“Guarda com toda a diligência o teu coração, porque dele procedem as fontes da vida” (Pv 4.23 – IBB-Rev.).
O dever de guardar o coração é sempre obrigatório; não existe hora nem condição na vida em que sejamos dispensados dessa tarefa, mas existem algumas ocasiões especiais e horas críticas que requerem mais vigilância do que aquela que comumente mantemos sobre o coração.
Quer saber como um cristão pode guardar o coração de sentimentos vingativos quando é alvo das maiores ofensas e maus tratos dos homens?
Uma dessas ocasiões é quando somos ofendidos e maltratados pelos outros. A depravação e a corrupção do homem é tão grande, que um trata o outro como lobo ou tigre. E, como os homens são cruéis por natureza e oprimem uns aos outros, assim os ímpios conspiram para maltratar e ofender o povo de Deus. “O ímpio devora aquele que é mais justo do que ele” (Hc 1.13). Quando somos ofendidos e maltratados dessa forma, é difícil guardar o coração de impulsos vingativos; com mansidão e quietude passar a situação para Aquele que julga retamente; evitar todo e qualquer sentimento pecaminoso. O espírito que está em nós deseja vingança, mas não deve ser assim. Nós temos opções de ajuda no evangelho para guardar nosso coração de sentimentos pecaminosos contra os inimigos e para abrandar nosso espírito amargurado. Quer saber como um cristão pode guardar o coração de sentimentos vingativos quando é alvo das maiores ofensas e maus tratos dos homens? Eu explico.
Quando você começar a perceber o coração inflamar-se de sentimentos vingativos, reflita imediatamente nas seguintes coisas:
Recomende com insistência a seu coração as severas proibições da Palavra de Deus contra a vingança. Por mais gratificante que seja a vingança a suas propensões corruptas, lembre-se de que ela é proibida. Ouça a Palavra de Deus: “Não vos vingueis a vós mesmos, amados, mas dai lugar à ira [de Deus]; porque está escrito: ‘A Mim Me pertence a vingança; Eu é que retribuirei, diz o Senhor’. Pelo contrário, se o teu inimigo tiver fome, dá-lhe de comer; se tiver sede, dá-lhe de beber; porque, fazendo isto, amontoarás brasas vivas sobre a sua cabeça. Não te deixes vencer do mal, mas vence o mal com o bem” (Rm 12.19-21). Este sempre foi um argumento apresentado pelos cristãos para provarem que sua religião é sobrenatural e pura: ela proíbe a vingança, que é tão agradável à natureza humana. Intimide seu coração, então, com a autoridade de Deus nas Escrituras; e, quando a razão carnal disser: “Meus inimigos merecem ser odiados!”, faça a consciência replicar: “Mas será que Deus merece ser desobedecido?” “Isso e aquilo foi feito contra mim, eu fui injustiçado”; “Mas o que é que Deus fez para que eu cometa alguma coisa contra Ele? Se meu inimigo se atreve a perturbar minha paz, devo eu ser tão perverso ao ponto de transgredir o mandamento de Deus? Se meu inimigo não teme fazer o mal contra mim, será que não devo temer fazer mal contra Deus?” Dessa forma, faça com que o temor de Deus restrinja e acalme seus sentimentos.
Coloque diante de seus olhos os mais altos padrões de mansidão e perdão, para você sentir o vigor desses exemplos. Essa é a forma de acabar com os argumentos normais da carne e sangue em busca de vingança, como estes: “Homem nenhum suportaria esse tipo de ofensa!” Sim, há homens que suportaram ofensas tão grandes e até maiores do que as que você sofreu! “Mas eu vou ser tido por covarde, por estúpido, se deixar isso passar!” Isso não deve preocupar você, desde que siga o exemplo de homens mais sábios e santos. Ninguém nunca sofreu mais ou maiores ofensas por parte dos homens do que o Senhor Jesus, nem jamais suportou insultos e acusações e todo tipo de abuso de forma mais pacífica e perdoadora. Quando Ele foi insultado, não devolveu os insultos; quando sofreu, não fez ameaças; quando Seus assassinos O crucificaram, Ele pediu ao Pai que lhes perdoasse. Com isso, Ele nos deu exemplo para que sigamos Seus passos. Seus apóstolos O imitaram: “Quando somos injuriados, bendizemos; quando perseguidos, suportamos; quando caluniados, procuramos conciliação; até agora, temos chegado a ser considerados lixo do mundo, escória de todos” (1Co 4.12,13). Eu já ouvi falar de um santo homem de Deus, o sr. Dod. Quando uma pessoa enfurecida por causa de sua pregação penetrante e convincente o atacou, socou-lhe o rosto e lhe quebrou dois dentes, esse humilde servo de Cristo cuspiu os dentes e o sangue na mão e disse: “Veja só, você me arrancou dois dentes, isso sem nenhuma provocação legítima. Mas, se você permitir que eu o abençoe e faça bem a sua alma, deixo que arranque o resto de meus dentes”. Aqui temos um exemplo da excelência do espírito cristão. Faça o que os outros não podem fazer, conserve ativo esse espírito, e você preservará a paz em sua alma e obterá a vitória sobre os inimigos.
Considere o caráter de quem lhe fez mal. Ou é um homem piedoso ou é um ímpio. Se é um homem piedoso, existem luz e sensibilidade na consciência dele, que, mais cedo ou mais tarde, lhe trarão uma percepção do mal que cometeu. Se é um homem piedoso, Cristo lhe perdoou ofensas maiores do que as que ele cometeu contra você; e por que você não o perdoaria? Cristo repreenderá a ele pelas ofensas, mas liberalmente perdoará todas elas; e você o pegará pelo pescoço por causa de uma pequena ofensa que cometeu contra você?
Mas, se foi um ímpio que ofendeu ou insultou você, na verdade há ainda mais razão para você exercer misericórdia em vez de vingança contra ele. Ele se encontra numa situação de engano e miséria; é escravo do pecado e inimigo da justiça. Se ele algum dia se arrepender, estará pronto para reparar o erro; se continuar impenitente, está chegando o dia em que será punido como merece. Você não precisa planejar nenhuma vingança; Deus executará a vingança contra ele.
Lembre-se de que, por meio da vingança, você só conseguirá gratificar uma paixão pecaminosa, paixão essa que, por meio do perdão, você pode subjugar. Lembre que, por meio da vingança, você pode destruir um inimigo; mas, pelo exercício da moderação cristã, pode subjugar três inimigos de uma só vez: sua própria paixão, a tentação de Satanás e o coração de seu inimigo. Se, por meio da vingança, você dominar seu inimigo, a vitória será infeliz e sem glória, pois, ao conquistá-la, você será vencido por sua própria corrupção; mas, pelo exercício da moderação mansa e perdoadora, você sempre sairá com honra e sucesso. A pessoa em que a mansidão e o perdão não operam é, de fato, muito perversa. É de pedra o coração que não se deixa derreter por esse fogo. Foi assim que Davi obteve vitória sobre Saul, seu perseguidor: “E chorou Saul em voz alta. Disse a Davi: Mais justo és do que eu” (1Sm 24.16,17).
