a sua salvação, receberam sinais visíveis da graça do Espírito Santo trabalhando neles. Alguns falaram em línguas que eles não sabiam e que ninguém lhes havia ensinado, enquanto outros realizaram milagres ou profetizaram.  O coríntios também fizeram essas coisas, mas não usaram os dons como deveriam ter usado. Eles estavam mais interessados em se mostrar do que em usar os dons para a edificação da igreja . . . Mesmo no nosso tempo a graça é dada para aqueles que são julgados dignos do santo batismo, mas não pode assumir a mesma forma que possuía naqueles dias.

(Fonte: Teodoreto de Ciro. Comentário sobra a primeira epístola aos Coríntios, 240, 43; em referência à 1Co 12:1,7.  Citado de 1-2 Coríntios, ACCS, 117).

4. Martinho Lutero (1483-1546)

Na Igreja primitiva, o Espírito Santo foi enviado de forma visível.  Ele desceu sobre Cristo na forma de uma pomba (Mt. 3:16), e à semelhança de fogo sobre os apóstolos e outros crentes.  (Atos 2:3) Esse derramamento visível do Espírito Santo foi necessário para o estabelecimento da Igreja primitiva, como também foram necessários os milagres que acompanharam o dom do Espírito Santo. Paulo explicou o propósito destes dons miraculosos do Espírito em I Coríntios 14:22, “as línguas são um sinal, não para os que crêem, mas para os que não crêem”.  Uma vez que a Igreja tinha sido estabelecida e devidamente anunciada por estes milagres, a aparência visível do Espírito Santo cessou.

(Fonte: Martinho Lutero, traduzido por Theodore Graebner [Grand Rapids, Michigan: Zondervan, 1949], pp  150-172. A respeito do comentário de Lutero sobre Gálatas 4:6.)

5. João Calvino (1509-1564)

Embora Cristo não declare expressamente se Ele pretende que esse dom [de milagres] seja temporário ou a permaneça perpetuamente na Igreja, é mais provável que os milagres tenham sido prometidos apenas por um tempo, para dar brilho ao evangelho enquanto ele era novo ou em estado de obscuridade.

(Fonte: João Calvino, Comentário sobre os Evangelhos Sinóticos, III:389.)

O dom de cura, como o resto dos milagres, os quais o Senhor quis que fossem trazidos à luz por um tempo, desapareceu, a fim de tornar a pregação do Evangelho maravilhosa para sempre.

(Fonte: João Calvino, Institutas da Religião Cristã, IV: 19, 18.)

6. John Owen (1616-1683)

Dons que em sua própria natureza excederam completamente o poder de todas as nossas habilidades, essa dispensação do Espírito há muito cessou e onde ela agora é simulada por alguém, pode ser justamente presumida como um delírio entusiasmado.

(Fonte: John Owen, Obras, IV:518.)

7. Thomas Watson (1620-1686)

Claro, há tanta necessidade de ordenação hoje como no tempo de Cristo e no tempo dos apóstolos, quando então havia dons extraordinários na igreja, os quais agora cessaram.

(Fonte: Thomas Watson, As Bem-Aventuranças, 140.)

8. Mattew Henry (1662-1714)

O que eram esses dons nos é largamente dito no corpo do capítulo [1 Coríntios 12], ou seja, ofícios e poderes extraordinários, concedidos a ministros e cristãos nos primeiros séculos, para a convicção dos descrentes, e propagação do evangelho.

(Fonte: Mattew Henry, Comentário Completo, em referência a 1 Coríntios 12)

O dom de línguas foi um novo produto do espírito de profecia e dado por uma razão particular, retirar o judeu e demonstrar que todas as nações podem ser conduzidas à igreja. Estes e outros sinais da profecia, começaram como sinais, e há muito cessaram e foram deixados para trás, e nós não temos nenhum incentivo para esperar um avivamento deles; mas, pelo contrário, somos direcionados para o chamado das Escrituras a mais certa palavra de profecia, mais certa que vozes dos céus, e ela nos orienta a tomar cuidado, a busca-la e se firmar nela.

(Fonte: Mattew Henry, Prefácio ao Vol IV de sua Exposição do At e NT, vii.)