Com seriedade, pergunte a seu coração: “Será que aproveitei alguma coisa para minha própria alma por meio das ofensas e injustiças que sofri?” Se elas não lhe fizeram nenhum bem, volte sua vingança contra si mesmo. Você tem todos os motivos para se encher de vergonha e tristeza por ter um coração que não consegue extrair nenhum bem desse tipo de aflição e por ter uma disposição mental tão diferente da atitude de Cristo. A paciência e a mansidão de outros cristãos fizeram com que as ofensas dirigidas a eles lhes fossem de bom proveito! Eles louvaram a Deus quando o mundo os acusou e repreendeu. Jerônimo disse: “Dou graças a meu Deus que eu seja considerado digno de ódio do mundo”. Mas, se você tem recebido algum beneficio das acusações e injustiças que recebeu, se elas o levaram a examinar o próprio coração, se fizeram com que você conduzisse a vida com mais prudência, se elas o convenceram do valor de um temperamento santificado – não vai perdoá-las? E que importa se essas coisas foram feitas com más intenções? Se, pela bênção de Deus, sua felicidade tem sido promovida por aquilo que lhe foi feito – por que você deveria sequer dispensar um pensamento desagradável a respeito do autor dessas coisas?
Pondere em quem ordena todas as suas tribulações. Isso será de grande ajuda para guardar seu coração da vingança; isso de imediato aquietará e suavizará seu ânimo. Quando Simei cercou Davi e o amaldiçoou, o espírito desse homem piedoso não se deixou envenenar pela vingança. Quando Abisai se ofereceu para arrancar a cabeça de Simei, o rei disse: “Deixai-o amaldiçoar; pois, se o Senhor lhe disse: ‘Amaldiçoa a Davi’, quem diria: ‘Por que assim fizeste?’?” (2Sm 16.10). “Pode ser que Deus o use como Sua vara para castigar-me, pois, por causa de meu pecado, eu dei ocasião a que os inimigos de Deus blasfemassem; e deveria eu ficar irado com o instrumento? Como isso seria irracional!” Dessa mesma forma Jó se aquietou; ele não xingou nem planejou vingança contra os caldeus e sabeus – mas considerou que Deus tinha ordenado as suas tribulações, e disse: “O Senhor o tomou; bendito seja o nome do Senhor!” (Jó 1.21).
Considere em como você está diariamente e a toda hora ofendendo a Deus – e não será tão facilmente inflamado com a ideia de represália contra aqueles que ofendem você. O tempo todo você está afrontando Deus – mas Ele não se vinga contra você; antes, tolera e perdoa; e mesmo assim você quer se levantar e se vingar contra os outros? Reflita nesta cortante repreensão: “Servo malvado, perdoei-te aquela dívida toda porque me suplicaste; não devias tu, igualmente, compadecer-te do teu conservo, como também eu me compadeci de ti?” (Mt 18.32,33). As pessoas que mais devem estar cheias de paciência e misericórdia com respeito aos que as prejudicam devem ser aquelas que experimentaram por si mesmas as riquezas da misericórdia! A misericórdia de Deus conosco deve enternecer nosso coração com misericórdia em relação aos outros. É impossível sermos cruéis para os outros – só se esquecermos o quanto Deus tem sido bom e compassivo para nós. E, se a bondade não prevalece em nós, temos de ouvir isto: “Se, porém, não perdoardes aos homens as suas ofensas, tampouco vosso Pai perdoará as vossas ofensas” (Mt 6.15).
Que a lembrança da proximidade do dia do Senhor refreie você de antecipá-lo com atos de vingança. Por que tanta pressa? Não está o Senhor perto para vingar todos os Seus servos maltratados? “Sede vós também pacientes e fortalecei o vosso coração, pois a vinda do Senhor está próxima. Irmãos, não vos queixeis uns dos outros, para não serdes julgados. Eis que o juiz está às portas” (Tg 5.8,9). A vingança pertence a Deus, e você vai se equivocar ao ponto de tomar sobre si o que é prerrogativa Dele?!
Muitos anos atrás, o Senhor me ensinou uma verdade, até onde sei sem a instrumentalidade humana, cujo benefício conservo até hoje, mais de quarenta anos depois.
O caso é o seguinte: eu vi mais claramente do que nunca que a principal e fundamental ocupação a que eu precisava me dedicar todos os dias era que minha alma sentisse prazer na presença e no favor de Deus. A primeira coisa com que me preocupar não era o quanto eu devia servir ao Senhor, como eu deveria glorificar o Senhor, mas como eu conseguiria levar minha alma a um estado de alegria e como meu homem interior podia ser alimentado. Porque eu poderia apresentar a verdade aos não-convertidos, poderia tentar beneficiar os crentes, procurar socorrer os aflitos, poderia de outras maneiras tentar comportar-me como convém a um filho de Deus neste mundo, mas, não estando alegre no Senhor e não estando alimentado e fortalecido em meu homem interior dia a dia, tudo isso poderia ser desempenhado sem um espírito correto.
Antes desse tempo, pelo menos nos últimos dez anos, minha prática habitual havia sido dedicar-me à oração depois de me levantar pela manhã. Agora eu via que a coisa mais importante que eu devia fazer era entregar-me à leitura da Palavra de Deus e meditar nela para meu coração ser confortado, alertado, encorajado, reprovado, instruído, e que, assim, ao meditar, meu coração fosse trazido a uma comunhão prática com o Senhor.
Comecei, então, a meditar no Novo Testamento cedo de manhã. A primeira coisa que fiz, depois de pedir em poucas palavras a bênção do Senhor sobre Sua preciosa Palavra, foi começar a meditar na Palavra de Deus, investigando por assim dizer cada versículo para extrair dele alguma bênção – não com a finalidade de ministrar publicamente a Palavra, não para pregar com base no que eu tinha meditado, mas com a finalidade de conseguir comida para minha própria alma. O resultado que tenho obtido quase sempre é o seguinte: depois de poucos minutos, minha alma tem sido levada a confessar, dar graças, interceder ou suplicar; de forma que, embora eu não tenha me entregado à oração e sim à meditação, mesmo assim ela se voltou quase que de imediato à oração, às vezes com mais, às vezes com menos intensidade. Depois de algum tempo em confissão, intercessão ou súplica ou ações de graças, prossigo para as próximas palavras ou o próximo versículo, transformando tudo, à medida que avanço, em oração por mim mesmo ou pelos outros, conforme a Palavra oriente, mas sempre tendo diante de mim que o objetivo da minha meditação é obter alimento para minha própria alma.
O resultado disso é que sempre tenho, misturados com minha meditação, bons motivos para fazer confissão, dar graças, suplicar ou interceder – e que meu homem interior quase invariavelmente é alimentado e fortalecido, e por volta da hora do café da manhã, com raras exceções, eu encontro meu coração cheio de paz e alegria.
Dessa forma, o Senhor também se agrada em dar-me aquilo que, logo depois, se torna alimento para outros crentes, embora não tenha sido por causa da ministração pública da Palavra que eu tenha me entregado à meditação, mas sim para o benefício de meu próprio homem interior.
A diferença, então, entre minha prática anterior e a de agora é que anteriormente, quando me levantava, eu começava a orar assim que me fosse possível, e geralmente gastava em oração todo ou quase todo o tempo antes do café da manhã. De todo jeito, eu quase sempre começava com oração, exceto quando sentia minha alma seca mais do que o normal, casos em que eu lia a Palavra de Deus em busca de alimento, ou de refrigério, ou de reavivamento e renovação de meu homem interior, antes de entregar-me à oração.
Mas qual era o resultado disso? Muitas vezes, eu gastava quinze minutos ou meia hora ou mesmo uma hora de joelhos, antes de perceber que tinha recebido algum conforto, encorajamento, humilhação de alma, etc.; e, muitas vezes, depois de sofrer muito nos primeiros dez, quinze ou trinta minutos com pensamentos que se dispersavam, somente então eu realmente começava a orar.
Raramente eu tenho dificuldades com isso agora. Por ter sido meu coração despertado pela verdade e trazido à comunhão experimental com Deus, eu falo com meu Pai e com meu Amigo (por mais vil que eu seja e indigno de disso tudo!) a respeito das coisas que Ele trouxe diante de mim em Sua preciosa Palavra.
Muitas vezes, fico admirado de não ter visto isso antes. Não li isso em livro nenhum. Não ouvi nenhuma pregação a respeito desse assunto. Não conversei com ninguém que me incentivasse quanto a isso. Mas agora, uma vez que Deus me ensinou esse ponto, para mim ficou mais claro do que nunca:
a primeira coisa que o filho de Deus deve fazer todos os dias de manhã é conseguir alimento para seu homem interior.
Assim como o homem exterior não está pronto para trabalhar sem se alimentar, e assim como essa é uma das primeiras coisas que fazemos de manhã, assim deve ser com o homem interior. Não há como negar que precisamos alimentar nosso homem interior.
Mas o que é esse alimento para o homem interior? Não é a oração, mas sim a Palavra de Deus. E também não é a simples leitura da Palavra de Deus, de forma que passe pela nossa mente assim como a água passa por um cano. Mas devemos considerar e meditar aquilo que lemos, ponderar na Palavra e aplicá-la ao nosso coração.
Quando oramos, nós falamos com Deus. Mas a oração, para durar algum tempo que não seja cheio de formalidades, requer, falando-se de forma geral, uma medida de vigor ou de desejo piedoso. Por isso, o momento em que esse exercício da alma pode ser executado de forma mais efetiva é depois que o homem interior foi alimentado pela meditação na Palavra de Deus, na qual o Pai fala conosco, nos encoraja, conforta, instrui, humilha e reprova. Por essa razão é que podemos meditar de forma proveitosa nas Escrituras com a bênção de Deus, por mais fracos que estejamos espiritualmente. Pelo contrário, quanto mais fracos estamos, mais precisamos meditar para o fortalecimento do nosso homem interior. Teremos muito menos dificuldade com pensamentos dispersos se orarmos depois da meditação do que quando nos dedicamos à oração sem gastar antes algum tempo meditando.
Insisto tanto nesse assunto porque sei o proveito e o alívio que recebi dessa prática, e carinhosa e solenemente imploro aos meus companheiros cristãos que considerem-na. Pela bênção de Deus, atribuo a esse costume a ajuda e a força que obtive de Deus para atravessar em paz profundas provações, mais do que eu tinha anteriormente. E, depois de provar esse caminho por mais de quarenta anos, posso recomendá-lo de forma mais plena, no temor de Deus.
Como é grande a diferença quando a pessoa é refrigerada e se alegra cedo de manhã, da situação em que ela, sem preparação espiritual, já se depara com o serviço, as provações e as tentações do dia!
Um novo ano é sempre um bom momento para (re)começarmos a leitura da Bíblia. Sabemos dos imensos desafios que a vida moderna nos impõe até mesmo (ou principalmente) com respeito às disciplinas espirituais: comunhão com o Senhor, oração, leitura devocional e estudo das Escrituras, meditação, etc. Mas devemos insistir, pedindo a graça e o poder do Senhor. Não há outro meio de sermos cristãos maduros e bem firmados na verdade sem um contato constante, sério, profundo e intencional com o Livro Antigo. Como disse A. W. Tozer:
Nunca vi um cristão útil que não seja estudante da Bíblia. Não existem atalhos para a santidade.
Visando ajudar os leitores nessa tarefa tão vital, apresentamos – com antecedência, para que seja possível escolher – algumas sugestões de planos de leitura da Bíblia. Estão no arquivo compactado que você encontra aqui. Escolha o que for mais adequado a você e use-o com dedicação, diariamente.
Planos de leitura da Bíblia
Abaixo, comentamos alguns dos planos que você encontrará no arquivo.
O plano cronológico sugere a leitura dos livros da Bíblia, não na ordem em que se encontram, mas pela sequência dos fatos registrados. Bom para ter-se uma idéia mais histórica do relato bíblico.
O calendar_mccheyne apresenta o plano de leitura idealizado por Robert McCheyne, no qual há uma leitura individual e uma leitura em família. (É a principal indicação de nosso editor que, há alguns anos, desenvolveu uma Bíblia que traz essas leituras para cada dia do ano. Chama-se Bíblia Devocional Robert McCheyne. Infelizmente, parece que ela não é mais publicada.) E há um plano adaptado, que exclui uma das leituras diárias do plano anterior.
Há um plano para ler a Bíblia toda em três meses e um para ler apenas o Novo Testamento, Salmos e Provérbios. Há planos para novos convertidos, para crianças, em que os livros são lidos de modo alternado ou misturados. Há um plano que considera os meses tendo 25 dias, para que haja tempo para meditação e para repôr alguma leitura.
Há dois planos em formato de planilha, que permitem acompanhar seu progresso (é preciso habilitar as macros).
Independentemente do método escolhido, o fundamental é o contato diário com a Palavra de Deus. Para isso, com certeza será preciso (re)organizar a vida, estabelecer horários a fim de ser possível separar um tempo a cada dia para estar a sós com Deus e com Seu Livro.
Não há vida cristã sem a Palavra de Deus. Não há maturidade cristã sem contato constante e sério com a Sagrada Escritura. Não é possível conhecer de fato a Deus à parte da Santa Palavra. Não é possível conhecer a vontade de Deus sem buscá-la no Livro Antigo. Não é possível viver de modo agradável a Deus sem submeter-se ao Sagrado Livro. Não é possível ter uma fé robusta sem alimentá-la com o Santo Texto. Ninguém se volta para Deus sem voltar-se para Sua Palavra. Ninguém ama a Deus sem amar Seu Livro.
Leia a Bíblia na presença do Senhor, na dependência de Seu Espírito, sob a operação da cruz, com santo temor, com coração humilde, com santa expectativa, com alegria, com amor, com desejo de que Deus fale por meio dela. Já disse alguém: “Você quer ouvir Deus falar? Leia a Bíblia. Quer ouvir Deus falar com voz audível? Leia a Bíblia em voz alta!”
A equipe do Campos de Boaz deseja que o Senhor abençoe você a cada dia do novo ano por meio de Sua Palavra.
“Muitos serão purificados, e embranquecidos e provados” (Dn 12.10).
Todos os cristãos desejam ser purificados e embranquecidos – mas, quando se trata de serem provados, isso lhes é algo muito diferente. Eles encolhem à vista da própria palavra. Suas provações são para eles como um pesadelo do qual, de bom grado, escapariam. Mas as provações são uma parte necessária do processo de Deus de nos preparar para o céu.
As tempestades e os obstáculos em nossa vida operam para o bem se os acolhermos como deveríamos. Graças a eles, nossa vida é enriquecida, enobrecida e desenvolvida. Eles são bênçãos para nós, embora pareçam ser bênçãos muito disfarçadas.
A vida tem tanto seu amargo quanto seu doce. Nós não devemos esperar sempre ter apenas o doce. Às vezes, as circunstâncias estão a nosso favor e trabalham para nossa felicidade, nossa paz e nosso contentamento. Às vezes, navegamos tranqüilamente e tudo corre de forma agradável. Somos corajosos, confiantes e alegres. O sol brilha intensamente num céu sem nuvens, e todas as perspectivas parecem serenas.
Mas essa navegação tranqüila não dura para sempre. Mais cedo ou mais tarde, as nuvens devem vir e os ventos tempestuosos nos atingirão. Devemos ter o mau tempo, assim como o tempo agradável; a tempestade, assim como a calma.
O brilho do Sol e a calma são muito necessários para a vida, e operam com um propósito definido. Mas as tempestades e a chuva e o vento são igualmente necessários, e eles também cumprem seu propósito.
As provações virão – não podemos evitá-las. Podemos planejar e construir esperanças – apenas para que nossos castelos no ar desabem em volta de nossa cabeça! Se colocamos o coração nessas coisas, provavelmente ficaremos muito desapontados com seu naufrágio e nos sentiremos muito tristes com o resultado.