9. John Gill (1697-1771)

Agora esses dons foram concedidos comumente, pelo Espírito, aos apóstolos, profetas e pastores, ou anciãos da igreja, naqueles primeiros tempos: a cópia de Alexandria, e a versão Latina da Vulgata, dizem, “por um só Espírito”.

(Fonte: Comentário de John Gill de 1 Coríntios 12:9)

Não; quando estes dons estavam presentes, nem todos os possuíam.  Quando a unção com óleo, a fim de curar o doente, estava em uso, ela só foi executada pelos anciãos da igreja, e não pelos seus membros comuns, que deveriam buscar o doente nesta ocasião.

(Fonte: Comentário de John Gill de 1 Coríntios 12:30.)

10. Jonathan Edwards (1703-1758)

Nos dias de sua [Jesus] encarnação, os seus discípulos tinham uma medida dos dons miraculosos do Espírito, sendo habilitados desta forma para ensinar e fazer milagres.  Mas, depois da ressurreição e ascensão, ocorreu o mais completo e notável derramamento do Espírito em seus dons milagrosos que já existiu, começando com o dia de Pentecostes, depois da ressureição Cristo e Sua ascenção ao céu.  E, em conseqüência disto, não somente aqui e ali uma pessoa extraordinária era dotada de dons extraordinários, mas eles eram comuns na igreja, e assim continuou durante a vida dos apóstolos, ou até a morte do último deles, mesmo o apóstolo João, que viveu por cerca de cem anos desde nascimento de Cristo, de modo que os primeiros cem anos da era cristã, ou o primeiro século, foi a era dos milagres.

Mas, logo após a finalização do cânon da Escritura quando o apóstolo João escreveu o livro do Apocalipse, não muito antes de sua morte, os dons miraculosos tiveram seu fim na igreja. Pois, agora, a revelação escrita da mente e da vontade de Deus estava completa e estabelecida. Revelação na qual Deus havia perfeitamente gravado uma regra permanente e totalmente suficiente para Sua igreja em todas as eras.  Com a igreja e a nação judaica derrotadas, e a igreja cristã e a última dispensação da igreja de Deus estabelecidas, os dons miraculosos do Espírito já não eram mais necessários e, portanto, eles cessaram; pois embora eles tenham continuado na igreja por tantas eras, eles se extinguiram, e Deus fez com que fossem extintos porque já não havia ocasião favorável a eles.  E assim foi cumprido o que está dito no texto: “Havendo profecias, serão aniquiladas; havendo línguas, cessarão;. Havendo ciência, desaparecerá”.  E agora parece ser o fim para todos os frutos do Espírito tais como estes, e não temos mais razão de esperar que voltem.

(Fonte: Jonathan Edwards, sermão intitulado “O Espírito Santo deve ser comunicado ao Santos para sempre, In na graça da caridade, ou amor divino”, em 1 Coríntios 13:8)

Os dons extraordinários foram dados para a fundação e o estabelecimento da igreja no mundo. Mas, depois que o cânon das Escrituras foi concluido e a igreja cristã foi plenamente fundada e estabelecida, os dons extraordinários cessaram.

(Fonte: Jonathan Edwards, Caridade e seus frutos, 29.)

(Fonte)

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O fluir do Espírito (Watchman Nee)

Se seguirmos o mover de Deus ao longo da história da humanidade, notaremos o fluir da atividade divina passando de uma geração a outra, e em nossa geração, podemos vê-la fluindo ainda de forma ininterrupta, avançando firmemente..

Faz já algum tempo, senti-me profundamente comovido ao meditar a respeito de alguns dos escritos de Wesley. Por meio deste Seu servo, Deus fez algo tão poderoso que, possivelmente, os alcances de seu esforço não possam ser superados hoje em dia, não obstante ser inegável que Deus continua a mover-se desde a época de Wesley. A corrente do Espírito avança constantemente. A corrente espiritual é uma corrente que segue crescendo.

Nisso há um princípio que é necessário termos em conta: todo aquele que em seu dia e geração responde plenamente às exigências de Deus será levado adiante pela corrente do propósito divino. Se, entretanto, aferrar-se ao passado, querendo que Deus trabalhe como fez outrora, anelando que se repita algo que, a seu próprio juízo, é de muita importância devido ao seu valor espiritual, encontrar-se-á deixado de lado pela corrente principal do mover divino. Ser um Lutero no século 16 foi de muita importância, porém ser um Lutero no século 20 não seria suficiente. Ser um Wesley no século 18 foi de grande valor para o Senhor, porém não o seria no século 20. Cada instrumento levantado por Deus cumpre uma função determinada, e a contribuição que cada um faz à Igreja é adequada estritamente há essa hora, porém não servirá para edificar a Igreja numa etapa posterior de seu desenvolvimento.

É de lamentar que muitos fracassam ao não reconhecer o avanço da corrente viva do rio através da história da igreja. Nós, que vivemos hoje, herdamos uma imensa riqueza por intermédio dos santos que já fizeram sua contribuição à Igreja.. Nunca poderemos superestimar a grandiosidade de nossa herança nem ser suficientemente agradecidos a Deus por ela; porém, se hoje anelamos ser um Lutero ou um Wesley, seremos nada mais e nada menos que um fracasso. Não estaremos enquadrados no propósito de Deus para esta geração, mas retrocederemos, enquanto a corrente do Espírito continuará a mover-se. Toda a Bíblia, de Gênesis a Apocalipse, mostra uma corrente que avança. O Santo Registro, do princípio até o fim, nos mostra uma revelação progressiva do mover de Deus.

Em certa ocasião, um irmão me interrogou sobre a importância da Epístola aos Hebreus. Perguntei-lhe se havia notado alguma diferença significativa entre esse livro e o de Atos. Neste último, a natureza progressiva da atividade divina se percebe claramente, porém a revelação por meio da Epístola aos Hebreus assinala um marcado progresso no tocante à revelação do propósito divino. O avanço espiritual que se observa em Atos é óbvio e a forma de avanço do Espírito segue o programa claramente delineado no primeiro capítulo: “Em Jerusalém, em toda Judéia, em Samaria, e até os confins da terra. Da Judéia, a corrente fluiu para Samaria; porém, ao chegar a esse lugar não estancou ali, mas seguiu seu curso para Roma, porquanto estava destinada a alcançar até os confins da terra.

Ainda que possamos notar o constante avanço do propósito divino em todo o livro de Atos, na sua conclusão encontramos que o conceito do que é ser um cristão ainda não se havia esclarecido totalmente. Entretanto, ao ler a carta aos hebreus, notamos que o cristão saiu de um período de transição e sua personalidade integrou-se totalmente. Em Atos, ele é tanto judeu como cristão. Junto com outros cristãos, congrega-se fora do templo para ter comunhão com eles, porém ainda continua visitando o templo. Entretanto, quando chegamos à Epístola aos Hebreus, encontramos o que já não é judeu e cristão, mas é simplesmente cristão. E já não se encontra seus camaradas cristãos algumas vezes dentro do templo e outras, fora. O que eles podiam fazer quando o Espírito havia sido recentemente derramado em Jerusalém não pode fazer agora que a corrente do Espírito continua fluindo para os confins da terra. Em Hebreus, encontramos os que já deixaram para trás o templo pelo “verdadeiro tabernáculo que o Senhor levantou, e não o homem”, e que puseram de lado os muitos sacrifícios, porquanto, com “uma só oferta”, o crente foi declarado “perfeito para sempre”.

Em Atos, lemos que Paulo foi ao templo para cumprir um voto. Não nos apressemos a pensar que cometeu um erro. Não nos arrisquemos a aplicar o veredito final de Deus sobre Seus santos em cada época, porque o mover de Deus para a meta final é progressivo. O que se requer, tanto de você como de mim hoje em dia, não é que alcancemos o definitivo, mas que nossa estatura corresponda ao nível adquirido pelo desenvolvimento do propósito divino na presente época. Você e eu devemos achar-nos no ponto ao qual chegou a corrente do Espírito hoje, não no ponto que havia chegado em algum momento do passado nem no que alcançará no futuro. Não era errado que Paulo se purificasse no templo segundo a velha aliança, porém aquilo que era correto naquele momento já não o seria mais adiante. Portanto, o escritor aos hebreus explica que a realização do propósito de Deus ao estabelecer a nova aliança envolvia a total abolição da velha ordem, à qual os crentes judeus se aferravam tão tenazmente. Uma vez que a velha aliança cumpriu o propósito de Deus, teve de dar lugar à nova.