Quão grandemente somos afetados por nossas provações depende de nos submetermos docemente a elas ou não. Nunca devemos nos afligir com as decepções. Se o fizermos, elas crescerão apenas mais rapidamente, tanto em tamanho quanto em intensidade.
Perdas podem vir a nós – nossa propriedade pode ser assolada ou queimada. Se tivermos nosso coração posto em nossas posses, elas podem tocar um ponto sensível, e isso escurecerá nossa vida e nos deixará melancólicos e insatisfeitos.
Pobreza e muitas dificuldades incidentais podem chegar.
A doença pode colocar sua mão pesada sobre nós ou sobre nossos entes queridos, e provar cada fibra do nosso ser. A doença pode tocar os acordes da dor, uma lamentação que incita com tortura requintada! Ou pode fazer nosso sangue ferver com febre até que nossos olhos brilhem e nosso rosto enrubesça. Ou pode nos prender desesperançadamente em cadeias.
A morte pode vir e levar aqueles que nos são queridos pelos laços da natureza ou da amizade – e deixar a dor e a tristeza como nossas companheiras.
Essas coisas provam a alma, mas devem ser suportadas. Não podemos fugir delas, pois são a herança comum daqueles que habitam em tabernáculos de barro. Eles pertencem à mortalidade e às coisas mutáveis do tempo. Quão imensamente tais coisas podem nos afetar dependerá de quanto nos rebelamos contra as circunstâncias ou de quão facilmente nos submetemos e nos adaptamos à vontade de Deus. Deus pode castigar você dolorosamente, mas Ele fará isso para seu proveito, não para sua destruição.
Nossas provações são a raiz sobre a qual nossas bênçãos crescem. Essas raízes podem ser amargas, mas o fruto será, com certeza, doce, se esperarmos pacientemente por seu amadurecimento. Muitas frutas escolhidas crescem em árvores espinhosas, e, quem colher os frutos, pode esperar ser picado de vez em quando pelos espinhos.
Nós não podemos escapar das provações. A única coisa que alguns cristãos fazem ao se rebelar é aumentar o próprio sofrimento nas provações e impedir a si mesmos de receber a bênção que delas vem.
Devemos estar dispostos a sofrer quando é da vontade de Deus que soframos, e quando Ele vê que é necessário que soframos. Nosso Mestre bebeu do cálice do sofrimento, mesmo que este fosse amargo. Somos melhores que ele? Devemos nos recusar a seguir o caminho que O levou à glória?
“Também vos digo que, se dois de vós concordarem na terra acerca de qualquer coisa que pedirem, isso lhes será feito por meu Pai, que está nos céus. Porque, onde estiverem dois ou três reunidos em meu nome, aí estou eu no meio deles” (Mt 18.19,20).
Uma das primeiras lições de nosso Senhor em Seu ensino sobre oração foi que não devemos orar para sermos vistos pelos homens. Mas, ao orar, entremos no aposento e estejamos a sós com o Pai. Quando nos ensinou que orar é um contato individual e pessoal com Deus, Ele também nos apresentou uma segunda lição: você não só precisa orar de forma secreta e solitária, mas também em público e em unidade. E Ele nos deu uma promessa muito especial para a oração em unidade de dois ou três que concordarem naquilo que estão pedindo.
Assim como uma árvore tem as raízes escondidas sob o solo e os galhos vão crescendo em direção à luz do sol, igualmente a oração, para seu pleno desenvolvimento, necessita ser feita em secreto, que é quando a alma a sós encontra Deus, e em comunhão pública com aqueles que no nome de Jesus encontram seu lugar para estarem juntos.
A razão pela qual isso deve acontecer assim é simples: o laço que une um homem a seu companheiro não é menos real nem menos próximo do que aquele que o une a Deus – ele é um com eles. A graça não só renova nossa relação com Deus, mas também com o homem. Aprendemos a dizer tanto “meu Pai” quanto “nosso Pai”. Nada poderia ser tão estranho quanto filhos encontrarem com seu pai separadamente e não em uma expressão única de seus anseios e de seu amor. Cristãos não são apenas membros de uma família, mas também de um corpo. Da mesma forma que cada membro do corpo depende de outro, assim a plena ação do Espírito, que habita o corpo, depende da união e da cooperação de todos, de tal modo que cristãos correm o risco de não receberem a plenitude da bênção que Deus está pronto para conceder mediante Seu Espírito, a menos que eles a busquem e a recebam em comunhão uns com os outros. É por meio da união e da comunhão entre os que crêem que o Espírito pode manifestar Seu pleno poder. Foi porque 120 pessoas permaneceram em um mesmo lugar, orando em unanimidade, que o Espírito veio do trono do Senhor glorificado.
As marcas da genuína oração em unidade nos são apresentadas nestas palavras do Senhor:
1. Concordância no que está sendo pedido
A primeira coisa é “concordância” no que está sendo pedido. É indispensável que não haja apenas um simples consentimento mental entre os que pedem, mas é indispensável que haja algo especial, um desejo unânime. A concordância, assim como toda oração, deve ser em espírito e em verdade. Sobre essa concordância ficará muito claro para nós exatamente o que estamos pedindo, se estamos confiantemente pedindo conforme o desejo de Deus e se estamos prontos para crer que já o recebemos.
2. Estarem reunidos em nome de Jesus
A segunda marca é estar reunidos em nome de Jesus. Nosso Senhor nos ensina que Seu nome deve ser o centro da união na qual os crentes estão, cujo laço os faz serem um, assim como um lar contêm e une todos os que estão nele. “Torre forte é o nome do Senhor; a ela correrá o justo e estará em alto refúgio” (Pv 18.10). Tal é a realidade desse nome para aqueles que o compreendem e crêem nele que estar nele é ter o próprio Cristo presente.
O amor e a unidade de Seus discípulos têm atração infinita por Jesus: “Porque, onde estiverem dois ou três reunidos em Meu nome, aí estou Eu no meio deles” (Mt 18.20). É a presença viva de Jesus, na comunhão de Seus amados discípulos que oram, que dá poder à oração em unidade.
3. A resposta segura
A terceira marca é a resposta segura: “Isso lhes será feito por meu Pai, que está nos céus” (Mt 18.19).
Encontros de oração que visam manter comunhão religiosa ou busca pela edificação pessoal podem ter utilidade, mas não é esse o modelo que o Salvador deixou. Outrossim, Ele imaginou encontros de oração como um meio seguro de resposta à oração. Encontros de oração que não têm suas petições atendidas devem ser uma exceção. Quando qualquer um de nós tem anseios específicos e está muito fraco para exercer a fé necessária, deve procurar força e socorro em outros. Na unidade da fé, do amor e do Espírito, o poder do nome de Jesus e Sua presença agem mais livremente e a resposta vem com mais certeza. A prova de que houve unidade na oração é o fruto, o resultado, a resposta, o recebimento do que foi pedido: “Também vos digo que, se dois de vós concordarem na terra acerca de qualquer coisa que pedirem, isso lhes será feito por meu Pai, que está nos céus” (Mt 18.19).
Que indescritível privilégio é a oração em unidade e que poder ela pode ter! Se o marido e esposa crentes soubessem que estão unidos no nome de Jesus para experimentar Sua presença e Seu poder na oração em unidade (1Pd 3.7); se amigos cressem quão poderosa ajuda dois ou três orando em consonância poderia prover para cada um deles; se, em cada reunião de oração, o reunir-se no Nome, a fé na Presença e a expectativa de resposta ficassem em primeiro plano; se, em cada igreja, as efetivas reuniões de oração em unidade fossem o principal motivo das pessoas estarem reunidas, para expressar esse mais elevado poder da igreja; se na Única Igreja a vinda do reino, a vinda do próprio Rei, primeiramente na dispensação poderosa do Espírito Santo, depois em Sua gloriosa pessoa, fossem realmente a causa de um clamor constante a Deus… Oh! Que bênçãos poderiam vir para e por meio daqueles que concordam em provar Deus quanto ao cumprimento de Sua promessa.
No apóstolo Paulo vemos muito claramente que realidade sua fé tinha no poder da oração em unidade. Aos romanos, ele escreve: “E rogo-vos, irmãos, por nosso Senhor Jesus Cristo e pelo amor do Espírito, que combatais comigo nas vossas orações por mim a Deus” (15.30). Como resposta à oração, ele espera ser livre dos inimigos e também prosperar em sua obra.
Aos coríntios, ele escreveu: “O qual [o Senhor] nos livrou de tão grande morte, e livra; em quem esperamos que também nos livrará ainda, ajudando-nos também vós com orações por nós, para que pela mercê, que por muitas pessoas nos foi feita, por muitas também sejam dadas graças a nosso respeito” (2Co 1.10,11). A oração deles era para terem uma participação real na libertação do apóstolo.
Aos efésios, ele escreveu: “Orando em todo o tempo com toda a oração e súplica no Espírito […] E por mim; para que me seja dada, no abrir da minha boca, a palavra com confiança, para fazer notório o mistério do evangelho” (6.18,19). Seu poder e sucesso no ministério dependiam da oração deles.
Aos filipenses, ele diz esperar que suas lutas sejam úteis para a salvação e sirvam para o progresso do evangelho: “Porque sei que disto me resultará salvação, pela vossa oração e pelo socorro do Espírito de Jesus Cristo” (1.19).
Aos colossenses, ele ordena que continuem firmes em oração: “Orando também juntamente por nós, para que Deus nos abra a porta da palavra […]” (4.3). Aos tessalonicenses, disse: “No demais, irmãos, rogai por nós, para que a palavra do Senhor tenha livre curso e seja glorificada, como também o é entre vós; e para que sejamos livres de homens dissolutos e maus; porque a fé não é de todos” (2Ts 3.1,2).
Está evidente, em todas essas passagens, que Paulo se sentia membro de um corpo e que ele contava com as orações das igrejas para que alcançasse o que, de outro modo, não obteria. Para ele, as orações da igreja eram um fator decisivo na obra do reino tanto quanto o era o poder de Deus.
Quem pode imaginar o poder que uma igreja poderia desenvolver e exercitar se ela se entregasse ao serviço da oração dia e noite para que o poder de Deus venha sobre Seus servos e Sua Palavra, e para que Deus seja glorificado pela salvação de almas?
A maioria das igrejas pensa que seus membros se reúnem simplesmente para zelar uns pelos outros e edificar uns aos outros. Elas não consideram que Deus rege o mundo pelas orações de Seus santos, que essas orações são o poder mediante o qual Satanás é vencido, que pela oração a Igreja na terra tem a seu dispor os poderes celestiais. Elas não se lembram de que Jesus, por Sua promessa, consagrou cada assembléia em Seu Nome para ser uma porta para o céu, onde Sua Presença pode ser percebida e Seu Poder pode ser experimentado quando o Pai responde a todos os anseios das igrejas.
Durante os dias em que nosso editor esteve em Salvador, participando da XXI Conferência UniCristã de Teologia e Espiritualidade, ele também teve oportunidade de servir à igreja naquela cidade com a Palavra. Foram duas mensagens. Elas estão abaixo.
Crescimento é um dos mais claros sinais de uma vida saudável. Se é assim no reino vegetal ou animal, é da mesma forma no reino da graça. Portanto, esperamos ver crescimento em todo cristão. Na natureza, em certo ponto, o crescimento pára e o decaimento se estabelece, mas, no cristão, ele deve continuar todos os dias de sua vida terrena.
Nenhuma pessoa com sensibilidade espera que aquele que se converteu ontem seja alguma coisa além de um bebê. Mas esperamos que o convertido não permaneça um bebê. Com um apetite devorador por comida espiritual saudável, uma boa digestão, cheia do ar fresco do Céu e exercícios, ele será compelido a crescer. E a Escritura: “Crescei na graça e no conhecimento de nosso Senhor e Salvador, Jesus Cristo” (2Pd 3.18) se aplica a cada um de nós.
O que é crescimento?
Crescimento não tem conexão direta com idade. Um homem pode ter cabelos brancos com os anos e ter passado por muitos marcos históricos desde a conversão, e ainda assim espiritualmente ser uma criança atrofiada. Alguns dos crentes hebreus eram assim. Eles andavam tropeçando sobre o ABC cristão quando deveriam ser mestres, e precisavam de leite quando já deviam estar prontos para alimento sólido (Hb 5.12-14).
Crescimento não está necessariamente conectado com o que fazemos. Pode haver muito fervor e atividade, e, ainda assim, nenhum crescimento. Os cristãos efésios exemplificaram isso tristemente anos após crerem. Quando o apóstolo Paulo escreveu uma epístola para os efésios, eles eram como uma árvore plantada ao lado de rios de águas: verdes e vigorosos. Mas, quando o Senhor Jesus se dirigiu a eles por meio de Seu servo João, apesar de reconhecer-lhes as obras, o trabalho e a paciência, Ele lhes disse: “Tenho, porém, contra ti que deixaste o teu primeiro amor. Lembra-te, pois, de onde caíste…”. A copa florescente da árvore jovem e promissora havia sido queimada pela frieza, e o crescimento parou (Ap 2.1-7).
Crescimento nem mesmo depende do que sabemos. Nosso desenvolvimento mental pode ultrapassar muito nosso desenvolvimento espiritual. Um “prodígio infantil”, em círculos musicais ou educacionais, é um objeto lamentável na esfera cristã, e terá um final ruim. O neófito, se capaz de mensurar abstrações, pode rapidamente compreender muitas verdades na mente, mas não assumir que se tornou um gigante e apto a instruir o avô.
Alguns dos cristãos de Corinto caíram sob esse engano. Eles estavam enriquecidos em “todo o conhecimento” (1Co 1.5), assumiram ser sábios (3.18), todos tentaram ser mestres (14.26); eles até mesmo começaram a deixar a mente se afastar da verdade cardeal da ressurreição (15.12,35). Mas, na verdade, eles eram ignorantes (6.2,3,9,15,19; 8.2; 10.1; 12.1; 14.38; 15.36), carnais e infantis (3.1-3). Eles usaram o “conhecimento” para prejudicar alguns irmãos (8.11). Esse conhecimento apenas encheu-os de orgulho. O amor edifica (v. 1).
Crescimento, portanto, está completamente ligado ao que somos. A própria Epístola que nos exorta a “crescer em graça” se inicia com uma clara declaração do que realmente isso realmente significa. Ei-la: “E vós também, pondo nisto mesmo toda a diligência, acrescentai a vossa fé a virtude, e à virtude, a ciência [conhecimento], e à ciência, a temperança [domínio próprio], e à temperança, a paciência, e à paciência, a piedade, e à piedade, o amor fraternal, e ao amor fraternal, o amor” (2Pd 1.5-7).
Todos nós começamos com a fé. Mas, a ela, virtude (ou coragem) deve ser acrescentada, para que ela seja levada em conta. A coragem precisa ser controlada pelo conhecimento. Conhecimento precisa ser temperado com domínio próprio. O domínio próprio desenvolve paciência (ou perseverança). A perseverança gera piedade. A piedade produz e desenvolve amor fraternal. O amor, o divino amor, coroa completamente e solda todos juntos no coração do que crê.