O livro de Atos é progressivo do princípio ao fim, e quando o relato se encerra, no capítulo 28, o Espírito não deixa de se mover; a corrente segue através das sucessivas gerações, enquanto Deus continua levantando instrumentos que contribuam concretamente, de acordo com a necessidade resultante do nível que o Espírito tenha alcançado em Seu poderoso fluir para adiante.

No Antigo Testamento, observamos que onde repousava a boa vontade de Deus não havia esterilidade. Deus se havia proposto ter uma “linhagem” e, portanto, em nenhuma geração permitiu que a linha genealógica se interrompesse, uma vez que, para obter seu propósito, necessitava da perpetuação dessa semente. É por isso que dependemos de nossos antepassados espirituais. Porém, não somente é necessário que aceitemos a herança que nos vêm deles, mas temos a solene responsabilidade de transmiti-la a outros. A pergunta que devemos fazer-nos não é: “Fluirá a corrente do Espírito nesta geração?”, mas: “Estaremos, tanto você como eu, envolvidos nessa corrente?”. Se fracassamos em cumprir com as exigências do propósito divino para o tempo presente, Ele encontrará outros que satisfaçam essa necessidade. Onde está o selo do Espírito hoje em dia? Onde está a autoridade espiritual hoje em dia? Está em nós ou não? Somente com a autoridade do Espírito, encontrar-nos-emos na corrente que flui para adiante.

Ao dar uma olhadela para a história secular e para a história da Igreja, observamos os caminhos de Deus à medida que Ele trabalha de acordo com Seu propósito. Fez surgir Lutero quando necessitou um Lutero, e ainda que Lutero tivesse suas debilidades, foi o instrumento adequado à necessidade divina daquele tempo. Muito devemos a Lutero, graças a Deus, visto que somos o fruto de seu trabalho. Ele, em seu dia, ofereceu à corrente do Espírito que avançava um caminho livre para que ela seguisse seu curso, e nós, que fomos alcançados por essa mesma corrente, temos o privilégio de oferecer-nos a ela para que avance um pouco mais em seu curso. Nossa maior glória deve ser: Ele abrir caminho para Si por meio de nossa vida. De outra maneira, Ele se voltará para outra direção, e, para nós, isso representará uma perda trágica. A corrente espiritual pode fluir nessa direção na atualidade, porém não podemos predizer para onde fluirá daqui a dez anos. Aceitemos o fato. Cada dia o Espírito passa por alto sobre este e usa aquele. Se hoje Lhe oferecemos resistência, quem sabe Ele terá de abrir caminho para Si em outra parte? Que pensamento tão solene!

Desde a era das trevas, quando a luz que iluminava a Igreja primitiva se havia apagado em grande parte, o Espírito Santo tem estado ativo, resgatando, por meio de uns e outros, a verdade perdida, de maneira que agora toda a verdade foi recuperada para a Igreja.. Faz mais de um século, a necessidade de um ministério compartilhado entre vários chamou a atenção dos santos, e em épocas mais recentes essa verdade tem sido ressaltada profusamente, ainda que tenha havido uma lamentável falta de desenvolvimento prático, pelo menos no que conhecemos. A recuperação da doutrina relativa ao ministério coletivo é uma coisa, a realidade deste ministério expressa pela vida da igreja é outra. Tendo em conta que é nosso privilégio sermos herdeiros de uma riqueza tão imensa, que vem sendo restaurada ao longo dos séculos, nós que vivemos no século 20 devemos assumir a responsabilidade a que nos desafia tão extraordinário legado. Toda essa riqueza foi posta a nossa disposição, não meramente para nosso enriquecimento, mas para o avanço do evangelho. Nossa herança de todo o conjunto das verdades nos desafia a um ministério coletivo que envolva cada aspecto da verdade.

Quando se houver alcançado um ministério cooperativo que abarque a todo o povo de Deus, cremos que se haverá dado as condições para o retorno do Senhor. Não é somente a proclamação de toda a verdade o que se necessita hoje em dia, mas, sim, a liberação da realidade espiritual que expressa tal verdade, a qual somente pode realizar-se à medida que nós permitimos que a poderosa e progressiva corrente do Espírito nos carregue.
(Traduzido por Gérson C. Lima do livro La Corriente del Espiritu, publicado pela Ediciones Hébron, Argentina)

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