Essas coisas, perceba, estão em nós e devem abundar (v. 8). Elas não devem ser colocadas como um homem veste um casaco, mas devem ser produzidas interiormente no poder do Espírito Santo, a fim de que se tornem parte e parcela de nós mesmos.
O apóstolo Pedro estava, de fato, desejando que as características da bela vida de Cristo fosse reproduzida naqueles crentes.
Crescimento, então, está relacionado a caráter. Enquanto crescemos, somos moldados mais e mais em conformidade a Cristo.
Você está crescendo?
Pergunte a si mesmo, então: “Isso está acontecendo comigo? Existe, em minha atividade cristã e no aumento de conhecimentos bíblicos, um forte desenvolvimento do caráter cristão?” Após se perguntar, responda com sinceridade e muito cuidado.
Ao fazer isso, contudo, um perigo espreita. Embora nada seja mais útil que um honesto auto-julgamento perante Deus, nada é mais nocivo do que deixar essa necessária inspeção degenerar em auto-ocupação.
Cuidado com seus pensamentos morbidamente centrados em si mesmo.
Vamos imaginar três crianças que têm pequenos jardins, claramente demarcados nos campos do pai. Quão diferentes eles são! Em um deles, as ervas daninhas crescem e, ao redor, as flores são poucas e fracas. Não há sinal de enxada, ancinho e regador! No segundo tudo está arrumado: as ervas daninhas são cortadas, e as flores, mesmo que não sejam as melhores, estão saudáveis. O terceiro, por sua vez, mostra marcas de muito trabalho. De fato, está quase penosamente em ordem, mas cada flor está ou murchando ou já morta. Quão fácil é, a partir do estado dos jardins, adivinhar o caráter das crianças! E se o estilo descuidado, vai-assim-mesmo, do primeiro deve ser lastimado, a febril ansiedade que levou o terceiro a continuamente puxar uma e outra das plantas para ver como as raízes estavam indo é quase tão desastrosa do ponto de vista prático.
Evite ambos os extremos. Que o bom Senhor livre você do descuido e do tipo de religião fácil que nunca permite que honestamente você se faça a pergunta: “Estou realmente crescendo em graça?” por medo de ser perturbado; e também da mórbida auto-ocupação que leva você a estar sempre se fazendo essa questão, e eternamente puxando tudo em seu pobre coração pelas raízes no esforço de responder a ela.
Encontrar a felicidade significa enfrentar a pergunta com o coração sob a grande luz do amor de Jesus, e, se chegar à conclusão de que seu crescimento é pequeno, deixar que ela o incentive alegremente a conhecer mais de Cristo.
Em que nós crescemos?
É importante lembrar que, como crentes, nós permanecemos na graça (ou favor) de Deus (ver Rm 5.2), e que nos foi pregado pelo apóstolo Pedro que crescêssemos em graça.
Graça, então, é o solo no qual os crentes são plantados, não o mundo – embora, se alguém julgasse pelos caminhos de alguns cristãos, poderia quase pensar que sim. Apesar de todos os crentes permanecerem na graça, muitos cercam a si mesmos com atmosfera mundana de tal modo que todo o processo é parado.
É muito fácil para nós abjurarmos o mundo de modo abstrato, enquanto fortemente nos entregamos a seus prazeres nos detalhes.
Para ilustrar isso. Algum tempo atrás, uma reunião de oração estava acontecendo. Considerável fervor era manifestado na reunião. Um homem começou a invocar a Deus. Em tom fervoroso ele clamou:
– Senhor, salva-nos do mundo!
– Amém! Amém – ecoou em alto coro de todas as partes do local.
Um momento de pausa. Então:
– Senhor, salva-nos do tabaco!
Silêncio mortal e ameaçador! Parecia ter matado a reunião.
Você pode desaprovar que se ore dessa maneira, mas isso mostra como é fácil orar para ser preservado do mundo de modo abstrato e apreciá-lo nos detalhes.
Lembre-se de que as vinhas de Salomão eram roubadas e estragadas pelas “raposinhas” (Ct 2.15). Havia muitas delas e, por serem pequenas, entravam nas vinhas sem atrair muita atenção.
Do mesmo modo, muitos cristãos sofrem por viver em uma atmosfera da lei. Eles vivem e andam, lêem e oram, servem e adoram mediante regras. Nenhum deles pode esperar crescer se ficar enclausurado em ferro rígido!
Quão doce é a liberdade que a graça dá! Refiro-me à liberdade, não à licenciosidade. Pois a graça que traz salvação também nos ensina “que, renunciando à impiedade e às concupiscências mundanas, vivamos neste presente século sóbria, e justa e piamente” (Tt 2.12).
Vamos fincar nossas raízes profundamente na graça. Vamos nos expor a sua luz. Oh! O efeito de uma alma humilhada e subjugada por tal conhecimento, a despeito de tudo o que encontramos em nós mesmos, o doce e perfeito favor de Deus repousa sobre nós por causa de Cristo, e nada pode nos separar “do amor de Deus, que está em” – não em nós mesmos, mas em – “Cristo Jesus nosso Senhor” (Rm 8.39).
Como crescemos?
Ultimamente, muito tem sido dito em público sobre o aspecto físico decaído de milhares de crianças que frequentam a escola. A questão prática é: “O que deve ser feito?” O caso será resolvido dando a elas muito o que fazer em exercícios e atividades? Não, elas não tem energia ou vigor para tanto. Deve-se incluir alguma instrução sobre saúde nos estudos escolares, e ensiná-las como o corpo humano cresce, acrescentando célula a célula e tecido a tecido, o valor de diferentes alimentos e as leis que governam o processo de digestão?
Seis anos de estudos desse tipo não vão acrescentar muitos centímetros à estatura delas quanto seis meses de uma boa alimentação: refeições substanciais de comida adequada, quatro vezes por dia e sete dias por semana!
Se você quer crescer, então, selecione boa comida espiritual. Boa comida, lembre-se. Não novelas, literatura leviana ou outro lixo mundano. E digira isso. Invista tempo para meditar e pensar a respeito. Quando o boi rumina, geralmente se deita. Do mesmo modo, a digestão espiritual é grandemente favorecida por um pouco de quietude, com os joelhos dobrados em oração.
A comida do Cristão é, em uma palavra, Cristo: “crescendo no [ou pelo] conhecimento de Deus” (Cl 1.10) – e, como é em Cristo que Deus é conhecido por nós, Pedro afirma: “Crescei na graça e no conhecimento de nosso Senhor e Salvador, Jesus Cristo” (2Pd 3.18).
É bom conhecer sobre Ele, e tudo que nos ajuda nesse sentido é proveitoso, mas o ponto de suprema importância é conhecer o próprio Senhor Jesus Cristo, desfrutar aquela santa intimidade que é fruto do viver e do andar diários em Sua presença. Mesmo aqui na terra, estar
“Perto de Sua confiável companhia
em divina comunhão”.
Então, pouco a pouco, devemos descobrir Sua multifacetada glória, e apreciar as várias características nas quais Ele permanece relacionado a nós. Nas linhas seguintes, vamos tentar sugerir um pouco delas.
O começo de nosso conhecimento de Jesus é como
Salvador, para libertar.
Para o pecador ansioso, sobrecarregado com culpa, lamentando sob o pecado e tremendo diante da morte e do julgamento, Jesus se destaca como Salvador. Ele lutou com o pecado; Ele morreu e ressuscitou. Quão perfeito e atraente Ele é! Não admira que o recém-perdoado pecador não se preocupe com mais ninguém e com nada mais.
Você pode olhar para trás, para o momento em que experimentou a alegria da salvação, como os israelitas fizeram, quando estavam na outra margem da inundação de julgamento do Mar Vermelho: eles cantaram, dizendo: “Cantarei ao Senhor, porque gloriosamente triunfou […] O Senhor é a minha força e o meu cântico; Ele me foi por salvação” (Êx 15.1,2)? Ou como ocorreu com Israel séculos depois, quando Davi encontrou Golias, de Gate, e, em nome de Jeová, forjou a libertação? Então, a terrível tensão e o horrível suspense terminaram. Uma emoção poderosa percorreu os que assistiam, e “os homens de Israel e Judá se levantaram e jubilaram” (1Sm 17.52).
Foi assim conosco. Nós fomos libertados. Nossos dias de murmuração e suspense acabaram. A vitória foi conquistada, e Jesus vive! E, apesar de talvez anos terem se passado desde quando O conhecemos, a emoção daquele momento está em nosso coração ainda hoje.
Nós não vamos muito longe sem antes ver o mesmo Jesus em outra característica. Ele é
Senhor, para comandar.
O evangelho, claro, no-Lo apresenta como Senhor (2Co 4.5). Nós não apenas cremos com o coração para a justiça, mas também com a boca O confessamos como Senhor para a salvação (Rm 10.9,10). Mas algum pouco tempo se passa antes que nós percebamos o que isso significa.
Jesus está no lugar de autoridade. É Dele o comando, e nossa, a prazerosa obediência, e isso significa render nossa vontade a Ele.
A conversão do apóstolo Paulo foi a ideal. Ele muito rapidamente alcançou o ponto de se render (ver At 9.5,6). Ele estava na poeira da estrada para Damasco quando reconheceu Jesus como seu Senhor, e sua vida toda foi transformada. Muitos de nós ficam muito atrás dele. Ainda assim, todos temos de chegar a esse ponto.
Estávamos conversando com um jovem cristão outro dia, e, durante a conversa, ele se referia muitas vezes aos “dias de outrora”, quando ele era um crente mundano, negligente, tendo apenas um apático interesse pelas coisas de Deus. Ele disse: “Eu realmente cri no Senhor Jesus Cristo para o perdão de meus pecados, e, se eu tivesse morrido, tenho certeza de que iria para o céu.”
Entretanto, aqueles foram os “dias de outrora”, pois um novo dia amanheceu com a descoberta de que Jesus era seu Senhor, um Mestre pelo qual viver e a quem servir. Ao colocar-se sob essa nova postura, uma grande alteração tomou lugar. Ele era um homem diferente.
Esse novo dia já amanheceu em sua história? Se não, que venha rapidamente! Ele está bem no comecinho da vida cristã.
Um dos primeiros resultados de um genuíno reconhecimento do senhorio de Cristo é que o convertido mergulha em um bocado de problemas e de exercício da alma, uma vez que seus muitos esforços para fazer a vontade de seu novo Mestre, recentemente encontrado, o levam a estar em conflito com a própria vontade.
Três coisas, pelo menos, devem ser aprendidas.
Primeira: a verdadeira natureza da carne (i. e., a velha natureza má ainda dentro de nós), irremediavelmente má. “Eu sei que em mim, isto é, na minha carne, não habita bem algum” (Rm 7.18). Se não há “bem algum”, então, nem mesmo um bom desejo será encontrado lá. No entanto, quanto tempo leva ainda para a maioria de nós abandonar qualquer expectativa de bem, ou mesmo de melhora, iniciado do interior.
Segunda: o terrível poder da carne. Esse poder – embora, de fato, tenhamos nascido de novo e, assim, possuindo uma nova natureza – não nos capacita a vencê-la. Vemos um homem dizendo: “Porque não faço o bem que quero, mas o mal que não quero esse faço” (v. 19). Ele desejava o bem, provando a existência da nova natureza dentro dele, mas tal era o poder da velha natureza que superava a nova, levando-o ao cativeiro (v. 23) e fazendo dele um homem completamente miserável (v. 24).
Você supostamente começou a viver uma valorosa vida cristã para o Senhor, apenas para se encontrar derrotado, não por inimigos gigantes exteriores, mas pela traidora “carne” que está dentro de você?
Essa é, então, a lição que você está aprendendo.
Terceira: o que Deus fez em relação à carne na cruz de nosso Senhor, Jesus Cristo. “Deus, enviando o seu Filho em semelhança da carne do pecado, pelo pecado condenou o pecado na carne” (8.3). Que alívio é conhecer isso! Deus agora trata a carne como uma coisa condenada, e fez isso com ela. Só nos resta alinhar-nos com Deus e, de nosso lado, tratá-la como coisa condenada e acabada. Isso nós podemos fazer, pois, por termos crido em Jesus, recebemos o Espírito Santo, o novo poder, e Ele é mais do que um mero adversário para o poder da carne.
Liderados pelo Espírito Santo, levantamos os olhos para o céu, e Jesus agora se torna para nós
Um objetivo, para controlar.
E este é o verdadeiro segredo do crente ser libertado, de modo prático, do poder do mundo, da carne e do diabo.
Satanás, o astuto adversário e acusador final, ocupa seu tempo em atacar a fé dos santos (ver 2Co 11.3; 1Ts 3.5; 1Pd 5.9) e, conseqüentemente, para enfrentá-lo o escudo da fé é necessário (Ef 6.16).
A carne nos supre com todos os desejos mais baixos, os quais cada um de nós conhece muito bem, assim como com qualquer outro desejo que não está de acordo com a vontade de Deus.
O mundo – o gigantesco sistema ao nosso redor, no qual Satanás e o homem têm trabalhado entre si na vã esperança de torná-lo o mais feliz e contente sem Deus –, como na grande “Feira das vaidades” de Bunyan, contém atrações adequadas para cada gosto e temperamento, e todas apelando para os desejos da carne dentro de nós.
Embora livros possam ser bem escritos sobre como o crente se liberta desse triplo inimigo, e o caminho para isso, essa liberdade mesma é simples e docemente desfrutada por aqueles que, tendo aprendido o suficiente sobre o mundo e sobre si mesmos para estarem enojados de ambos, voltam para Jesus e encontram Nele
“O Objetivo brilhante e adequado
para preencher e satisfazer o coração.”
(Jim Elliot, em seu diário)
Jesus é isto para sua alma: um Objetivo para amar e pelo qual viver? Paulo disse: “Porque a lei [ou controle] do Espírito de vida, em Cristo Jesus, me livrou da lei [ou controle] do pecado e da morte” (Rm 8.2).
Uma impressionante ilustração do poder de um objetivo para controlar ocorreu quando o primeiro avião militar fez um vôo de teste ao redor de Londres. Durante a breve hora que pairava sobre a metrópole, ele se tornou o objetivo de milhões de pares de olhos. Tudo o mais foi esquecido. A última moda perdeu sua atração, lojas ficaram desertas, jantares esfriaram. Alinhados homens de negócios largaram a caneta e estudantes largaram seus livros. Todo mundo parou e olhou fixamente para esse novo objetivo no céu e, naquele instante, foram claramente libertados de sua vida ordinária.
De qualquer modo, foi a novidade da coisa que atraiu. Não é assim com Jesus. Quem O tem amado há mais tempo e O conhece melhor sente Suas benditas e permanentes atrações. Em síntese: está tudo centralizado em Seu poderoso e eterno amor. Assim como um poderoso ímã extrairá uma agulha de um monte de serragem, o amor magnético de Jesus irá libertar uma alma de qualquer montanha de lixo mundano e carnal. Que Deus atraia tanto os leitores quanto o escritor para esse poder cada vez mais.
Se tudo isso for mantido, devemos conhecer e apreciar o Senhor Jesus em outra característica, que é
Sumo sacerdote, para sustentar.
Há muitos bons cristãos que querem ser mais devotados, ou viver “a vida mais elevada”. Mas, apesar dos desejos serem bons, suas circunstâncias são um desafio e os resultados são pobres. Você é um deles?
Possivelmente você está familiarizado com a Epístola de Hebreus e, assim sendo, sabe que Jesus é seu grande Sumo Sacerdote no céu (4.14), mas a questão é: Você, de modo real e prático, O conhece como seu grande Sumo Sacerdote, que sustenta sua alma dia a dia, no meio de tantas provas e dificuldades da vida?
Somente aqueles cujo rosto está voltado na direção certa podem esperar a ajuda do Sacerdote. Ajudar um homem no caminho errado não é, de fato, ajudar. Consequentemente, o crente descuidado e de mente mundana não receberá a ajuda do Sacerdote; ele precisa dos serviços de Jesus como Advogado para tocar-lhe a consciência e endireitá-lo. O crente de mente sincera, que, de coração, reconhece Jesus como Senhor e O ama como Objetivo, tanto precisará disso quanto o obterá, tendo por resultado não apenas ser levado em segurança para o céu mais tarde, mas também levado ao Santo dos Santos (i. e., a conscientemente percebida presença de Deus) agora (10.19-22)
Nada que possa ser dito sobre o assunto, entretanto, nos dará uma percepção da graça e do poder de Jesus como nosso Sumo Sacerdote maior do que a dada por uma pequena experiência prática, ganha em nos voltarmos para Ele em momentos de dificuldade e necessidade. Portanto, guardemos bem a exortação. “Cheguemos, pois, com confiança ao trono da graça, para que possamos alcançar misericórdia e achar graça, a fim de sermos ajudados em tempo oportuno” (4.16).
Tudo isso nos ensinará a olhar alegremente para o Senhor Jesus como
A Cabeça, para direcionar.
Cristo é a cabeça da Igreja, assim como o marido é a cabeça da esposa (Ef 5.23). Dele, também, como Cabeça, vem todo o alimento e suprimento para Seu corpo (4.15,16).
Sabedoria, direção e nutrição são necessidades diárias, e o suprimento delas não está em nós, mas Nele. Como cabeça, Ele é a fonte superabundante de tudo. Estar “ligado à cabeça” (Cl 2.19) é apreciá-Lo e apegar-se a Ele como tal, e, desse modo, realmente encontrar Nele aquilo que nos faz gratamente independentes da sabedoria dos homens no caminho do racionalismo (v. 8) e de sua religião no caminho do ritualismo (vv. 20-23).
Cristo é tudo e, assim, Ele se torna tudo no coração do crente. Fora Dele, nada há.
Uma palavra de alerta. Não pense que cada um desses passos no conhecimento de Cristo existe separadamente. Eles estão intimamente ligados, e, com freqüência, se fundem um em outro na história do cristão. O grande final é que podemos estar completamente firmados, não sendo mais crianças, mas homens totalmente crescidos, com Cristo sendo tudo para nós.
O que expressamos quando estamos com outros cristãos?
O que expressamos quando estamos com outros cristãos?
Recentemente, num domingo à tarde, rodeado de muitos amados irmãos, enquanto eu lavava louça me vieram ao coração dois pensamentos.
1) Nosso ajuntamento cristão não tem aquilo que o mundo tem.
Quando cristãos – e aqui me refiro a cristãos sérios, bíblicos, que levam a santidade a sério, que têm temor do Senhor, que honram Seu nome por meio do viver prático que têm – estão juntos, em ambiente informal (num almoço ou numa convivência, por exemplo), não há aquilo que caracteriza eventos mundanos semelhantes: bebedeira, palavrões, insinuações maldosas, piadas de baixo calão, fofocas, adultérios, crianças largadas a si mesmas, etc. Cristãos que honram a Deus em todos os aspectos da vida, começando com a linguagem, reúnem-se e conversam amenidades, trocam idéias sobre as questões mundiais, dicas sobre educação de filhos, riem de si mesmos, buscam orientação profissional, trocam receitas, dicas de tratamento médico, corujices sobre os filhos… É aquilo que chamam de ambiente saudável.
Isso é, sem dúvida, para quem teme a Deus, mil vezes melhor do que um ambiente mundano típico. (Infelizmente, há muitos cristãos que se sentem completamente à vontade em ambientes mundanos, que os preferem àqueles “crentes”, que estão plenamente conformados a este mundo, pensando, falando, rindo, comendo, bebendo e vivendo como se a ele pertencessem.) Há ali segurança, respeito mútuo, alegria saudável, domínio próprio, ambiente propício para as crianças e tantas outras vantagens. É muito bom, é muito vantajoso estar em um lugar assim. E eu estava alegre com essa percepção e grato a Deus por estar ali.
Mas algo mais me veio ao coração:
2) Mas será que nosso ajuntamento cristão tem aquilo que o mundo não tem?
Isso me foi um choque instantâneo. O que há de distintivo, único, exclusivo dos cristãos? O que há nos cristãos que não há, de modo algum, naqueles que não obedecem à fé? A presença do Senhor Jesus, por meio do Espírito; a vida de Cristo Jesus habitando naqueles que Lhe pertencem. E é isto que faz a verdadeira e prática comunhão cristã: Cristo ser “servido” pelos cristãos uns aos outros. Quando Cristo é nosso centro e a esfera de nossa comunhão, podemos dizer que, de fato, estamos em comunhão. Do contrário, teremos, talvez, apenas um bom ajuntamento cristão (que, repito, em princípio é muito melhor do qualquer similar mundano).
Mas, tenho de reconhecer, é tão difícil termos genuína comunhão! É tão difícil sairmos da esfera natural, das coisas desta vida, e partilharmos das celestiais, daquilo que é nossa rica herança em Cristo, das riquezas insondáveis Daquele que nos salvou! Parece pouco espontâneo (perdoem-me se generalizo; falo, em primeiro lugar, de mim mesmo) voltar-se de um assunto desta vida para a Bíblia, como se fosse possível mantê-los separados, como se fossem antagônicos.
Como cristãos, temos algo único: um relacionamento vivo e real com Deus por meio de Seu Filho, Jesus Cristo! Isso nenhum ajuntamento secular tem. No entanto, é possível que um ajuntamento de cristãos também não o tenha, caso não falemos entre nós “com salmos, e hinos e cânticos espirituais”, que é o modo de nos enchermos do Espírito (Ef 5.19); se não tivermos um falar que denuncie que estivemos com Jesus (At 4.13). Os primeiros discípulos não podiam deixar de falar do que tinham visto e ouvido (4.20). E nós, cristãos do século 21, por que deixamos tão facilmente? É possível que seja resultado de vermos e ouvirmos pouco nosso Senhor, de termos pouca comunhão com Ele, por Sua Palavra não habitar em nós ricamente (Cl 3.16), e, como a boca fala do que está cheio o coração…
Os primeiros cristãos caíram na graça de todo o povo (At 2.47), pois seu viver diário e prático não tinha aquilo que o mundo tinha ― era distinto, atraente. No entanto, “dos outros [os não-cristãos], porém, ninguém ousava ajuntar-se a eles” (5.13), certamente porque naquele ajuntamento havia algo que no mundo não havia: Deus mesmo, real, manifestado palpavelmente por meio de Seus filhos ― um Deus tão santo que não tolerava mentira entre eles (vv. 1-11). As pessoas de fora viam, naquele novo grupo, características que as atraíam, mas percebiam que havia também uma realidade interior, um padrão dela derivado, que impedia que qualquer um se achegasse e por ali ficasse se não fosse um “deles”, um discípulo, um nascido do alto, um filho de Deus.
No que depender de mim e de você, que tipo de ajuntamento cristão o mundo verá?
Publicado originalmente em 7.2.15; atualizado em 1.8.18.